quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Inteligente, mas parvinho



Publicado ontem

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A História tem, às vezes, infelizes coincidências. Um exemplo: S. Francisco de Assis, o homem que se dedicou aos mais pobres dos pobres, teve como companheiros de vida problemas de visão e no aparelho digestivo. Passados quase 800 anos sobre a morte do fundador da Ordem dos Franciscanos, temos outro Francisco Assis acossado pelas mesmas maleitas.
O deputado e ex-líder parlamentar do PS escreveu, na passada quinta-feira, um texto no "Público" intitulado "Atravessamos o mais perigoso dos tempos". É uma pretensa reflexão sobre os dias negros que sobre nós pairam: Assis vê a catástrofe ao virar da esquina e antevê o "triunfo dos cínicos, dos redentores, dos demagogos, dos proclamadores de simplismos ideológicos" (sic). Um horror!
A dada altura, a azia que consome o deputado socialista turva-lhe, manifestamente, a visão. Francisco acha que, entre os vastos e gigantes perigos que nos atormentam, estão também o "Jornal de Notícias" (JN) e o "Correio da Manhã" (CM). Diz o parlamentar que os dois diários "constituem verdadeiros inimigos da democracia". Credo! E porquê? Porque, "ao apelarem às piores pulsões populares (...), contribuem para a degradação de um espaço público que é indispensável para a afirmação de um verdadeiro espaço democrático" (sic).
Francisco Assis está para a leitura da linha editorial do JN como António Borges esteve para a leitura das críticas às alterações na taxa social única. Borges acha que os empresários são "ignorantes"; Assis acha que os cerca de dois milhões de pessoas que, por junto, leem todos os dias o JN e o CM são estúpidas. Quer dizer: não percebem que estão a ler perigosos instrumentos antidemocráticos; não percebem que estão a ser sibilinamente conduzidos por gente sem escrúpulos que só quer vender papel; não percebem que lhes estão a ser arrancadas a ferros as suas "piores pulsões", seja lá isso o que for.
O deputado já quis um dia ser líder do PS e, logo, primeiro-ministro deste país. Convém, por isso, perguntar--lhe: se, um dia, lhe calhar essa sorte, o que fará para travar estes "verdadeiros inimigos da democracia"? Manda fechá-los? Nacionaliza-os?
A arrogância nunca anda de mão dada com a sensatez. Francisco Assis faz lembrar o que um amigo de Mário Soares lhe disse sobre o filósofo e autor António Sérgio, quando o viu a passear na Baixa de Lisboa: "Olha, ali vai o parvinho mais inteligente que conheço".
S. Francisco de Assis viveu num tempo em que o estado do Mundo não se recomendava. Dedicou-se aos pobres. Fez-se santo. Francisco Assis vive num tempo em que o estado do Mundo também não se recomenda. Ele está disposto a cobrir-nos com o seu enorme manto de sabedoria, para nos salvar. Far-se-á santo?
Tenhamos medo. Muito medo.

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