O Passos Coelho e o pobre que votou nele não são a mesma pessoa, não têm o mesmo poder, saber e responsabilidade. Não foi o «povo», que todos culpam de tudo, que governou o país estes anos.
Nos últimos anos criou-se uma ideia absurda de igualdade entre desiguais e de obscurantismo de pensamento, o que gera suspeitas permanentes. A pessoa chega a um bairro miserável de gente que não consegue educar os filhos e dizem-nos que é uma comunidade, «cada um é como cada qual». Também isto chegou às salas de aulas onde os alunos acham que são iguais ao professor, alguns até acham que estão ali para brincar e não para aprender com humildade (o que é compatível com a critica). O resultado disto é o crescimento vertiginoso da ignorância e do falso bem estar. Eu como professora pergunto sempre: «queres a versão dura ou a soft?». É que sei fazer ambas mas, aviso já, só a primeira resulta. Porque a certa altura aquilo que é delicadeza passa a ser ocultação. E é na ocultação que vivemos. Os trabalhadores que cada vez mais só fazem asneiras na gestão da vida familiar ou pessoal são tidos como uma multidão que opera por escolhas. Quando o que são e estão é perdidos, incluindo e muito nos sectores médios. Tão pouco querem reconhecê-lo. Quanto mais pobres mais paternalista é a sociedade. E quanto mais médio mais dão por adquirido que o que fazem fazem bem. Tudo é fruto das suas escolhas individuais que como são escolhas seriam correctas. Estão devastados nos trabalhos, os filhos obesos agarrados aos telemóveis, exaustos sem tempo de lazer, com os casamentos presos por um fio, isto é, pelo crédito à habitação. Mas escolhem. Escolhem o quê?! Tudo isto é puro liberalismo, embora com a capa de liberdade.
Isto vem a propósito do seguinte: estou aqui no quentinho a corrigir o meu último livro há dias e dias, e dias. Tive o bom senso de o dar a 3 homens que gostam muito de mim, e eu deles. Devolveram-me com críticas duríssimas, só quem respeita e acarinha faz as coisas assim. É certo que quando lhes entreguei pedi «sem clemência», para mim é a versão durissima faz favor. Agora divirto-me a ler, enquanto corrijo todas as críticas que fizeram. Então a coisa reza assim: «Que português é este?», «Não se percebe nada!», «Que petisco é este?», «Reescrever tudo», «ERRO», «Simplificação grosseira!», «Erro MONUMENTAL», «Precisamos de falar sobre isto». Também há por lá uns simpáticos «Brilhante», «Muito bom», aqui e ali, qb para não acirrar a vaidade.
Antes de um livro ir para o forno nós precisamos de ouvir o que não queremos ouvir. E agradecer, muito. Já agora, os trabalhadores não sabem o que fazem, vivem mal, o povo não é estúpido, é estupidificado. Precisam de ajuda e não de gente cínica a crucificá-los e a dizer que são responsáveis pelo estado do país. Precisam também de saber que não sabem e saber pedir ajuda. Reconhecer com humildade que não sabem é bonito, seguir o rumo da ignorância é suicida. Precisamos de acabar com este obscurantismo, e o primeiro passo é dizer ESTÁ ERRADO! E há caminhos certos. E não, não é "tudo igual", "tudo relativo", "cada um tem a sua opinião" e outras chanchadas. Há erros, erros graves, são para corrigir. RAPIDAMENTE.
Passos Coelho conseguiu, pago pelos nossos impostos, destruir os serviços públicos, que já não existem com qualidade mas que continuamos a pagar. E acaba a dar aulas numa universidade pública, paga por nós, onde vai ensinar a outros como continuar a destruir serviços públicos, que continuaremos a pagar, mesmo quando já não existirem. O Estado é deles. Merece o lugar de catedrático. Quem não o conseguiu parar é que deve lamentar. A oposição real neste país está paralisada entre o corporativismo sindical, o eleitoralismo partidário e o colapso moral da esmagadora maioria dos intelectuais, que se recusam a criticar com substância o modelo social em que vivemos. Passos foi de Massamá ao Restelo a cavalo na vida política pública. Pagámos a conta toda.
PEDRO, O CATEDRÁTICO
Nada contra a possibilidade de um ex-governante lecionar numa universidade. Independentemente das suas escolhas políticas. Nada contra o acesso especial à carreira universitária, inclusive em lugares do topo, a pessoas de reconhecido mérito, cuja experiência e obra, ainda que desenvolvidas noutros lugares que não a sala de aula, possam acrescentar algo em termos de conhecimento ou de real prestígio para a escola. Ora é aqui que bate ponto no caso agora em apreço: sem formação, mérito ou reconhecimento não faz sentido, a não ser por nepotismo, o convite dirigido pelo ISCSP a Passos Coelho. É uma desonra para uma escola pública, e uma afronta para quem, no sistema universitário, tanto dá ao longo da vida subindo custosamente a pulso, ou nem sequer o consegue fazer devido ao rigoroso limite de vagas.
Nada contra a possibilidade de um ex-governante lecionar numa universidade. Independentemente das suas escolhas políticas. Nada contra o acesso especial à carreira universitária, inclusive em lugares do topo, a pessoas de reconhecido mérito, cuja experiência e obra, ainda que desenvolvidas noutros lugares que não a sala de aula, possam acrescentar algo em termos de conhecimento ou de real prestígio para a escola. Ora é aqui que bate ponto no caso agora em apreço: sem formação, mérito ou reconhecimento não faz sentido, a não ser por nepotismo, o convite dirigido pelo ISCSP a Passos Coelho. É uma desonra para uma escola pública, e uma afronta para quem, no sistema universitário, tanto dá ao longo da vida subindo custosamente a pulso, ou nem sequer o consegue fazer devido ao rigoroso limite de vagas.
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