Michel Temer quer candidatar-se. Ainda não se sabe se o seu ministro das Finanças será candidato a vice ou a Presidente. Com hipóteses de vitória quase nulas, a campanha pode servir para preparar o futuro de ambos fora do Planalto.
No espaço de dias, Michel Temer confirmou a intenção de se candidatar às presidenciais brasileiras, marcadas para Outubro, e escolheu o seu candidato a vice-presidente, que pode servir como seu substituto na candidatura: Henrique Meirelles, o ministro das Finanças. As hipóteses de vitória eleitoral de ambos são praticamente nulas. Por isso, a entrada na corrida eleitoral deste ano poderá servir para começar a desenhar o futuro de ambos.
"Meirelles provavelmente quer ser candidato para ganhar mais visibilidade”, diz Christian Lynch, professor no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Para se candidatar “a senador ou continuar como ministro da Fazenda [das Finanças] no próximo Governo”, explica.
Henrique Meirelles pertence ao Partido da Social Democratico (PSD), mas esta semana o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), de Temer, anunciou que o ministro se iria filiar nesta formação. Meirelles confirmou a troca de sigla mais tarde, mas afirmou que iria decidir sobre uma eventual candidatura presidencial, e consequente saída do Ministério das Finanças, na próxima semana.
Temer seria a primeira aposta do PMDB para candidato presidencial. O partido pretende que Meirelles forme “chapa” (candidato a vice-presidente) com o actual Presidente, ou que seja uma espécie de suplente presidencial, caso Temer desista de concorrer. Ou se veja obrigado a sair da corrida, pelos casos de corrupção que o acossam.
Agradar aos mercados
Mas a aposta não tem grandes hipóteses de vingar. “Meirelles seria um candidato de centro-direita, para agradar ao sector financeiro. Não tem a mínima chance de ser eleito”, diz Lynch.
As sondagens não têm sido simpáticas nem para Temer nem para Meirelles. Os níveis de popularidade do Presidente rondam os 6% e, segundo uma sondagem do Datafolha, de Janeiro, a tendência de voto em Meirelles, mal conhecido dos eleitores, embora tenha sido presidente do Banco Central do Brasil durante os dois governos de Lula, não chega aos 5%.
Os feitos económicos do Governo serão a grande bandeira eleitoral de Temer. Este tem realçado insistentemente, tal como Meirelles, que retirou o Brasil da maior recessão das últimas décadas, que a inflação está em níveis bem abaixo do esperado, que os juros estão também a cair e que o desemprego baixou. Mas a crise política instalada no país e os sucessivos escândalos de corrupção têm falado mais alto.
Para além de uma carreira de décadas na alta finança que lhe granjeou prestígio, o período no Governo valeu a Meirelles a confiança dos mercados. Mas junto do eleitorado pouco ou nenhum efeito teve.
Sem carisma
“Ele não tem qualquer carisma. Nunca exerceu cargos executivos. Ninguém sabe o que ele pensa sobre qualquer outro assunto que não seja economia e finanças”, afirma Lynch.
Aliás, a decisão de envolver Meirelles na corrida eleitoral, juntamente com Temer ou sozinho, dá um sinal de que a intenção é continuar a “actual linha de condução da política económica”, explica o professor brasileiro.
Por isso, se a questão económica é a grande bandeira do actual Governo, como poderá Meirelles capitalizar esses feitos junto do eleitorado brasileiro? “Francamente, não há nada que ele possa fazer. A sua missão última era fazer a reforma da previdência, e ele fracassou”, diz Lynch.
A reforma da previdência (da Segurança Social), arquitectada por Meirelles, é talvez o maior pilar do Governo de Temer. Mas depois de várias negociações com a sua base aliada no Congresso brasileiro, o Presidente não a conseguiu aprovar.
Temer, em entrevista esta semana à revista Isto É, atribui o fracasso das negociações ao “acidente do rapaz”, referindo-se a Joesley Batista, que gravou uma conversa com o Presidente, onde este aparenta, entre outras coisas, autorizar o pagamento para comprar o silêncio do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha no âmbito do processo da Lava-Jato.
Manter-se vivo
Esta semana, Temer desfez praticamente todas as dúvidas e afirmou que tem a intenção de se candidatar, apesar de ter níveis de impopularidade recorde, de ter dito quando chegou ao Planalto que não iria entrar na corrida eleitoral e de enfrentar três processos judiciais – relativamente a dois deles, o Congresso rejeitou o seu prosseguimento para os tribunais para que fosse julgado. Mas esta sexta-feira, a justiça voltou a cercá-lo, com detenções de próximos.
Disse, na entrevista à Isto É, que não avançar com a candidatura seria “cobardia”. Argumentando que recuperou “um país que estava quebrado”, Temer garante que se orgulha do que fez. “E eu preciso de mostrar o que está a ser feito. Se eu não tiver uma tribuna o que vai acontecer é que os candidatos sairão e vão-me bater. E eu vou ter de responder”, justifica ainda.
Apesar de acalentar esperanças de continuar no cargo de Presidente, Temer pretende principalmente ir à luta para defender o que fez no Palácio do Planalto, antecipando já os intensos ataques de que vai ser alvo durante a campanha eleitoral que começa a meio de Agosto.
“Temer sempre foi um político eleitoralmente inexpressivo. É a representação perfeita do político profissional, articulador, oligárquico, para quem a política é uma arte em si mesma”, aponta Lynch, afirmando que a candidatura servirá para o “projectar” e para impedir que “o seu Governo ‘acabe’ agora, mantendo-o ‘vivo’ debaixo da chuva de ataques que lhe dirigirão”.
O professor brasileiro diz ainda que o Presidente pretende “garantir alguma força no próximo quadriénio presidencial”. “Quem sabe para obter um posto que lhe mantenha o foro privilegiado nos próximos anos. Como embaixador em Lisboa, por exemplo”.
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