Saturday, February 6, 2016

'Quinito': A vida, os golpes e as fugas de um rei do crime


05.02.2016 às 9h56 




Durante mais de dez anos, jogou ao gato e ao rato com as polícias. As autoridades acreditam que, numa das suas passagens pela prisão, continuou a comandar o seu gangue com um telemóvel que escondia na cela. Quinito escapou a emboscadas e sobreviveu a acidentes, mas acabou atraiçoado por dois ex-companheiros. Em entrevista à Visão, nega os crimes violentos e diz que quer 'continuar a ser uma mais-valia para a sociedade'




Jornalista



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Fins de maio de 2009. Foi só com relativa surpresa que investigadores criminais do Grupo de Intervenção de Operações Especiais (GIOE) da GNR descobriram que Fábio Rodrigues, ou Quinito, possuía e usava um telemóvel na sua cela da penitenciária de Lisboa (algo proibidíssimo, claro), onde estava em prisão preventiva sob a suspeita de ter feito um carjacking (roubo violento de um carro, com o condutor presente). Nada de muito espantoso, o telefone. Qual enguia, Quinito já havia escapado de alegadas (e, sobretudo, pesadas) situações incriminatórias que pareciam não lhe oferecer saída. E, afinal, abria-se uma janela de oportunidade aos investigadores (leia-se escutas), que procuravam provas para envolver Quinito em bem mais crimes do que apenas um carjacking. Em concreto, na liderança de um gangue de assaltos a caixas de multibanco que, a partir de um problemático bairro onde Quinito era rei, o da Bela Vista, em Setúbal, já ia em mais de cem investidas e €2,7 milhões roubados. Esses assaltos eram antecedidos de carjackings, às dezenas, de automóveis de gama alta e média alta, para deixarem as viaturas policiais a milhas em perseguições. Entre as nove da noite e as duas da madrugada, roubavam os carros. Depois, disparavam em grande velocidade ao encontro da ATM escolhida, em dois automóveis um para transportar a caixa de multibanco arrancada ao chão e outro para confundir e despistar as forças de segurança. Imprevisivelmente, atuavam de segunda a sexta-feira, até às sete da manhã. Ao fim de semana, descansavam. O seu modus operandi, porém, tem muito mais que se lhe diga. Lá iremos.

O alvo das escutas na penitenciária de Lisboa mostrou-se prolixo. Entre chamadas feitas e recebidas na cela, a que acresciam trocas de SMS, Quinito estava agarrado ao telemóvel dia e noite. Mas tudo era conversado e escrito em linguagem codificada. Ainda assim, os investigadores do GIOE percebiam que se falava muito de dinheiro a receber e entregue, e de recados suspeitos. Quando algum interlocutor ia mais longe do que devia, no entanto, Quinitocortava a conversa com uma piada, que as tinha sempre na ponta da língua e estas para serem entendidas à primeira. Por exemplo: "Sou o perigoxo eletrexixta maix kunhexido d portugal!", ironizava, num SMS, usando a profissão, de exercício misterioso, que apresenta sempre às autoridades. Mas as escutas apenas duraram um mês e uma semana. Uma fuga de informação deu cabo das expectativas dos investigadores.

'ALERTA CM'

A 5 de julho de 2009, pouco antes do almoço, Quinito ligou a um familiar, que o avisou de que a edição do Correio da Manhã desse dia trazia uma notícia segundo a qual ele, mesmo preso, continuaria a comandar os assaltos a caixas de multibanco da sua cela, por telemóvel. Segundo o jornal, havia uma hora noturna combinada em que elementos do "gangue" se juntavam em casa de um grande amigo de Quinito, Jonny Pinho, então em prisão domiciliária na Bela Vista, à espera do telefonema do líder, com "instruções" operacionais. Na busca à cela feita ainda nesse dia, os militares do GIOE verificaram o sumiço do telefone. Encontraram folhas com numerosos contactos telefónicos e com nomes associados a quantias monetárias. Quinito disse desconhecer a proveniência de tudo isso. Ao arredarem um móvel de madeira, descobriram um buraco escavado na parede, com as medidas perfeitas para o telemóvel repousar. Mas o telefone, assim como a engenhoca que o carregava (colado a uma pilha, um fio elétrico termina num cabo de ligação ao aparelho), já estavam em parte incerta.

Menos afortunados, dois companheiros de Quinito, Marco Daires e Carlos Semedo, ou Titi (tido pelos investigadores como o mágico da rebarbadora elétrica, capaz de, em poucos minutos, cortar uma ATM, por mais bem escorada que estivesse ao chão), em prisão preventiva, respetivamente, nas cadeias de Setúbal e de Caxias, viram os telemóveis e as engenhocas para os carregar apreendidos pelas buscas dos militares do GIOE, feitas em simultâneo nos três casos.

A primeira foto tirada a Quinito para registo policial, por suspeita de crime, é de março de 2004, tinha ele 17 anos. Andou sucessivamente às voltas com processos por furtos, simples ou qualificados, e roubos. Dos 29 anos que agora tem (fará 30 a 20 de agosto), passou oito preso, segundo fonte conhecedora. O próprio diz que foram cinco anos e dois meses. Beneficiou, seja como for, de cúmulos jurídicos. E fora destas contas está o que sucedeu na noite de 8 de novembro último: foi outra vez detido, após uma investigação que o visou ao longo de dez meses. Alegadamente, liderava um grupo de seis elementos suspeito de ter furtado meia centena de máquinas de tabaco de cafés e pastelarias em Lisboa, Setúbal e centro do País, sendo os maços (a GNR apreendeu 1 300) depois introduzidos no mercado negro por um intermediário, conhecido como Banana. As operações implicariam, antes, o furto de viaturas, para transporte das máquinas roubadas, que eram desmanteladas em locais ermos. Um juiz de instrução decretou a prisão preventiva de Quinito, que aguarda na cadeia de Setúbal o desenvolvimento do inquérito. Como sempre, negou tudo, mas dois dos coarguidos disseram ao magistrado que ele participou nos furtos. O pacto de silêncio de outros tempos terminou. E a queda em desgraça do ex-rei da Bela Vista acentuar--se-ia por uma circunstância vexatória: naquela noite de 8 de novembro, um domingo, Quinito seria detido quando saía da prisão, após cumprir mais um fim de semana de reclusão, dos 72 a que foi condenado, por não pagamento de multas de trânsito... Pouco depois estava de regresso à cadeia, por tempo indeterminado.

APERTA-SE O CERCO

Foi a partir de 2007 que o cerco se apertou em torno de Quinito. Em outubro daquele ano, uma reunião ao mais alto nível da PJ e da GNR analisou a epidemia de carjackings e assaltos a caixas de multibanco que se alastrava há já 30 meses, com escassa resposta policial. Os crimes eram praticados num grande raio geográfico, dos distritos de Coimbra e Castelo Branco aos de Beja e Faro, com pouca troca de informação entre as forças de segurança, enquanto os processos se diluíam por numerosas comarcas, aí se perdendo. Era preciso atacar o fenómeno a nível nacional, com entidades específicas, que se organizariam para isso. A Secção de Investigação Criminal do GIOE da GNR começou então a atuar, e o Ministério Público criou Unidades de Combate ao Crime Especialmente Violento nos DIAP (Departamentos de Investigação e Ação Penal). Em pouco mais de um ano, Quinito caiu na rede. Um jackpot.

Dezembro de 2008, dia 10. Pela 22 e 45, uma mulher de 27 anos, chefe de vendas de uma grande superfície, estacionou o seu Audi A4 numa rua do Casal do Marco, Seixal. Estava sozinha, dirigiu-se à bagageira do carro e, num ápice, viu-se rodeada de três indivíduos com as caras tapadas e enluvados. Um deles, levando o dedo indicador à boca, ordenou-lhe silêncio. Mas a vítima, em pânico, gritou a pedir socorro, correndo em direção à porta da sua casa. Nessa altura, um dos indivíduos seguiu-a, agarrou-a por trás e colocou-lhe as mãos na boca e no nariz, imobilizando-a. Um segundo elemento surgiu e também a agarrou, projetando-a para o chão. Foi esse o momento em que o cachecol que tapava a cara de um dos indivíduos caiu, e o seu rosto ficou à vista da mulher. Um terceiro homem arrancou-lhe a mala da mão, despejou-a e, encontrada a chave do carro, puseram-se os três em fuga no Audi A4.

Três dias passados, a 13 de dezembro, essa viatura transportou quatro encapuzados que, "com recurso a arma de fogo", assaltaram, pela 1h20 da madrugada, a Brisa de Pinhal Novo, roubando o dinheiro das portagens. Há 1h30 de 15 de dezembro, sucedeu outra investida igual, nas portagens da Brisa na Marateca, com o Audi A4 de novo referenciado. Às 22h45 desse segundo dia (15), Quinito seria detido pelo GIOE quando seguia ao volante de um Golf de um amigo, numa rua de bares de Setúbal. Os investigadores tinham tudo preparado para o apanhar.

VÍTIMA COM PROTEÇÃO TOTAL

Após apresentar a queixa-crime do carjacking de que fora vítima, a jovem do Audi A4, em reconhecimentos fotográfico e presencial, apontou, sem vacilar, Quinito como o agressor a quem caíra o cachecol, ficando com o rosto a descoberto. A mulher seria tratada pelo GIOE como uma testemunha de ouro. Embora com o suspeito em prisão preventiva, a jovem mudou-se para a residência de um familiar e teve segurança permanente. Ainda transferiu a morada para uma cidade do Sul, de onde depôs no julgamento por videoconferência. Havia que dar-lhe todas as garantias, para enfrentar receios e não voltar atrás. E assim aconteceu.

O coletivo de juízes ponderou um cúmulo jurídico, porque Quinito trazia de 2005 uma condenação a cinco anos e oito meses de prisão, entretanto transitada em julgado. Em fins de 2009, aplicou-lhe sete anos de cadeia, a serem cumpridos na prisão de Pinheiro da Cruz, em Grândola.

Nunca se soube de qualquer ameaça, direta ou indireta, à jovem do Audi A4. Aparentemente, não lhe passou pela cabeça que a mulher o reconhecesse. O atrevimento em doses generosas é, aliás, uma das características que lhe atribuem. Exibia-se pejado de ouro, em anéis e colares, só vestia roupa de marca, com predileção pela Lacoste, guiava bons carros, sobretudo um BMW descapotável, sem que lhe fosse conhecida atividade laboral que justificasse os sinais exteriores de riqueza. E levaria ao extremo a arrogância perante elementos da autoridade. Contra um subchefe da PSP, que pertenceu à Brigada de Intervenção Rápida de Setúbal, e um militar da GNR, com idênticas funções, terá proferido ameaças e indicado que ATM's iam ser assaltadas - roubos que de facto ocorreram, segundo documentos processuais. Um sentimento de impunidade reinava no grupo da Bela Vista. E o GIOE viu-se em palpos de aranha para os travar.

CENAS DE FILME

À meia-noite e cinco de 24 de janeiro de 2008, foi detetado pelos investigadores do GIOE um Honda CRX, com quatro indivíduos, carro referenciado por utilização em carjackings e que circulava na EN252, perto de Palmela. Percebendo que estavam a ser seguidos, desataram numa velocidade louca, com manobras suicidas, até colidirem contra um veículo que estava parado num semáforo. Os quatro ocupantes do CRX puseram-se em fuga a pé, mas um deles seria detido no local. Outro foi identificado já no Hospital de Setúbal, a cuja urgência recorreu para tratar ferimentos. Pela uma da manhã do dia seguinte, 25 de janeiro, a situação foi mais grave. Também em Palmela, os militares deram com um BMW 320d, roubado por carjacking duas horas antes na Portela de Sacavém. No carro iam três suspeitos e a perseguição começou. O BMW pôs-se em fuga pela A2, em direção a Setúbal, chegando aos 220 km/h. Ao mesmo tempo, arremessavam pó de extintores para o carro do GIOE, um BMW 330, a fim de dificultar a visibilidade, e faziam travagens bruscas, tentando que os perseguidores se despistassem. Uma violenta saída da estrada acabou por acontecer, com a destruição total da viatura da GNR e ferimentos graves em dois militares. Um deles fraturou o ilíaco e esteve 78 dias imobilizado numa cama, a que acresceu um ano de baixa, para reaprender a andar. Os suspeitos conseguiram fugir.

O GIOE concluiu que tinha de enveredar por uma atuação que resultasse em detenções em flagrante delito. E na madrugada de 18 de março consegue-o. Um grupo da Bela Vista assaltou a caixa de multibanco da estação de serviço do Pingo Doce de Torres Novas, após o que levou a ATM para um pinhal, onde a desmantelou. Os investigadores assistiram e perseguiram. Apanhados de surpresa pelos militares, alguns conseguiram fugir num Mercedes, mas dois importantes elementos, Jonny Pinho e Marco Daires, seriam caçados à mão.

Pelas cinco da manhã de 10 de setembro seguinte, houve mesmo tiros. Os investigadores tinham informações de que o alvo naquela noite podia ser a ATM da BP de Carnaxide, em Oeiras. Em dois carros, um Mitsubishi Evolution e um Volvo S70, aguardaram discretamente estacionados a possível chegada dos suspeitos. E eles lá apareceram, cinco indivíduos encapuzados, dois no BMW 320d atrás mencionado e três num Mercedes S 320 CDI, roubado de um stand lisboeta. Para surpresa dos militares, os suspeitos, ao passarem pelo Mitsubishi, interessaram-se pelo carro, e prepararam-se para o furtar. Os investigadores bem escorregaram pelos bancos abaixo, mas os indivíduos viram-nos e puseram-se em fuga. Os do BMW 320d conseguiram escapar pela A5 em direção à ponte Vasco da Gama. Já os três do Mercedes entraram numa estreita rua sem saída de Carnaxide. Dispararam um tiro, realizaram uma rápida inversão de marcha, aspergiram pó químico de extintores para o Volvo S70, de onde um militar também fez um disparo para a ilharga do lado do condutor do Mercedes. Sem êxito. O carro dos suspeitos desembestou contra o Volvo do GIOE, deixando-o sem préstimo. Por milagre apenas com ferimentos ligeiros, militares abriram uma das portas do Mercedes imobilizado, e um dos suspeitos, Fábio Chora, com a cara feita num bolo de sangue, devido ao tremendo choque frontal, e a cabeça caída sobre o volante, ainda acelerava, por instinto de fuga. Os outros dois suspeitos tiveram sortes diferentes: correram no escuro e tropeçaram num desnível com cerca de sete metros até ao chão. Um logrou escapulir-se, mas Calhotas partiu uma perna e foi detido. Cerca de três meses depois, Quinitojuntou-se-lhe na penitenciária de Lisboa.

PROVOCAÇÃO FESTIVA

Os investigadores dizem ter encontrado um grupo com organização apurada. Os locais das caixas de multibanco a serem assaltadas eram estudados, assim como percursos alternativos em caso de deteção policial. Os carjackings eram feitos a carros de alta cilindrada, para tornar a fuga expedita. Atuavam encapuzados, enluvados e com fatos de treino sobrepostos, que iam abandonando, de maneira a que, se detetados, estivessem com outra indumentária que não a captada pelas câmaras de videovigilância durante os roubos. Faziam por não mostrar armas de fogo - se fossem detidos e condenados, esse cuidado atenuaria a pena. Aspergiam pó químico de extintores sobre os automóveis que deixavam de servir, para eliminar a possibilidade de recolha de vestígios digitais e biológicos. No momento das investidas, desligavam os telemóveis e, num excesso de zelo, até lhes tiravam as baterias.

Os investigadores concluíram que estes "ensinamentos" lhes foram transmitidos por Óscar Gonçalves, ex-operacional das FP-25 de Abril (organização armada dos anos 1980), que cumpriu uma pena de 13 anos de prisão, sendo indultado, em 1996, pelo então Presidente Mário Soares. Gonçalves instalou-se depois no Poceirão, em Palmela, concelho vizinho do de Setúbal.

Os esforços do GIOE e da procuradora Cândida Vilar, do DIAP de Lisboa, nem sempre foram bem sucedidos nos tribunais. Pelo contrário. Em julho de 2010, um coletivo de 1.ª instância absolveu 11 dos 12 arguidos do "gangue da Bela Vista", incluindo Quinito, que estava acusado de associação criminosa. Após recurso do Ministério Público (MP), desembargadores da Relação de Lisboa demoliram aquela sentença e ordenaram a repetição do julgamento na íntegra. No 2.º round, em abril de 2012, os resultados revelaram-se só um pouco melhores: Jonny Pinho foi condenado a oito anos e quatro meses de prisão e Marco Daires (o único a quem os investigadores atribuíram tino financeiro, recolhendo até indícios de que teria uma empresa offshore na Zona Franca de Tânger, em Marrocos) a dois anos e oito meses. Já Óscar Gonçalves ficou com uma pena de um ano e seis meses, suspensa. Os restantes, outra vez com Quinito incluído, saíram absolvidos. Dir-se-ia premonitória a provocação feita às forças de segurança por amigos de Quinito que, em 11 de abril de 2009, durante uma festa numa discoteca em Palmela, surgiram vestidos de preto e encapuzados, com a inscrição "Equipa Anti-Carjacking" nas costas.

UMA 'CRIANÇA GRANDE'?

Com Quinito na cadeia de Pinheiro da Cruz, o grupo da Bela Vista, com dois elementos novos, continuou os assaltos, estendendo muito o seu raio de ação até Bragança. Havia, porém, o problema das notas tintadas de algumas caixas de multibanco roubadas, que era resolvido com a sua troca em máquinas de moedas (como a do outlet Freeport, em Alcochete) ou na compra de bilhetes da CP. Essas máquinas aceitavam as notas manchadas e devolviam troco "limpo". Há imagens recolhidas pelo GIOE em estações da Linha da Azambuja que mostram o chão juncado de bilhetes de comboio. Este segundo fôlego do gangue ocorreu entre junho de 2010 e maio de 2011, quando o grupo foi dado como desmantelado. O total dos roubos, desde 2006, terá chegado perto dos €4 milhões. A acusação do MP obteria resultados melhores, com condenações dos principais elementos transitadas em julgado em 2014. Carlos Semedo, ou Titi, Adelino Correia, ou Jacaré, e Domingos Moreno foram sentenciados a cinco anos. E Carlos Ramos (personagem misteriosa para os investigadores, porque os familiares, com desafogo financeiro, lhe davam tudo o que queria), Telmo Silva, ou Teté, e Telmo Ribeiro, ou Galego, a três anos e meio de prisão.

O mais novo de três irmãos, Quinito lidou com um pai psicologicamente instável. Após a separação do casal, tinha ele três anos, a mãe emigrou para a Suíça, em busca de trabalho. Os filhos ficaram ao cuidado da avó materna, que não conseguia controlar os netos. Por isso, a mãe do rebelde Quinito regressou dois anos e meio depois, para uma vida que continuou difícil. Já na cadeia de Pinheiro da Cruz, a crer num relatório do Serviço de Reeducação e Ensino, tudo correu pelo melhor. Quinito concluiu na prisão o 9.º ano, frequentou cursos de formação profissional e foi responsável pela secção desportiva. "O arguido", lê-se no documento, "tem revelado (...) uma maior maturidade na avaliação da sua anterior conduta, demonstrando capacidade de autocrítica (...)." Aqui é possível vislumbrar o pai de um rapaz já com nove anos. Mas eis que, poucos meses após sair de Pinheiro da Cruz em liberdade condicional, a 10 de outubro de 2014, Quinito, ao volante de um carro de alta cilindrada alugado, na A2, voou a uma velocidade vertiginosa do asfalto para cair numa ravina, depois de galgar um viaduto. O automóvel ficou como uma folha de papel amachucada. Quinito, milagre dos milagres, saiu apenas com ferimentos ligeiros. Mas os seus dois amigos morreram ali mesmo. Passado menos de um ano, está outra vez preso. E, diz quem o conhece bem, se sair voltará aos mesmos carros, à mesma vida: "No fundo, é uma criança grande."
AS FERRAMENTAS DO CRIME

REBARBADORA

Essencial para arrancar a caixa de multibanco do chão e, depois, fazer um corte numa chapa lateral, para aceder ao interior da máquina

MARRETA

Com uma chapa lateral cortada, a marreta irá destruir os êmbolos da ATM e permitir o acesso às gavetas do dinheiro

LUVAS

Asseguram que não haverá impressões digitais

EXTINTOR

O pó químico, aspergido nos automóveis abandonados, elimina a possibilidade de recolher vestígios digitais e biológicos

MANGUEIRA

Serve para furtar combustível de pesados para os carros roubados em uso

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