Monday, February 1, 2016

Ofensivas de Nyusi em marcha

A luta pela preeminência ocupa uma parte significativa da vida social. Com um pouco de atenção, em particular aos fenómenos que parecem sem importância, verificamos quanto a vida é, ao mesmo tempo, cooperação e conflito, quanto é um jogo permanente de relações e de problemas de poder. A esse respeito escreveu o sociólogo francês Michel Crozier: “A análise empírica demonstra que [o jogo da cooperação, CS] é dominado por problemas de poder; não o poder no sentido político e mais ou menos mítico do termo, esta entidade que reside no topo e que poderíamos um dia capturar, mas as relações de poder, estas relações que todo o mundo mantém com todo o mundo para saber quem perde, quem ganha, quem conduz, quem influencia, quem depende de quem, quem.

Há muito tempo que se vinha notando que a Lei, no nosso país, tem de ser cumprida rigorosamente nos casos em que isso agrada, ou interessa, aos detentores do Poder. Nos casos em que isso não agrada, ou não interessa às autoridades, a Lei pode ser totalmente ignorada. Só que isso nunca tinha sido dito, clara e abertamente, por um porta-voz qualificado dessas mesmas autoridades. Agora foi. Segundo o porta-voz do Comando Geral da Polícia, Inácio Dina, os agentes policiais em serviço não são obrigados a usar placas de identificação. Ora, o Código da Estrada em vigor no nosso país determina: “art. 11º. – 1. – Todos os condutores de veículos ou animais são obrigados a parar sempre que uma autoridade policial ou seus agentes, devidamente uniformizados e identificados nos termos do número 2 do artigo anterior, lhes façam sinal para tal fim.” Ora, o tal número 2 do art. 10º. Determina que: “Os agentes da PT devem estar identificados com o nome e número visíveis sobre o uniforme (...)” Portanto, existe uma norma legal, o Decreto Lei no. 1/2011, que impõe a identificação dos agentes da PT como condição para que estes possam mandar parar uma viatura. Os agentes que o fizerem sem estar devidamente identificados estão, eles próprios, a violar o Código de Estrada. E não vejo razão para ser obrigado a cumprir os outros artigos do Código, sujeitando-me a ser multado ou sofrer maiores punições, por um polícia que está fora da Lei. E, se tudo isso é grave em si, mais grave é vir um porta-voz da autoridade dizer, perante os órgãos de informação nacionais, que os polícias estão autorizados a desprezar a mesma lei que impõem aos outros utilizadores das estradas. Creio que seria muito útil que a verdade fosse publicamente restabelecida e Inácio Dina fizesse a competente autocrítica, para evitar situações desagradáveis se um condutor se recusar a ser interpelado por um agente da autoridade não devidamente identificado.

Talvez inspirando-se no slogan do maior partido da oposição em Moçambique – a Renamo – que nos seus manifestos eleitorais apregoa uma mudança tranquila, o Presidente da República (PR), Filipe Nyusi, está de forma serena a reposicionar suas pedras a fim de dirigir o comboio sem grandes sobressaltos. Um ano depois de tomar posse e de ter manifestado publicamente que não está satisfeito com a sua governação, o executivo de Nyusi decidiu, esta semana, dar prosseguimento com as mexidas iniciadas no ano passado. Assim, através dum despacho presidencial, Filipe Nyusi exonerou o vice-governador de Banco de Moçambique, Pinto de Abreu. Ao que o SAVANA apurou, Pinto de Abreu sai do cargo por razões de saúde. Recentemente, Abreu foi sujeito a uma melindrosa intervenção cirúrgica devido a um tumor no cérebro. Fontes próximas da Presidência Ofensivas de Nyusi em marcha Por Raul Senda da República dão conta que nos próximos dias haverá mexidas na equipa de conselheiros do Presidente. Até ao fecho da presente edição ainda não havia um comunicado oficial sobre o assunto, mas António Gaspar, conselheiro para assuntos político e comunicação, era dado, em meios restritos, como estando de saída. Empresa Maputo Sul Vinte e dois meses depois de assumir as rédeas da Empresa Maputo Sul; entidade responsável pela gestão da estrada circular de Maputo, ponte para KaTembe e a estrada que liga a vila turística de Ponta de Ouro e a capital do país; Paulo Fumane foi afastado das funções de Presidente de Conselho de Administração (PCA). Para o lugar do economista Paulo Fumane foi nomeado o arquitecto Silva Magaia, um conhecido crítico do projecto da Estrada Circular. Num artigo publicado neste jornal em Julho de 2012, Magaia considerou o projecto como um atentado ao meio ambiente, pouco transparente e que estava prenhe de irregularidades. Silva Magaia, na altura funcionário do Programa das Nações Unidas para Habitação (UN-HABITAT), um braço da ONU, sublinhava que os defeitos do projecto começavam pela equipa técnica que era composta por pessoas sem competências para dirigir um projecto daquela envergadura. Como agravante, prosseguia Magaia, os referidos técnicos não tinham nenhum conhecimento sobre o projecto que nas suas aparições públicas limitavam-se a apresentar o traçado da via, o número de faixas, a largura e extensão da estrada e cruzamentos. Os mesmos, segundo ele, em nenhum momento falavam das questões técnicas porque não tinham argumentos para tal. Outra questão que inquietava o actual PCA de Maputo Sul prende-se com as questões ambientais já que os projectistas do empreendimento não deram valor aos espaços verdes. Dizia Magaia que a circular de Maputo não foi antecedida de um estudo de impacto ambiental, o que no futuro não muito distante podia afectar o ecossistema predominante na zona da Costa do Sol. “À primeira vista, não nos parece ser uma boa opção fazer a estrada passar justamente onde está, hoje, a linha da estrada Marginal. Não nos parece bom projecto. Uma infra-estrutura muito cara e muito importante como a estrada circular não pode estar numa zona muito exposta porque isso é contrário aos princípios de resiliência”, advertiu na altura Magaia. Acrescentou igualmente o mesmo acontece no troço que vai sair da Miramar até ao Chiango, que também está muito exposta à natureza, ao mar, portanto, é uma zona de dunas, em que o mangal vai ser afectado”, concluiu. Magaia foi mais longe, afirmando que a estrada circular de Maputo não passava de um projecto desenhado na China por chineses para ser implantando nos municípios de Maputo e Matola bem como no distrito de Marracuene. Para o arquitecto, um dos grandes problemas da circular de Maputo resultava da arrogância dos dirigentes políticos que para satisfazer interesses alheios escamotearam a verdade e ignoram todos os princípios de resiliência. Queda de Fumane Paulo Fumane chega à direcção de Maputo Sul em Março de 2014 em substituição de Elias Paulo que estava naquele lugar há oito meses. Paulo Fumane, que vinha do Millennium Challenge Account (MCA), tinha como desafios concluir a estrada Circular de Maputo até finais de 2014; colocar as obras da Ponte Maputo – KaTembe a um ritmo significativamente acelerado; construir parte significativa das estradas de ligação e os troços KaTembe – Bela Vista e Boane para além de iniciar a implementação do Plano de Desenvolvimento Urbanístico da KaTembe e fortalecer cada vez mais as parcerias existentes com diversas instituições que, de forma directa ou indirecta, têm sido determinantes na prossecução dos objectivos da Maputo Sul. Tinha também o desafio de seguir uma gestão rigorosa do dinheiro destinado àqueles projectos e fechar a questão dos reassentamento das famílias afectadas pelos projectos. No entanto, a maior parte dos desafios traçados aquando da tomada de posse não foram cumpridas. São os casos da estrada circular de Maputo que até hoje ainda não foi concluída. O plano de desenvolvimento urbanístico da KaTembe continua miragem, os reassentamentos ainda estão por concluir e as obras da estrada KaTembe-Ponta de Ouro ainda está na fase embrionária.

A ndamos com o coração a pulsar ao compasso de Fevereiro e Mar- ço. Fevereiro é, por assim dizer, o mês da Frelimo e Março, o da Renamo. Não estamos a vislumbrar grande coisa relativamente ao que poderá vir a ser produzido pelo mês de Fevereiro para poder antecipar-se desfazendo um (provável) confronto de consequências imprevisíveis em Março, Abril... Mesmo aumentando a graduação das lentes que usamos. É bem melhor tirarmos os óculos e ficarmos fora de qualquer graduação de lentes. A persistência com que a Renamo aborda a questão de governação das “suas províncias”, em Março de 2016, parece transmitir alguma seriedade. É preciso encará-la afinando um pouco mais os olhos e aguFevereiro (Frelimo) e Março (Renamo) çando conscientemente a inteligência. Dentro do pacote político, na reunião extraordinária do Comité Central da Frelimo prevista para o dia 5 de Fevereiro do ano em curso, este assunto, por razões óbvias, não escapará à agenda. A questão da verdadeira “entrega” do poder a Nyusi (PR) poderá, nesse encontro, não ser o problema de fundo. Será, provavelmente, tomado como algo “ultrapassado”, algo a ser “debatido formalmente” para o gosto de uns e outros. A questão de fundo será o debate sobre o poder, sobre a aceitação ou a recusa da tomada de poder pela Renamo nas “suas províncias”. Que impactos de curto, médio e longo prazos essa “entrega” terá na quantidade e qualidade de poder que a Frelimo tem no País? Se a Renamo e a Frelimo fossem representadas cada uma por uma garrafa de um litro qual dos recipientes, uma vez repleto, representaria o poder ao ponto de transbordar para outro? De que fontes se alimentariam para mais rapidamente ficarem repletos? A sessão extraordinária do CC da Frelimo, uma vez deliberada a reestruturação do seu secretariado, poderá provavelmente trazer- -nos novos elementos de análise da situação política em Moçambique. Elementos positivos e de esperança. Ou poderá, simplesmente, metaforizar a esperança e ficarmos na confusão entre “conteúdo” e “forma”. Essa sessão poderá mesmo vir a ser vital se produzir não só mudanças em termos de novas peças no xadrez do CC como, também, se o novo conteúdo produzido significar uma mudan- ça de paradigma relativamente às pretensões da Renamo para o mês de Março. Fora desse conteúdo deverá estar claramente o “nó górdio” bem como a velha roupagem do tipo “o poder arranca-se!”. É neste sentido que o mês de Fevereiro será o da Frelimo e o de Março o da Renamo. A euforia do mês de Fevereiro poderá vir a ser marcada ou pelo dia 3, dia dos Heróis Mo- çambicanos, ou pela sessão do dia 5. Pela situação em que nos encontramos política e militarmente, a sessão do dia 5 assume-se como aquela possuidora de importância redobrada. Ao que parece, o anúncio no ano passado, do mês de Março (o da Renamo), como aquele dedicado à tomada das “suas províncias”, teve o condão estratégico de contar com a sessão extraordinária do CC da Frelimo. Lançaram a bola e agora esperam pela reacção de Fevereiro para ver como actuarão em Março. Desejamos que prevaleça a lógica da Paz e não a de guerra.

Todo o mundo ficou mudo, quando o líder da oposição, Afonso Dhlakama, foi atacado em Manica por duas vezes em Setembro de 2015, uma acção levada a cabo, segundo a retórica governamental, por “uma terceira força”. A Assembleia da República, o mais alto órgão legislativo, onde a Renamo detém 89 deputados, constituindo-se na segunda maior força política, ficou calada. O Governo sustentado pela Frelimo idem. O Presidente da República permanece até hoje em estranho silêncio. O regime ficou mal na fotografia perante claras evidências – inclusive testemunhas oculares – da participação de forças securitárias à paisana nos ataques a Dhlakama. Os protestos – sociedade civil e algumas chancelarias – vieram dos suspeitos do costume, para glosar o clássico “Casablanca”. Os ataques contra a oposição, no seu todo, não começaram hoje. Vêm crescendo de maneira alarmante, estimulados pelo clima de ódio gerado pela postura histericamente belicista, de alguns sectores radicais do regime. Durante a campanha eleitoral em 2014 eram expediente normal as mortes, espancamentos, inceneração de bandeiras, sedes e casas de responsáveis. Mais recentemente, é o terror noturno em zonas de Nhamatanda, Gorongosa e Tsangano. As mortes continuam selectivas. Com o atentado há uma semana contra o Secretário Geral da Renamo, Manuel Bissopo, na cidade da Beira, região que sempre votou oposição, assistimos a uma estranha mudança de actuação. A Frelimo, através do seu diligente porta-voz, Damião José, apressou-se a condenar, considerando uma acção criminosa que “lamentamos profundamente e condenamos naturalmente este tipo de acções que põem em causa a integridade física dos cidadãos”. A Assembleia da República, que nos anteriores ataques se manteve silenciosa, também condenou a acção por via da sua Comissão Permanente, considerada pela chefe da bancada da Renamo, como “terrorismo de Estado”. Jorge Khalau, o actual Comandante-geral da polícia, descrito como detendo uma posição de “pivot” nos eventos contra Dhlakama em Manica e defensor feroz da necessidade do desarmamento da Renamo, também convocou a imprensa para condenar a acção contra Bissopo. O ataque agudizou os momentos de incerteza política que o país vive e, em alguns sectores, chegou-se a acreditar numa reacção de força mais ousada por parte da Renamo, mas, tal como em ocasi- ões anteriores, Afonso Dhlakama apelou à contenção. A Renamo e Afonso Dhlakama parecem ter-se apercebido que a ideia – tal como aconteceu em Setembro de 2015- é empurrá-los para uma confrontação, acção que poderia levar alguns sectores a colocarem em prática a “solução Savimbi”, colocada por algumas alas da Frelimo como parte da equação para a solução da actual crise política. A aparente mudança de postura por parte dos mais importantes órgãos do Estado e do próprio partido Frelimo parecem mais um apelo à calma e o aumentar do lastro para que, de novo, Filipe Nyusi tome uma iniciativa de paz, apesar do enorme fosso de desconfiança e descrédito cavado em relação à Renamo e a Afonso Dhlakama. Fevereiro – Comité Central da Frelimo - e Março - mês anunciado por Dhlakama para governar seis províncias onde reivindica vitória - estão bem pertinho. E por isso, é preciso que algo aconteça.
T enho a intenção de reflectir sobre um termo que hoje se transformou numa categoria de análise da nossa vida política. O termo é Guebuzismo. Este termo tem sido usado seja no discurso jornalístico, seja no discurso de carácter académico como uma categoria que tem em si atributos explicativos. Todavia, porque não estou convencido que este termo tenha alguma utilidade explicativa, voltei às 292 páginas de uma colectânea de discursos de A.G intitulada «Armando Guebuza em presidência aberta» para poder ver o que poderia ser o «guebuzismo». No fundo, o que me interessava era ver que conteúdo tinha essa palavra pomposa, que para mim, não sendo nenhum conceito, nenhuma categoria de aná- lise, era apenas um espaço comum que foi integrado no imaginário colectivo e no discurso académico sem nenhum trabalho de hermenêutica da logística interna do conceito (Levinas). Quando lemos e ouvimos esta palavra em diversos lugares de produção de discursos (Bourdieu), ela pretende-se um sistema de valores, de práticas, de estrutura de acção criados por A.G. Mas a questão que vem imediatamente é de sabermos o que é que há de novo nesse termo. No fundo, se respeitarmos aos princípios de desconstrução (Derrida) dos objectos e conceitos por via da análise da sua durabilidade (Bergson), intencionalidade (Husserl), historicidade (Foucault, Ricoeur), podemos dizer que guebuzismo não se constitui como uma ideia, pelo menos não é nenhuma revelação da verdade nova (Heidegger), é apenas a recuperação e renovação de mecanismos coloniais e da primeira República (vejamos as lógicas de funcionamento do Estado Novo). Mas não significa que seja puramente isso. Esquematicamente ele reconstruiu quadros de acção antigos para um contexto novo. Mas isso não Guebuzismo??? Por Régio Conrado o faz sistema, pois, mesmo que tenha tentado produzir uma forma específica de agir, parece-me que os limbos de ligação, de continuidade e de interpenetração temporal (M. Augé, P. Bourcheront) são os elementos estruturantes desse tal «guebuzismo». Como, então, analisar um processo a partir de um termo confuso, problemático, um conceito que ninguém sabe o que é que ele é concretamente? O que se sente é que há uma apropria- ção de termos puramente políticos e comuns, como podia ser o islamismo, para analisar um processo complexo que é nossa incapacidade em nos assumirmos como parte de um mesmo projecto que é Moçambique. Se se diz que Guebuzismo não termina ou termina, assume-se que ele exista mas quais, então, os elementos essenciais desse guebuzismo? Pelo que eu saiba até hoje não temos nenhum trabalho de sistematização do que Guebuza fez como A. Bragança tinha tentado fazer com Samora (a ideia de samorismo). Recentemente, a politóloga B. Hibou juntamente com o politólogo marroquino M. Tozy, e outros, publicaram uma obra «l’État d’injustice au Maghreb: Tunisie et Maroc», onde alertam o problema de se assumir termos sem validade científica para analisar fenómenos que precisam desse tipo de análise. Se olharmos com rigor histó- rico constataremos que o processo de implantação da administração pública logo após a independência e sua reimplantação após 1992, o fio condutor foi onde esteja um hospital, um centro de saúde, uma instituição deve igualmente estar instalada uma estrutura do partido. Foi nestes termos que hoje vemos que regiões antigamente dominadas pela Renamo estão de alguma forma sob controlo da Frelimo por via da administração e de serviços do Estado como a saúde. O exemplo mais caricato é a forma de politização de brigadas móveis de saúde que começou intensamente em 1979 e que continua até hoje. A.G continuou com um processo histórico mais longo que lhe ultrapassa. Então falar de guebuzismo é não só deixar de lado uma história da formação do Estado pós-colonial em Moçambique, mas também entrar numa espécie de «santa ignorância» (O.Roy) desse processo histórico, particularmente da cultura política da Frelimo. Peter Geschiere num famoso artigo «le poids de l’histoire» (o Peso da história) critica severamente o reducionismo presentista que levou a produzir análises, se não falsas, pelo menos superficiais. Se pensarmos nestes termos, podemos dizer que análises que partem desses termos políticos concorrem para duas coisas. A produção da falsa consciência (Marx) e capitulação explicativa (Michael Lowi). A.G queria entrar para a história como inovador. De alguma forma o foi, mas de que forma não sabemos ao ponto de falar de Guebuzismo. Essas análises legitimam esse desejo sem descortinar que os grandes problemas não se limitam nem a Guebuza e Nyusi, mas a uma economia política de funcionamento do partido Frelimo e de reprodução dos seus membros cuja unidade é sobretudo, penso, não pelas crenças mas a protecção de seus interesses, mesmo que não estejam não de acordo sobre vários pontos. Isso não vem com Guebuza. Continuando nesse tipo de análises não nos permitimos ver aquilo que Marx tinha visto no seu “A guerra civil da França”, os problemas estruturais que se manifestam por meio de posições de diferentes grupos dentro de determinadas classes. Implicitamente, aqueles que assumem o Guebuzismo como categoria analítica ajudam a construí-lo, dão-no conteú- do e ofuscam os reais problemas que esse país tem. 

S emana passada, concretamente ao princípio da tarde do dia 20 de Janeiro, uma quarta-feira, Manuel Bissopo, deputado da Assembleia da República (AR) pela bancada da Renamo e secretário-geral (SG) deste partido político, foi vítima de um atentado à sua vida numa das zonas nobres da cidade da Beira, tendo, na ocasião, perdido de imediato a vida o seu ajudante de campo, que com ele seguia na sua viatura. Relatos da imprensa dizem que Bissopo, que dias depois foi evacuado para uma clínica na vizinha África do Sul, encontra-se a receber cuidaO disparate de Mariano Matsinha dos intensivos, por uma bala se ter alojado numa parte sensível do seu corpo. Dito de outra forma, ainda não está fora de perigo. Embora se reconheça a igualdade de todos perante a lei, há a destacar, neste caso em concreto, o facto de a qualidade do sujeito (membro de um órgão de soberania e SG do maior partido da oposição no país) qualificar para que o atentado à vida de Bissopo dever ser visto de forma diversa de qualquer outra situação análoga. Aliás, coube ao próprio legislador penal moçambicano estabelecer, no artigo 384 do Código Penal (CP), que o atentado à vida dos membros dos órgãos de soberania, provedor de justiça e de magistrados, bem como à dos presidentes e secretários-gerais (ou equiparados) de partidos políticos com assento na AR constitui algo particularmente grave, a ponto de a moldura penal aplicável a situações tais ser de entre 16 a 20 anos de prisão maior. O atentado à vida de Bissopo acontece num momento particularmente crítico da vida do país, tendo em conta que se está, de há alguns meses a esta parte, num impasse entre o Governo e a Renamo, o que coloca preocupações redobradas à nossa paz, que, infelizmente, nunca foi materialmente efectiva, sobretudo nos últimos pouco mais de dois anos. Não é por acaso que um ilustre cidadão classificou o atentado à vida de Bissopo de quarto atentado à paz, depois dos dois ataques de que Afonso Dhlakama, líder da Renamo, foi vítima em Setembro de 2015, ao que se seguiu, em Outubro do mesmo ano, um assalto à sua residência na cidade da Beira pelas Forças de Defesa e Seguran- ça (FDS), supostamente com o fito de se proceder ao desarmamento da Renamo, o que nos parece não ser sinónimo de desarmamento compulsivo da guarda do presidente do maior partido da oposição. Muitos têm estado a se pronunciar quanto ao que julgam ser o leit motiv do atentado à vida de Bissopo, havendo os que não dissociam, disso, as suas paixões políticas: “só pode ser obra da Frelimo”, dizem alguns; “só pode ser produto de brigas internas da própria Renamo”, referem outros. Tudo isso, em bom rigor, não esvazia algo nitidamente factual: um membro de um órgão de soberania (a AR, neste caso), que é também SG do principal partido da oposição, foi vítima de um atentado à sua vida, em plena luz do dia e no coração da segunda maior cidade do país. Se se pode fazer um esforço no sentido de se multiplicar muitas das declarações tais por zero, para que o resultado seja nada, julgamos não ser razoável assim proceder para com certa categoria de pessoas, pelas responsabilidades públicas e/ou estaduais que possuem. Uma das pessoas que se encontra nessa situação é Mariano de Araújo Matsinha, que é, desde Agosto de 2015, membro do Conselho Nacional de Defesa e Segurança, por nomeação presidencial. No passado, Matsinha já ocupou tantas outras pastas de redobrada responsabilidade, de entre as quais se destaca a de ministro da Segurança. É que, na noite do dia em que Bissopo foi vítima de um atentado à sua vida, evento que, em boa verdade, pode ser visto, reiteramos, como mais um atentado à própria paz, qual bem colectivo, quando interpelado por jornalistas à margem da cerimónia de lançamento do website de um antigo Presidente da República (PR), Matsinha disse, a propósito, mais ou menos o seguinte: “aquilo só pode ser algo interno; só pode ter a ver com confusões internas da própria Renamo e não outra coisa”. Julgamos serem absolutamente irresponsáveis os pronunciamentos de Matsinha, sobretudo quando não apresenta prova alguma para consubstanciar as suas graves afirmações. Muitos “acólitos” disto ou daquele já fizeram pronunciamentos da mesma estirpe, à esquerda ou à direita, mas de um membro de um órgão com dignidade constitucional, designadamente o Conselho Nacional de Defesa e Segurança, julgamos ser absolutamente lamentável ouvir palavras tais. Sobretudo, insistimos, quando tal membro é um dos dois que, nos termos da Constituição da República de Moçambique (CRM), é de nomeação presidencial. Uma das atribuições constitucionais do Conselho Nacional de Defesa e Segurança é “...analisar e acompanhar iniciativas de outros órgãos do Estado que visem (...) a manutenção da lei e da ordem” – alínea d) do artigo 269 da CRM –, pelo que não sabemos que relevância teria o concurso de Mariano de Araújo Matsinha se tivesse, por exemplo, de se pronunciar, em sede própria, a propósito da problemática ‘Comissão de Inquérito’ aparentemente constituída por Jorge Khalau para investigar o atentado à vida de Bissopo.
R ecentemente, tanto o Presidente como o Governador do Banco de Moçambique afirmaram que Moçambique deve aumentar a produção local e reduzir a dependência das importações. Eles explicam que isso é uma forma de atenuar a crise económica actual com que o País se depara. Aumentar a produção não é algo que se faz sem problemas de um dia para o outro. Os Moçambicanos trabalham muito e produzem na medida das suas possibilidades. Reduzir a dependência das importações não é algo que indivíduos podem resolver. O Governo deve eliminar as barreiras que actualmente impedem a produção. As barreiras ao desenvolvimento económico são bem conhecidas. Os constrangimentos dentro do ambiente de negócios são bem conhecidos. O Governo deve agora tomar medidas urgentes para eliminar estas barreiras e constrangimentos. Nos últimos 20 anos o Governo e o sector empresarial entabularam um diálogo sobre o ambiente de negócios. Uma análise deste diálogo mostra que foram levantadas as mesmas questões ano após ano, mas não foram resolvidas. As mesmas questões surgem novamente na matriz do diálogo público-privado da CTA, nas propostas para um melhor desempenho nos indicadores de Doing Business como apresentadas pelo MIC e o Banco Mundial, na Estratégia de Melhoramento do Ambiente de Negócios, no Plano Quinquenal e em muitos planos e estratégias sectoriais. Em consequência da falta de reformas encontramo-nos na situação actual. As questões que limitam a produção podem em termos gerais ser classifi- cadas do seguinte modo: Interacção entre o sector empresarial e o Governo – incluindo licenciamentos, permissões, requerimentos, inspecções, pagamentos de “Devemos produzir mais” – mas como? Por Carrie Davies* impostos e taxas. Todo o sistema necessita de uma simplificação radical. O quadro legal para as empresas é altamente complexo com jurisdições sobrepostas e uma multiplicidade de licenças, impostos e taxas a pagar. Se o Governo realmente quer aumentar a produção, deve eliminar os muitos níveis de requisitos burocrá- ticos diversos. Toda a política sobre as interacções entre o Governo e o sector empresarial deve ser invertida. Em vez das empresas terem de pedir autorização ao Governo para as coisas mais pequenas, as empresas devem poder funcionar livremente. O papel do Governo deve ser uma da gestão ligeira, visando assegurar a conformidade legal. Em vez de cada um dos muitos ní- veis do Governo obter dinheiro das empresas por meio das suas próprias taxas, licenças, taxas para a apresentação de documentos, etc., o único enfoque deve ser na geração e aumento de receitas fiscais. Devem ser implementadas o mais rapidamente possível medidas como a tributação electrónica (e-tributação). Todas as outras taxas e impostos devem ser eliminados. O Governo deve focar em deixar o sector empresarial produzir e na tributação das empresas nos lucros que fazem. Isto iria reduzir o tempo, os custos e a corrupção. Infra-estrutura – O papel do Governo deve ser oferecer ao sector empresarial o melhor ambiente físico possível no qual poderá funcionar. São necessários grandes investimentos nas infra-estruturas para assegurar que as empresas possam movimentar bens por todo o País e para dentro e fora do País, e que tenham electricidade e água suficiente para funcionar. Todas as decisões sobre investimentos nas infra-estruturas devem basear-se numa análise custo-benefício clara em torno da questão de quanto tempo ou dinheiro irão poupar para as empresas ou do volume de receitas fiscais novas das empresas a que irão dar origem. Encontramo-nos numa crise económica, mas apesar disso devemos procurar formas de desenvolver e melhorar as infra-estruturas pú- blicas, seja através de parcerias público-privadas ou de outros mecanismos. Devemos definitivamente ter um plano de desenvolvimento infra-estrutural, que mostre quando e onde estarão disponíveis infra- -estruturas para que as empresas possam tomar decisões sobre onde e quando investir ou expandir os seus negócios. Atitude – Uma via rápida de melhorar o ambiente empresarial seria melhorar a atitude do sector público vis-à-vis o público em geral e o sector empresarial em particular. Em vez de ver aqueles que se aproximam de sector público como irritantes ou como forma de ganhar dinheiro, o sector público devem tratá-los como clientes e esforçar- -se por dar o máximo apoio possí- vel. Isto inclui pôr termo às práticas corruptas e remover o espírito de “deixa andar” que actualmente é generalizado. O sector público deve ver uma produção mais elevada pelo sector privado como o objectivo principal de tudo que fazem. Por isso, cada uma das acções e decisões deve ser tomada tendo em vista facilitar as operações rápidas, custo-eficientes e legais das empresas. Para concluir, não basta dizer simplesmente que devemos produzir mais e reduzir a dependência do país das importações. O Governo deve urgentemente tomar medidas concretas para melhorar radicalmente o ambiente de negócios, alterar a sua atitude perante o sector empresarial, eliminar a burocracia e elaborar e implementar um plano de investimento em infra-estruturas. As causas da falta de produção são bem conhecidas – chegou o momento de concentrar-nos na cura. Os moçambicanos querem produzir mais. Cabe ao Governo tornar isso possível. *Speed

É a nossa vez de comer - uma expressão esclarecedora sobre o sentido de alternância governativa democrática em África - é o título de um livro que relata, de forma vigorosa e cáustica, a história de um escândalo de corrupção de alto nível, alguma vez denunciado no Quénia, consequência da captura do Estado por elites predadoras, ancoradas em forças políticas de base tribalista ou regionalista. Ao longo de anos sem fim, Ministros de áreas-chave, de governos de partidos rivais, saqueiam o Estado em várias centenas de milhões de dólares, simulando aquisições de equipamento tecnologicamente sofisticado… para a modernização das forças de defesa e segurança do país! Uma saga pungente e corrosiva, cuja arquitectura faz lembrar estórias moçambicanas e constitui um sério alerta ao próprio percurso político de Moçambique. O livro de Michaela Wrong, uma jornalista internacional com larga experiência de trabalho em África, onde cobriu vários eventos e crises políticas para a BBC, a Reuters e a Financial Times, conta a odisseia de um alto funcionário do governo queniano que, confrontado entre a lealdade tribal/ partidária e a sua consciência ética, opta por esta última, pisando graves riscos pessoais e para a sua família, incluindo o risco da própria vida! Através de uma pesquisa rigorosa, Michaela Wrong demonstra como se urdem os esquemas de corrupção de alto nível dentro do governo, em conluio com o mundo dos negócios, questionando também o papel, quantas vezes cínico, dos doadores ocidentais, na luta contra a corrupção em África. O texto que se segue é uma tentativa de resumo de um denso livro de 354 páginas, publicado em 2009, mas cada dia mais actual! A chegada do “Messias” Quando Mwai Kibaki ganha as elei- ções presidenciais de 2002 no Quénia, ele vinha de duas derrotas em 1992 e 2000, a favor de Arap Moi, no poder desde 1978. Enquanto líder da oposição no Parlamento, Kibaki tinha desenvolvido um forte discurso anticorrupção, atacando o seu antigo líder, agora rival: afinal Kibaki era uma velha raposa da política queniana, com passagem por diversos cargos ministeriais, desde a era de Jomo Kenyatta, o fundador do estado queniano, até à era do próprio Arap Moi, de quem foi, aliás, Vice-Presidente, ao longo de 10 anos: de 1978 a 1988! Até que em 1991, Kibaki rompe definitivamente com Arap Moi e o seu partido, o KANU (Kenya National Union). No seu discurso de tomada de posse, Kibaki vai reiterar, em termos resolutos, “tolerância zero à corrupção”, a pior e a mais arreigada das endemias de governação do país, incubada e desenvolvida desde a independência do país, em 1964, sob a couraça político- -ideológica do tribalismo e do regio- É a nossa vez de comer: uma história queniana…que alerta Moçambique! Que se desenganem aqueles que confundem alternância governativa com alternativa política! Por Tomás Vieira Mário A reacção de membros do governo vai variar entre exigências de mais provas e ameaças de processar Githongo pelo crime de traição, previsto na lei! Até que...dias depois rebenta a grande “bomba”! - a BBC vai transmitir as conversas secretamente gravadas, em que ministros revelam, de viva voz, que são eles a… Anglo Leasing! Vai ser, então, o desmoronamento do castelo! Um por um, o Vice- -Presidente da República, os ministros das Finanças, da Justiça e do Interior, vão apresentar a sua demissão, bem como um grupo de assessores directos do Presidente, cuja imagem de “messias” tinha-se esboroado, como uma bolha de sabão… O vasto consenso nacional para a reconstrução do país pós-Arap Moi cai por terra, representada pela NARC, desmorona! Com a sua imagem totalmente destruída, o que oferece campo político favorável à oposição, nas elei- ções presidenciais aprazadas para o ano seguinte, Kibaki dá uma “meia volta” e cria um novo partido, o Partido da Unidade Nacional (PNU), sob o qual vai concorrer para um segundo mandato. Mas com o escândalo tinha traído profundamente a confiança da população e tinha oferecido espaço para a oposição, nomeadamente a Raila Odinga, que formara o ODM, e poderia dizer: “agora é a nossa vez de comer!” Vários candidatos vão apresentar-se ao escrutínio, um dos mais renhidos da história do Quénia, com um recorde de participação do eleitorado. Depois de atrasos sucessivos na divulgação dos resultados, Kibaki é declarado vencedor, com uma margem mínima, sobre Raila Odinga. Este vai contestar imediatamente os resultados, recebendo apoio indirecto dos observadores internacionais, que questionam a validade dos resultados finais. Na sequência, protestos violentos vão eclodir e propagarem-se rapidamente por todo o país, então dividido sobretudo entre dois grupos étnicos: os Kikuio (tribo/partido de Kibaki) e os Luo/ Kalenjin (tripo/partido que apoia Odinga). Ao longo de dois meses seguidos, de Dezembro de 2007 a Fevereiro de 2008, mais de 1.000 pessoas vão ser barbaramente mortas; e mais de 600,00 desalojadas, numa carnificina a aproximar-se ao genocídio ocorrido 13 anos antes, no vizinho Ruanda! Em apenas dois meses de violência, cujo grau de destruição claramente reflectia o resultado de tensões sociais acumuladas, Quénia vai perder todos os cinco anos de reconstrução nacional pós-Arap Moi! No final, duas importantes figuras políticas do país vão ser acusadas da prática de crimes contra a humanidade e chamadas a responder perante o Tribunal Internacional de Haia. Com efeito, em Janeiro de 2012, o TPI vai confirmar processos-crime contra três importantes membros do governo de coligação nacional, constituído para gerar a crise política pós- -eleições. São eles Uhuru Muigai Kenyatta, então Vice-Primeiro-Ministro e Ministro das Finanças; William Samoei Ruto, Ministro da Educação Superior, Ciência e Tecnologia; Francis Kirimi Muthaura, Secretário da Função Pública e do Gabinete do Presidente, e ainda um jornalista: Joshua Arap Sang, ao serviço de uma estação de rádio local. Estes líderes políticos vão ser acusados de instigação activa ao ódio tribal/partidário - o manto político-ideológico que tem coberto e fertilizado a corrupção endémica, a exclusão política, económica e social crónicas, naquele país da África Oriental. Que distância separa Moçambique deste cenário? nalismo. Com efeito, quando da independência do Quénia em 1964, sob a liderança de Kenyatta, os Kikuios, a tribo maioritária do país, tornaram-se o grupo dominante, tendo-se apoderado das terras férteis deixadas pelos colonos britânicos e dominado a administração estatal. Onde vem escrito “Quénia”, leia-se “Moçambique”; onde vem escrito “tribos/tribalismo” leia-se “partidos/ partidarismo”. Com a ascensão de Arap Moi ao poder, emergiu a era dos Kallenjin, que passariam a dirigir a máquina do Estado e a ascender, também, a grandes negócios da mais forte economia da África Oriental. Porém, a chegada ao poder de Kibaki (da tribo Kikuio) parecia prenunciar o fim deste ciclo: quando rompeu com Moi, o “elitista jogador de golfe” - como alguma imprensa o qualificava - logrou criar e liderar uma forte aliança com outras forças da oposição, através da NARC (National Rainbow Coalition), para derrubar o governo do seu antigo líder. A NARC incluía partidos conotados com diferentes tribos, nomeadamente com a mais directa tribo rival, a dos Luo, agrupada em torno do Orange Democratic Party, liderado por Raila Odinga. Como se não bastasse, os parceiros ocidentais do Quénia haviam já bloqueado toda a ajuda a Arap Moi, após sucessivos escândalos de corrupção massiva de alto nível! Este quadro parecia proporcionar a Kibaki excelentes condições sócio-políticas e psicológicas para introduzir reformas políticas estruturais no Quénia. Sendo um homem do “sistema”, Kibaki seria, pois, a figura certa para liderar uma revolução pacífica na sociedade queniana, libertando-a das políticas tribalistas que engendravam, desde há 50 anos, uma distribuição incestuosa e potencialmente explosiva da renda nacional. Afinal, não tinham sido forças políticas fora do “sistema” a liderar os processos de reformas políticas profundas que transformaram a África do Sul e a União Soviética (sobretudo neste último caso), nos finais dos anos 1980, mas sim dirigentes máximos do próprio “sistema”, como foram os casos de Frederich de Klerk e Michael Gorbatchov! Por isso, dizem as crónicas da época, a ascensão ao poder de Kibaki era celebrada, mais pelo fim do regime cleptocrata de Moi, do que pela chegada ao poder do novo Presidente! Ou seja: as razões da expectativa ultrapassavam a figura do novo Presidente! No acto da sua investidura, e discursando mesmo ao lado do seu antecessor, Kibaki vai afirmar: “A era do “vale tudo” (any thing goes) acabou!” E sentencia: “A corrupção vai agora deixar de ser o modo de vida no Quénia!” Na linha desta retórica, nos primeiros meses do consulado de Kibaki, os jornais vão sair todos os dias com estórias pitorescas, assinalando a “nova era”: condutores de matatus (“chapa cem”), vão procurar agentes corruptos da Polícia nas esquadras, exigindo que lhes devolvam dinheiro que lhes vinham extorquindo na estrada, ao longo de anos, naquilo que é comummente designado por kitu kidoko (pequena corrupção). Por seu lado, funcioná- rios públicos vão escrever em jornais, revelando nomes de seus superiores hierárquicos, a quem pagavam mensalmente kitu kidoko, como “taxas de segurança”, para manterem os seus empregos seguros; nas salas de espera e em gabinetes de Gestores Públicos são pendurados grandes quadros, proclamando, em letras garrafais: “zona livre de corrupção” ou “aqui não se aceitam subornos”; etc. O próprio Presidente Kibaki vai criticar publicamente grandes empresas que haviam comprado largos espaços nos jornais, para o felicitarem, dizendo que estavam a desperdiçar dinheiro! (A mensagem verdadeira era: “escusem-se de me “escovar”!). As largas fotografias de Arap Moi, algumas de corpo inteiro, ubiquamente pregadas em tudo quanto fosse sítio, vão ser retiradas, mas o novo Chefe de Estado proíbe que sejam substituídas pela sua própria imagem; as sirenes da comitiva presidencial, cortejada por filas de motorizadas de alta cilindragem, que paralisavam o já insuportável tráfego de Nairobi, desaparecem: um novo Quénia parece anunciar-se! Um Czar anti-corrupção no Governo Para provar que falava a sério, a respeito da luta contra a corrupção, Kibaki vai criar, junto do seu Gabinete, um posto com um propósito claro: o de Secretário Permanente para a Governação e Ética, uma entidade estatal dotada de poderes extraordinários e plenipotenciários, que incluem acesso directo e privilegiado ao Chefe de Estado, a qualquer hora. A escolha do titular de tão poderosa pasta vai reconfirmar, aos olhos da opinião pública, designadamente da Sociedade Civil e dos doadores, a determinação do Presidente: John Githongo, renomado jornalista investigativo e antigo Director Executivo da Transparência Internacional (TPI) no Quénia, é o todo-poderoso Czar Anti-Corrupção que Kibaki vai designar! Githongo, temperado nos meandros de uma comunicação social inquisitiva e de uma sociedade civil fortemente interventiva, chega ao Governo com a reputação de intrépido combatente anticorrupção: ao longo de anos, tinha sido um carrasco do governo de Arap Moi, investigando e denunciando furiosamente o regime corruptocrático do sucessor de Jomo Kenyatta. Encorajado por este clima, Githongo vai encarar a sua missão com determinação, penetrando rapidamente redes de uma poderosa classe de predadores do Estado, que floresceu coberta por uma densa manta do mais primário tribalismo e nepotismo. Um número de funcionários de escalão médio do anterior regime vai ser arrastado à barra do tribunal e obrigado a devolver fundos e património do estado de que se haviam locupletado inescrupulosamente. Com as notícias da sua “obra” fazendo eco junto da popula- ção, Githongo vai começar a receber informações não solicitadas, porém particularmente inquietantes: altos funcionários do seu próprio governo são indiciados de…continuar os esquemas do anterior regime! Pouco a pouco, Githongo vai-se dando conta de estar a desfiar a pele de uma jiboia que parece prolongar-se sem fim, pela mata adentro. Contudo, também cedo ele vai se aperceber de que, se a sua “perseguição” judiciária aos cleptocratas do regime de Arap Moi poderia ocorrer com algum resultado, já o mesmo não seria de tolerar, quando tratando-se de seus colegas, ministros do mesmo do governo: se Arap Moi tinha “comido” com a sua tribo, os Kalenjin, era agora a vez de Kibaki e a sua tribo, os Kikuio, de também “comerem”! Com efeito, assim que os Serviços de Segurança do Estado dão-se conta de que o “Czar anticorrupção” quer ir “longe demais” e “depressa demais”, vão tratar de travar-lhe o ímpeto: aos seus pedidos de informação, passam a responder com relatórios ocos. Em face desta realidade, Githongo vai lançar mão dos seus recursos investigativos, adquiridos na Transparência Internacional: decide estruturar uma rede privada de informantes de primeira água, que lhe vão fazer “leaking” de informação valiosa, a partir de Ministérios estratégicos e do Banco Central: tinha orçamento suficiente para pagar generosamente por informação de qualidade! O esquema Mês-após-mês, assim que penetra naquilo que se vai relevar ser um tú- nel profundo e escuro, Githongo vai acabar por dar “de caras” com um devastador esquema de delapidação de fundos públicos, através do qual Ministros do seu Governo roubam ao Estado, impiedosamente, milhões de dólares, mensalmente! Na base de um esquema com terminais no exterior, Ministros de áreas- -chave, nomeadamente das Finanças, da Justiça, do Interior, dos Transportes e Comunicações, da Defesa e da Segurança e entidades subordinadas, haviam criado uma empresa fantasma, denominada Anglo Leasing, com um falso endereço de Londres. A esta empresa, eles iam “encomendando”, sucessivamente, equipamento sofisticado, de tecnologia de ponta, supostamente destinado à modernização das forças de defesa e segurança! A longa lista de equipamento constante de falsos contratos inclui: uma rede digital multi-canais de comunicação para os serviços penitenciários; novos helicópteros e um sistema seguro de comunicações para a polícia; uma fragata de tecnologia de ponta para a marinha de guerra; uma rede de dados e serviço de Internet via satélite para os Correios; um sistema sofisticado de vigilância militar denominado “Project Nexus”; um sistema de radar de aviso prévio para os serviços de meteorologia, etc., etc. Para a “aquisição” destes equipamentos, o gangue lançava concursos internacionais, para os quais concorriam, de facto, várias empresas que, apesar da sua reputação internacional nas respectivas áreas de especialidade, sempre perdiam a favor da …Anglo Leasing! Ao longo de anos, com esta empresa, eles e seus antecessores, do Governo de Arap Moi, haviam simulado um total de 18 contratos milionários! A opção por “equipamento de segurança nacional” é óbvia: à luz das leis de segurança do estado, sempre há- -de ser, em qualquer parte do mundo, entendível que tais operações sejam efectuadas pelo governo em ambiente sigiloso, sendo o acesso aos respectivos ficheiros extremamente restrito, mesmo para a acção fiscalizadora do Parlamento… Velhas cobras debaixo de novas alcatifas Dos 18 contratos através dos quais o gangue urdiu esta saga, 12 haviam sido assinados na era de Arap Moi; os restantes seis…já no primeiro ano da era de Kibaki! Ou seja: quando Kibaki assume o poder, as velhas cobras que ele tanto atacava, enquanto líder da oposição, enfiaram-se no seu Gabinete e esconderam-se debaixo das novas alcatifas! A rede, tentacular, tem conexões junto de sectores da comunidade queniana de origem asiática, conhecedora dos meandros da corrupção internacional! Rapidamente, os Ministros vão dar-se conta de que o Czar Anticorrupção está “cavando” fundo demais e acabará, inevitavelmente, por descobrir o secreto esquema: encarando-o como “irmão” do mesmo sangue Kikuio, chamam-no e lhe dizem: “na verdade, a Anglo Leasing…somos nós”. A “justificação” apoia-se, exactamente, em argumentos tribalistas: “o governo anterior privilegiou os Kalenjin, a tribo de Arap Moi; agora somos nós, os Kikuios: é a nossa vez de comer…” O grupo - a que Githongo vai mais tarde designar por “Mafia do Monte Quénia” - faz esta revelação na convicção de que ele, sendo Kikuio, vai condescender e, assim, desistir de mais investigações: não só se enganavam, como também corriam um alto risco: afinal Githongo estava gravando, discretamente, esta confissão e iria gravar muitas outras conversas sigilosas, com os ministros do seu governo, nos tempos que se iam seguir! O General Cobarde Ao longo do período em que finge ignorar as operações da Mafia do Monte Quénia, Githongo vai tendo acesso a mais evidências sobre o esquema e, já na posse de provas suficientes, escreve uma carta ao Governador do Banco Central, pedindo-lhe para parar imediatamente com quaisquer novos pagamentos à Anglo Leasing, e solicitando detalhes sobre todo o dinheiro transferido para a firma até à data. Compilados vários documentos e cruzadas várias fontes, os auditores descobrem que o gangue acoitado no Governo tinha saqueado, através daquele esquema, nada menos que… 751 milhões de dólares, ao longo de anos! Ora, uma tal quantia, de tão elevada, já não causa qualquer revolta no cidadão comum, pois ela já não cabe, nem faz qualquer sentido, na sua cabeça! Pouco depois, John Githongo, tomando pequeno-almoço com Kibaki - o que era habitual, tal era a sua proximidade com o Presidente - conclui ter chegado o momento apropriado para dar o passo decisivo, e sugere ao Chefe de Estado: “Vossa Excelência tem agora todas as evidências necessárias para agir; confiar no nosso sistema de justiça… não vai adiantar nada: sugiro-lhe, pelo contrário, uma acção política enérgica!” Githongo fica na maior expectativa, pois está convicto de que, chegado a este ponto, o seu desempenho satisfaz, certamente, as expectativas do Presidente! E o que diz o Presidente? Para o total espanto de Githongo, o Presidente vai reagir como reagiria um rato surpreendido com uma fatia de queijo na boca, e diz, simplesmente: Take it easy…Isto é: “tenha calma”. O Presidente diz isto e levanta-se da mesa, deixando Githongo estupefacto e confuso: afinal o que quer o Presidente?! Nos dias que se seguem o Secretá- rio Permanente para a Governação e Ética vai começar a notar que os seus colegas do Governo, Ministros, olham-no de forma estranha, de soslaio, e lançam-lhe piadas despropositadas, conduta não muito comum aos hábitos algo sisudos, pretensamente britânicos, da classe política queniana. Dias depois, o Presidente, surpreendendo Githongo, convoca a imprensa, dizendo que pretende fazer uma comunicação à Nação: John Githongo não tem dúvidas: o Presidente vai, certamente, anunciar uma remodelação governamental, demitindo os ministros corruptos e nomeando um novo governo. Não poderia estar mais equivocado! A Mafia do Monte Qué- nia vai, pelo contrário, sair reforçada do discurso televisivo do Presidente e ele… transferido para um obscuro gabinete, junto do Ministério da Justiça! Exactamente o Ministério que, com o das Finanças, liderava as operações da Anglo Leasing, que ele tinha documentado e denunciado ao Presidente! No dia seguinte, quando Githongo arrumava os papéis do seu gabinete, para se mudar, um assistente do Presidente vai ter com ele diz-lhe o seguinte: na verdade, o Presidente não o tinha demitido do seu cargo: foi o Ministro da Justiça que, sub-repticiamente, enfiou um parágrafo no discurso do Presidente, com o nome de Githongo, anunciando aquela transferência! E o assistente do Presidente enfatiza: “Aposto que o Presidente nem se deu conta do que leu…até agora!” Quando, incrédulo, John Githongo vai ter com o Presidente, o que vai ocorrer é uma cena absolutamente surrealista: o Presidente mostra- -se sinceramente espantado; nega a pés juntos que o tenha demitido, e diz-lhe para continuar a trabalhar… …”normalmente”! O que será que se estaria a passar? Teria o “velho” sido enganado, e de forma tão vil e primária, por um dos seus ministros-chave, sem se dar conta de nada? Estará o Presidente em pleno gozo das suas faculdades mentais? Ou serão ainda sequelas do ataque cardí- aco que sofreu, na sequência do grave acidente de viação de que foi vítima, durante a campanha eleitoral? Ou será o velho hábito dos líderes fracos - quais generais cobardes! - de querem agradar a toda a gente, ficando paralisados, na hora de tomar grandes decisões? Ou então a velha táctica de pronunciar discursos de mudança, porém sistematicamente desmentidos pela prática, para criar o discurso desculpabilizante, bem africano, segundo o qual “o Mais Velho quer honestamente a mudança, mas está rodeado de crápulas que o sabotam”? Todas estas perguntas cruzavam-se na cabeça de Githongo, porém sem reposta. Mas um facto apresentava- -se-lhe evidente: depois de tudo, já não lhe restava ambiente de trabalho sustentável! Do exílio voluntário ao rebentar do escândalo Desiludido com o sistema, mas sobretudo, com o Presidente, Githongo abandona o governo e parte para Oxford, aonde ensaia pretender continuar com os estudos superiores, numa instituição de estudos estratégicos internacionais. Contudo, em vez disso, e com a ajuda da sua antiga rede de informantes, de Nairobi, ele vai entregar-se a uma tarefa monumental: transcreve as suas várias de horas de gravações secretas, em que os Ministros assumem a Anglo Leasing e revelam o funcionamento do esquema; consubstancia com os seus sistemáticos diários pessoais; junta documentos oficiais do Banco Central e de Ministérios-chave e outras entidades oficiais envolvidos e prepara um detalhado dossier sobre a saga. Entretanto, e sem surpresa, de Nairobi é lançada uma forte campanha para o desacreditar, com artigos de encomenda na imprensa: vão chamá-lo de vil traidor, que acabou se desmascarando, entregando-se aos seus patrões britânicos, dos serviços secretos do MI6! Um anti-patriota sem escrúpulos nem classe, que traiu a confiança dos colegas, e vive agora uma vida de Lord, graças a negociatas sobre segredos de estado! Os ataques vão atingir a sua família: o pai, dono de uma das maiores empresas de auditoria do Quénia, que quase detinha o monopólio das auditorias das entidades pú- blicas do país há várias décadas, perde todos os contratos e vai praticamente à falência! Mas Githongo ainda não perdeu a esperança; ainda acredita no Presidente; e acredita que Kibaki, na posse de informação mais consubstanciada sobre a Mafia do Monte Quénia, vai certamente reagir: cria todas as condi- ções necessárias para enviar, com segurança, o seu dossier ao Presidente, e certifica-se de que este o vai, efectivamente ler! O Presidente, após ler o dossier, ao longo de toda uma tarde, fecha-o e deixa-o na sua secretaria. Até ser arquivo pelos assistentes, na manhã seguinte. E…silêncio! Githongo vai ainda fazer inúmeras tentativas, para ser ouvido pessoalmente por diferentes instituições do Estado, incluindo o parlamento: em vão! Chegado a este ponto, ele toma uma decisão de recurso: decide revelar o dossier através da comunicação social queniana! Assim, em 2006 os ficheiros da Mafia do Monte Quénia começam a ser revelados pelo Jornal The Nation: peça por peça, dia-após- -dia, sendo reproduzidos - inevitavelmente! - por toda a imprensa queniana e vasta imprensa internacional! As reacções não vão tardar: a oposição pede a dissolução imediata do governo; a sociedade civil e as Igrejas pedem a “cabeça” de vários ministros!

Num estudo de campo divulgado esta segunda-feira, o Centro de Integridade Pú- blica (CIP), uma organiza- ção não governamental que trabalha em prol da Boa Governação, Transparência e Integridade na função pública, revela que, três anos após a aprovação da Lei de Probidade Pública, o processo de Declaração de Património por parte das entidades públicas abrangidas pela Lei está prenhe de imperfeições que sugerem incongruências, incumprimento da Lei, desorganização, ineficácia e falta de seriedade. Concebido como um mecanismo para garantir transparência na gestão do bem pú¬blico e prevenção de actos de corrupção, a Declaração de Património é, na verdade, um termómetro para medir a evolu- ção ou variação do património de deter¬minadas entidades públicas, tendo em atenção o in¬tervalo entre a sua tomada de posse ou início do exercício de funções e o momento da sua cessa¬ção. À luz do Artigo 58 da Lei de Probidade Publica, estão sujeitos à declaração de rendimentos e bens patrimoniais os titulares de cargos políticos providos por eleição ou nomeação; os juízes e magistrados do Ministério Público, sem excepção; os gestores e responsáveis da administração central e local do Estado; os membros do Conselho de Administração do Banco de Moçambique; os quadros da direcção da Autoridade Tributária; os gestores do património público afectos às forças armadas e à polícia, independentemente da sua qualidade; os gestores e responsáveis dos institutos públicos, dos fundos ou fundações públicas, das empresas públicas e os gestores públicos das empresas participadas pelo Estado; e membros da Assembleia Provincial. Declaração de Património à lupa do CIP “Incongruências, desorganização e falta de seriedade” -pelo menos três governadores ainda não apresentaram as suas declarações de património Por Armando Nhantumbo Foi assim que, visando aferir o decurso do processo, o CIP realizou, entre Novembro e Dezembro de 2015, actividades de monitoria em Cabo Del¬gado, Nampula, Zambézia, Niassa, Tete, Sofala, nas procuradorias provinciais respectivas, onde são depositadas as declarações. O que se observou, refere o estudo, é que o processo ainda se encontra numa fase bastante embrionária. Inconsistências devido à existência de procedimentos não uniformes por parte das procuradorias provinciais; dúvidas de interpretação da lei por parte dos membros das Comissões de Recepção e Verificação das procuradorias provinciais e que não eram esclarecidas pela Comissão Central que funciona na Procuradoria-Geral da República; a não aplicação de medidas sancionatórias às entidades que por lei deviam proceder ao depósito das declarações de património; a não recepção a seu nível das declarações pelas procuradorias distritais; a não disponibilidade dos modelos das declarações de bens para todas as entidades depositárias; o uso pelas procuradorias de formas diferentes para fazerem chegar as declarações aos destinatários; a não adesão pelas procuradorias distritais ao processo de declaração de bens, em violação da lei, estão entre as imperfeições que tornam o processo não efectivo. Revela o CIP que as entidades obrigadas a fazer o depósito das declarações de património ainda não encaram a obrigatoriedade com a seriedade devida, sobretudo, pela inexistência de uma acção vigorosa por parte das entidades depositárias, no caso das procuradorias provinciais, para desencadearem o respectivo procedimento sancionatório. “O cumprimento até ao momento tem sido facultativo”, refere o estudo e os números falam por si. Em Cabo Delgado, por exemplo, do total de 342 declarantes, apenas 172 entidades depositaram suas declarações, faltando 170 por o fazer. Em Nampula, do total de 728 declarantes, apenas 119 haviam, até o período em análise, depositado as suas declarações, faltando 609. Na Zambézia, 274 entidades haviam cumprido a Lei, 59 infractores, do total de 333 que a província possui. Com 354 declarantes, Tete recebeu até o mesmo período, 213 declara- ções contra 141 em falta. Em Sofala, 569 depositaram, 184 não, do total de 753 declarantes que a província possui. Indica a análise que, do total das procuradorias monitorizadas, notou-se que apesar da obrigatoriedade legal os gestores de património público afectos às forças armadas e à polícia não o fazem, principalmente os das forças armadas, mas nenhum foi notificado pelas entidades depositárias para esse fim. Governadores faltosos No que tange aos governadores provinciais, só os de Nampula, Victor Borges, de Niassa, Arlindo Chilundo e de Sofala, Helena Taipo é que já haviam apresentado a declaração de bens, sendo que os de Cabo Delgado, Celmira da Silva, da Zambézia, Abdul Razak e de Tete, Paulo Auade, pelo menos a nível da província, não tinham apresentado as declarações. Mas preocupante também, acrescenta o CIP, é a não aplicação de san- ções aos declarantes que não fizeram a apresentação da declaração de bens nos prazos exigidos por lei. A constatação é de que muitos declaran¬tes, mesmo depois de noti- ficados para fazerem o depósito das declarações por já ter excedido o prazo ordinário indicado por lei, continuaram sem cumprir o seu dever, violando o n.º 1 do arti¬go 72 da Lei de Probidade Pública que estabelece o prazo de 10 dias, contados a partir da notifica¬ção, para se depositar as respectivas declarações. “Quer isto significar que as entidades depositárias estão a pactuar com as violações da Lei de Pro¬bidade Pú- blica, o que conduz a que as entidades sujeitas a apresentar as declarações de bens não se mostrem pressionadas a fazê-lo, retirando se¬riedade, eficá- cia e credibilidade ao processo. Esta forma de agir por parte das entidades depositá¬rias, caracterizada pela impunidade dos decla¬rantes que não cumprem a obrigação legal de apresentar as declarações de património, conduz a que estes não vejam qualquer necessidade de fazer o respectivo depósito, pois agem na convic¬ção de que nada lhes acontece, fazendo-o ou não”, destaca o CIP, para quem é altura de a Procuradoria-Geral e as pro¬curadorias provinciais começarem a aplicar a lei para os que não apresentam a declaração de pa¬trimónio, sob pena e risco de ine- ficácia e descré¬dito do processo. Por outro lado, o estudo aponta para a falta de clareza por parte de algumas procuradorias na interpretação da lei no que se refere às entidades que devem fazer o depósito da declaração de bens. “Esta situação foi notória em quase todas as pro¬víncias monitorizadas e nalgumas como Nam¬pula e Niassa, a definição dos cargos abrangi¬dos foi diferida para as próprias instituições ou órgãos públicos, na figura dos seus responsáveis, ou para as secretarias permanentes provinciais, no sentido de se pronunciarem sobre que cate¬gorias de funcionários é que devem fazer a apre¬sentação das declarações”, observa a organização, rebatendo que o alcance da interpretação da lei é que todas as entidades que tenham a sua guarda, para administrarem, bens e fundos do erário público, apresentem a declaração de pa¬trimónio nos termos fixados pela lei. A falta de formação dos membros das comissões de recepção e verifi- cação foi outra das constatações do estudo. “Constatou-se que os membros destas comissões exerciam as suas actividades sem quaisquer conhecimentos e, por isso, demonstravam dificuldades diversas nos procedimentos a seguir no exercício das suas funções”, diz o estudo que observa que os referidos membros foram designados sem que existisse qualquer regulamento ou guião para os orientar nas suas novas funções, o que fazia com que, em cada província, o processo decorresse da forma como os mem¬bros achassem que fosse a mais indicada para o momento. O CIP deplora ainda a realização de depósito das declarações de bens sem os respectivos comprovativos de propriedade do património. “Embora não seja uma obrigação de cariz legal (acreditamos que se trata de uma lacuna da lei), as declarações de bens estão a ser efectuadas sem os necessários comprovativos da propriedade para aferir da sua legalidade e legitimidade”, observa o organismo de acordo com o qual em todas as procuradorias provinciais monitorizadas, nenhuma entidade depositária exige os comprovativos dos bens declarados, principalmente quando se tratem de bens sujeitos a registo. Nisso, a organização dirigida pelo professor universitário de Ciência Política, Adriano Nuvunga, é da opinião de que esta situação pode concorrer para que determinadas entidades sujeitas à declaração de património o façam para defraudar a lei, isto é, podem surgir situações em que podem ser declarados bens que não existem, na perspectiva do declarante vir a obtê-los no futuro, recorrendo a actos de corrupção ou equiparados.

O governador do Banco de Moçambique, Ernesto Gove, considerou que a instabilidade vivida no sector financeiro no ano passado tem sido típica dos anos pós-eleições, períodos em que são afectados os indicadores macroeconómicos, com incidência para a taxa de inflação e cambial. O comentário de Gove foi feito na abertura do 40º Conselho Consultivo do Banco de Mo- çambique, que decorre desde esta quarta-feira, na cidade de Tete. Na abertura da reunião, que termina nesta sexta-feira, Gove passou em revista a trajectória económica que o país enfrentou ano passado, nomeadamenGove socorre-se da tensão pós-eleitoral te, volatilidade cambial, agravamento do défice da balança comercial e a inflação fora do programado. “A série cronológica que possuímos revela-nos que os anos pós-eleitorais são particularmente afectados, sob o ponto de vista de estabilidade dos indicadores macroeconómicos, com incidência para a inflação e taxa de câmbio”, precisou. Desde Outubro de 2014 o país vive uma incerteza política, resultante, em parte, da não aceitação dos resultados eleitorais, por parte do principal partido da oposição que reclama governar nas províncias onde venceu as eleições. Afonso Dhlakama promete governar as referidas províncias a partir de Março do presente ano. Segundo Gove, agregando esses factores à conjuntura económica internacional que se consubstanciou no fortalecimento do dólar face ao metical, o agravamento do défice da balança de pagamentos, aliada à acentuada estagnação das exportações, a saída de alguns parceiros de apoio programático acabou por influenciar a depreciação do metical na ordem dos 40%. Como medida para reverter a situação, o BM destaca a introdução do ajustamento das taxas de juros de facilidade permanente de cedência, e de depósito em 9,75% e 2,75%, respectivamente. Destacou ainda o limite estabelecido no pagamento de serviços via carões de crédito no estrangeiro na ordem dos 700 mil meticais por pessoa num determinado ano civil, que no final de um mês de vigência trouxe resultados positivos. De acordo com o dirigente do banco emissor, esta medida inverteu o comportamento da taxa de câmbio face ao dólar americano que dos 56,06 meticais que era transacionado em Novembro, passou para 45 meticais até ao fecho da primeira quinzena de Janeiro do presente ano. Refere ainda que a situação foi extensiva aos bancos comerciais que também transacionavam o dólar a 56,0 meticais no mesmo período em referência recuou para 46,58 meticais. Para o presente ano, apesar de reconhecer os desafios existentes como a seca na zona sul, chuvas a norte e a prevalência de fraquezas na recuperação da economia mundial, o BM projecta reverter a taxa de inflação anual para 5,6% e uma taxa de crescimento do PIB de 7% e um nível adequado de reservas internacionais. Por forma a fazer face a estes desa- fios, Gove disse que a coordenação de políticas fiscais e monetárias se mostra pertinente de modo a alcançar a estabilidade macroeconómica, que é base fundamental para implementação de políticas sectoriais que promovam o aumento da produção, produtividade e emprego. Numa altura em que os preços das commodities no mercado internacional continuam baixos, Gove alertou para a necessidade da diversificação da economia nacional, tirando maiores vantagens em sectores como agricultura, turismo e infra-estruturas que têm um forte potencial mas pouco explorados. Segundo Gove, isto permitirá que a produção substitua paulatinamente as importações e a promoção das exportações, o que poderá elevar as reservas nacionais e criar resiliências aos choques externos. (A.Nhampossa)
A vertiginosa baixa, no mercado internacional, do preço de barril de petróleo continua a alimentar expectativas entre os mo- çambicanos que aguardam, ansiosamente, notícias sobre a revisão em baixa de preços da gasolina, do gasóleo e do gás de cozinha. O SAVANA foi atrás daqueles que lidam com a matéria e, depois de tantas insistências, conseguiu finalmente entrevistar o Director Nacional de Hidrocarbonetos e Combustíveis no Ministério dos Recursos Minerais e Energia que, entretanto, admitiu haver condições para redução dos preços. Mas Moisés Paulino fala de estratégia cautelar e evoca a subida do dólar como factores que ditam a manutenção dos preços de 2011, numa altura em que o barril de petróleo variava de USD 100 a USD 110 contra os actuais cerca de USD 30. Contudo, porque o metical voltou a recuperar, ainda que timidamente, o dirigente garante estar novamente na mesa a possibilidade de redução, mas avisa para não se cair na ilusão porque mesmo a acontecer, não irá para além dos dois ou três meticais, contados a partir dos actuais 47.5 e 51 meticais e 36 a 40 meticais o litro de gasolina e gasóleo, respectivamente. Transcrevemos a entrevista na íntegra para que o leitor tire a sua própria ilação. A 20 de Janeiro corrente, o barril de crude chegou a custar, no mercado internacional, USD27,88. O País está atento a esta dinâmica e, se a resposta for sim, até que ponto pode influenciar o mercado doméstico? Como País, estamos atentos a esses factores todos que não dependem muitas vezes de nós, particularmente aqui na área dos combustíveis. Sabemos que a partir de meados de 2015, o crude ou barril do petróleo está sofrendo uma descida quase que de uma forma brusca no mercado internacional. Sabemos que o barril hoje (quarta-feira) pode andar aos 29 a 30 dólares, então, estamos atentos a isso e, como Sector de Recursos Minerais e Energia, na vertente Energia e Combustíveis, sabem que temos vindo a subsidiar estes preços há alguns anos e esse trabalho de subsídio, o Governo não deixou de fazer, continua a fazê-lo e também tem se preocupado em reparar os preços dos combustíveis ao nível do País. Portanto, era suposto que esta descida de preço do crude se re- flectisse na descida dos preços da gasolina, do gasóleo e do gás de cozinha, mas como sabem o Governo vinha subsidiando, na altura em que o barril chegou a 130/140 “Não caiamos na ilusão” - Director Nacional de Hidrocarbonetos e Combustíveis adia expectativas sobre redução do preço de combustíveis Por Armando Nhantumbo dólares, que era para manter os preços da gasolina e do gasóleo porque as gasolineiras registavam perdas. Quando o fenómeno se inverte no mercado internacional, o Governo tem outra forma de gerir isto, continua sim a subsidiar, mas continua a ir buscar os valores que essas gasolineiras ganham para fazer face àqueles subsídios e continuar, naturalmente, os preços que estão no mercado que a economia local suporta. Por outro lado, nos finais de 2015, nós pensávamos que íamos fazer o reajuste em baixa, para reagir a esta descida do preço do petróleo a nível internacional, mas surgiu um outro fenómeno de que se calhar as pessoas menos atentas não se aperceberam. É o câmbio, em termos da flutuação da nossa moeda (metical), em relação do dólar, que quase disparou até aos 60. Então, de uma forma estratégica e cautelar e para não criar perturbação na economia nacional, este Governo preferiu manter os pre- ços até hoje. Numa altura em que verificamos que o câmbio quase que se estabilizou nas últimas semanas, o Governo de novo volta a uma abordagem para corresponder a esta necessidade de reagir ao preço do barril do petróleo. Portanto, estamos a produzir documentos, nós chamamos isso de memorandos, e vamos dar a conhecer a outros níveis porque o ministério de Recursos Minerais e Energia pertence ao grupo de ministérios económicos deste País, então, não cabe somente a nós porque o preço do combustí- vel mexe com a economia no seu todo. Mexe com a viatura do senhor que está a me entrevistar, da minha viatura, do camponês, do cidadão comum. Então, este grupo de ministérios económicos é que deve fazer uma abordagem mais sustentável para reagirmos a esta descida do preço de combustíveis. Está a dizer que a não descida dos preços de combustíveis em Mo- çambique deve-se ao efeito dólar? Nas últimas semanas de 2015 até hoje, o efeito dólar foi sim um factor determinante para nos mantermos os preços. Houve outros factores? Há outros factores que aqui não interessa mencionar, mas que numa economia tão frágil como a nossa, é preciso que o Governo, ao embarcar por esta forma de mexer nos preços de combustíveis, tenha em conta. Interessa mencionar sim, afinal estamos a falar do bolso do cidadão! Registe que o grande factor que determinou a não mexida foi o efeito dólar em relação ao metical. Portanto, essa flutuação não favorável ao metical, fez com que de uma forma cautelar o Governo mantivesse os preços para não controlar turbulência. Mas hoje que há uma certa estabilidade, estamos a produzir memorandos para ver se conseguirmos reagir, mexendo os preços, mas essa mexida dos preços não depende, como dizia, de um único ministério, depende de toda a economia no geral. 2014-2016: a duração da cautela Director, insistimos em saber se o factor é apenas o dólar ou não porque, em Dezembro de 2014, o SAVANA entrevistou a então directora Nacional de Combustíveis, Felisbela Cunhete, que como justificação da não redução dos preços de combustíveis, apesar da queda do preço de barril desde aquela altura, ela dizia que não se podia tomar medidas precipitadas; que era preciso esperar para captar a real tendência do mercado. Ora, o argumento hoje não é mais de que é preciso acompanhar essa dinâmica dos preços no mercado internacional. Hoje a justificação é completamente outra: o dólar … Não tanto, continua a outra abordagem da minha colega que esteve aqui a dirigir esta direcção. A questão cautelar que ela enfatizou, na altura, nós continuamos com a mesma ponderação, é verdade que acrescentamos outro factor que é esta flutuação. Estávamos cautelarmente a assistir o descer do preço do crude no mercado internacional. Não era logo a prior mexer os preços porque não sabíamos como é que o barril se iria comportar, isso é uma questão cautelar. Mas depois tivemos a infelicidade de termos a flutuação não favorável do metical. Admitiu que poderá fazer-se alguma revisão em baixa. Quando e para quanto? Para quando, isso não cabe a esta direcção dizer, cabe a esta direc- ção mostrar, tecnicamente, que há condições para existir algumas mexidas nos preços dos combustíveis, verificando a flutuação do comportamento do barril e as importações. Não diria quando exactamente, são níveis de competência que eu não posso ultrapassar. A minha competência é técnica, mostrar com A+B que há condições para se fazerem mexidas dos preços. Agora, é preciso que não caiamos numa ilusão, um País com uma economia como a nossa, frágil, que não é produtora ainda desses combustíveis como o petróleo. Para além da descida de preços das importações, há outros factores como a estabilidade cambial e o crescer da própria economia. Esses factores todos é que determinam o preço último da gasolina, do diesel e do gás de cozinha. O que significa cair na ilusão? É que podemos pensar que podemos descer até a metade do preço, o que não é verdade. Mesmo as economias que produzem petró- leo não vão até aí. Se hoje estamos a 47 ou 48 o preço da gasolina, se calhar vamos descer em dois ou três meticais, mas isso é bom para uma economia de escala porque ajuda aquele último beneficiário a reduzir os custos, estou a falar essencialmente da gasolina e do diesel, então, é preciso não nos iludirmos, termos esses factores todos. Pode, pelo menos, dizer se será neste trimestre, ou o próximo trimestre ou mesmo semestre que haverá tal redução? Eu volto a dizer, recuperando o que a minha colega dizia há anos, que a cautela é extremamente importante nesta área porque hoje se o senhor jornalista pode estar a ver que o crude do petróleo está a 30 dólares no mercado internacional e de repente surgem factores que não são de controlo deste Governo, o barril dispara para 50, automaticamente, uma economia como a nossa vai reagir no sentido de que olha não há condições. Mas director, há mais de um ano que o preço do barril no mercado internacional está em queda. Ora, quando dizem que precisam de tempo para medir esta dinâmica, estamos a falar de quanto tempo, afinal? Estou a dizer-lhe que, tecnicamente, hoje há condições de a gasolina descer um ou dois meticais. Esse estudo já foi feito, não estamos alheios a esse um ano de descida, mas eu pus um outro factor na mesa que é a oscilação do metical em relação ao dólar que não foi favorável. O Governo já teria feito essas mexidas logo nos primeiros dias do ano, mas surgiram outros factores como a taxa de câmbio que não foi favorável. Mas o Governo está a acompanhar esta dinâmica e a manter-se assim a estabilidade do metical em relação ao dólar, já se pode mexer, mas essa mexida não cabe a esta direcção, existem outros órgãos que podem determinar isso, é que estava a dizer. Quando em 2011, o preço da gasolina disparou para entre 47.5 e 51 meticais e o preço do gasóleo para cerca de 36 a 40 meticais, a justificação do Governo era de que o barril também tinha subido para a casa dos 100 a 110 dólares. Como dizer hoje ao cidadão que os preços de 2011 se mantêm, quando o crude baixou, bruscamente? Boa pergunta. Há um factor que a comunidade ou o cidadão não está a ver e aí aproveitaríamos aos órgãos de Comunicação social para fazer ver o factor que enfatizei aqui e é preciso que venha ao de cima. O metical ficou fraco em relação ao dólar. Nesse ano, o câmbio do dólar em relação ao metical andava aos 30, mas hoje está 40 a 50, esse também é um factor que é preciso trazer ao de cima e este factor que estou a mencionar, senão o Governo já teria revisto em baixa se a condicionante de 2011 continuasse aquela, mas de repente, em 2015, houve turbulência na economia.
E ra uma bomba relógio que se arrastava há anos, mas este mês explodiu. Trata-se de um desentendimento que opõe a direcção da Medlife Trauma e os trabalhadores, a diversos níveis, daquela clínica privada situada na zona nobre da capital do País, Maputo. Atrasos salariais foram a razão que levou a massa laboral a quebrar o silêncio e denunciar uma longa lista de irregularidades. É uma lista da qual o patronato só assume demora de salários, cujas dívidas promete liquidar até 20 de Fevereiro próximo. São aproximadamente 200 trabalhadores, entre médicos generalistas e especialistas, enfermeiros, técnicos de laboratório e de farmácia, pessoal de administração e de recepção, serventes e até dirigentes de departamentos que dizem que os atrasos excessivos dos seus salários atingiram o inadmissível. Asseguram haver, entre eles, os que só viram seus honorários há mais de 7 meses, porquanto naquela clínica os pagamentos são aleatórios. Mas também denunciam disparidades salariais entre colegas da mesma categoria. “Há estrangeiros que ganham duas a três vezes mais que os moçambicanos, mas a fazerem o mesmo trabalho”, anotam. Dizem que na Medlife Trauma não há progressão salarial anual. Que não há pagamentos de horas extras. E mais, segundo os afectados, quando os atrasos começaram, aproximaram-se ao Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) para se inteirar da canalização ou não dos seus subsídios, ao que constataram Salários agitam clínica Medlife Trauma Por Armando Nhantumbo que tal não acontece, apesar dos descontos mensais feitos aos seus ordenados pelo patronato. Ao SAVANA, os queixosos reportaram que a direcção daquela clínica sempre se mostrou indisponível a atender as preocupações da massa laboral, o que obrigou os trabalhadores a paralisar as actividades entre 18 e 19 de Janeiro corrente. Os grevistas, que no entanto salvaguardaram a prestação de serviços mínimos como urgências, só não foram para além dos dois dias porque a direcção abriu a mão ao diálogo, sentando-se com eles à mesma mesa, na presença de uma equipa de mediação do Ministério do Trabalho. O nosso jornal sabe também que, na resolução da contenda, está envolvido o Ministério da Saúde. Tudo quanto os trabalhadores querem é ver os seus ordenados o mais rápido possível e dizem estar atentos para que até Fevereiro, as dívidas sejam saldadas na totalidade conforme o combinado. Caso o prazo não seja cumprido, avisam os trabalhadores, “voltamos a paralisar os serviços porque o que fizemos foi voltar a dar voto de confiança” ao patronato. Até porque os trabalhadores garantem que, mesmo agora, “estamos em greve, só retomamos ao trabalho, condicionalmente” referindo-se aos compromissos assumidos pela direc- ção em liquidar as dívidas. Foi quando questionamos se os “trabalhos condicionais” não colocariam em causa a vida dos pacientes, ao que garantiram que não. “As pessoas até podem descobrir o nosso mau estar, mas nós garantimos os serviços porque trabalhamos com vidas humanas”, asseguraram. Para além do salário Mas a questão salarial apenas foi aquela que fez transbordar o copo. É que a lista das inquietações é longa. Inclui falta de contratos de trabalho, há mais de dois anos, para cerca de 55% dos trabalhadores, segundo os denunciantes que deploram ainda a falta de respeito pela entidade patronal. No capítulo dedicado ao que chamam de deficientes condições de trabalho, mencionam sobrecarga no horário de trabalho, falta de assistência médica-medicamentosa embora trabalhem numa clínica, falta de seguro de trabalho para todos os funcionários, falta de refeições para os trabalhadores em regime de turnos, de segurança no trabalho, uniforme e crachás de identificação. Denunciam ameaças de despedimentos ou outras consequências em caso de reclamações salariais ou de melhores condições de trabalho, por isso que pediram anonimato. Afirmam que a contratação dos funcionários segue a lógica do paternalismo e não as capacidades e necessidades da empresa. Dizem desconhecer o organograma da estrutura da empresa. “Para o nosso espanto, a clínica tem prestado bons serviços aos seus utentes (assegurados, singulares e corporativos), que diariamente aumentam em número, resultando num maior ganho financeiro para a clínica. Em contrapartida, o patronato alega não haver fundos para pagamento de salários, fornecedores de servi- ços, defendendo que as seguradoras de saúde não honram com os seus compromissos, mas todos os dias são emitidos cheques em nome de motoristas com valores e existe um suporte financeiro a empresas paralelas”, lê-se numa exposição ao nosso semanário, na qual os trabalhadores referem que a Medlife Trauma não leva a peito o esforço do trabalhador, nem o considera como um ser com necessidades básicas. “Estamos a sofrer revés da economia” - Abubacar Omar, jurista da Clínica conhecida como avessa à comunicação social, a direcção máxima da Medlife Trauma não deu a cara ao nosso jornal sobre o assunto. Delegou o jurista da empresa, Abubacar Omar que, entretanto, afastou quase todas as acusações dos trabalhadores da empresa. Omar, que não soube dizer quantos trabalhadores possui a clínica que representava, disse que a única queixa que a Medlife Trauma assume é o atraso salarial, mas as partes já chegaram a um acordo. Disse que, na base desse entendimento, a empresa comprometeu-se a liquidar todas as dívidas entre dois a 20 de Fevereiro próximo. “Ate lá a situação estará ultrapassada” prometeu o jurista segundo o qual os atrasos devem-se a conjuntura económica nacional. “A empresa está a sofrer revés da economia. Há fuga de investimentos. Como sabem, o País não anda bem em todos os sentidos e neste momento andamos a procurar injecção de financiamento”, justificou, negando que a empresa não tenha comunicado aos trabalhadores sobre os atrasos salariais. Sobre as disparidades salariais entre trabalhadores da mesma categoria e a fazerem as mesmas actividades, a fonte considerou ser normal porquanto os contratos são individuais. “Não é verdade que haja trabalhadores sem contratos”, sentenciou, por outro lado, o jovem advogado.
E x-presos políticos de Mabalane queixam-se da falta de reconhecimento do seu papel pelo Estado moçambicano. Os membros do grupo, que são conhecidos como “combatentes na clandestinidade”, dizem que não recebem apoios para a melhoria das suas condições de vida e sentem-se magoados por ouvirem “camaradas” afirmarem que “têm direto de ser ricos, porque combateram”, numa alusão a uma declaração atribuída a Alberto Chipande, considerado pela historiografia oficial moçambicana como o autor do primeiro tiro da guerra contra o colonialismo português. Contam que o seu passado tem sido um longo calvário. O seu compromisso com a causa da liberdade foi sempre alvo de desconfiança, havendo, entre os revolucionários que levaram Moçambique à independência em 1975, quem os chamasse traidores, supostamente porque foram parar às celas de Mabalane por terem pilhado galinhas, entre outros delitos. Há, contudo, admitem, quem reconhece o seu papel. Américo Magaia fez parte dos 75 moçambicanos encarcerados nas celas de Mabalane e narra que os membros do grupo já estiveram à beira do fuzilamento, depois da independência nacional, porque uma ala da Frelimo entendia que os relatos trazidos da penitenciária eram pura encenação. Segundo Magaia, as suspeições em relação ao papel dos “nacionalistas” presos em Mabalane provocaram a marginalização do grupo e muitos integrantes morreram na indigência. Passado meio século após a deten- ção pelo regime colonial português dos “75”, encarcerados na cadeia de Mabalane, na província de Gaza, o governo decidiu homenageá-los com a criação de um museu que reporta a história por eles vivida. A iniciativa é do Serviço Nacional Penitenciário (SERNAP), em parceria com o Ministério dos Combatentes (MICO), Associação dos Combatentes da Luta de Libertação Nacional (ACCLIN) e do governo da Província de Gaza. Prevê-se que o museu seja inaugurado em meados de Fevereiro. Durante os preparativos da cerimó- nia, o SAVANA acompanhou os depoimentos de alguns membros do grupo, cujo sonho era juntar-se à Frelimo em Dar Es Salam, Tanzânia, para a luta de libertação nacional. Hoje, olhando para o passado e no seu percurso, Adriano Sumbana diz que o reconhecimento do governo Presos políticos de Mabalane dizem-se marginalizados Por Argunaldo Nhampossa ficou aquém das expectativas, porque, na altura, havia muito por contar e nãos lhes foi dado um espaço para tal. Segundo Sumbana, as novas gerações pouco sabem da luta na clandestinidade e muito já teria sido difundido, mas só este ano o governo decidiu abrir-lhes as portas. David Chambal, um dos mais velhos do grupo, comunga da mesma opinião e considera que o Estado pouco ou quase nada fez para dignificar os presos políticos de Mabalane. Entende Chambal que não há luta de libertação sem luta na clandestinidade, pelo que não percebe o que terá levado o Estado, desde a proclamação da independência nacional até hoje, a não prestar o devido apoio ao grupo e muito menos espaço para exporem o que lhes vai na alma. Para Manuel Panguene, a dissolução da história dos presos políticos na história de luta de libertação nacional contribuiu para que não tivessem o devido apoio, incluindo as intensas torturas infligidas por Chico Feio, o carcereiro mais sinistro de Mabalane. Panguene diz sentir mágoa, quando alguns antigos combatentes dizem de viva voz que “têm direito de serem ricos porque lutaram”, enquanto eles vivem na miséria. Amós Mahanjane diz que não pode negar que há frustrações no seio dos ex-presos políticos de Mabalane, isto porque alguns foram isolados por serem considerados perigosos e deviam ser afastados das hostes do partido no poder. No entanto, diz que o Estado fez algo por este grupo, mas não o sufi- ciente. Refere ainda Mahanjane que o mesmo sentimento de frustração que toma conta dos integrantes do seu grupo existe nos combatentes que pegaram em armas de foram à luta. Louva a ideia da criação do museu dos presos políticos de Mabalane, mas sugere a continuidade deste tipo de actos por forma a perpetuar a história do país, que até aos dias de hoje depende de fontes orais. Disse estranhar que nunca tenha sido investigado de forma exaustiva o que terá acontecido com a parte do grupo que passou para a cadeia de máxima segurança, vulgarmente conhecida B.O. Ao encontro de “Chico Feio” Imbuídos pelo espírito nacionalista de lutar contra o regime colonial português, segundo eles, vários moçambicanos juntaram-se em pequenos grupos e partiram para a Suazilândia, em trânsito para Dar Es Salam, Tanzânia. Contra todas as expectativas, Adolfo Bila conta que o grupo dos 75 cidadãos nacionais, entre homens e mulheres, foi “aldrabado” por um policial bóer, que estava ao serviço da PIDE. Segundo Bila, o polícia apresentou-se ao grupo como amigo de Eduardo Mondlane e, para credibilizar a sua estória, exibiu falsas correspondências que, no momento, ninguém se deu conta de serem falsas. Conta que o mesmo prometeu levar- -lhes à terra de Julius Nyerere e a partida foi marcada para a noite de 09 de Maio de 1964. Já em solo sul-africano, foram interceptados na fronteira de Middelburg e recambiados para Ressano Garcia, onde embarcaram num comboio até Mabalane. Américo Magaia, que na altura era jogador de futebol numa equipa na vizinha Suazilândia e decidiu trocar os relvados pela arma, recorda que estavam em três vagões, dos quais, um para mulheres e outro para homens. Segundo Magaia, depois de desembarcarem, iniciou-se um duro e tenebroso processo de torturas e interro.
I . Injustiça legalizada a. O artigo 540 do Código de Processo Penal (CPP) que determina que “Só poderá interpor-se recurso da senten- ça para a respectiva Relação, quando os representantes da acusação ou da defesa expressamente declararem que não prescindem dele, antes de se proceder ao interrogatório do réu.” b. O artigo 561 do CPP determina que “(…) Só pode recorrer-se da sentença final, se a acusação ou a defesa declararem antes do interrogatório do réu que não prescindem do recurso e o interpuserem logo em seguida à leitura da sentença.” c. O parágrafo único do artigo 651 do CPP que determina que “No processo sumário, o recurso da sentença final só pode interpor-se em seguida à sua leitura, nos termos do artigo 561. A obrigatoriedade legal da declaração expressa de não prescindir de recurso por parte da acusação (Ministério Público) ou da defesa antes do interrogatório do réu em sede de julgamento nos processos Sumário-Crime e Polícia Correccional é condição processual essencial para efeitos de admissibilidade de recurso e consequente reapreciação das sentenças proferidas nestes processos-crimes. Ora, não havendo essa declaração expressa, os factos relatados em julgamento sobre a produção de prova não são reduzidas a escrito, não havendo, portanto, nenhuma acta de julgamento. Nestes casos, cabe ao juiz memorizar ou tomar nota de tudo quanto é dito no julgamento e que achar relevante para fazer a sentença, sem ajuda e conhecimento sobre tais notas dos demais intervenientes no julgamento. No final, a sentença é proferida com a natureza de decisão transitada em julgado e irrecorrível, se não através da revisão extraordinária de sentença, ainda que a sentença seja injusta ou contrária à lei. Por isso, há espaço para o juiz ferir o princípio da veracidade deturpando o que foi dito no julgamento de relevante, uma vez ter certeza de que não haverá recurso que possa anular a sua decisão. O conteúdo das normas do CPP supra confere excessivo poder discricionário ao juiz para decidir sem rigor jurídico necessário, para além de que conflitua com o princípio constitucional da presunção da inocência e com a extensão do direito à defesa por via de recurso. O referido condicionalismo para efeitos de recurso está colocado de forma ardilosa e como se de uma “ratoeira” se tratasse. Ademais, sabendo que os magistrados se beneficiam dos emolumentos que advém duma condenação, facilmente os perversos ficam tentados a decidir pensando nas vantagens dos emolumentos, em prejuízo da salvaguarda dos direitos e liberdades fundamentais dos arguidos. Aliás, situações há em que, dependendo do interesse do juiz ou por incompetência, o mesmo condena os réus, sabendo que não há matéria para tal ou absolve os mesmos quando há elementos bastantes que evidenciam, indubitavelmente, que os réus em causa cometeram o crime de que são acusados. Neste contexto, os cidadãos e o Ministério Público têm sido vítimas de violação do direito à defesa e do direito de recorrer aos tribunais por via de recurso. O trabalho da defesa e da acusação para a descoberta da verdade material dos factos é significativamente ignorado e a garantia de realização de um julgamento justo também fica comprometida devido ao conteúdo das normas do CPP supra. Quando o julgamento é reduzido a escrito sob a forma de acta de julgamento, há espaço para esclarecimento conjunto de quaisquer dúvidas ou para chamar a atenção do tribunal para considerar aspectos que se afiguram importantes para uma decisão conscienciosa e justa. Importa notar que o processo Sumário-Crime é mais grave relativamente à limitação do direito de defesa e de recorrer aos tribunais através de recurso, na medida em que mesmo se a defesa ou a acusação declararem expressamente não prescindirem de recurso, se não interpuserem tal recurso logo de imediato após a leitura da sentença, também, perdem a possibilidade legal de recorrer para instância superior caso não concordem com a sentença. O que significa que o prazo para recorrer da sentença é logo após a leitura da mesma. Nos termos do nº 1 do artigo 62 da Constituição “O Estado garante o acesso dos cidadãos aos tribunais e garante aos arguidos o direito de defesa e o direito à assistência jurídica e patrocínio judiciário.” No mesmo sentido e em complementaridade com a garantia do direito à defesa, o artigo 70 da Constituição determina que “O cidadão tem o direito de recorrer aos tribunais contra os actos que violem os seus direitos e interesses reconhecidos pela constituição e pela lei.” Estas disposições constituem a garantia constitucional da extensão do direito à defesa e direito de acesso aos tribunais. II. Concluindo As normas do CPP em questão são inconstitucionais por contrariam os artigos 62 e 70 da Constituição, na medida em que limitam o exercício do direito fundamental à defesa e de acesso à justiça à margem da Constituição, sabendo que nos termos do nº 4 do artigo 2 da Constituição “as normas constitucionais prevalecem sobre todas as restantes normas do ordenamento jurídico.” Não se deve, pois, desrespeitar a regra do processo penal como garantidora do direito constitucional de ampla defesa, até porque não se percebe o que se pretende salvaguardar com o conteúdo de tais normas do CPP. Advogado e defensor de direitos humanos*
1 . As recentes movimenta- ções de sociedades de capitais angolanos em empresas de media em Portugal são interpretadas no sector como um reposicionamento dos interesses que as mesmas representam, ligados em última instância ao regime do MPLA, no sentido de ajustar o esforço financeiro necessário ao atual momento de constrangimentos financeiros em Angola. O anúncio da saída de António Mosquito da Global Media, responsável pela publicação de títulos históricos como o Diário de Notí- cias, Jornal de Notícias e ainda pela rádio TSF, é vista sobretudo como correspondendo aos interesses reputacionais do próprio. O grupo de media tem vindo a proceder a despedimentos, apesar de a entrada de Mosquito, no início de 2014 por mais de 10 milhões de euros, ter sido anunciada como uma solução que assegurava a liquidez e viabilidade das operações. A solução então encontrada permitiu aos dois maiores bancos credores (Millennium Bcp e Novo Banco) limparem o seu passivo, trocando dívida por participações diretas na sociedade. O até então dono da sociedade a 100 por cento, Joaquim Oliveira, reduziu a sua participação para 27,5 por cento, tal como Mosquito. Os problemas da Global Media têm tido grande visibilidade em Portugal, sendo os accionistas, e Mosquito em particular, frequentemente visados em manifestações. É admitida a necessidade de novos cortes e/ou despedimentos no futuro próximo. Reposicionamento angolano nos media em Portugal* 2. O GAM (Grupo António Mosquito) é considerado “intermediário” (AM 823) de interesses de Isabel dos Santos nos negócios da comunicação social em Portugal. Em privado, António Mosquito terá, mesmo antes de se concretizarem os investimentos na Global Media e também na construtora Soares da Costa, manifestado desconforto com a posição que teria sido compelido a assumir. Após contactos na Presidência, em Nov., Mosquito terá conseguido negociar uma saída a breve trecho dos media e da construção em Portugal, que considerava estarem a trazer- -lhe danos reputacionais, pela imputação a si mesmo das consequências (prejuízos, despedimentos) das crescentes dificuldades. Anunciou posteriormente a renúncia à presidência da Soares da Costa, a par da intenção de sair do capital da construtora, onde detém 66,7 por cento, após um investimento de 70 milhões de euros feito em 2014. Oficialmente, atribui a decisão a uma reorientação estratégica do grupo para os negócios em Angola. A decisão de sair da Global Media terá sido posteriormente comunicada ao presidente não-executivo do grupo, Daniel Proença de Carvalho, que pediu ao empresário para aguardar até final de fevereiro, enquanto se encontrava uma solução para a manter a estrutura acionista. Em meios dos media, é admitida como solução mais provável a venda a outro empresário angolano da participação na sociedade veículo detentora da participação na Global Media. Mais remota é vista a possibilidade de alguma das empresas participadas por Isabel dos Santos, como a operadora de telecomunicações Nos, vir a adquirir a mesma participação. 3. O desinvestimento do grupo Madaleno nos jornais Sol e I é interpretado também como conjuntural. Oficialmente, o grupo saiu do capital dos dois jornais, o que obrigou a emagrecer fortemente a estrutura, com o despedimento de 120 trabalhadores e renegociação dos salários dos restantes. A decisão foi abrupta, até porque alguns meses antes os jornais estavam “no mercado” a avaliar a contração de jornalistas. Os títulos continuam a ser publicados, agora sob responsabilidade de uma empresa criada pelo ex-administrador Mário Ramires. Segundo observam fontes do sector, a continuação da publicação e o pagamento das indemnizações negociadas exigem um esforço financeiro só possível com o apoio dos anteriores accionistas, que assim poderiam manter a sua influência nos títulos, mas agora com um menor esforço financeiro e exposição. O Grupo Madaleno é geralmente considerado testa-de-ferro, no país e no estrangeiro, de interesses de altos sectores do regime e da elite política no mundo mediático (AM 980). É controlado por Álvaro Sobrinho, e tem a maior parte das chamadas publicações privadas – Novo Jornal, Expansão e Sol, além do Agora, cuja publicação foi recentemente suspensa após um editorial considerado “irreverente”. 4. Em negociação continua a entrada de Domingos Vunge no grupo Económico. O negócio foi dado como fechado em nov., mas terá sido dificultado, já nas últimas fases, pela penhora fiscal dos activos do grupo, por incumprimento de dívidas. O grupo vendedor, Ongoing, aceitou inclusivamente assumir o passivo dos meios de comunicação social. Internamente, o mês de fevereiro é visto agora como limite para ser encontrada uma solução para viabilizar os meios e continuação da sua publicação. Os activos da empresa estão avaliados em cerca de 40 milhões de euros, incluindo a televisão (Económico TV), vista como o meio que mais interesse desperta ao investidor angolano. A penhora terá dificultado uma solução, mas mantém-se, o interesse de D Vunge e as negocia- ções com a Haitong (ex-BESI). A contraparte inclui também o Novo Banco (ex-BES), credor de 400 milhões de euros em dívidas da Ongoing, parte das quais têm como colateral os activos do Económico. Uma solução terá sempre de ser aceite pelo Banco de Portugal e pelo Fundo de Resolução, que mantêm controlo do banco. 5. Desconhecido em Portugal, D. Vunge é considerado próximo de duas das mais importantes figuras da Presidência da República: Aldemiro da Conceição, diretor do Gabinete de Quadros, e Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, chefe da Casa Militarv. É visto como um “ponta de lança do sistema”. Em Luanda, está ligado a vários negócios, que incluem as lojas Descontão. Nos media, esteve na Score Media, que publicou o Expansão, antes de o jornal passar a ser controlado pelo grupo Madaleno. Mais tarde, assumiu-se como investidor da Revista Rumos e do jornal Mercado, através da empresa MédiaRumos, com instalações no bairro de Alvalade. Um dos principais revezes nas negociações com a Haitong terá acontecido quando D Vunge se fez representar pela advogada Ana Bruno, representante legal de Álvaro Sobrinho. O facto causou surpresa e desagrado nas equipas negociais portuguesas, que integravam equipas ligadas ao antigo BES, que manteve conflito aberto com Sobrinho (AM 876, 808, 876). 6. A entrada dos interesses angolanos nos media em Portugal é geralmente considerada no regime do MPLA como tendo falhado, a nível financeiro e também de influência política. A situação terá sido internamente comentada pelo presidente da República, questionando o facto de o esperado benefício “de imagem” não ter surgido. A situação foi vista como um “cartão” a Manuel Vicente, defensor da estratégia seguida e apoiante de Carlos Silva, que através da banca garantiu a concretização das principais operações. Dos contactos sa- íram instruções no sentido de “apanhar os cacos” dos investimentos e de dar uma “nova dinâmica” aos investimentos nos media. Mário António foi recentemente enviado a Portugal, com uma equipa que coordena, para fazer um levantamento da situação das diversas operações e propor uma nova estratégia. As “arrumações” em curso deverão deixar de fora A Mosquito, o grupo Madaleno e C Silva. *áfricamonitor intelligence, edição 995 Moçambique entrou num período de crise financeira, com uma moeda em desvalorização rápida, um défice da balança corrente e uma escassez de reservas cambiais. De facto, o banco central já alertou o sector privado e a economia como um todo da sua incapacidade de intervenção para estabilizar os mercados, basicamente avisando os consumidores de estar preparados para tempos difíceis. É invulgar encontrar um país em desenvolvimento apoiado por doadores, que se vê confrontado com a necessidade de implementar medidas de austeridade. As razões são bem conhecidas. Todas as soluções, incluindo o aumento das taxas de juro, a reestruturação do mercado cambial, a revisão do orçamento para 2016 em baixa, e a redução de subsídios, estão em discussão. Contudo, cada crise também oferece uma oportunidade. Todas as soluções descritas acima serão importantes. Ao mesmo tempo, o Governo precisa de aumentar a confiança no seio das pessoas, dos investidores e nos parceiros de deTornar uma crise numa oportunidade Por Otis Holloway* senvolvimento. A confiança de que Moçambique está disposto a implementar ou aprofundar as reformas e continuar a ser um bom destino para o investimento, contribuirá em larga medida para acalmar os receios sobre a economia e a gestão das finanças públicas e talvez iniciar a inverter a situação actual. O Plano Quinquenal do Governo já indica que um objectivo importante é melhorar a classificação do País nos indicadores de Doing Business (Fazer Negócios) do Banco Mundial, promovendo um ambiente empresarial atraente para investidores nacionais bem como estrangeiros. A situação actual não apoia esta intenção, uma vez que Moçambique desceu 5 lugares em relação aos seus pares na classificação para 2016. A implementação de reformas, que irão fortemente apoiar o ambiente empresarial do País, iria contribuir muito para recuperar a economia. Neste ponto, se o Governo der um sinal da sua intenção de proceder a grandes reformas no sentido de melhorar o clima de investimento, isto iria provavelmente apaziguar os receios dos investidores, bem como restaurar a confiança dos cidadãos no Governo. Há uma série de reformas que poderão ser introduzidas rapidamente e facilmente e que poderão ter grande impacto. Algumas delas terão baixo ou nenhum custo para o Governo e outras irão mesmo dar origem ao aumento das suas receitas. Algumas das nossas propostas são as seguintes: Garantir a aplicação uniforme da lei – todos os indivíduos e empresas são afectados negativamente pela forma como muitas leis são aplicadas (por exemplo, em relação à terra, o emprego de cidadãos nacionais e estrangeiros, a constituição e licenciamento de empresas, a importação e exportação). Os funcioná- rios da função pública muitas vezes elaboram as suas próprias interpretações do quadro legal e “aplicam” novos procedimentos e requisitos. Esta situação pode ser ultrapassada rapidamente, facilmente e a custo zero. Exige simplesmente vontade e liderança políticas – instruções directas dos membros superiores do Governo para o seu pessoal no sentido de começar a aplicar a lei como está escrita e deve ser aplicada. Aprovar o projecto de legislação que permite a participação pública no processo legislativo – esta legislação já existe e está pronta para ser discutida e promulgada. A sua aprovação irá enviar um sinal claro à sociedade civil e à comunidade internacional que o Governo está aberto ao diálogo e disposto a participar com a sociedade civil em prol do melhor futuro possível para o País. Aprovar a legislação sobre “cessão de exploração” que irá permitir as comunidades e singulares a envolver-se no “arrendamento” de terras, trazendo mais benefícios económicos das parcelas de terra subutilizas e basicamente permitir que a terra se torne um bem económico pelo qual os titulares de DUAT’s poderão proceder a cessões com um mínimo de intervenção ou discrição do Governo. Garantir que sejam dados passos para que Moçambique ratifique o Acordo de Facilitação do Comércio (AFC) de Bali, que inclui disposi- ções para acelerar o movimento, a autorização de saída e o desalfandegamento de mercadorias, incluindo as mercadorias em trânsito. O AFC também estabelece medidas para uma cooperação eficaz entre as alfândegas e as outras autoridades na facilitação do comércio e das questões em relação ao cumprimento das obrigações aduaneiras. Estas e outras medidas políticas e administrativas poderão constituir opções gratuitas para o Governo sublinhar o seu compromisso de melhorar o ambiente empresarial e de contribuir para o fomento dos investimentos essenciais que o País precisa. Como dissemos – nenhuma destas medidas tem custos adicionais. Todas elas irão aumentar significativamente a confiança no Governo e na economia. Reconhecemos que os tempos são difíceis e que a situação política é difícil. Contudo, a crise oferece uma oportunidade de mostrar forte liderança e empenho na reforma. As decisões tomadas agora terão impacto na economia durante muitos anos. Então, vamos juntos aproveitar esta oportunidade e agir decisivamente para implementar a legislação existente e as reformas-chave. *Speed

DESPORTO J á está decidido! Abel Luís da Silva Costa Xavier, mais conhecido como Abel Xavier, foi apresentado, esta semana, como novo seleccionador nacional de Moçambique, substituindo no cargo o croata Boris Pucic, que orientou o combinado nacional na eliminatória ao Mundial de 2018, frente ao Gabão. O luso-moçambicano, nascido em Nampula há 42 anos, chega ao comando dos “Mambas”, após vencer a concorrência do outro luso-moçambicano, Daúto Faquirá, que também era apontado ao mesmo cargo. Segundo o presidente da Federação Moçambicana de Futebol (FMF), Alberto Simango Júnior, dos vários nomes arrolados para comandar os destinos da nossa selecção, Abel Xavier é que reuniu mais consenso. “Depois de termos feito um trabalho de pesquisa e de análise dos vários curricula, dos diversos técnicos estrageiros e nacionais, chegamos à conclusão que Abel Xavier era a pessoa mais próxima daquilo que eram as nossas ideias (em termos de ambição, convicção, determinação e desejo). Por isso, chegamos ao acordo para ser treinador da selecção principal e sub- 23”, anunciou. O contrato de Abel Xavier tem dura- ção de dois anos (termina em 2018) e chega a Moçambique para ajudar a “melhorar a prestação da nossa selecção (ganhar mais e perder pouco); lutar pelos melhores resultados, assim como pelo bom futebol e que o nosso futebol ocupe o lugar que merece no concerto das nações”, segundo Alberto Simango Júnior. Se a duração do vínculo contratual foi revelada, o mesmo não acontece com os valores envolvidos na operação. “Prefiro omitir a parte dos números”, disse Simago, não avançando as razões dessa omissão. “Não entrei na primeira porta que me abriu”, Abel Xavier Enquanto se omite os números da operação, o que não se pode omitir é a experiência do técnico. Esta é a primeira aventura de Abel Xavier como seleccionador nacional. Na sua curta experiência de treinador (come- çou em 2013), Abel Xavier orientou o Olhanense da primeira divisão, no seu ano de estreia (de Junho a Outubro), durante oito jogos, tendo ganho dois. Seguiu-se o Farense e o Desportivo das Aves, todos da segunda divisão. Entretanto, isso não preocupa o novo seleccionador nacional. Abel Xavier diz que é preciso entender a sua experiência em vários modos. “Existe a jogada (como jogador tive treinadores de muita qualidade e também maus, mas aprendi com todos). Tive 20 anos dentro de espaço de selecção. Ao nível de metodologia de treino, conceito e aquilo que acho importante é o que vou fazer aqui” disse o técnico, antes de rematar: “não tenham dúvidas que eu não estou aqui no espírito de ter entrado na primeira porta que me abriu. É uma Agora é a vez de Abel Xavier Moçambique: o país da “iniciação”! -“A nossa lógica nunca foi trazer grandes treinadores, com curricula, mas de eles fazerem os seus curricula aqui”, Alberto Simango Júnior Por Abílio Maolela porta especial e constitui um desafio”. Não tendo a experiência de treinador, o de jogador também conta. Como jogador, Abel Xavier representou o Estrela da Amadora, Benfica, PSV Eindhoven, Everton, Liverpool, Galatasaray, Hannover e AS Roma. Em Novembro de 2005, foi apanhado nas malhas do doping, tendo sido suspenso por 12 meses. Regressou ao activo, em 2007, pelas mãos do Los Angeles Galaxy, onde jogou até 2009. Contestado antes da sua oficialização, o técnico diz que “neste momento, o mais importante é a selecção nacional, que é o fio condutor para o desenvolvimento do futebol moçambicano e eu vou querer contribuir nesse processo. Não é a minha história de vida, porque todos temos uma histó- ria para contar”. Na maior parte destes clubes, a rescisão do contrato não foi pacífica, mas o assinado com a FMF é para ir até ao fim. “Para haver saída, é preciso haver entradas. Porque a forma como se entra e como se quer fazer um projecto deve ser sustentado pelas pessoas, se não chega um momento em que tudo colide”, defende o técnico. O luso-moçambicano não é o primeiro técnico a chegar ao país sem experiência. A história vem desde a era de Feizal Sidat que, em 2007, foi buscar o holandês Mart Nooij que, até a data da sua contratação, era treinador dos sub-20 do Burquina Faso. Seguiu-se depois, em 2011, o alemão Gert Engels, que também a data da sua contratação, a sua história resumia-se a clubes sem expressão, no campeonato japonês. “A nossa lógica nunca foi trazer grandes treinadores, com curricula, mas de eles fazerem os seus curricula aqui”, disse Alberto Simango Júnior, no fim da apresentação de Abel Xavier. Entretanto... O novo seleccionador nacional agradece ao presidente da FMF pela confiança e afirma estar muito “orgulhoso por estar aqui e por termos, ao longo deste tempo, definido uma estratégia do que vai ser, a partir de hoje (segunda-feira), a estrutura, a organização e as questões que vamos trabalhar em conjunto para podermos ter uma selecção melhor, com valores modernizados e de qualidade para podermos disputar com qualquer adversário”. Xavier diz ter feito um levantamento da situação dos “Mambas” (comportamento nos últimos cinco jogos) e “não tenho dúvidas que temos matéria-prima, uma geração rica para podermos competir com qualquer equipa”. Para que isso seja possível, o antigo lateral esquerdo da selecção portuguesa aponta a mudança de mentalidade nos atletas e a união de todos os actores como sendo a solução para mudarmos o rumo do nosso futebol. “É preciso que os jogadores sintam o privilégio de estar na selecção nacional. Não é um lugar de passagem, mas de marcar”, defende. O técnico garante: “vamos preparar as coisas num contexto de bom senso, de coesão, união e faço apelo a todas as pessoas que gostam dos “Mambas” saibam o que a selecção significa. É o clube mais importante para mim e para todas as pessoas que estiverem na estrutura da selecção”. “Quero aproximar a relação com os clubes, seus treinadores e dirigentes para percebermos o trabalho que eles fazem, de modo a darmos continuidade na selecção nacional. Vamos redigir um documento com regras precisas, onde todos vão ter de assinar o compromisso”, frisa. Abel Xavier começa a trabalhar no dia 01 de Fevereiro e a sua estreia está marcada para 23 de Março diante do Gana, em jogo referente à terceira jornada das qualificações ao CAN- 2017, no Gabão. Com duas derrotas, Moçambique tem poucas possibilidades de chegar a esta competição, mas o novo técnico renova a esperança dos moçambicanos. “Nós temos de tirar a ideia de que não podemos competir, teoricamente, com outras selecções. Isso vai terminar. Não podemos olhar no papel e dizermos que não temos capacidade. Porque no campo e durante os 90 minutos, tudo é possível. É um trabalho de mentalidade que temos de fazer”, afirmou. Referir que Abel Xavier será coadjuvado pelo moçambicano Alcides Chambal e um técnico português por si indicado e ainda por revelar. “Não tenham dúvidas que eu não estou aqui no espírito de ter entrado na primeira SRUWDTXHPHDEULX eXPDSRUWDHVSHFLDOHFRQVWLWXLXPGHVDÀRµ $EHO;DYLHU Apresentado o novo seleccionador nacional, o SAVANA saiu à rua para colher a sensibilidade dos amantes da modalidade-rainha. A primeira grande reacção é do Ministro da Juventude e Desportos, Alberto Nkutumula, que antes mesmo da sua apresentação, já mandava recados. Nkutumula espera que o novo técnico dos “Mambas” “traga resultados” para se inverter o actual cenário do futebol moçambicano, marcado por resultados negativos. “O que esperamos é que se mude o estágio actual do nosso futebol. O nosso futebol não está nada bom. Não queremos apenas uma selec- ção. Queremos também um bom campeonato. Do treinador esperamos resultados. Acreditamos na boa-fé e bom senso da FMF ao escolher o seleccionador que escolheu”, disse em entrevista ao canal televisivo, STV. “Não havendo resultados, iremos exigir responsabilidades. Se não produzir, não vamos insistir em manter o treinador. Ele que venha com a clareza de que deve produ- “Que venha produzir resultados” -Diz Alberto Nkutumula zir resultados que é o que todo o povo moçambicano espera do nosso futebol”, acrescentou a fonte. “Não sei qual é o objectivo da sua contratação”, Tico-Tico Ao SAVANA, o antigo capitão dos “Mambas”, Tico-Tico, diz não entender o objectivo da contratação de Abel Xavier, pois para ele “serão dois anos em vão”, pois a selecção nacional já não disputa o acesso ao mundial e tem poucas hipóteses de chegar ao CAN-2017. “Se é para preparar a selecção para os próximos três anos, penso que estamos num bom caminho. Mas, se a ideia é nos qualificarmos ao CAN, como disse o treinador, penso que devemos ser realistas e assumirmos que já não é possível, pois perdemos dois jogos com os nossos adversários directos e temos dois jogos consecutivos com a melhor equipa do grupo”. Para o antigo goleador da selecção nacional, não interessa a experiência, assim como a nacionalidade do técnico, mas o mais importante é a “clareza naquilo que pretendemos com a equipa de todos nós”. “Há condições para ele triunfar”, João Chissano Quem se mostrou mais moderado é o antigo seleccionador nacional, João Chissano. Chissano congratula a FMF pela contratação de Abel Xavier, afirmando que se o escolheram é “porque reúne todas as condições que o novo elenco da FMF acha que deve reunir para comandar a selecção nacional”. Tendo passado pelo comando da selecção nacional, recentemente (foi demitido em Junho de 2015), João Chissano entende que há condições para o luso-moçambicano triunfar, porem “terá algumas dificuldades como nós os outros, porque a maior parte dos amantes do futebol exigem resultados, algo que será muito difí- cil”. Questionado se é o momento certo para a contratação de um estrangeiro, Chissano foi mais cauteloso, explicando que “é relativo”. “Há quem pode dizer que não é o momento e há quem vai dizer que é. Mas, o que digo é que a escolha foi feita com alguma razão e o que temos a fazer é apoiar o novo seleccionador nacional”, diz. “Temos de ter respeito por ele”, Mussá Osman Mussá Osman, outra figura incontornável do futebol moçambicano, considera Abel Xavier como uma boa aposta da FMF, porém admite não conhecer muito historial seu como treinador. “Como jogador, tenho muito respeito por ele, porque teve uma carreira brilhante, mas como treinador não tenho muito a dizer. Mas, há histórias de pessoas anó- nimas que triunfaram em clubes e selecções nacionais”, disse Osman. O antigo treinador do Ferroviário de Nampula afirma que é preciso que ser apoiado e respeitado por todos, por forma a que possa triunfar, pois “mesmo que haja competência, se não existir respeito e união, não haverá resultados”. Em relação ao facto de ser um treinador com a visão do futebol europeu, Osman prefere considerá-lo “moçambicano e espero que traga a experiência que bebeu nas terras lusas”. Abílio Maolela

CULTURA Por Luís Carlos Patraquim 79 S ó o sábio sabe o que vai passar- -se, dizia o poeta grego de Alexandria, Constantino Cavafis. Pode acrescentar-se os videntes, os cultores da prospectiva, os profetas, os feiticeiros, os gabinetes de estudo do FMI e do Banco Mundial, o Fórum de Davos e os polícias. Não se mencionam todos, o que não significa falta de respeito pelo seu árduo trabalho. Lembre-se o leitor dos Think Thanks, por exemplo, alguns bem pesados! Mas só os polícias se diferenciam porque são os únicos que usam farda. Limitam-se a saber o que lhes mandam. O resto são as ignoraçons, grandes e pequenas. O trabalho do polícia de giro é, a mais das vezes, aleatório. Excepto se instituir metas para o montante diário da gasosa, ele vai circulando sem saber quantos acidentes haverá, que assaltos acontecerão e onde, quem será o feliz contemplado com um sequestro. O tiroteio de esquina é fortuito e decorre do azar ou incompetência dos empreendedores de assaltos e outras actividades. Os cinzentinhos são gente simpática, se assim se pode dizer, excepto quando não sabem negociar porque a ganância os descontrola, obnubilando o bom senso que deve presidir à arte da colecta. Estas ignoraçons são até ternurentas, mesmo pitorescas, para usar adjectiva- ção cara aos naturalistas e folcloristas. As grandes ignoraçons é que são o mistério. Não se espera da polícia que tenha a omnipresença e a omnisciência divinas embora às vezes ela aja como o deus da criação. Esse controlo absoluto sobre a narrativa é mais para gente como Balzac ou Tolstoi ou Conan Doyle e Patricia Highstmih. O que fascina nas grandes ignoraçons é o repto que lançam à árdua tarefa de especular, interrogar, deduzir. Deixemos outras metodologias. Num brevíssimo excurso histórico, é óbvio que todos sabem que o massacre do dia de S. Valentim, na Chicago de 1927, foi executado por polícias fardados apesar de as más línguas dizerem que tinha a mão do bom do Scarface. As proezas do velho Al foram tão interessantes que seduziram o realizador Howard Hwaks. O filme foi protagonizado por Paul Muni, no papel de Tony Camonte, Al Capone, e Boris Karlof no de Gaffney. A contribuição de Al Capone para o léxico global é impressionante. Se hoje se fala em lavagem de dinheiro isso deve-se às lavandarias que o gangster espalhou pela cidade junto ao Lago Michigan, onde o álcool era rei. O Jazz deve-lhe também a evolução quando os músicos do dixieland de Nova Orleans se mudam para o Illinois. Caruso, a convite e bem pago, emocionou os melómanos na Ópera de Chicago, consolando todas as traviatas que pululavam nos bares do excepcional e pragmático empresário. As nossas grandes ignoraçons são pí- fias e pouco têm contribuído para o up grading cultural do país. Precisamos de empreendedores que sejam simultaneamente mecenas. Exigem actos e gentes que excitem o talento e propiciem o romance, a canção de gesta, o romanceiro popular, o cinema e todas as outras artes. É óbvio que nunca se deve perguntar a polícias fardados, os cinzentinhos, se executaram este ou aquele ataque surpresa, esta ou aquela emboscada, os vários assassinatos e execuções de encomenda. Seria estulto, porque a sua tarefa é a chateação quotidiana e o refresco. A evidência, na artimanha do Scarface, contribuiu para a sua desgraça. E, das instituições, respeitáveis de per si, espera-se o pudonor e o florilégio das ac- ções de bem. Onde se incluem as más, é bem de ver. Só a inépcia da grande ignoraçon nos deixa estupefactos. Como não sabem? A pergunta não é mal intencionada. Resta-nos a consolação da promessa proferida. Vão investigar. Felizes os que sabem deformar os espelhos! A Ignoraçons cidade de Maputo vai acolher nos dias 2 e 3 de Fevereiro corrente, pelo nono ano consecutivo, do Festival Marrabenta. O arranque desta festa musical está marcado para o dia 2 de Fevereiro, na Estação Central dos Caminhos de Ferro de Moçambique, na baixa da cidade, a partir das 13:00horas, seguido do tradicional Comboio Marrabenta com partida às 14:00horas rumo à Gwaza Muthini onde será apresentado um concerto gratuito na vila de Marracuene. “No Centro Cultural de Malalane, criado pelo artista plástico Malangatana, vamos realizar o concerto onde será gravado o segundo volume do disco Marrabenta acústico. Esse é um compromisso que procuramos realizar com vista a registar a performance dos artistas que têm tocado este género musical”, explica Litho Sithoe, organizador do festival. Nesta edição do Festival Marrabenta será homenageado o malogrado guitarrista Nanando, um dos artistas que num passado introduziu neste género musical uma abordagem contemporânea. “É uma honra para mim participar neste evento que nesta edição vai homenagear o guitarrista Nanando, que teve uma influência na abordagem neste ritmo. Ele conseguiu trazer inovações nesta música. Mostrou que a Marrabenta podia ser apresentada com outras abordagens. Ele tornou- -se numa referência em termos de nova abordagem neste estilo musical. Para mim serviu de uma fonte de inspiração para a execução das minhas composições. Sempre levo o seu aprendizado em tudo o que faço na música”, afirma o músico Jimmy Dludlu. O Festival de Marrabenta conta com a participação da Orquestra Djambo, Dilon Djindji, Stewart Sukuma e Banda Nkuvu, Gabriel Chiau, Alberto Mutcheka, Xidiminguana, Marrabenta homenageia Nanando Conjunto os Galtones entre outros convidados. Juntam-se ainda os jovens da Team Sabawana e República do Panza representando a nova vaga da música popular nacional. “Neste evento vamos apresentar as músicas que serão integradas no novo disco que o grupo os Galtones vai gravar no próximo ano para comemorar os 30 anos do grupo. Estamos a trabalhar nisso há bastante tempo. No próximo ano vamos lançar o disco para comemorar essa efeméride”, conta Ximanganine, integrante dos Galtones. Celebrando nove anos de existência, a direcção do Festival Marrabenta compreende que tem estado a contribuir para a preservação deste género musical enquanto um rítmo presente em diversos momentos da história de Moçambique. Aliás, o Festival Marrabenta tem despertado a consciência de vários segmentos da sociedade (singulares e instituições) sobre a capitalização do poder da Marrabenta na mobilização popular, bem como na promoção da cidadania. “O evento já mostrou que é uma referência em termos de programa cultural aqui na capital do país. E comemorar o nono ano mostra que o programa veio para ficar e que tem mobilizado várias camadas da sociedade. O público tem participado neste evento de uma forma surpreendente. Sentem que o Festival Marrabenta é um evento que promove de alguma forma a questão da promoção da cidadania, auto-estima e outros valores da nossa sociedade”, enaltece Litho Sithoe. O Festival Marrabenta é uma plataforma de arte e cultura Moçambicana que usa como nú- cleo principal a extraordinária extensão e rami- ficações do que é a Marrabenta, esta é entendida como “o concentrado de nós mesmos, sua música, dança, as vidas dos artistas e do público que dela respira”, disse uma vez o malogrado artista plástico Malangatana, em 2007. A.S O fotojornalista Naíta Ussene vai apresentar a exposição fotográfica sobre a pesca artesanal em Moçambique, intitulada “Mãos de mar, Barcos de Vida”, de 29 de Janeiro a 7 de Fevereiro, no edifício da Câmara Municipal de Quelimane, na Zambézia. “A mostra vai coincidir com o período de carnaval que sempre decorre em Quelimane. É uma oportunidade para mostrar aos residentes de Quelimane sobre a pesca artesanal no país e também aos turistas que vão participar no carnaval, que tem sido um evento de referência cultural de Quelimane”, explica Naíta Ussene. Mostra de pesca artesanal em Quelimane Ascensão Pinto escreve sobre o contexto das fotografias de Naíta Ussene que “nas suas fotografias sobre a pesca artesanal revela uma forte relação com actividade económica normalmente praticada localmente ao longo da costa de Moçambique, bem como em zonas costeiras de massas de água do interior do país. As fotografias de Naíta expressam uma combinação de pesca de subsistência e pesca artesanal, ambas vulgarmente conhecidas de pesca artesanal. A referida pesca é exercida com ou sem embarcação e com artes de pesca artesanais elementares, constituindo uma actividade secundária para quem pratica. A produção tem como finalidade consumo próprio e é vendida esporadicamente”. Noutro desenvolvimento, escreve que “na óptica de alguns leitores as fotografias de Naíta constituem uma contribuição didáctica para os mais jovens, porque com elas conhecerão a silhueta das características da pesca artesanal em Moçambique. Através delas encontrarão as lições importantes, como por exemplo materiais que garantem as boas práticas de pesca e materiais que relevam práticas incorrectas. Estas noções são importantes para renovar o conhecimento dos praticantes da pesca artesanal”. Por sua vez, Calane da Silva escreve que “este homem, este ser humano, herdeiro genético de artistas e pessoas de outros ofícios obreiros do sultanato de Angoche, hoje já maduro e experimentado dedo clicador do mundo- -natureza que lhe rodeia, resolveu desta vez brindar-nos com o seu mar, um mar-praia de redes e barcos, de peixes e pescadores. E, consciente da dimensão litorânea do país, não se ficou por Angoche e trouxe para esta exposição esse mundo de brisa e sal de outras zonas de Moçambique, incluindo Beira e Maputo”.

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