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Por Max Altman – de São Paulo
O representante do Brasil no FMI, Otaviano Canuto, descartou em reunião da instituição em Lima, no começo deste mês, a possibilidade de o Brasil adotar políticas econômicas “populistas”: “Há perfeita consciência do governo e da maior parte da oposição de que resvalar para políticas inconsequentes não é bom para ninguém”, disse.
Em entrevista ao (diário conservador paulistano) Estado de S. Paulo, ele afirmou que o Brasil não vai virar uma Argentina: “A Argentina teve uma profunda crise, derivada do desmonte de um regime extremamente rígido, que foi o currency board (paridade cambial da moeda local, o peso, com o dólar), que desaguou em uma crise política, para a qual a resposta de política econômica foi populista”.
O termo populismo é utilizado pejorativamente pelos economistas e políticos defensores do liberalismo e do neoliberalismo para designar um conjunto de práticas políticas que consiste no estabelecimento de uma relação direta entre as massas e o líder carismático para se obter apoio popular. Assim, o “povo”, como categoria abstrata, é colocado no centro da ação política, independentemente dos canais próprios da democracia representativa. Historicamente, o termo populismo tornou-se uma força importante na América Latina, principalmente a partir de 1930, estando associado à industrialização, à urbanização e à dissolução das estruturas políticas oligárquicas, que concentravam firmemente o poder político na mão de aristocracias rurais. Daí a gênese do populismo, no Brasil, estar ligada à Revolução de 1930, que derrubou a República Velha oligárquica, colocando no poder Getúlio Vargas.
Ernesto Laclau, argentino, recentemente falecido (2014), com Doutorado em História em Oxford, onde chegou sob orientação de Eric Hobsbawn, escreveu, em defesa aberta do populismo, que “quando as massas populares que estavam excluídas se incorporam à arena política, aparecem formas de liderança que não são ortodoxas do ponto de vista liberal-democrático, como o populismo. Porém o populismo, longe de ser um obstáculo, garante a democracia, evitando que esta se converta em mera administração”.
Na boca dos setores conservadores e oligárquicos, populismo passou a ser um xingamento, um verdadeiro palavrão. A crítica clássica ao populismo está muito ligada a uma concepção tecnocrática do poder segundo a qual só os especialistas devem determinar as fórmulas que vão organizar a vida da sociedade. “Ponhamos o exemplo da Venezuela. Ali havia massas políticas virgens que nunca haviam participado do sistema político, exceto por meio de formas de extorsão de caráter clientelístico. Então, no momento em que essas massas se lançam à arena histórica, o fazem mediante a identificação com certo líder, e esse é uma liderança democrática porque, sem essa forma de identificação com o líder, essas massas não estariam participando dentro do sistema político e o sistema político estaria em mãos de elites que substituiriam a vontade popular”.
Nos últimos 15 anos, pela primeira vez na história da América Latina, as aspirações nacionais de soberania e independência e as aspirações populares das camadas mais pobres coincidiram com o fortalecimento dos direitos humanos, a divisão dos poderes, o pluralismo político e a democracia participativa e não apenas representativa.
Na Argentina, objeto do ataque do tecnocrata Canuto, o peronismo representou um enorme desenvolvimento na participação das massas, em especial do movimento operário, no sistema político. Muitos criticam que poderia se revestir de formas mais democráticas, contudo foi a que historicamente se mostrou possível.
Ainda segundo Ernesto Laclau “qualquer elaboração de uma política mais progressista teria de partir deste fenômeno histórico – o peronismo – posto que o leito histórico aberto em 1945 é um dado absolutamente primordial e definitivamente positivo na história argentina. O regime oligárquico que existia antes, certamente não era melhor”.
A Argentina, sob a liderança de Nestor Kirchner e depois de Cristina Kirchner mostrou uma capacidade de governabilidade excepcional. Superou uma crise econômica de primeira grandeza, talvez a mais grave do mundo, adotou uma atitude crítica ante o FMI que produziu uma série de efeitos positivos, malgrado as agências de risco terem reduzido suas notas a zero, e tem um sistema econômico em boa medida controlado, com taxas razoáveis de crescimento do PIB, não obstante uma inflação relativamente alta e de reservas financeiras extremamente baixas.
Debaixo de um tiroteio permanente dos opositores e da grande mídia local, manteve e ampliou os programas sociais, e sua chapa às eleições presidenciais – Daniel Scioli e Carlos Zannini – vai ganhar as eleições presidenciais do próximo 25 de outubro, já no primeiro turno. Apesar da imensa torcida contra do Estadão, da Folha, do Globo…
Max Altman é jornalista, diretor e editor da revista Samuel.
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