Hoje quero falar dos meus fatídicos momentos passados nas celas do Comando da PRM durante 18 meses
“Estamos em 1975. Nós, os brancos, vamos embora desta terra. Entregamos a terra aos pretos, mas vai chegar um dia que esses mesmos pretos se vão matar entre si; ou fazer sofrer outros pretos seus semelhantes por causa da ambição e ganância…”, disse um branco, português, ao meu pai em 1975.
É um facto inequívoco de que em Moçambique os que ocupam cargos de chefia gostam de espezinhar aos subalternos, esquecendo-se de que têm a mesma cor da pele. Há alguns dias postei uma matéria no meu facebook em que falava do antigo director da PIC da cidade de Maputo, Dias Balate. Dias Balate fez me passar por momentos deploráveis nas celas do Comando da PRM.
Hoje, neste post, trago algumas fotos que clarificam o ambiente das celas do Comando. Foram tiradas por um polícia, à minha solicitação. Nalgumas fotos poderão ver a brutalidade de um ser humano em querer fazer mal ao seu semelhante, propositadamente. Depois de tantos anos, venho dar razão ao que disse aquele branco português ao despedir-se do meu pai em 1975.
Soube que Dias Balate deixou, finalmente, de ser um vira-latas. Ele é chefe de guardas da EDM e Águas de Maputo. É a velha máxima de que “Deus não deixa ninguém morrer a fome. Até às formigas Deus lhes dá abrigo.” O mundo dá voltas. Depois de director da PIC, Dias Balate chutou latas por longos três anos e finalmente arranjou um empregozinho de guarda.
Se hoje Dias Balate é um simples chefe de guardas é porque está a pagar pelo que fez. As próprias chefias do Ministério do Interior sabem que ele está envolvido nos raptos. É por isso que depois da sua exoneração do cargo de director da PIC da cidade de Maputo não lhe deram outra afectação. Deixaram-lhe a soçobrar de fome, a chutar latas, até se virar sozinho. É a paga por ter promovido tanta brutalidade gratuita. Fiquei 18 meses nas celas do Comando sem saber se era dia ou noite. A única ocasião que podíamos adivinhar a hora era quando recebíamos a comida de casa. Mesmo assim, ouve quase 50 raptos nas cidades de Maputo e Matola. E eu que se alegava que era promotor dos raptos estava incomunicável.
Complementado o post anterior em que falava de Dias Balate, ele, porque estava comprometido com algumas gangues de raptores e, por outro lado, porque tinha poderes de elaborar mandados de captura em virtude de ser director da PIC, fê-lo contra os meus motoristas, cozinheiros e amigos.
Num determinado sábado, cuja data já não me ocorre, uma das minhas irmãs estava em casa dos meus pais de visita ao meu pai que estava num estado de saúde degradante devido ao câncer que lhe apoquentava. Nesse mesmo sábado, Dias Balate mandou um contingente policial à casa da minha irmã para prendê-la. Obviamente, não a encontraram.
Dias Balate elaborou um outro plano. Mandou o agente da PIC, de nome Raul, para que ligasse à essa minha irmã para informar que Nini havia perdido a vida nas celas do Comando e solicitava-se a presença dela para poder identificar o corpo e facilitar para que seja levado à morgue do Hospital Central de Maputo.
Imaginem, meus amigos, a confusão que se instalou. Obviamente que a minha família entrou em pânico. O meu pai na fase terminal da sua doença tendo as minhas irmãs à sua volta e logo recebem uma informação triste dessa. A minha família sequer duvidou da informação. A minha mãe, traumatizada que estava, não teve coragem de ser ela a ir fazer a identificação do corpo.
à informação coreu logo pra familia e ja vinham sentar pra darem sentimentos.
a minha mãe Pediu a uma das minhas irmãs para que fosse ao Comando. Só que quando ela chega lá é detida.
Depois de a interrogarem, soltaram-na porque não era a pessoa que eles precisavam. De imediato ela ligou à casa do meu pai e informou de que a notícia do falecimento de Nini era tudo uma mentira. Foi um alívio para a família. Por conta da doença, o meu pai nos seus dias finais já não falava e nem se mexia, contudo, percebia tudo à sua volta. Já podem imaginar como é que ele ficou. Consumido pela doença e ouve a falsa notícia da morte do seu filho.
E Dias Balate não desanimou. Dois dias depois, ele e o tal do agente Raul localizaram a minha irmã e prenderam-na. Depois disso apareceu em grandes parangonas na televisão dizendo que a irmã de Nini havia sido presa em conexão com os raptos. Só que no processo dela vinha alguma coisa relacionada com cheques.
Cinco dias depois, quando foi presente ao tribunal, a juíza da causa ficou estupefacta e disse: “Na imprensa vi que a senhora havia sido presa por causa de raptos. Mas no seu processo não há nada disso. Fala-se de cheques. A PIC ainda não se cansou de brincar com a vida das pessoas”. Colocou a minha irmã em liberdade de imediato porque esse processo elaborado por cima do joelho estava mal inquirido. Não foi só ela: todos os que Dias Balate mandou prender foram postos em liberdade pelo competente tribunal.
Na mesma semana, o ex-Procurador-Geral da República, Augusto Raul Paulino, fez uma visita à PIC da cidade de Maputo. Ele fazia-se acompanhar por alguns procuradores e jornalistas. Dias Balate deu uma breve entrevista ao jornal “notícias” e fez um “show off” e falou mentiras dizendo que havia muita gente presa em conexão com os raptos.
e ele nem devia falar ao jornal
existe porta vozes
Na verdade não havia ninguém preso por esse crime. Mentiu o homem que antes foi director da PIC, deu guarita às gangues de Bernardo Timana e hoje é chefe de guardas.
Durante os vários meses que fiquei preso nas celas do Comando em nenhuma ocasião fui ouvido para que me clarificassem das reais razões que estiveram por de trás da minha transferência da BO. Não fui a única pessoa a ser transferida, levaram também o meu irmão Ayob. Como podem ver, Dias Balate promoveu uma autêntica tortura no Comando. Vivíamos em condições desumanas. E não foi só a mim que ele agrediu psicologicamente, no Comando havia cerca de 40 reclusos detidos por diversos crimes.
Eu, Nini Satar, ocupava uma cela minúscula de qualquer coisa como 3, 5 metros quadrados. Havia reclusos que dormiam na mesma cela em número de seis a sete. Se observarem bem a foto aqui postada irão verificar que nessas celas tudo fazia-se no mesmo lugar. Era ali onde se tomava banho, fazia-se as necessidades maiores e menores, almoçava-se, jantava-se. As celas do Comando nem redes mosquiteiras tinham.
A foto do post mais abaixo foi tirada depois da visita de José Abudo, o provedor da Justiça. Depois disso, nós, os presos, já usufruíamos de algum luxo. Éramos “FIVE STAR”. Dormíamos nos colchões e não no cimento nu e cru onde estávamos anteriormente. Era uma pequena lufada de ar fresco.
Importa dizer que os meus pais tiveram oito filhos. Dentre eles, os únicos corajosos são o meu falecido irmão Ayob e eu Nini satar
Ayob, quando visse que estava com baixo astral dizia algumas palavras de encorajamento. Recordo-me dele dizendo: “Não há mal que dura para sempre. Essa gente que faz isto connosco hoje, um dia será castigada”.
Durante meses não via meu irmão estavamos vedados de vermos
enquanto a parede que separavamos não pasavam de 3 metros
durante anoite conversavamos por baixo da porta
uma tinha que repiter varias vezes as palavras por causa do Eco
Dias Balate e a sua equipa de investigadores composta pelo agente Raul, Inspectora Beatriz, os agentes Pires, Nabingo e Judite não fizeram nada para acabar com os raptos. A sua equipa era manietada por Dias Balate. Alguns me vão dar razão quando digo que a nossa sociedade, a moçambicana, deixa-se levar facilmente por mentiras. O jornal oficial, o “notícias”, para muitos não mente. Mas digo, sem reservas, que é o jornal que mais mentiras veicula.
Há um episódio que gostava de compartilhar convosco. Certo dia, à hora do almoço, recebi da comida vinda de casa dois iogurtes no lugar de um que era habitual. Eram iogurtes da marca danon. Quando abri um dos iogurtes, vi que dentro daquele recipiente havia uma bolinha plástica. Dentro dela estava uma carta que dizia: “Nós estamos bem. Não se preocupem connosco. A única preocupação nossa são vocês. O nosso pai está muito doente e está de baixa no hospital. Mando este pedaço de lápis e uma folha para poderes responder a minha carta. Responda e meta na bainha das tuas calças de treino e iremos receber. Para termos a certeza de que recebeste esta carta, mande a resposta com o nome da nossa avó materna e esse será o código”.
Aquele pedaço em forma de carta que recebi deixou-me com um misto de alegria e tristeza. Alegria porque havia encontrado, enfim, formas de receber notícias da minha família. Tristeza porque percebi que o câncer estava a dar cabo da saúde do meu pai. Durante uma semana troquei correspondência com a minha família via iogurte e eu respondendo e enfiando a resposta na bainha das calças.
A minha alegria durou pouco. Um dia desses fui descoberto tudo porque a comida demorou chegar devido a burocracia do próprio Comando. Nesse momento, o recipiente de iogurte que continha a carta descolou aquele papel prateado devido ao sol intenso que fazia nesse dia. Nisso, os polícias ali afectos viram alguma coisa estranha dentro do iogurte. Comunicaram logo à PIC. E porque fica dali do lado do próprio Comando nem demoraram três minutos para chegarem.
Eu estava a tomar banho quando ouvi a porta da minha cela a ser aberta estrondosamente por agentes da PIC. Pedi, por favor, para que me deixassem apenas amarar a toalha. “Chega aqui”, disse um dos agentes da PIC, gritando e com o iogurte na mão. “Isto é seu?”, questionou. “Ainda não é meu”, respondi. Com cara de poucos amigos, o agente da PIC ordenou: “Leia o que está ai escrito. Isto foi encontrado dentro do iogurte.”
Eu, ainda com o corpo todo ensaboado e semi-nu, li a carta em voz alta: “Nós estamos bem. Só a situação do velho é que não é das melhores. Os médicos dizem que ele tem de ser operado ao pulmão com urgência. Queremos o vosso aval, de ti e do Ayob. Responda-me na bainha amanhã”. Quando terminei de ler a carta fiquei todo preocupado. Como haveria de responder porque havia sido descoberto?
Como castigo, o director da PIC mandou para que fosse trancafiado numa cela disciplinar. Era um lugar minúsculo, sem luz e dormia encima de jornais ali jogados ao acaso. Fiquei 24 horas trancafiado na escuridão. Por algumas horas até pensei que havia perdido a visão. Em suma, depois de Dias Balate ter sido desmontado como director da PIC, fui ouvidos por alguns agentes para dar esclarecimentos em torno dos raptos. Nessa altura o director da PIC era Januário Cumbana.
Depois de me terem ouvido, a PIC elaborou um relatório final em que o meu nome não constava no rol dos acusados. Ademais, o inspector da PIC, na sua fundamentação, disse que “de todas as investigações feitas pela Polícia de Investigação Criminal não encontramos nenhum elemento que prova o envolvimento de Nini Satar nos raptos ”.
Não obstante ter se produzido esse relatório, o mesmo foi distribuído à Procuradoria e também chegou às mãos do Procurador Marcelino Vilanculos. Numa conversa que ele teve com meus advogados disse o seguinte: “Como sabem, nós na Procuradoria não somos autónomos. Somos teleguiados pelos nossos superiores hierárquicos. Por isso tenho que fazer uma acusação contra o Nini mesmo sem provas. São ordens superiores do próprio Paulino. Caso não o acuse, serei mando para Chicualacuala ou qualquer outro distrito recôndito. Me perdoem mas é a realidade”.
“Filho de uma égua” desse Procurador Marcelino Vilanculos. Quer dizer para tirar benefício de uma determinada situação até é capaz de acusar alguém mesmo sem provas. Deduziu a tal acusação e assinou-a. Talvez por peso de consciência, entregou o mesmo processo a uma outra Procuradora de nome Ana Sheila Marrengula (uma cobra cuspideira). Trata-se de uma senhora quem nem sabe nada sobre leis- brevemente falarei dela.
Fomos à instrução contraditória no tribunal e provei que 1+1=2, 2+2=4 e não 24. O tribunal não encontrou nenhum indicio de que eu estava envolvido nos raptos. Provei documentalmente que até 2006 tinha investimentos que ascendiam a 150 milhões de dólares. Os raptos começaram em 2011. Eu nunca iria precisar de raptar alguém para ganhar 100, 200 ou 300 mil dólares enquanto tenho investimentos de milhões de dólares fora do país. Fui claro para a Procuradoria e o tribunal que se quisessem saber da origem do meu dinheiro seria um outro processo que não tem nada a ver com os raptos.
Também provei que graças a minha colaboração com a polícia havia muitos raptores presos. Eu é que comprei as informações sobre os raptores com o meu dinheiro e dei-as gratuitamente à Polícia. O competente tribunal exarou um despacho de não pronúncia contra mim. Nunca fui julgado em nenhum processo relacionado com os raptos. Existem sim pessoas invejosas, mal intencionadas que tentam relacionar o meu nome com os raptos.
Brevemente voltarei a este assunto. Para finalizar, quero deixar bem claro que não tenho nenhuma inimizade com Dias Balate. Ambos somos servos de Deus. Está claro nas escrituras sagradas da Bíblia e do Alcorão que o mal que fazemos ao outro um dia teremos de pagar. Dias Balate está a pagar pelo que fez. Chutou latas durante três anos e hoje é chefe de guardas na EDM e Águas de Maputo.
..... alguns trechos deste texto tirei do livro que tou escrever.....
Nini Satar
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