terça-feira, 13 de outubro de 2015

Coligação e PS não avançaram “rigorosamente nada”


Costa destacou "lacunas graves" no documento facilitador da coligação. Passos aguarda uma "contra-proposta do PS" mas tem dúvidas sobre a existência de "vontade política" dos socialistas.
A segunda reunião entre a coligação PSD/CDS e o PS terminou num clima de impasse. O secretário-geral socialista António Costa reiterou estar a trabalhar, com o PCP e com o BE, num governo alternativo e considerou a proposta da direita “insuficiente”. A reposição salarial na função pública mais rápida, a descida do IVA na Restauração e a redução das taxas moderadoras foram algumas das exigências colocadas em cima da mesa. Passos Coelho mostrou dúvidas de que haja vontade política por parte do líder do PS para conseguir uma solução de governabilidade, mas vai aguardar pela contra-proposta que – sublinhou – tem de ser compatível com as regras europeias.
No final de duas horas e um quarto de encontro entre os representantes da coligação Portugal à Frente (PaF) e do PS, Passos Coelho afirmou que não se tinha “avançado rigorosamente nada” desde a primeira reunião e depois de ser colocado em cima da mesa um documento com mais de 23 propostas escolhidas entre o programa eleitoral socialista.
Momentos depois, em declarações aos jornalistas, António Costa clarificava alguns dos “17 ou 18” exemplos que o levaram a considerar a proposta “insuficiente”: a inexistência de uma política de combate ao desemprego e à precariedade, combate à pobreza infantil, a reestruturação dos escalões do IRS para aliviar a carga fiscal, a reposição dos cortes dos salários na função pública, a redução do IVA na restauração, a redução das taxas moderadoras e a aposta na educação de adultos. “Medidas indispensáveis e que não encontraram eco na coligação”, afirmou o líder socialista, reiterando a ideia da existência de um “novo quadro parlamentar” em que PSD e CDS não têm maioria absoluta.
Questionado sobre a hipótese de haver um Executivo PSD/CDS sem o apoio do PS, António Costa reiterou que o PS não é um partido de “obstrução” e que não vai suportar uma moção de rejeição ao programa de Governo sem haver uma alternativa.
“Temos trabalhado para que esse governo alternativo seja possível e possa existir”, disse, numa alusão às reuniões que têm decorrido com o PCP, o PEV, o BE e o PAN. Esta posição está na linha das suas declarações esta terça-feira à agência Reuters quando afirmou poder vir a haver um Governo “que corresponda à maioria de esquerda que existe hoje no Parlamento”.
Questionado pelos jornalistas sobre a posição assumida esta terça-feira pelos comunistas, após uma reunião técnica com o PS, de não se comprometer no apoio a um futuro executivo liderado pelos socialistas, Costa referiu que se está a tentar pôr fim a um “muro” erguido desde 1975 e admitiu que o “caminho não é fácil”.
O líder do PS reafirmou a intenção de fazer mais do que adocicar a política da coligação, rejeitando que as propostas do PS sejam assim uma “espécie de bolas de Natal que vão enfeitar o programa da coligação”. António Costa disse estar convencido de que “quem votou no PS não votou para o PS viabilizar as políticas da coligação”. Com os prazos constitucionais a esgotarem-se – o Presidente da República deverá chamar os partidos – o líder do PS disse ser “mau” que a situação de indefinição se arrastasse. Mas voltou a deixar um aviso: “Se a maioria de governo não existir, não vamos deixar o país no pântano”.
Sem definir uma data, António Costa comprometeu-se a enviar para os líderes da coligação uma contra-proposta. E foi sobre esse documento que Passos Coelho deixou um avisos e deixou escapar  algum cepticismo. “é preciso saber se há ou não vontade política de chegar a um entendimento”, disse o líder da coligação PaF, acrescentando que nesse patamar é preciso saber se as “medidas do PS cabem ou não nas regras europeias e se são compatíveis com o défice abaixo dos 3%”.
Se Costa mostrou “desilusão” com o encontro, Passos Coelho não escondeu o desencanto. “Nós esperaríamos que o PS pudesse apresentar nova proposta para prosseguir nova discussão. Isso não aconteceu, a reunião foi inconclusiva”, disse o líder dos sociais-democratas. Questionado sobre se tem dúvidas da vontade política do PS em chegar a um entendimento, Passos Coelho lembrou que a coligação “fez o trabalho de casa” e que não houve da parte do PS “nenhuma posição que fosse construtiva, positiva”. “O PS pôs-se numa posição passiva", rematou. Já sobre que forças devem ser chamadas a formar governo, o líder dos sociais-democratas disse ter a expectativa legítima” de que deve ser a coligação a ser chamada pelo Presidente da República.

Os elogios à proposta feita ao PS pela coligação – o “documento facilitador de compromisso” foram feitos pelo próprio Paulo Portas. “Para qualquer português isto significa um avanço”. O PS diz que não é suficiente, então terá que dizer como é que é suficiente e como é que cabe nas regras europeias”, afirmou. 


Presidente deve nomear Passos, mesmo que depois não governe, defende Santana Lopes

Antigo líder do PSD diz que uma "solução natural" para o país é a coligação fazer “um acordo de viabilização de Governo com o PS”. Critica Cavaco e os líderes do PSD e do CDS por deixarem António Costa andar num "frenesim" de entendimentos. E desafia Marcelo Rebelo de Sousa a dizer o que faria.
ENRIC VIVES-RUBIO
Pedro Santana Lopes não tem dúvidas: o Presidente da República deve nomear Pedro Passos Coelho como primeiro-ministro, porque foi a coligação Portugal à Frente que ganhou as eleições, e deixar que a Assembleia da República decida se o Governo PSD/CDS deve ou não governar. Mas avisa que "seria uma solução natural" para o país a coligação fazer “um acordo de viabilização de Governo com o PS”.
“Os resultados são o que são, os preceitos constitucionais também: o Presidente da República tem o dever de nomear o primeiro-ministro, e depois o Parlamento deve assumir as suas responsabilidades: se votar e deixa passar o Governo, está resolvido; se não deixa, também está resolvido noutro sentido. Isto [o que se tem passado na última semana] é que acho pouco clarificador”, defendeu o provedor da Santa Casa da Misericórdia no final de um almoço-conferência do American Club of Lisbon.
"Tem o direito de formar Governo quem ganha as eleições, mesmo que porventura não venha a governar. O Presidente tem a estrita obrigação, depois de passado este ciclo (para não deixar a situação degradar-se, institucionalmente e sistemicamente), de indigitar formalmente o primeiro-ministro – que ainda não o fez, encarregou-se de fazer conversações –, indigitá-lo, nomeá-lo, o primeiro-ministro formar Governo e ir ao Parlamento", enunciou Pedro Santana Lopes.
Depois, "cada um assume as suas responsabilidades": "O PS, se quiser, vota a favor de uma moção de rejeição do programa de Governo e depois se verão, um dia, as consequências, boas ou não boas. (...) Não podemos andar nesta diluição sistémico-institucional em que António costa – e não o culpem por ele fazer o que outros talvez devessem fazer – anda de uma sede para a outra, de uma reunião para a outra, como se tivesse sido ele o encarregue de formar Governo. Mas a culpa não é de quem o faz, é de quem não o faz. Não podemos andar nesta diluição sistémica-constitucional."
Santana Lopes avisa que "nem António Costa era o Deus perfeito [há um ano, quando se candidatou a líder do PS], nem hoje em dia é o Diabo". Para o antigo primeiro-ministro, "a questão é a dimensão de Estado de cada actor político e sabermos tirar lições do que passou e agirmos como deve ser para diante". Na sua opinião, o líder socialista "não pode fazer uma maioria absoluta na secretaria - e conhecendo-o como conheço estou convencido de que, mesmo que pudesse não quereria. Outra coisa é fazer um acordo de viabilização de Governo com o PS - que acho que é uma solução que seria natural para o país, mas António Costa lá saberá."
Na sua intervenção perante 140 personalidades da política portuguesa, diplomatas, empresários e gestores de multinacionais ou ligadas aos Estados Unidos, Pedro Santana Lopes foi crítico da actuação da coligação - que considera que tem sido secundada por António Costa -, defendeu o dever de Cavaco Silva nomear Pedro Passos Coelho, falou sobre a revisão constitucional de 1982 em que ficou definido que o Presidente deve nomear o primeiro-ministro com base no resultado das eleições, e desafiou os candidatos presidenciais a dizerem o que pensam deste impasse.
Desafio a Marcelo
Questionado sobre o leque de candidatos a Belém, o antigo líder do PSD - que chegou a ponderar candidatar-se a Belém mas recuou - não abriu o jogo sobre se tenciona votar ou não em Marcelo Rebelo de Sousa porque, garantiu, ainda não "conseguiu pensar muito". “Ainda não cheguei a uma conclusão. Eu entendo que os candidatos à Presidência da República têm obrigação de dizer o que pensam e o que tencionam fazer no cargo. Eu quero saber o que quem quer ser Chefe de Estado pensa do exercício da sua função.”

Aparentemente, apesar de conhecer a visão do professor de direito constitucional Marcelo Rebelo de Sousa pelos manuais que escreveu, Santana não sabe ainda o que pensa o político Marcelo Rebelo de Sousa – nem ele nem Rui Rio, especificou. "Eu ainda não sei o que é que ele pensa do exercício da função presidencial. Por exemplo, eu gostava imenso de o ouvir dizer o que faria no lugar de Cavaco Silva agora. Nomeava Pedro Passos Coelho ou não? Ou dava posse a António Costa?", questionou Santana Lopes.
Sobre a inércia da coligação, que está apenas a ser espectador das diligências de António Costa, que se tem mostrado tão “activo” na busca de entendimentos que “até parece que foi ele a ganhar as eleições”, Santana questiona-se se não será isso uma “estratégia” da coligação. Mas avisa: “Se for, é uma estratégia arriscada porque ficou um pouco para trás neste processo todo…”
Se tudo se resolver esta semana, como António Costa prometeu, “não tem mal”. “Mas lá está: é ele que diz quando começa e quando acaba; não ouvimos a coligação nem o Presidente, sequer, a deixar claro até quando Passos Coelho pode continuar a desenvolver diligências para assegurar uma base estável de Governo”, como o Chefe de Estado o encarregou há uma semana.
“E no frenesim do dia-a-dia o que se vê é António Costa de um lado para o outro a desenvolver diligências. O Presidente não pode olhar para esta dessintonia entre o que disse e o que se passa indiferente. Tem de tomar uma atitude e a atitude é ouvir os partidos todos, fazer a sua escolha, e nomear quem ganhou as eleições”, considera Santana Lopes.

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