Joaquim Chissano, Armando Guebuza, Afonso Dhlakama e Raúl Domingos conhecem melhor do que ninguém as linhas com que coseu o AGP de Roma. Cabe a eles gastarem o tempo que for necessário para corrigirem o que jamais foi implementado daquele Acordo. Não basta dizer que o AGP foi incorporado nas leis do país. A questão militar jamais foi plenamente cumprida e por isso o país vive ainda hoje numa situação de dois exércitos pertencentes a dois partidos. Essa é a verdade nua e crua.
É preciso deixar de mentir, mesmo que seja mentira oficial. Isso não transforma a mentira em verdade.
Quando aparentemente se pensava que estavam criadas as condições para ver o país caminhando para a frente, eis que a questão da partidarização do Estado vem à tona.
Compatriotas, quem ignora que o sistema judicial está amordaçado pelos interesses do partido Frelimo ou da sua liderança?
Quem não sabe como chegam as ordens e instruções às forcas policiais?
Quem não se apercebeu de que as eleições são “arrancadas” com ajuda da PRM?
Quem ignora que os comandos das FADM são escolhidos a dedo com base em critérios de confiança política?
Dar entrevistas e falar no geral, ou ter um jornalista fazendo perguntas simpáticas que não tocam nos assuntos controversos ou quentes, é fazer vista grossa perante a realidade que milhões de moçambicanos vivem.
A Lusa, agência de notícias portuguesa, por cortesia ou por outra motivação, não se preocupa em explorar “dossiers” sensíveis da realidade moçambicana. Não nos esqueçamos que Cavaco e Silva foi um dos primeiros a felicitar um presidente moçambicano que ainda não havia sido homologado pelo Conselho Constitucional. Os jornais locais ou não têm acesso, ou fazem entrevistas de endeusamento e de envernizamento. A grande “mídia” internacional praticamente não tem Moçambique nos seus despachos noticiosos. São como abutres que só se aproximam de animais mortos ou moribundos. Chegarão às dezenas, quando a guerra regressar.
Kofi Annan prestou um inestimável serviço ao Quénia pós-eleitoral. Tem a estatura e respeito internacional suficiente para ajudar no processo pós-eleitoral moçambicano. Não vale de nada fazer de contas que por nós próprios resolveremos os nossos problemas.
Há uma crise de falta de confiança entre os interlocutores do CCJC.
E como o Executivo moçambicano segue uma linha ambígua, produto de “estranhas” considerações estratégicas, não é previsível que se alcance um acordo definitivo a breve trecho.
E a quem interessa este estado de coisas?
Quem se refugia numa Constituição para se manter no poder, mesmo que tenha chegado lá por vias abertamente ilícitas, deve ser olhado com desconfiança.
O momento requer seriedade e honestidade.
Moçambique é uma entidade política e territorial concreta que necessita de consensos que a viabilizem.
Teatro político e inflexibilidade arrastam o país para mais e maiores crises.
Ex-beligerantes que se conhecem têm uma obrigação para com os seus concidadãos, que se chama manutenção da PAZ.
Mas continua a não haver ou a vislumbrar-se boa-fé.
Há uma ferrenha posição de intransigência que só pode indiciar agendas secretas.
Robert McNamara reconheceu, no seu livro de memórias, que insistir no Vietname foi um erro americano. Em Moçambique, insistir numa solução final que signifique a obliteração dos outros, como já foi defendido por pessoas como Marcelino dos Santos, remete-nos a uma situação de convulsão e derramamento de sangue perfeitamente evitáveis.
No que se pode resumir a uma situação de intolerância relacionada com a negação de democracia política e económica, encontramos políticos e seus conselheiros com vista deturpada pelo poder exercido.
Da academia e dos centros de pensamento com mais influência no Executivo, os pontos de vista tendem a alinhar com visões belicistas e de irredutibilidade.
Dos chamados medianeiros nacionais, assiste-se com frequência à incapacidade de se apresentarem equidistantes e proactivos. Sabendo o que emperra as negociações, seria aconselhável que procurassem apoios na sociedade moçambicana e em fóruns externos.
Uma “troika” governamental não parece opção, dado os interesses em jogo.
Precisa entrar em cena uma entidade de créditos firmados e da confiança das partes em litígio.
Existem “anciões nacionais” que poderiam, querendo, trazer outra dinâmica ao processo negocial, mas, pelo que parece, preferem brilhar no estrangeiro, no lugar de dar contributo directo e atempado ao dilema nacional.
O ditado diz: “Quem procura encontra”. (Noé Nhantumbo)