A Guiné-Bissau fica em África
Escrevi uma postagem a dizer que Moz, Guiné-Bissau e Ruanda eram estados em construção. Algumas pessoas reagiram incrédulas como se eu tivesse cometido um sacrilégio por colocar a Guiné-Bissau no mesmo patamar que o Ruanda. Não me enganei. A sociologia não funciona como a ciência popular que envereda pelo lado menos doloroso e prefere dar destaque às aparências e ao trivial. É verdade que a Guiné-Bissau há vários anos que atravessa momentos políticos difíceis. As elites políticas assim como todos os guineenses são responsáveis por isso, mas nada do que lá acontece está fora do que é de esperar dum País africano.
A questão não é cultural. É profundamente estrutural. A Guiné-Bissau, por enquanto, constitui um exemplo extremo de tudo quanto pode correr mal no processo de construção dum Estado. Os países que não passam pelo que a Guiné-Bissau vive hoje são apenas sortudos, a engrenagem estrutural que determina o que acontece quando num determinado momento se falha o passo (no caso da Guiné-Bissau o golpe de Nino Vieira foi esse momento - e por razões totalmente compreensíveis, ainda que problemáticas) poupou aos outros países o tipo de dissabores que a Guiné-Bissau vive e que se agudizam em razão da sua estrutura social específica. A Guiné-Bissau é a África quando as coisas não vão bem assim como a África é o mundo quando as coisas não vão bem. O problema da Guiné, e de África, é que o que não vai bem tem uma história bem específica.
Nāo existe um horizonte temporal para que o sofrimento acabe. Pode ser que a Guiné nunca mais acerte o passo. O mundo não é justo no sentido de que ele não recompensa quem faz bem as coisas. Muita coisa é simplesmente aleatória que a gente, por preguiça de pensar, atribui à visão, clarividência, boa governação, etc. de políticos. Não estou a desfiar um argumento fatalista porque acredito que essas coisas são importantes, ainda que não dê os seus efeitos positivos por adquirido. Num outro momento histórico Kagame podia fazer as mesmas coisas que faz agora e dar berro. O Ruanda é pequeno demais para ser mais forte que as circunstâncias. A gente exagera os méritos de Kagame. A Costa do Marfim de Boigny nunca teria levado ninguém a imaginar as guerras civis que destruíram tudo o que o velhote tinha construído. E a verdade é que essas guerras civis foram resultado do que ele fez, também. De igual modo, ninguém teria apostado um tostão sequer no Gana até ao primeiro mandato democrático de Rawlings, mas hoje o Gana é talvez a melhor história de sucesso em África. O Botswana que até há pouco fazia lágrimas jorrarem dos olhos da indústria do desenvolvimento pelo exemplo de “boa governação” parece ter iniciado um processo de declínio que ainda vai dar que falar.
Eu estou aberto à possibilidade de a Guiné-Bissau nos surpreender um dia destes. De resto, a história mostra que momentos de cataclismo tornam países robustos. Se calhar o Ruanda está a colher dessa árvore...
É o que digo: a sociologia pode não servir para muita coisa, mas ela é duma paciência que constitui bom antídoto contra conclusões apressadas e contra a resistência que sempre manifestamos contra a necessidade de realmente pensarmos os nossos países e não sermos apenas caixas de ressonância.
A Guiné-Bissau fica em África. Em cada um dos nossos países há uma Guiné à espera de acontecer. Andamos apenas com mais sorte do que os nossos irmãos.
3 comentários:
As reported by Stanford Medical, It's in fact the one and ONLY reason this country's women live 10 years longer and weigh on average 19 KG less than we do.
(And by the way, it has totally NOTHING to do with genetics or some secret-exercise and really, EVERYTHING about "HOW" they are eating.)
P.S, I said "HOW", and not "what"...
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As stated by Stanford Medical, It's in fact the one and ONLY reason women in this country get to live 10 years more and weigh 42 lbs less than we do.
(And really, it has NOTHING to do with genetics or some secret-exercise and really, EVERYTHING around "HOW" they eat.)
BTW, What I said is "HOW", not "WHAT"...
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«momentos de cataclismo tornam países robustos»-Sim, ou não.
Analisado há muito por historiador emérito, Arnold Toynbee, que em vez de ler a História em dois períodos, antes de Cristo (aC) e depois (dC), considera aG e dG (Gama, Vasco da Gama).
Sobre a caminhada das sociedades, a tese do problema, 'desafio' ou catástrofe, como mecanismo de superação (continuidade) ou não superação (morte).
O 'desafio' suficientemente robusto ao qual fazem frente e os torna mais fortes, são capazes,
o desfio demasiado forte, perante o qual não são capazes de reacção, acabando por ficar para trás e desaparecer.
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