30.01.2019 às 17h16
Entraram e não mais voltaram a sair: 153 pessoas desapareceram no metropolitano da Cidade do México. Ninguém sabe delas e nem as mais de três mil câmaras de vigilância foram eficientes para perceber o que aconteceu a todas aquelas que foram vistas pela última vez a entrar numa das 195 estações de metro da capital mexicana
Graciela desceu as escadas do metro. Leva a filha pela mão. Estava na estação de Chabacano, bem no centro da Cidade do México. Um grupo de seis pessoas encurralou-a. “Por esta dão-nos 20”, lembra-se de ouvi-los dizer. Tentaram raptá-la. Não conseguiram. Graciela esbracejou, lutou e conseguiu soltar-se. Correu para o interior de uma carruagem com a filha. A mexicana de 30 anos poderia ter sido a 154º pessoa a desaparecer no metro da capital do México. Não foi. Teve sorte. Outras 153, não tiveram.
“Penso naquelas pessoas que não conseguiram escapar e que agora lembramos como mais um número nas mesas do Ministério da Segurança Pública”, dizia Graciela ao “El País”. O que se passa no metropolitano da Cidade do México ninguém parece saber explicar. E nem as 3.417 câmaras de videosegurança espalhadas pelas 195 estações conseguem ajudar a travar o problema.
Pela estação de Chabacano passam milhares de pessoas todos os dias. Nem podia ser de outra forma, pois ali cruzam-se três linhas de metro diferentes. Segundo a Procuradoria Geral de Justiça, citada pelo jornal “El País”, 153 pessoas foram dadas como desaparecidas na rede de metropolitano em quatro anos. Destas, cerca de 65% das vítimas voltam a aparecer, sejam dias ou semanas mais tarde. Mas há uma parte dessas pessoas (35%) que nunca mais ninguém volta a ver.
Só no ano passado, 43 novas investigações foram abertas.
Tentaram levar Graciela e a filha a 13 de janeiro, um domingo, quando voltavam a casa. A mulher escolheu não apresentar queixa junto do Ministério Público, porque em tempos, contou, já teve problemas quando denunciou um assalto. Deu conta do sucedido, as autoridades pediram-lhe todos os dados pessoais e a família do ladrão conseguiu obtê-los. “Tive uma má experiência”, recorda Graciela, depois de descrever como os familiares do criminoso lhe apareceram à porta de casa, pedindo que retirasse a queixa.
“O pior é que nos dizem que é um sítio com muita gente, que isso não poderia acontecer ali [no metro].” Graciela partilhou o que lhe aconteceu nas redes sociais. Chamaram-lhe trapaceira e mentirosa. “Em momento algum tentaram tirar-me a mala ou o telemóvel, mas tiveram a intenção de me levar.”
Graciela sabe que aquilo por que passou não foi só um assalto falhado.
FALTAM DENÚNCIAS
O sistema judicial e as autoridades asseguram que o maior problema que enfrentam é que a maioria das famílias não dão conta do desaparecimento das pessoas. “Apelamos às vítimas que denunciem”, dizem. E, apesar de terem conhecimento de vários casos, sem denúncia formalizada não podem avançar com uma investigação. Consequentemente, justifica a Procuradoria, não é possível descobrir se existe ou não um grupo de crime organizado.
“Infelizmente, as câmaras não cobrem todas as estações e não podemos fazer o seguimento do que acontece”, sublinha ao “El País¨ um porta-voz da Procuradoria.
Entre 2007 e abril de 2018, segundo estatísticas governamentais, 37 435 pessoas desapareceram. Um número que, admitem, pode ser mais elevado, uma vez que só uma parte são reportados. Mais de 65% dos crimes cometidos no México nunca são denunciados, pois a população considera que todo o processo e formalismo são “uma perda de tempo” . Mais de 90% dos crimes nunca são resolvidos.
A violência no país é frequente, sobretudo contra as mulheres. Aliás, no metro da Cidade do México há carruagens exclusivas para mulheres, com o objetivo de reduzir o número de casos e denúncias por assédio sexual. Mais de cinco milhões e meio de pessoas usam diariamente o sistema de transportes públicos mexicano. É o segundo mais usado no mundo. Mais saturado só o serviço público de Nova Deli, na Índia.
Os raptos, recorda a revista mexicana “Nexos”, dispararam entre 2006 e 2012, durante a presidência de Felipe Calderón, quando começou a guerra da droga.
Em média, todos os dias 11 mexicanos desaparecem. Alguns, nunca voltam a aparecer.
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