FRELIMO ALUCINADA
Governo moçambicano detecta falhas na interpretação de documentos rubricados e sublinha que ainda não há acordo final
Nada está decidido quanto a indicação de governadores provinciais provenientes da Renamo no quadro do diálogo político em curso em Maputo. O Governo relembra que na mesa de negociações estão quatro pontos e o acordo final apenas poderá ser rubricado pelo Presidente da República e pelo líder da Renamo, abarcando a totalidade de todos os pontos.
Quando tudo era dado como esgotado na abordagem e debate do primeiro ponto da agenda, referente “a governação das seis províncias pela Renamo”, as partes retomaram-no quarta-feira passada, buscando a melhor interpretação do conteúdo acordado nas actas.
O aparente “volte-face” denuncia problemas complexos que estão em jogo nas negociações e que parecem ainda longe de ser consensuais quanto a nomeação de governadores provinciais indicados pela Renamo, o maior partido da oposição.
A Renamo continua apostada na eliminação de barreiras legais para governar, o mais cedo possível nas seis províncias onde alega ter vencido, posição que levanta dúvidas para o Governo que defende que no pano de fundo deve estar presente a Constituição da República e a própria Lei Eleitoral.
A Renamo faz derradeiro esforço de governar nas seis provinciais e o Governo defende que o caminho da concórdia passa inelutavelmente pelo primado da Lei, que não pode ser derrubada.
Jacinto Veloso, Chefe da equipa do Governo na Comissao Mista do diálogo para a paz detectou falhas na interpretação do documento rubricado pelas partes e ressalvou que as regras existem e são para cumprir por todos independentemente da filiação partidária.
Explicou que na mesa de conversações estão quatro pontos, nomeadamente, governação das seis províncias “ganhas” pela Renamo, cessação das hostilidades militares, composição das Forças de Defesa e Segurança e de desarmamento da Renamo.
Ciente que o todo nunca pode superior as partes, Veloso sublinhou que nenhum acordo pode ser avalizado num ponto isolado, sem que haja entendimento noutros previamente agendados.
“Não podemos dizer que como o primeiro ponto colheu alguns consensos deve ser implementado sem que os outros tenham sido discutidos”, referiu o Chefe da equipa do Governo.
Disse ainda que os quatro pontos em discussão, uma vez discutidos e consensualizados, apenas poderão ser avalizados pelo Presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi e pelo líder da Renamo, Afonso Dhlakama, mediante um acordo final.
Ciente de que o ódio excita contendas, Jacinto Veloso disse que a alcançar-se o tal acordo final, será desenhado um programa de reconciliação nacional, constatado que esta ainda não foi visada desde os Acordos de Roma em 1992.
Curiosamente, desde que as partes entraram em choque quanto a interpretação do conteúdo acordado, referente ao primeiro ponto, o secretismo passou a revestir as negociações a partir de quarta-feira.
Os mediadores que fazem a supervisão das conversações em ambiente aparentemente descontraído, promoveram encontros separados com as partes na busca de consenso final e na abordagem do ponto seguinte que visa precisamente a cessação das hostilidades.
O QUE DIZ O DOCUMENTO?
Em relação ao primeiro ponto da agenda (governação das seis províncias pela Renamo) o documento rubricado pelas partes refere que a delegação do Presidente da República e a delegação do presidente da Renamo concordam que o assunto deve ser discutido no quadro da unidade nacional e do processo de descentralização administrativa, que confira mais poderes de decisão aos órgãos locais do Estado, incluindo os recursos financeiros e a forma descentralizada de eleições/designação dos governadores provinciais.
Aponta por isso, que a delegação do Presidente da República e a delegação da Renamo concordam de construir, no âmbito da Comissão Mista e com a presença dos mediadores/facilitadores, uma Subcomissão com a tarefa de preparar um pacote legislativo que esteja em vigor antes das próximas eleições gerais, em 2019, nomeadamente: a Revisão pontual ou substancial da Constituição da República; a Revisão da Lei dos Órgãos Locais do Estado e seu Regulamento; a Revisão da Lei das Assembleias Provinciais; a Aprovação da Lei dos Órgãos de Governação Provincial; a Aprovação da Lei das Finanças Provinciais; a Revisão da Lei de Bases da Organização e Funcionamento da Administração Publica e, finalmente, o reexame do modelo de autorização de todos os distritos conforme a Lei 3/94.
Sobre a “governação da Renamo nas Seis províncias” o documento que temos estado a citar sublinha que “devem ser encontrados mecanismos legais para nomeação provisória dos governadores provinciais oriundos da Renamo o mais cedo possível”.
Destaca que a preparação do referido pacote tem que ser concluída antes do final do mês de Novembro próximo, devendo a Comissão Mista entregar o pacote legislativo a Assembleia da República, através dos canais apropriados, para sua apreciação e eventual aprovação.
Do pacote legislativo a submeter ao Parlamento domingo destaca três pontos fundamentais: aprovação dos órgãos de governação provincial, aprovação da lei das finanças provinciais e revisão da lei das assembleias provinciais.
São pontos que acomodam a revindicação da Renamo no que tange a governação das províncias pelo partido com vantagem nas futuras eleições provinciais. Trata-se de matéria que, a ser aprovada, remeterá o preceituado na Lei ao futuro.
Por vislumbrar fica o tal “mecanismo legal” que a Renamo diz que deve ser encontrado para nomeação provisória dos seus governadores o mais cedo possível.
Caberá ao Parlamento vislumbrar num “xadrez” inusitado, inédito, tudo jogando contra o tempo, dado que estamos a falar de dispositivos legais vitais e complexos que remetem alguns deles para auscultação pública.
CORREDOR DESMILITARIZADO?
Tudo continua em aberto. Amanhã as negociações são retomadas com grande dose de optimismo, prevalecendo a expectativa de os mediadores se deslocarem a Serra da Gorongosa para um encontro com o líder da Renamo, Afonso Dhlakama.
Dados disponíveis indicam que a “perdiz” continua a exigir o recuo das Forças governamentais que estão a apertar o cerco. O Governo sublinha que um cessar-fogo não implica recuar. Esclarece que o mesmo impõe o fim dos disparos, mas cada um permanece onde está.
Os mediadores procuram meio-termo. Esta é a batalha que está agora a ser travada e que tem que ser ganha pelo povo moçambicano.
Enquanto isso, a Renamo continua com investidas militares, atacando civis no pressuposto de que desta forma pressionará o Governo a ceder na mesa do diálogo.
A Renamo defende, com unhas e dentes, a necessidade de se aprovar o pacote legislativo antes de novembro, reiterando a urgência de nomeação de governadores provinciais por si indicados.
Vamos ver se a Frelimo aceita esta investida do maior partido da oposição. Jacinto Veloso foi claro: Tudo depende do que o Presidente da República decidir e do acordo final por rubricar. Podem ser nomeados zero governadores da Renamo, dois ou três. Até mesmo sete se o Presidente concluir que há interesse nacional.
Como diz a gíria popular, o caminho faz-se caminhando e amanhã ver-se-á o que as conversações irão assinalar como progresso mais vistoso no atinente a cessação das hostilidades.
Texto de Bento Venâncio
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