Em meados e final de Junho de 1989, um documento circulou em Maputo que, apesar de não carregar nenhuma atribuição, foi reconhecido como uma declaração de um conjunto mínimo de condições da Frelimo para contacto directo. Os dois pontos-chave eram que a Renamo devia reconhecer a legitimidade do estado moçambicano e do governo; e desistir de suas armas. Ele circulou em primeira instância às embaixadas: União Soviética, Estados Unidos, Reino Unido, França, Itália e África do Sul, assim como Portugal, mas logo vazou para jornalistas. O plano dos «12 pontos de Chissano», em Português e Inglês, causou considerável excitação, entre os radicais. Mais tarde, o documento foi formalmente entregue a Delegação da Renamo em Nairobi, de onde D. Alexandre trouxe a Resposta, em 16 pontos. A seguir, os dois documentos.
«Os 12 Pontos de Chissano para a Paz»
1. Estamos perante uma operação de destabilização que não deve ser confundida com uma luta entre dois partidos.
2. A operação tem sido realizada através de acções brutais de terrorismo que provocam sofrimentos imensos que incidem sobretudo sobre a população e sua propriedade. Já foram mortas centenas de milhares de pessoas. Muitas infraestruturas económicas e sociais vem sendo destruídas ou paralisadas impedindo a vida normal dos cidadãos e lançando milhões de pessoa na situação de deslocados.
3. Trata-se de procurar pôr termo a esta situação desumana. A primeira acção deve ser a paragem de todas as acções terroristas e de banditismo.
4. Trata-se de criar condições para a normalização da vida de todos moçambicanos de forma a que possam por um lado participar na vida política, económica, social e cultural do país e por outro lado na discussão e definição das políticas que conduzam o país em cada um destes aspectos (político, económico, social e cultura).
5. Estas políticas são estabelecidas por consenso nacional formulado através dum processo de consulta e debate com as populações ou grupos sociais envolvidos. As principais leis relativas à terra, saúde, educação, foram aprovadas após consulta popular. A revisão da Constituição ainda em curso está sendo realizada através de debate que visa introduzir crescentes factores de participação democrática no funcionamento do Estado. As Instituições religiosas estão a ser consultadas no processo da legislação sobre as liberdades religiosas.
6. O diálogo tem como objectivo clarificar estas posições e dar garantias de participação para todos os indivíduos incluindo os até aí envolvidos em acções violentas de destabilização.
7. Essa participação e gozo de direitos refere-se desde logo aos processos que já estão em prática no que respeita à afirmação dos princípios definidos na Constituição quanto – à defesa das liberdades individuais e colectivas; à defesa dos direitos humanos; à defesa dos direitos democráticos.
8. As liberdades individuais e liberdades sociais tais como a liberdade de culto, de expressão e de reunião são garantidas. Elas não devem ser utilizadas contra o interesse geral da Nação. Não podem ser utilizadas para destruir a unidade nacional, a independência nacional e a integridade das pessoas e bens. Não podem ser utilizadas para propagar o tribalismo, o racismo, o regionalismo ou qualquer forma de divisionismo ou sectarismo. Não podem ser utilizadas para a preparação ou perpetração de actos punidos por lei tais como roubo, assassínio, agressões. Não podem ser utilizados para preparação ou perpetração de acções violentas contra o Estado e a Constituição, tais como movimentos secessionistas ou golpes de Estado.
9. As mudanças ou revisões políticas ou constitucionais ou das principais leis do país onde em muitos casos já se realizou ou está em curso um debate ou consulta com cidadãos podem ser feitas e só podem ser feitas com ampla participação de todos os cidadãos.
10. É inaceitável que um grupo utilize a intimidação ou violência para se impor ao conjunto da sociedade. É antidemocrático alterar ao sabor da violência de um grupo a constituição e as leis principais do país.
11. A normalização da vida e integração dos elementos até agora envolvidos em acções violentas de destabilização implica de forma geral a sua participação na vida económica e social através das formas melhor adaptáveis e acordadas pelos próprios e garantidas pelo governo.
12. A aceitação destas bases pode conduzir a um diálogo sobre as modalidades do fim da violência, estabelecimento da Paz e a normalização da vida para todos no país.
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Resposta da Renamo
Os 16 Pontos da Renamo para a PAZ
Resistência Nacional Moçambicana
Renamo
1. Desde 1964, o povo moçambicano está morrendo diariamente vítima da guerra.
2. Impõe-se, portanto, que todos os verdadeiros nacionalistas e amantes da paz, afiliados em organizações políticas ou não, envidem todos os esforços, mobilizando para esse efeito meios ao seu dispor para encontrar uma solução genuinamente moçambicana e africana, que conduza à paz e estabilidade duradouras.
3. O povo moçambicano precisa de liberdade. É na liberdade que procedem a paz, estabilidade, a prosperidade, o respeito e a dignidade do individuo.
4. Deve prevalecer o princípio de que o povo é soberano e tem o direito inalienável de eleger os seus dirigentes que sirvam as suas expectativas e respeitem as suas tradições seculares.
5. A RENAMO é uma força política e activa na cena política moçambicana. Qualquer solução para a paz deve tomar em consideração esta realidade e bem como a tradição, cultura, estádio do desenvolvimento e realidades do presente momento.
6. Não é intenção da Renamo mudar a ordem existente em Moçambique através da força armada. A luta armada só serve como último recurso de defesa do povo contra a negação dos seus direitos e contra a sua opressão.
7. A RENAMO nunca consentirá que a força militar venha a ser utilizada para impor uma chefia ou opçoes políticas contrárias à vontade do povo.
8. Nenhuma das partes envolvidas neste conflito tem algo a ganhar com a continuidade desta guerra. Somente o povo vê o sofrimento e agravar-se dia a dia.
9. Deve-se pôr fim os ataques verbais insultuosos quer por aqueles que combatemos, como os externos directa ou indirectamente interessados no problema. Realçar o futuro e não o passado.
10. A propaganda contra a RENAMO não mudará a realidade político-militar em Moçambique e nem facilitará a reconciliação nacional.
11. A presença das forças estrangeiras trazias pela FRELIMO não trouxeram a paz e bem-estar para o povo moçambicano.Nós na RENAMO vemos esta presença como um obstáculo para a paz para além de significar ultraje à nossa dignidade e perda de soberania e independência nacionais.
12. Para a resolução do actual conflito a RENAMO tem em consideração os países vizinhos e outros interessados na região.
13. A Renamo declara publicamente que fará tudo o que estiver ao seu alcance para que o actual processo de negociações continue e finalmente desagúe em paz.
14. A RENAMO defende intransigentemente o povo, razão da sua existência e luta. É contra qualquer acto que viole a sua integridade física e moral, tais como massacres, pilhagens, etc.
15. A RENAMO é uma força de guerrilha, cuja sobrevivência depende unicamente do povo, por isso, é por natureza contra qualquer acto de atrocidade que ponha em risco a vida das populações, a razão de ser da sua existência.
16. A RENAMO quer uma genuína negociação que conduza a uma reconciliação nacional sem vencidos nem vencedores seguida de uma reforma constitucional, unir esforços para formar um novo Moçambique, onde a nossa fraternidade seja afirmada pelo livre debate das ideias e pelo consenso; um novo Moçambique onde a luta armada jamais torne a ser o último e único recurso para a solução dos nossos problemas.
Gorongosa, 15 de Agosto de 1989, (entregue em Nairobi).
Fonte: Transcrição feita a partir de cópias de originais.
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