Ficámos a saber na última semana que os que criticam a actual governação – que aliás praticamente nada tem para ser saudado, muito por culpa da imoralidade que nela pontifica – foram baptizados com um outro cognome, para a sua galeria de colecção. São agora “agitadores profissionais”.
E é a mesma entidade suspeita de sempre que insiste no seu processo de topónimos aos críticos. De “apóstolos da desgraça”, passaram a “tagarelas”, “inimigos do desenvolvimento”, “instrumentalizados a favor dos brancos” (qual xenofobia!...), até “marginais”. Há dias mudaram de categoria: “São agitadores profissionais!”
A nós, os nomes em si, nem nos preocupa, porque o exercício de atribuir alcunhas indesejáveis a outros cidadãos está, só em si, geralmente carregado de algum humor, mas vindo os epítetos de quem vem neste caso faz-nos reflectir, mais uma vez, sobre questões de ordem comportamental grave.
Quando um Presidente da República diz que os seus concidadãos são “marginais”, “apóstolos da desgraça” e usa adjectivos de jaez similar é da mais elementar responsabilidade que exijamos, no mínimo, as pautas de sanidade mental e sobriedade desse mesmo cidadão, sob o risco de confiarmos os nossos destinos (tamanha responsabilidade) a indivíduos de postura bastante precária e duvidosa, pese embora saber-se que não tarda terá de fazer as malas e seguir o seu destino… Para grande alívio dos críticos do desastre que tem sido a sua governação.
O exercício da crítica está formalmente salvaguardado no Artigo 48 da nossa Constituição da República que versa sobre as liberdades, constituição esta, aliás, que o Chefe de Estado jurou respeitar, cumprir e fazer cumprir, e ignora isso com imensa desfaçatez.
Não nos venha dizer o senhor Armando Guebuza que não gosta da crítica!
A crítica não é para ser gostada porque não seria crítica, mas elogio.
Não foram os “marginais” nem os “tagarelas” que inventaram a crítica.
Se o senhor Armando Guebuza não quer ser criticado demita-se e arranje outro emprego.
Quando se propôs a Presidente devia conhecer de antemão que é uma tarefa de permanente exposição e escrutínio público.
O senhor Guebuza não é um “todo-poderoso” neste País, embora possa imaginar-se um cidadão acima de todos os outros. Mas queira como não, toda a responsabilidade sobre a forma como andam as coisas neste País, é em última instância do Presidente da República que tem poderes que descem até a todas as instituições. E estando nesse cargo deve ter uma postura condicente, que pelo visto não sabe ter e é pena.
À luz do preceito das liberdades e participação política, todos os moçambicanos têm o direito de criticar se lhes ocorrer verificar que a riqueza nacional está a ser acumulada nas famílias que se acham donas do País. E é o que está a acontecer!...
Recentemente o Centro de Integridade Pública (CIP) tornou público em documento que indicava que é a “elite” política nacional que está a beneficiar da exploração de recursos, no corrupto joguete de atribuição de licenças.
Partiu-se aqui do determinismo exclusório de que só os de apelido próximo a Guebuza ou da Frelimo é que são capazes de ser empresários nas minas.
Que fique claro que mesmo a alegada abertura de espaço para a participação dos moçambicanos nesses negócios é o mesmo ciclo que acaba desembocando na Frelimo. E, se por falha não acontecer, não será suficiente para compensar o roubo de que os moçambicanos são apaticamente vítimas.
Na verdade, os insultos do senhor Armando Guebuza são um convite à estupidez. Para que continuemos a assistir a um punhado de gente a enriquecer enquanto pessoas morrem em muitos distritos por falta de hospital; para que crianças comam plantas nutricionalmente irrecomendáveis para matar a fome.
Devia envergonhar qualquer moçambicano medianamente informado o facto de até na capital do País as pessoas serem transportadas como se de gado se tratasse.
Devia envergonhar sobretudo o Presidente da República o facto de na maior parte das escolas do País os estudantes sentarem-se no chão enquanto a nossa madeira vai saindo fraudulentamente para a China e com envolvimento confirmado de indivíduos que sentam à mesma mesa com Guebuza.
Ao combater a crítica, Guebuza o faz por questão de sobrevivência política, para criar o efeito de carangueijização pública. É um efeito que, segundo o filólogo português Martins Garcia, começa pela infantilização da sociedade ao ponto de a mesma sociedade ser vista como um conjunto de caranguejos. O exercício posterior é pegar nesses mesmos caranguejos e colocá-los num cesto. E como o caranguejo é pelo número de pernas um animal complexado, quando são muitos num cesto torna-se uma barafunda que ninguém consegue outro exercício senão pisar o outro sem responsabilizar o que detém o cesto. É quanto a nós o raciocínio aplicável ao comportamento pouco famoso do senhor Armando Guebuza.
Guebuza, na verdade, quer uma sociedade como um cesto de caranguejos onde nos pisamos uns aos outros sem que consigamos atirar as responsabilidades ao maior culpado.
Por isso, o senhor Guebuza vai dividindo os moçambicanos em genuínos e agitadores. Os genuínos são aqueles que singraram sem esforço e como estão conscientes do seu feito pouco dignificante vão aplaudindo os insultos do Chefe e até chegam a propor a próxima designação aos que interpelam de forma crítica a governação.
À falta de ideias de liderança, este País atingiu um ponto tal que o desequilíbrio emocional está a apossar-se dessas mesmas pessoas. Resultado: estão a tornar-se desequilibrados profissionais.
Roça, no nosso modesto entender, o cúmulo da falta de ética que um Presidente se comporte como um fofoqueiro profissional que de comício em comício vai espalhando fofocas. Vai por aí andando a dizer que sabe que existem uns fulanos que existem uns tais… que disseram tal, e que andam tal… E isso é objectivamente uma actividade de quem tem falta de agenda clara e que já anda perdido.
Ora, o papel de um Presidente não é comentar fofoca. É garantir que com os seus meios o Estado prossiga os objectivos a que a teoria política tratou de definir: segurança, justiça a todos os níveis e o bem-estar.
Pensamos que é urgente que o senhor Armando Guebuza recorde-se, no mínimo, que ainda é Chefe de Estado! Depois de ir à sua vida, pode comportar-se como bem entender. Agora, para além de ridículo, torna-se impróprio e desprestigia a República. Por isso daqui lhe recomendamos que se eleve para não prejudicar o bom-nome de Moçambique.
CANAL DE MOÇAMBIQUE – 12.12.2012
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