Maputo (Canalmoz) – Enquanto o chefe de Estado está empenhado em dar nomes aos que criticam o modelo de (não) distribuição da riqueza nacional, mais um estudo vem provar que a riqueza nacional, principalmente a gerada pelos mega-projectos, não está a beneficiar a população moçambicana. O estudo prova ainda o equívoco do discurso oficial.
O estudo da autoria conjunta da Jubilee Debt Campaign UK, uma organização britânica, Tax Justice Network e da Justiça Ambiental, faz uma rigorosa análise dos lucros da Mozal, os ganhos do Estado moçambicano e o impacto daquele mega-projecto na vida dos mais de 21 milhões de moçambicanos.
As conclusões do estudo são, tal como outras, bastante preocupantes. Os investigadores referem que apesar de todo o investimento público e de toda ênfase no desenvolvimento, muito pouca é a receita da Mozal que acaba nos cofres do governo de Moçambique. São accionistas da Mozal a BHP Billiton, que possui 47% a Mitsubishi, que possui 25%, a sul africana IDC – Industrial Development Corporation (com 24% das ações) – e o governo de Moçambique (com 3,9%). O Governo é representado por uma comissão interministerial.
O estudo estima que o Estado moçambicano tem vindo a receber uma média de apenas 15 milhões/USD por ano em impostos e participação nos lucros (NB: Para esta e outras estimativas mencionadas neste documento, consulte os cálculos detalhados no suplemento).
Em contraste: o governo britânico tem feito em média 6 milhões/USD por ano em juros, e pode também estar a receber impostos sobre o lucro da BHP Billiton que é repatriado para o Reino Unido, algo que o UK Export Finance estabeleceu como condição nas suas garantias de empréstimo.
O governo Sul-Africano tem feito em média com a Mozal 68 milhões/USD por ano em pagamentos de juros e em lucro; A IFC do Banco Mundial faz 14 milhões/USD por ano em pagamentos de juros.
Dados recentes citados pelo estudo indicam que a BHP Billiton fez um lucro de 800 milhões/USD entre 2005/06 e 2011/12, uma média de 114 milhões/USD por ano. “Se a Mitsubishi teve lucros proporcionais a estes, os dois proprietários privados da Mozal fizeram coletivamente mais de 175 milhões/USD de lucro por ano da fundição (antes dos eventuais impostos no Reino Unido, Austrália e Japão). Tal taxa de lucros seria mais do que 11 vezes a receita do governo de Moçambique”, refere o estudo.
Os investigadores estimam que a BHP Billiton tenha investido 520 milhões/USD na Mozal. Entre 2005/06 e 2011/12, os extractos financeiros da BHP Billiton dizem que estes receberam uma média de 114 milhões/USD de lucros anuais da fundição. A taxa anual de retorno sobre o capital investido ronda, portanto, os 22%.
Interacção com a economia
Segundo Jubilee Debt Campaign UK a fundição tem pouca interacção com a economia de Moçambique. “Dois economistas da Universidade de Copenhaga, e um da Universidade de Akron, em Ohio, afirmaram: “Os mega-projetos [tais como a Mozal] são propriedade estrangeira, são projectos de capital intensivo que dependem fortemente de intermediários importados e exportam 100% da sua produção. Nestas circunstâncias, as ligações com a economia nacional serão pequenas” refere acrescentando que apenas 200 milhões/USD da receita anual de 1.2 bilhões/USD da Mozal entra na economia de Moçambique. O resto paga importações, é gasto em pagamentos da dívida da empresa, ou sai como lucro.
Mozal paga menos electricidade que a população
O estudo diz que um recurso chave de Moçambique de que a Mozal faz uso é a electricidade. A BHP Billiton diz que a Mozal adquire electricidade à barragem de Cahora Bassa em Moçambique, através de um consórcio com a companhia de electricidade Sul-Africana Eskom. Estimamos que a Mozal use cerca de 45% da electricidade produzida em Moçambique, e seja responsável por 65% da electricidade consumida. “Este é um uso enorme dos recursos de Moçambique para uma fábrica que contribui com tão pouco para a economia nacional” refere o estudo que frisa que em contraste, apenas 12% da população de Moçambique tem acesso a energia eléctrica.
Uma das razões para os grandes lucros gerados pela Mozal, segundo estudo, é a extremamente generosa tarifa de energia eléctrica que paga. A Mozal negociou um preço fixo de electricidade de 1.1¢ por kwh até ao final de 2006, e depois de 1.6¢ por kwh até 31 de Dezembro de 2012. Em contraste, em 2008 as tarifas de electricidade em Moçambique foram de 4.5¢ a 6¢ por kwh para os usuários industriais, 9¢ por kwh para usuários residenciais e 12¢ por kwh para usuários comerciais. Os cidadãos de Moçambique que têm acesso a energia eléctrica têm vindo a pagar mais de cinco vezes o que a Mozal paga.
O estudo refere citando dados do FMI que o valor do rendimento per capita duplicou entre 1998 e 2010. No entanto, este crescimento económico não resultou na redução da pobreza. Segundo o Banco Mundial, na verdade, o número de pessoas que vivem com menos de 2 USD por dia aumentou de 15.2 milhões em 1996 para 18.3 milhões em 2008, o último ano com dados disponíveis. Dada a taxa de crescimento económico per capita, não seria insensato esperar que o número de pessoas a viver com menos de 2 USD por dia tivesse diminuído para metade, isto se um crescimento económico em benefício dos pobres estivesse genuinamente a acontecer.
A Mozal demonstra, segundo o estudo, uma das razões porque isto acontece. As altas receitas de exportação – A Mozal representam 30 por cento das exportações oficiais de Moçambique e a sua actividade económica gera aumentos nos valores globais de crescimento e exportações. Mas estes valores não estão a entrar na economia de Moçambique. Isto dá azo a perigosas falsas percepções. Por exemplo, a fim de pagar a dívida externa, as exportações são necessárias para gerar receita externa. Portanto, o FMI e o Banco Mundial aconselham o governo de Moçambique em relação à dívida que deve contrair, com base nos níveis de exportação. No entanto, as receitas de exportação verdadeiras que entram em Moçambique são muito mais baixas do que as apresentadas nestas análises, podendo levar a um perigoso aumento da dívida externa do governo.
O FMI diz que em 2012 o governo de Moçambique vai gastar 3.8% das receitas de exportação do país para pagar a dívida externa, 145 milhões/USD. Mas uma vez excluídas as receitas da Mozal que não entram no país, essa percentagem sobe para 5%.“É claro que, de modo nenhum todas as receitas de exportação que entram em Moçambique acabam nos cofres do governo”. Os investigadores estimam que apenas 15 bilhões/USD lá acabem em virtude de tributação directa e de lucro, embora mais do que isso possa lá acabar indirectamente. Para fazer pagamentos da dívida externa, o governo de Moçambique tem de usar a moeda estrangeira adquirida com as exportações.
O rendimento da Mozal que entra realmente no país, representa 6% dos 2.8 bilhões/USD das exportações de Moçambique. Assim sendo, é razoável dizer que os rendimentos da Mozal devem contribuir com 6% dos pagamentos do governo da dívida de Moçambique: 9 milhões/USD. Ou seja, dos 15 milhões/USD que o governo de Moçambique recebe de Mozal, cerca de 9 milhões/USD são necessários para cobrir o pagamento da sua dívida. (Redacção)
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