O impeachment a Fernando Lugo começou a ser tramado em 2008. Sem provas, destituição deveria “servir de lição a futuros governantes”.
Na quarta-feira 22 de agosto de 2012, poucas coisas em Assunção, capital do Paraguai, lembravam os dois meses da destituição do presidente em um julgamento-relâmpago que surpreendeu todo o continente. Grupos de homens jogavam dominó na Plaza de la Democracia, ambulantes ofereciam câmbio de dólares as turistas e estudantes uniformizados iam e vinham dos colégios em casarões coloniais; à parte algumas pichações nos muros chamando o atual presidente, Federico Franco, de golpista – “as paredes falam”, dizia uma delas – a vida seguia seu ritmo normal.
Na sede do movimento Frente Guazú, coalizão de esquerda que integrava o antigo governo, o clima não era muito diferente. Às quartas-feiras o presidente deposto, Fernando Lugo, costuma tirar folga; então não havia ali o costumeiro entra-e-sai de ex-ministros que ainda se reúnem diariamente com o ex-chefe. Foi na última hora que se improvisou a gravação de um “comunicado à nação” transmitido pela internet, uma espécie de continuação do discurso semanal que Lugo, quando presidente, realizava na TV Pública.
Sentado no seu pequeno escritório no mezanino do casarão – do outro lado da rua fica a residência presidencial, ocupada pelo seu ex-vice – e diante da bandeira paraguaia, Lugo estava relaxado, de camiseta vermelha e sandália de couro, brincando com sua equipe e a repórter da Pública, que aguardava para a última de três entrevistas com o ex-presidente. “Hoje faz dois meses que se executou no Paraguai um golpe de Estado parlamentar… Um golpe de Estado que não levou em conta a democracia participativa, não levou em conta o seu voto, a sua participação, a sua dignidade”, dizia, apontando para a câmera.
Apesar de ter sido o último presidente latinoamericano destituído do cargo, em um julgamento que levou menos de 24 horas para ser concluído, classificado como ruptura democrática por organizações regionais como Mercosul (Mercado comum do Sul) e Unasul (União de Nações Sul-Americanas), Lugo permanecia desconcertantemente tranquilo. “Eu o vejo muito bem”, comenta o militar que fazia sua escolta pessoal desde a época na presidência. “Parece que ele está até menos preocupado…”
Durante quatro anos, Lugo governou com o parlamento mais arisco da América Latina – apenas 3 deputados em 80 e 3 senadores em 45 eram da Frente Guazú – contando apenas com uma frágil aliança com o Partido Liberal de seu vice. “Não tínhamos quadro, não tínhamos apoio político, era só confronto”, resume, melancólico, numa tarde calorenta em sua residência na capital paraguaia. “Quando eles me elegeram em 2008, pensaram que eu seria o bobo deles, mas isso eu me nego a fazer”, diz referindo-se aos liberais, segunda maior força política no país. Entre frases pausadas, Lugo suspira: o poder, de fato, nunca foi totalmente seu. “Eu sabia que iria terminar assim”.
Representante da Teologia da Libertação, Fernando Lugo era conhecido como “o bispo dos pobres” até renunciar à batina em 2006. Bispo da diocese de São Pedro, uma das regiões mais pobres do país, coordenava as comunidades eclesiais de base e trabalhava diretamente com movimentos camponeses e sem terra. Ao optar pela política, foi suspenso pela igreja católica, mas seguiu sua trajetória aliando a aura religiosa com um discurso progressista em favor dos camponeses e da redistribuição de riqueza. A popularidade o consagrou e o Partido Liberal, arraigado em todo o país, forneceu a estrutura, abraçando uma oportunidade única de finalmente chegar ao governo, depois de seis décadas; a aliança, no entanto, seria arenosa.
Em abril de 2008, Lugo venceu por dez pontos percentuais, pondo fim a 60 anos de domínio do Partido Colorado, o mesmo do antigo ditador Afredo Stroessner.
Nada de novo
O fim repentino do governo Lugo não chegou a ser uma surpresa – basta ler a cobertura da imprensa paraguaia nos últimos 4 anos. Pouco depois da posse, em agosto de 2008, o termo “juízo político” – versão paraguaia do impeachment – passou a figurar repetidamente, de maneira quase banal, nas sessões do Congresso e nas páginas dos jornais diários. “Eu não tenho medo porque não encontro motivos lógicos, válidos, para que o presidente seja julgado politicamente pelo Parlamento Nacional”, ele declarou, já em fevereiro de 2009, em uma conferência de imprensa.
“Não cometi nem faltei à Constituição Nacional no desempenho das minhas funções”. Na época, não havia nenhum um motivo concreto para um impeachment, além do rumor de que o ex-presidente Nicanor Duarte Frutos tramava sua derrubada com o general Lino Oviedo, líder do partido direitista Unace, homem que tentara dar um golpe de Estado – militar – em 1996. Antes mesmo da posse, Oviedo apostava com o ex-presidente Nicanor Duarte Frutos que Lugo “ia durar apenas de 3 a 9 meses no cargo”.
A cada novo escândalo envolvendo o governo, ou Lugo, as duas palavrinhas voltavam à tona. Os partidários do ex-presidente contabilizaram 23 tentativas, por membros do Congresso, de utilizar o “juízo político”. No final de 2009 o senador liberal Alfredo Jaeggli, um dos mais aguerridos promotores da causa, falava abertamente à imprensa sobre um plano para destituir o presidente em seis meses, “antes que se fortaleça”. “Quero que este senhor se vá”, afirmava.
Dentro do partido liberal, pretensamente aliado no governo, o impeachment tinha um apoio de peso: Julio César Franco, o “Yoyito”, irmão do vice-presidente Federico Franco. Yoyito também fez suas apostas quando, na mesma época, surgiram notícias de que Lugo tivera três filhos enquanto ainda era sacerdote, o que gerou novo escândalo político. Yoyito disse a um repórter que o fato era “imoral”, mas não o suficiente para derrubá-lo. “Deve ser um fenômeno mais político”, afirmou. Aproveitando o momento, Federico Franco também falava abertamente sobre sua ambição de ocupar o cargo. “No domingo, fizemos uma entrevista em um café de manhã com o vice-presidente Federico Franco, que mal terminou de expressar o seu apoio a Lugo, nos lembrou que está capacitado para substituí-lo caso ocorra um eventual juízo político”, descreveu o jornalista Nicasio Vera, do jornal ABC Color, em dezembro de 2009, num editorial entitulado “A angústia de Federico”.
“Foi um pesadelo constante”, relembra o presidente deposto. “Trabalhávamos com muitas desconfianças e dúvidas sobre as suas intenções. Mas não havia outra alternativa”.
O governo Lugo desagradava grande parte dos congressistas. “Nenhum governo foi interpelado pelo Congreso tantas vezes quanto o nosso”, diz, suspirando, uma senhora baixinha e gordinha, de olhar firme e expressão cansada. Reconhecida dentro e fora do círculo de Lugo como sua melhor ministra, Esperanza Martinez foi titular da Saúde do primeiro ao último dia de governo. Em entrevista na sede da Frente Guazu, ela tenta lembrar quantas vezes foi prestar esclarecimentos diante dos deputados: “Olha, foram mais de 50 vezes, ao longo dos 4 anos… A cada 2, 3 semanas eu tinha que ir lá explicar gastos em recursos humanos, em tal licitação… Me ofendiam. Uma vez disseram que eu era muito gorda para ser ministra de saúde”. À frente da pasta, ela foi responsável pela maior – e mais sutil – afronta aos partidos que tradicionalmente governam a política paraguaia: saúde gratuita.
A busca pela universalização da saúde combatia de uma vez duas enfermidades: a corrupção dos funcionários, que guardavam parte da “caixinha” dos hospitais, e o clientelismo político. “Antes você tinha que ser filiado a algum partido para conseguir um leito no hospital, ou uma ambulância. Se tinha um problema de saúde, tinha que ir a um político local ou à sede do partido… O que fizemos foi devolver o serviço de saúde à população sem intermediação de partidos”. No Paraguai, a lealdade ao partido passa de pai para filho. Tanto que o Partido Colorado é um dos maiores, em número de filiados, da América do Sul: quase dois milhões. Já o Partido Liberal tem 1,2 milhão. Juntando os dois, dá quase metade da população total do país, de 6,5 milhões. Pra se ter uma ideia, o PMDB, maior partido do Brasil, tem 2,3 milhões de filiados; o PT tem 1,5 milhão.
Outro membro do governo que enfurecia colorados, liberais e proprietários de terra era o engenheiro agrônomo Miguel Lovera, que assumiu o Senave, Serviço Nacional de Qualidade e Sanidade Vegetal e Sementes em abril de 2010. Seu maior pecado foi decretar a resolução 660, que ditava normas para a aplicação de agrotóxicos, estabelecendo a necessidade de autorização para a realização de fumigações aéreas e terrestres e de avisar aos vizinhos com 24 horas de antecedência, indicando produtos a serem utilizados e grau de toxicidade.
O ex-diretor do Senave também comprou briga com o setor agroexportador, em especial da soja – o Paraguai é o quarto maior exportador mundial – ao aumentar os critérios para liberação do uso de agrotóxicos e cancelar vários registros cujos processos estavam incompletos. O setor conclamou um tratoraço – protesto em que tratores bloqueariam a estradas do país – para o dia 25 de junho. Não daria tempo.
Em um jogo de xadrez complicado para quem não conhece a política paraguaia, o ex-presidente contava, para não ser deposto, com o inusitado apoio do mesmo Partido Colorado, que não queria um impeachment que resultasse na posse do vice, liberal: “Os liberais nunca tiveram ajuda do Partido Colorado. Sempre tive certeza de eles não aceitariam um juízo político para colocar um liberal como presidente”, revela Lugo. “Os membros do Partido Colorado mesmos me diziam, ‘fica tranquilo, não vai ocorrer nada, eles não têm os votos sem nós…”.
A relação de Lugo com o seu vice era “tensa, para dizer o mínimo”, na visão da embaixadora americana Liliana Ayalde, que enviou mais de 15 comunicados a Washington sobre movimentações em prol de um impeachment, vazados pelo WikiLeaks. Em um país com uma institucionalidade frágil, a embaixada americana sempre foi um dos mais importantes centros de poder – e local favorito para as discussões sobre a destituição do presidente.
“Os tubarões políticos ao redor de Lugo continuam a rondá-lo em busca de espaço e poder”, escreveu Ayalde em 6 de maio de 2009. “Rumores dão conta de que o golpista General Lino Oviedo, o ex-presidente Nicanor Duarte Frutos, e/ou o Vice-Presidente Federico Franco continuam a procurar maneiras de encurtar o mandato de Lugo. A maioria das teorias se baseia em um impeachment contra Lugo, o que requereria 2/3 dos votos na câmara para fazer a acusação e 2/3 no Senado para condená-lo”, descrevia Ayalde, com precisão. “O resultado desta equação parece ser a própria versatilidade de Lugo e força (que tem nos surpreendido), a capacidade dos seus oponentes de executar um golpe democrático (que esperamos que não nos pegue de surpresa) e o fator do tempo”, concluía a embaixadora americana.
Minha amiga Ayalde
Início de agosto de 2012. No celular blackberry do já ex-presidente Fernando Lugo, brilha uma mensagem carinhosa, enviada de Liliana Ayalde para seu email pessoal. “Espero que você esteja bem. Votos de melhoras”. Lugo conversava com esta repórter no lobby do hotel Tripp, em São Paulo, onde estava hospedado para seguir o tratamento de um câncer linfático. Daí a mensagem de Ayalde.
Substituída na embaixada em 2011 – ela assumira o cargo 4 dias antes da posse de Lugo – Liliana subiu na hierarquia e hoje é responsável pelo Caribe, América Central e Cuba no departamento de Estado de Hillary Clinton. “Ela é minha amiga. Quer dizer, era minha amiga…”, disse Lugo, em tom hesitante. “Bom, ela me salvou. Muitos líderes de oposição iam a ela pedir que me tirasse do poder”.
Um documento de dezembro de 2008 descreve como. Apenas quinze dias depois da posse, Ayalde escreve sobre “um turbilhão de rumores e notícias exageradas na imprensa” sobre um golpe de Estado. As informações vinham de uma reunião entre Lino Oviedo, Nicanor Duarte, e o então presidente do Senado Enrique Gonzalez Quintana, também do partido Unace. Escreve Ayalde: “Gonzalez Quintana fez numerosas tentativas de contatar a embaixadora em 1 de Setembro, quando a história vazou. Consciente da vontade dos paraguaios de trazer os EUA para dentro das seus disputas internas, ela não atendeu aos telefonemas” diz o cable, cujo sugestivo título é “Rumores de golpe: apenas um dia normal no Paraguai”.
Três dias antes, Lugo havia jantado com Ayalde na sua residência, onde disse querer manter reuniões, “oficiais e não oficiais, de maneira discreta”, conforme documento do WikiLeaks. Entre comentários pessoais – contou que gostava de caminhar ao amanhecer, ouvir música e que tocava violão – ele usou a ocasião para testar a postura da nova embaixadora. “Lugo constatou que foi uma prática frequente na história do Paraguai que a embaixada se intrometesse em assuntos internos”, relata Ayalde. “A embaixadora agradeceu pela observação, e assegurou que estilos diferentes são apropriados para tempos diferentes, e que a sua intenção era respeitar a soberania do Paraguai e garantir o sucesso do então presidente”.
Um ano depois, o secretário-assistente do Departamento de Estado dos EUA para o hemisfério, Arturo Valenzuela, reiterou o apoio ao governo Lugo. Em visita ao país, depois de ouvir uma enxurrada de crítica dos parlamentares e comentários sobre o impeachment pendente – com a devida explicação de que não se trataria de um “golpe”, o americano encerrou o papo. “Valenzuela compreendeu que um processo constitucional de impeachment não é igual a um golpe, mas alertou que o Paraguai não deveria usar o impeachment como um mecanismo para resolver problemas de curto prazo sem considerar cuidadosamente as consequências”, relata outro cable, de 31 de dezembro de 2009.
A missão diplomática americana, claro, jamais fechou totalmente as portas para as vozes que pediam repetidamente a destituição de Lugo. Muitas vezes, os líderes da oposição eram fotografados pela imprensa ao sair, orgulhosos, de reuniões na embaixada. Poucos integrantes do governo ligavam; um deles, um fervoroso general nacionalista, foi o único a protestar veementemente. Caiu.
Cai o ministro da Defesa
É muito difícil apontar o exato momento em que o frágil equilíbrio de apoios ao governo Lugo ruiu. Mas pergunte a um general reformado, de olhos pequenos e gestos enfáticos, e ele precisará a o mês de fevereiro de 2010 como o começo do fim.
Bareiro Spaini foi o escolhido por Lugo para assumir o ministério da Defesa por contar com elevada reputação não só entre os militares mas também entre civis – foi o primeiro juiz de um tribunal militar, no Paraguai, a condenar à prisão outro general por corrupção. Era ele que aparecia ao lado do presidente em cadeia nacional, junto aos comandantes militares, nas repetidas vezes que os boatos de impeachment ganhavam força.
O general, como Lugo, vivia às turras com os parlamentares paraguaios, tendo perdido as contas de quantas vezes foi convocado pelo Congresso para prestar esclarecimentos. Quando reconta a história, deixa transparecer ainda uma irritação profunda. “Me interrogaram no Congresso muitas vezes”, diz Spaini. “Me chamaram por causa da vinda de um avião venezuelano ao aeroporto, sem haver passado pelos registros oficiais. Não importa se eu tinha ou não responsabilidade. Uma vez, me pediram explicações sobre uma jovem que foi morta no lado brasileiro e depois levada para o lado paraguaio da fronteira… E me perguntaram por que a bandinha militar de uma cidade onde há um quartel acabou, por que a cidade foi deixada sem sua bandinha!”
A tempestuosa relação com os parlamentares, relata Spaini, teve início em um jantar com os presidentes das comissões de defesa do Senado, o colorado Hugo Estigarribia, e da Câmara, Mario Morel Pintos. “Um deles me perguntou: ‘O que você pensa dos americanos?’ Eu gosto do povo americano, são gente boa, amável. ‘E o que você pensa de nos aliarmos aos americanos?’ Eu penso que não é possível, racionalmente falando, por causa da assimetria pronunciada entre os nossos países. O que interessaria a eles, uma super potência, que tipo de aliança estratégica estariam fazendo com o Paraguai? A não ser que fosse para ter uma base aqui. Por que me perguntam? ‘Porque pensamos que seria interessante convidá-los para que venham instalar suas bases aqui’’.
Spaini – conhecido por não medir as palavras – ficou profundamente ofendido com a sugestão: “Então, disse eu, de que soberania nacional estamos falando se o próprio Estado paraguaio não tem condições de defender o seu povo, o seu próprio território? Em que condições ficaria o glorioso exército paraguaio, como você diz? Não teria sentido a sua existência. É isso que vocês querem?”, vociferou o ministro. A relação azedou ali.
Mas aquilo era mais que um bate-boca acalorado. Era uma disputa que marcaria todo o governo Lugo. Spaini era abertamente favorável à formação da Unasul e de uma aliança militar regional, em detrimento de uma continuada aproximação militar com os EUA e a Colômbia tendo sido responsável por exemplo, pelo fim de um programa de treinamento que permitia a presença de militares americanos no Paraguai. “A melhor maneira de alentar qualquer possibilidade de conflito regional é incrementar a colaboração”, explica.
O mandato do incômodo ministro teve fim dois anos depois, com outro arroubo típico do general. Enquanto políticos oposicionistas – e liberais – continuavam tentando buscar apoio para o impeachment na embaixada americana, Bareiro foi o único ministro a protestar, com estardalhaço.
O estopim viria no dia 19 de fevereiro de 2010. Convidado para um almoço oficial, realizado na embaixada americana, o ministro enviou o seu vice, o general Cecílio Pérez Bordón. Lugo não estava presente. À mesa, a anfitriã Liliana Ayalde reuniu um grupo de generais americanos que visitavam o país, um general das forças armadas paraguaias, o vice-presidente Federico Franco e o senador colorado Hugo Estigarribia. Segundo o relato de Spaini, a embaixadora puxou o assunto. Spaini relata: “Franco, o senador e outro civil reclamaram das atitudes do ministro da Defesa. Depois passou-se ao tema do juízo político ao presidente. E os militares ali, só ouvindo. O vice-ministro então interveio, em guarani, dizendo que seria interessante mudar de assunto, discutir esses temas domésticos em outro lugar, pois era uma embaixada estrangeira…”
Ao sair do almoço, consternado, o general Pérez Bordón disse à embaixadora: “eu nunca passei tão mal em um almoço como neste. Informo que lastimavelmente não voltarei a pisar aqui”.
Pouco depois, Spaini escreveu uma carta expressando sua “inesperada surpresa, próxima ao incrível assombro” e afirmando que o evento poderia colocar em risco as relações entre os governos de Paraguai e dos EUA. Escrita em espanhol, a vaporosa carta foi enviada para a embaixada americana, com cópias para o Comando Sul das Forças Armadas Americanas e ao Pentágono. “Em particular, resultam inadmissíveis e intoleráveis as palavras de sentido panfletário e demagógico sobre ‘a péssima gestão administrativa do Presidente Fernando Lugo que o faz merecedor de um urgente e inegociável juízo político’”, dizia o texto (veja aqui e aqui o documento original).
Em alguns dias, a carta vazou para a imprensa – não de parte do governo, segundo o general. “Grosseira carta de ministro a embaixadora de EUA”, dizia o jornal conservador ABC Color, que publicou parte de seu conteúdo. Dentro do governo, o vice e os ministros liberais espumavam de raiva pela ofensa à representante americana. Lugo contemporizava. “A embaixadora, depois de uns dias, afirmou que era uma questão pessoal, que tudo estava superado… Mas o senador (Estigarribia) insistiu que se ofendeu a embaixadora, que se ofendeu um país amigo, que eu passei dos limites…”, lembra Spaini. “Aqui foram mais papistas que o papa”.
A gestão de Spaini durou apenas cinco meses depois do episódio. Sob pressão do Congresso – que se negou a aprovar o orçamento militar – o general renunciou. “Renunciei contra a vontade do presidente”, afirma. “Eu disse a ele que a única solução para essa situação era a minha saída, para não comprometer seu governo. E disse, em entrevistas a uma rádio, que eu estava convencido de que isso mirava ao presidente da República, e que o próximo seria ele.”
Em conversa com a Pública na sua casa, o general Cecílio Pérez Bordón – que assumiu a pasta de defesa após a saída de Spaini – não quis comentar sobre o fatídico almoço: “É um assunto já encerrado”. A primeira convidada a visitá-lo no gabinete depois da posse foi a mesma Liliana Ayalde. “Continuamos trabalhando, fazendo parcerias com eles”.
Mas e a promessa de nunca mais pisar os pés na embaixada? “Jamais pisei”.
De repente, uma matança: Curuguaty
15 de junho de 2012, meio dia. Fernando Lugo está em uma feira de exposição do Ministério da Educação, no centro de Assunção. Ele sabe que, naquela manhã, haverá uma desocupação de terras no distrito fronteiriço de Canindeyu, próximo ao município de Curuguaty. Tratava-se de um terreno de 2 mil hectares reivindicado pela empresa Campos Morumbi S.A., de propriedade de Blas N Riquelme, ex-presidente do Partido Colorado. Mas nada disso o preocupa; trata-se de uma desocupação corriqueira, mais uma entre dezenas que ocorreram durante o seu governo. “Quando subimos no helicóptero, Alcides Lovera ao meu lado, ele escuta na rádio que o irmão foi ferido. Quando chegamos à residência presidencial, ele já havia falecido”.
Erven Lovera, irmão do chefe de segurança presidencial que estava sempre ao lado de Lugo, foi o primeiro policial a tombar no episódio que ficou conhecido nacionalmente como “a matança de Curuguaty”, um trágico conflito entre polícia e sem-terra, durante a desocupação. Após um breve e confuso confronto, morreram outros cinco policiais e 11 camponeses. Tido como o grande responsável pela tragédia, Lugo foi destituído da presidência uma semana depois pelo Congresso Nacional.
“Eu disse a Lovera que fosse ficar com sua família e já comecei a me comunicar com todo mundo. Fiquei em comunicação contínua com o Ministro do Interior e a polícia. Naquele momento, nos dedicamos a socorrer os feridos e mortos. Foi a prioridade”, lembra Lugo. Havia dúvidas se o presidente deveria ir ao local imediatamente. Após algumas horas de incerteza, a ministra da saúde Esperanza Martinez pegou um avião para lá. Lugo não foi.
Em Assunção o chefe de gabinete da presidência, Miguel Lopez Perito, também ficou sabendo da matança através dos membros da sua escolta. “Foi casualidade, um militar me disse que houve um enfrentamento em Curuguaty e mataram o irmão do chefe de segurança de Lugo. E me disse: parece que há mais mortos”.
Apontado pela imprensa como um “capa preta” do governo, Lopez Perito foi correndo ao palácio de governo. “Aí tivemos uma reunião com os comandantes do Exército, da Armada e da Aeronáutica, e também com o chefe do gabinete militar, o comandante da polícia, o ministro do interior e alguns outros ministros”, lembra. “Eu disse: ‘Presidente, esse é o início do juízo político’”.
Perito não conseguiu convencer seus pares, nem o presidente, de que se tratava de um complô para destituí-lo, afinal. O clima no palácio ainda era de torpor quando, naquela mesma sexta-feira, os primeiros congressistas começaram a evocar as palavras “juízo político”. “Creio que as 17 mortes doeram muito ao presidente Lugo”, diz o ex-ministro do planejamento Hugo Royg. “Lugo por essência não é um ator político, é um ator eclesial, formado nesta lógica. Um ator que essencialmente escuta”.
Foi assim que, no xadrez luguista, ao amanhecer de sábado, enquanto o jornal ABC Color trazia a manchete “A República sofre uma de suas horas mais negras” com um editorial de capa que começava com “O presidente Lugo é o responsável por essa lamentável tragédia”, o presidente trabalhava para resolver a situação nomeando, como novo Ministro do Interior, um notório colorado: o ex-procurador geral da República Ruben Candia Amarilla. A escolha de Amarilla, desafeto dos movimentos sociais do campo, acirrou ainda mais os ânimos liberais, criou desconfianças dentro do governo e acabou por desagradar a todos.
Nos bastidores, alguns ministros trabalhavam para mostrar que haveria uma reação enérgica e que o crime não ficaria impune. O plano era formar uma comissão de “notáveis” que faria uma investigação paralela sobre o massacre, “dando mais transparência ao processo”, segundo Hugo Royg. Conseguiram a adesão de uma fazendeira da região de Canindeyu e de um renomado jornalista do diário ABC Color. Foi como jogar óleo à chama.
A iniciativa foi vista como uma afronta às forças policiais – ou foi assim que diversos oposicionistas se referiram a ela através da imprensa. Segundo Lopez Perito, o que estava em jogo era outra coisa: “Na segunda-feira, 18 de junho, tivemos uma reunião ao meio-dia onde estava o presidente do Partido Liberal, três senadores liberais, vários militares, a ministra de saúde, o procurador-geral da República… E estavam Emílio Camacho, assessor jurídico de Lugo, e eu. Foi na casa do senador (Alberto) Grillon. E aí o Blas Lano (presidente do Partido Liberal) disse que eles não podiam seguir sustentando este governo, porque não sabiam o que era que queria este governo”, lembra Perito. “Disse que se não lhes déssemos a chapa presidencial para 2013, se Lugo não lhes garantisse que eles iam pôr o candidato a presidente, não iam frear o juízo político na Câmara”.
“Bom, o que veio depois foi muito rápido”, diz. “Ligamos para os colorados, e alguns me diziam ‘isso é loucura, não se pode entregar o governo ao Partido Liberal”, lembra o ex-chefe de gabinete. Na ala colorada, diz ele, quem mais trabalhou pelo juízo político foi Horácio Cartes, empresário com terras na fronteira, pré-candidato à presidência em 2013 – e provável vencedor das eleições, segundo a revista americana The Economist.
Lugo seguia incrédulo e hesitante. Como sempre. “Mas também, como já haviam falado 23 vezes em impeachment em 3,5 anos, no Parlamento, eu acreditava que seria como nas outras vezes”, explica-se. Na quarta-feira, descreve Esperanza Martinez, “nós percebíamos que a temperatura estava subindo dentro do Partido Liberal. Já estavam mais distantes, muitos diziam que iam fazer o juízo político. Muitos de nós, os colaboradores, nos aproximamos do presidente, pedimos por favor que negociasse com eles. Ele tentou falar pelo telefone. Não atendiam”.
“Desta vez foi diferente, porque houve uma reunião dos líderes dos partidos políticos na quarta-feira, dia 20. Eu sabia. E aí fecharam…”, diz Lugo. Na mesma noite, com boa parte do seu gabinete ainda na residência oficial, Lugo foi dormir às 22h, como de costume.
A calma do ex-bispo, motivo de críticas constantes durante o seu governo, surpreendeu colaboradores próximos. “Ele já estava cansado, dizia ‘se querem fazer o juízo, que façam’”, conta um deles. “Mas isso, é claro, é uma observação pessoal. Não se entrega assim um governo”.
Quando foi dormir, Lugo contava, segundo as últimas pesquisas, com uma taxa de aprovação crescente: cerca de 40% dos paraguaios considerava seu governo bom ou muito bom em meados de 2011. Em julho de 2012, a taxa chegaria a 60%.
Acordou com o impeachment pendendo sobre sua cabeça.“Foi neste momento que soube que ia acabar”, diz.
Cai o bispo
Quinta-feira, dia 21 de junho foi, efetivamente, o último dia do governo do primeiro presidente de centro-esquerda a chegar ao poder na história do Paraguai. A Câmara dos Deputados já discutia o juízo político a todo vapor; naquela mesma noite, elaboraria e apresentaria o libelo acusatório, documento de acusação que embasaria a destituição. Com base nele, o Senado votaria como juiz, no dia seguinte.
Naquela manhã, José Tomas Sanchez, ministro da Função Pública, participava de um seminário junto com outros membros do governo. Sanchez, que era o ministro mais novo, não se lembra bem sobre o que falou. Lembra-se apenas que o telefone não parava de vibrar. “Um monte de ligações do ministério. E o telefone de todo mundo vibrava. Renunciou o ministro liberal. ‘Nossa senhora’, eu pensava. Os liberais estavam renunciando, um a um, e a gente vendo aquilo, na mesa do debate, era um desespero”.
Os principais ministros liberais, como Enzo Cardoso, da Agricultura, e Humberto Blasco, da Justiça e Trabalho, renunciaram por volta das 11 horas.
Na embaixada brasileira, a ficha caía naquela mesma hora. Até então, o corpo diplomático tivera cautela para não acionar a cúpula do Itamaraty, entretida nas negociações da Rio + 20, evento da ONU sobre meio ambiente que acontecia no Rio de Janeiro. “Achávamos que era só mais uma crise”, diz uma fonte do Itamaraty. “O que víamos era que não havia nenhuma relação direta do fato, entre o massacre de Curuguaty e o presidente”, Na quinta-feira de manhã, o alarme foi acionado. “Ao meio-dia eu liguei para a Dilma e o (Pepe) Mujica”, diz Lugo.
Na Rio+20, o chanceler paraguaio Lara Castro pediu uma reunião extraordinária da Unasul ali mesmo, no Rio Centro. “A verdade é que quando eu recebi a notícia, pelo telefone, não foi uma surpresa”, diz. As informações batiam com o tom de urgência repassado pela embaixada brasileira no Paraguai. A reunião foi presidida por Dilma Rousseff e contou com os presidentes José Mujica, do Uruguai, Rafael Correa, do Equador, Evo Morales da Bolívia, Sebastian Piñera do Chile e Juan Manuel Santos, da Colômbia. Naquela mesma noite, uma delegação de chanceleres dos países que compõem a Unasul – Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Chile, Guiana, Suriname e Venezuela – aterrissou em Assunção.
“Eu expliquei a eles que havia elemento de um golpe de Estado”, lembra Lara Castro. “Havia um processo tão acelerado, que seria condenável pela cláusula Ushuaia II”. A chamada “claúsula democrática”, assinada pelos presidentes dos países do Mercosul em dezembro de 2011, estabelece sanções aos países-membros em caso de ruptura democrática, desde a suspensão da organização até suspensão de tráfego aéreo e terrestre e de fornecimento de energia.
Lugo, como os demais presidentes, assinou a cláusula, mas diante da reação do Congresso, jamais o enviou para sanção. “Depois que assinamos a cláusula, a campanha pelo impeachment foi permanente na imprensa. Foi um bombardeio em janeiro e fevereiro, houve uma ameaça constante”, diz Lara Castro. “Os jornais nos chamavam de traidores da pátria, pediam juízo político a Lugo e interpelação a mim”.
A cláusula de Ushuaia 2, embora não tenha sido oficialmente sancionada, foi um dos cinco motivos, ao lado da matança de Curuguaty, apontados pela Câmara dos Deputados como causas da destituição. Foi também o instrumento usado pelos países vizinhos para suspender o Paraguai da Unasul e do Mercosul. Quatro meses depois, os deputados paraguaios a rechaçariam por ampla maioria, em clima de celebração.
Na TV, o embate final
Na noite da quinta-feira, 21 de junho, a Câmara dos Deputados apresentou a acusação formal que embasaria o impeachment. Lugo foi notificado às 18:10, dando à sua equipe de defesa 17 horas, noite adentro, para preparar a argumentação. Ao meio-dia da sexta-feira, diante dos 45 senadores, teria 2 horas para refutar as 5 acusações listadas no libelo acusatório.
Naquela noite, com o relógio em contagem regressiva, o deputado colorado Oscar Tuma, principal advogado de acusação, protagonizou um histórico embate com o advogado de defesa de Lugo, Antônio Ferreiro, ao vivo, pela televisão. Foi o mais extenso debate sobre o juízo político, acompanhado com avidez pelo público paraguaio. Foi ali que Ferreiro teve tempo de expor seu principal argumento: “Quando se tem 5 acusações, duas horas para a defesa é um fuzilamento”, repetia, irritado.
Em reposta, calmamente, o deputado Oscar Tuma explicava que “um juízo político geralmente se faz quando há mortes”. “Nós podemos aguentar muita coisa, viemos aguentando muitas coisas que estão nos ‘causais’ da acusação, que se deram anos atrás. Mas quando existem mortes…”. Para Tuma, não havia outro responsável pelos traumáticos eventos de Curuguaty: “Se você me perguntar quem é responsável por todas as mortes, eu vou responder: Fernando Lugo é responsável por tudo que estamos vivendo”.
Ferreiro, renomado jurista, chegou a dizer que pouco se importava que se julgasse o presidente. Sua irritação crescia ao longo do debate, enquanto gesticulava avidamente. “Vamos ter menos de meia hora para defender cada acusação. Para discutir a responsabilidade de um acidente de trânsito que não tenha sequer feridos temos mais tempo aqui no Paraguai. Para responder a um processo comum, de descumprimento de um contrato para construir uma muralha, tenho 18 dias”.
“Repito, porque isso é grave: estamos destroçando a vigência dos princípios jurídicos ocidentais no Paraguai. Isso nos vai custar caro”, disse, exasperado. “Esta crise vai levar 20 anos para se solucionar” – concluiu, exasperado.
O impeachment deve “servir de lição a futuros governantes”
Com apenas nove páginas, o documento que fundamentou o impeachment de Lugo é impressionante. (veja aqui uma cópia autenticada)
Segundo a Constituição paraguaia, promulgada em 1992, o presidente, ministros, o procurador-geral da República, o controlador-geral os integrantes do Tribunal Superior eleitoral podem ser destituídos pelo Congresso por “má gestão” – acusação usada contra Lugo. Os fundamentos apresentados são cinco.
Primeiro, o Congresso acusa Lugo pela realização, em maio de 2009, do II Encontro Latinoamericano de Jovens pela Mudança, realizado no Comando de Engenharia das Forças Armadas. O fato, considerado gravíssimo e tachado como “ato político” no seio das Forças Armadas, causou ainda mais consternação porque os jovens alçaram uma bandeira de Che Guevara durante o encontro.
A seguir o libelo lista o que chama de “caso Ñacunday”, referindo-se a diversas ocupações de terras realizadas no distrito de mesmo nome, próximo à fronteira com Brasil e Argentina.
O documento diz que o governo de Lugo é “o único responsável como instigador e facilitador das recentes invasões de terra na zona”. A acusação remete à candente questão fronteiriça. Após a promulgação de um decreto presidencial em outubro de 2011, que determinava que terras a 50 km das fronteiras não podem, por lei, pertencer a estrangeiros, o Congresso acusa o governo Lugo de ter “ingressado em imóveis de colonos, sob o pretexto de realizar o trabalho de demarcação da franja de exclusão fonteiriça”, mas na realidade para permitir que a Associação Nacional de Carperos (sem-terra) comandasse o exército. A acusação, afinal, é de que Lugo “utiliza as forças militares para gerar um verdadeiro estado de pânico na região”.
Pior: o presidente “se mostrava sempre com portas abertas aos líderes dessas invasões” como José Rodriguez e Eulálio Lopes, dirigentes da Liga Nacional de Carperos, e Victoriano Lopez, líder camponês da zona de Ñacunday. Ao reunir-se com eles, na visão da Câmara de Deputados, Lugo estava “dando uma mensagem clara” sobre seu “incondicional apoio” a “atos de violência e comissão de delito”. Ou seja: a acusação contra Lugo é de manter diálogo com lideranças camponesas.
O terceiro ponto listado é descrito, genericamente, de “crescente insegurança”. Segundo a Câmara dos Deputados, “ficou mais que demonstrada a falta de vontade do governo de combater o Exército do Povo Paraguaio” – a pequena guerrilha que se situa no norte do país. “Todos os membros desta honorávelCâmara de Deputados conhecemos os vínculos que o presidente Lugo sempre manteve com grupos de sequestradores” da ala militar do EPP, prossegue o documento, sem maiores detalhes.
Além disso, argumenta a câmara, Lugo e seus ministros agiram de forma “absolutamente equivocada” ao tratar da matança de Curuguaty. O crime? “Tratar de maneira igual policiais covardemente assassinados e aqueles que foram protagonistas destes crimes” – os primeiros seriam os policiais e os segundos, camponeses.
A cláusula democrática de Ushuaya II é descrita, em letras garrafais, como “UM ATENTADO CONTRA A SOBERANIA” do país. “A principal característica do Protocolo de Ushuaia II é a identificação do Estado com a figura dos presidentes para, em nome da ‘defesa da democracia’, defenderem uns ao outros”.
A seguir, vem o último e mais extenso ponto, a matança de Curuguaty, cuja introdução estabelece que o presidente “representa hoje o que há de mais nefasto para o povo paraguaio”.
“Não cabe dúvida que a responsabilidade política e penal dos trágicos eventos registrados recaem sobre o presidente Lugo”. Os deputados reiteram sua certeza de que o conflito de Curuguaty foi premeditado, e de que as forças de segurança foram vítimas de uma “emboscada” armada no local.
Junto a essas gravíssimas suspeitas, que se confirmadas mais que justificariam o impeachment de um presidente em qualquer país democrático, a acusação não apresenta nenhuma – nenhuma – evidência. Explica o documento: “todas as causas mencionadas acima são de pública notoriedade, motivo pelo qual não necessitam ser provadas, conforme o nosso ordenamento jurídico”.
Vai além. “Todas as evidências, que são públicas, demonstram que os acontecimentos da semana passada não foram fruto de uma circunstância derivada de um descontrole ocasional, pelo contrário, foi um ato premeditado, onde se emboscou as forças da ordem pública, graças à atitude cúmplice do Presidente da República”, diz a parte final da acusação. Que conclui com um alerta: Lugo “não somente deve ser removido por juízo político como deve ser submetido à justiça pelos fatos ocorridos, a fim que isso sirva de lição a futuros governantes”.
Leia amanhã: A deposição vista do palácio. A ordem do dia era condenar Lugo; a postura dos militares paraguaios; a ligação de Franco para a embaixada brasileira; a ignorada missão dos chanceleres; os rumores de um derramamento de sangue; e o que fez Federico Franco ao tomar posse.
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