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A história da aterragem à força na Turquia de um avião sírio com 17 cidadãos russos a bordo foi entusiasticamente prosseguida por Washington.
“Apoiamos totalmente a decisão do governo da Turquia de deter o
avião”, disse a representante oficial do Departamento de Estado dos EUA,
Victoria Nuland. A senhora Nuland até acho necessário acrescentar que “quaisquer
fornecimentos de equipamento militar ao regime sírio neste momento causam
preocupação”.
Surge a questão: Porquê? A Síria continua a ser um país soberano,
membro da ONU, tem o direito de assinar contratos militares com os outros países
soberanos. Não obstante, a senhora Nuland agarrou-se às declarações bastante
nebulosas dos funcionários turcos, que teriam alegadamente encontrado a bordo
equipamento militar. “Estamos aguardando uma resposta do lado turco, quando eles
examinarem minuciosamente a carga apreendida,” disse Victoria Nuland.
Surge nova questão: Examinar o quê? Por que é que a parte turca,
no dia a seguir à detenção do avião, não mostrou a carga existente a bordo que,
na sua versão, teria caráter militar?
A agência noticiosa RIA Novosti já citou um representante
dos serviços secretos russos, que manifestou dúvidas quanto ao avião poder
transportar armas de contrabando.
“Se a bordo do avião civil sírio seguisse uma carga diretamente
militar, a parte turca já a teria mostrado aos jornalistas. Em todo o caso,
seria mostrada de manhã à noite por todos os canais turcos. Se tal não acontece,
então o problema dos alegados fornecimentos de armamentos russos à Síria por
meio de um avião civil não passa de desinformação”, disse.
Segundo o representante, a bordo da aeronave poderiam seguir
equipamentos electrónicos, tipo GPS, que são utilizados para vários fins,
incluindo militares.
“Hoje em dia, qualquer equipamento electrónico pode ter dupla
utilização”.
Surge uma situação semelhante à da América Latina, em que os
aliados dos EUA recebem todas as armas que querem e instalam bases americanas
nos seus territórios, ao passo que os governos "inconvenientes", como o cubano, são alvos de sanções por decisão do
Departamento de Estado.
Aliás, a declaração do Departamento de Estado ainda não é a
opinião dos Estados Unidos. Quer nos EUA, quer na Turquia, a opinião pública
começa a pouco e pouco a resistir à propaganda militar, voltada abertamente para
justificar a intervenção na Síria das tropas turcas ou de forças de outros
países da OTAN.
“Quem fala de contrabando entre a Síria e a Rússia?”, pergunta o
leitor David no fórum da versão electrónica do New York Times, onde se discutiam
as notícias sobre o avião sírio. “A Rússia não precisa de utilizar meios ilegais
de fornecimento de armamentos... Não há nenhum embargo da ONU ao fornecimento de
armas à Síria. Pelo contrário, é a Turquia e os outros membros da coligação
anti-Assad que violam o direito internacional. De que forma? Pelo facto de
apoiarem financeiramente e diplomaticamente, para além de terem ainda armado, um
grupo de pessoas que leva a cabo uma operação perfeitamente ilegal de mudança de regime num país-membro da
Organização das Nações Unidas”.
Interessante o facto de as próprias autoridades turcas não
esconderem os seus próprios fornecimentos de armas à Síria, que incluíram,
nomeadamente, 20 sistemas de mísseis móveis. O que acontecerá se estes mísseis
forem parar às mãos dos combatentes da Al-Qaeda que, segundo dados de diversos mídia,
incluindo o New York Times, estão realmente presentes entre os
opositores ao governo sírio? Qualquer destes sistemas em mãos de terroristas é
uma terrível ameaça à aviação civil.
O jornal francês Le Figaro, na sua edição na semana
passada, relatou o esquema pelo qual armas provenientes da Turquia chegam aos
opositores sírios. De início, a Turquia recebe dinheiro para apoio aos rebeldes
sírios proveniente das monarquias do Golfo Pérsico, principalmente o Qatar e a
Arábia Saudita. Com este dinheiro são adquiridas armas no mercado negro. Depois,
estas armas são enviadas, naturalemnet de forma ilegal, aos rebeldes islamistas
na Síria.
O jornalista do Le Figaro, Georges Malbrunot, vencedor de
vários prémios de imprensa e que se tornou conhecido por ter sido refém dos
islamistas durante muito tempo no Iraque, reproduz a opinião de cidadãos turcos
de que Ancara tenta transformar a Síria em um novo Afeganistão. “A atual
situação permite à Turquia como que supervisionar o fluxo de armamentos que
entra na Síria, incluindo não só metralhadoras, mas também mísseis antitanque,
bem como mísseis terra-ar, capazes de abater aviões”, escreve o jornalista em
conclusão.
Agora a Turquia, com o apoio dos EUA, quer “ensinar” a Rússia a
não enviar armas para a Síria, como se ela própria não o praticasse. Faz lembrar
a expressão bíblica: “Médico, cura-te a ti próprio”.
Aliás, os últimos acontecimentos no Oriente Médio mostram que a
aspiração da Turquia de ser a única força decisiva e com peso no drama sírio é
tão impossível como é impossível hoje em dia o monopólio dos armamentos
ocidentais nos mercados do Oriente Médio.
O novo primeiro-ministro iraquiano, Nuri al-Maliki, durante a sua
visita a Moscou na semana passada, não só assinou com a Rússia contratos de
fornecimento de helicópteros militares e sistemas anti-aéreos no valor de 4,2
bilhões de dólares, como também condenou uma possível agressão da Turquia à
Síria.
“Não devemos desencadear uma guerra por causa dos incidentes na
fronteira, e chamar toda um organização internacional como a OTAN a defender a
Turquia. Ninguém ameaça a Turquia”, disse o responsável iraquiado em entrevista
à agência Interfax. Ele acrescentou ainda que a Turquia tem um comportamento
extremamente arrogante quando “assume a responsabilidade pela resolução dos
problemas da Síria em substituição do povo sírio”.
“A comunidade mundial deverá intervir e fazer parar a Turquia”,
disse Nuri al-Maliki, considerado segundo opinião geral o líder incontestável no
Iraque, país onde o governo é dominado por muçulmanos chiitas.
A Al-Qaeda, de orientação
sunita, embora continue a levar a cabo atentados terroristas no Iraque e na
vizinha Síria, está fora da lei no Iraque, sendo as suas posições neste país
muito mais fracas do que entre os rebeldes sírios apoiados pelo Ocidente.
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