Numa recente reunião entre pais e responsáveis da Escola Portuguesa de Luanda (gravada em vídeo), expressa-se o desejo de que apenas sejam contratados professores portugueses, excluindo-se os candidatos angolanos. A verificar-se esta política de contratação, trata-se de puro racismo contra os angolanos dentro do seu próprio país. Um caso como este merece a atenção urgente do governo, que aqui, sim, estará a defender não só um valor ético fundamental, como também a soberania e a dignidade angolanas.
por MOIANI MATONDO
por MOIANI MATONDO
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Vimos uma recente gravação em vídeo de uma reunião de pais com responsáveis da Escola Portuguesa de Luanda. Durante a reunião, uma mãe dirige-se aos responsáveis da Escola e queixa-se da falta de professores portugueses. Segundo ela, angolanos disponíveis haverá sempre muitos, mas os pais e a escola querem professores portugueses, por se tratar de uma escola portuguesa. Fica-se com a suspeita de que a política de recrutamento da escola consiste em contratar apenas professores portugueses, excluindo os angolanos. Uma espécie de foro privado luso na Angola moderna.
Sejamos angolanos ou portugueses, não podemos deixar passar em branco esta manifestação absurda de racismo. Há que condená-la e exigir aos governos angolano e português que supervisionem as regras de contratação desta escola e tomem as eventuais medidas necessárias.
O discurso da mãe da Escola Portuguesa tem implícito o seguinte raciocínio simples: os professores portugueses são bons, os professores angolanos são maus, por isso, só queremos portugueses. Se temos uma vaga para professor e temos mil professores angolanos a concorrer, não a vamos preencher. Só a preenchemos com professores portugueses.
Se isto não é racismo, o que é o racismo? Estamos perante a mais assombrosa discriminação com base na nacionalidade, uma espécie de apartheid actual.
A Escola Portuguesa de Luanda é detida por uma cooperativa sem fins lucrativos denominada Cooperativa Portuguesa de Ensino em Angola, C.R.L. Trata-se de uma pessoa colectiva portuguesa. A escola foi reconhecida pelo Ministério da Educação português em 1986 e pelo Ministério da Educação de Angola em 1993. Hoje funciona ao abrigo de um protocolo entre os dois Estados e, embora a gestão pertença à cooperativa, as instalações são propriedade do Estado português.
Em termos jurídicos, é por isso uma figura híbrida entre o público e o privado, o angolano e o português. O que não é de todo híbrido é a proibição da discriminação racista entre angolanos e portugueses. Quer o ordenamento jurídico português, quer o angolano proíbem explícita e incondicionalmente o exercício de discriminação racista em qualquer contexto.
O recrutamento de professores nesta escola, como noutras, deve obedecer ao princípio da igualdade. Para cada vaga, deve ser escolhido o/a candidato/a com as qualificações mais adequadas, independentemente da nacionalidade. Acresce que os angolanos falam português. Muitos estudaram em Portugal, outros em Inglaterra, outros na Rússia ou em Cuba, e nunca se lhes conheceu qualquer capitis diminutio (incapacidade para exercer qualquer direito ou função). Assim, distinguir entre portugueses e angolanos, ainda por cima em Angola (!), é inaceitável.
Aqui está uma situação em que João Lourenço, sempre tão cioso das prerrogativas da soberania angolana no caso de Manuel Vicente, deve agir. Para começar, deve exigir explicações ao governo português em relação aos comportamentos racistas na sua escola em Luanda e indagar acerca das suas intenções correctivas. Se as explicações não forem satisfatórias, ou se Portugal não der garantias de que o racismo não será mais tolerado, deve proceder à nacionalização da escola. Pois é inaceitável existirem ilhas de racismo e de apartheid lusitano em Luanda.
Lembremos Diogo Cão, que, ao chegar à foz do Congo, foi tratado e tratou com respeito e cortesia os príncipes locais. Mais tarde esta cordialidade foi estragada, e houve sempre entre os portugueses uma tensão entre os que estabeleceram boas relações, procurando simultaneamente o melhor para si e para o outro, e os que se dedicaram à exploração, ao domínio e ao mercenarismo em Angola. São estes últimos que actualmente prevalecem – basta ver a cumplicidade lusa nos desmandos da oligarquia angolana.
É desde há muito dever de angolanos e portugueses combater as más práticas: o racismo, a corrupção, o mercenarismo.
Por isso, há que averiguar se existem práticas de racismo no recrutamento na Escola Portuguesa de Luanda e, em caso afirmativo, tomar medidas vigorosas para erradicar esse racismo. Angolano ou português, um professor bom, com as qualificações adequadas, deve ter direito a ser contratado.
É muito mais importante defender a soberania e a dignidade angolanas neste caso do que na infeliz situação de Manuel Vicente.
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