segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

Nos deixam dançar ao som do batuque dos vocábulos, mas a Maçaroca não deixam comer!


Assinantes: Bitone Viage & Ivan Maússe
PS: Sabe-se que, o batuque e a maçaroca são dois símbolos constantes na bandeira do partido no poder – a Frelimo. Enquanto o batuque liberta o som e os seus vocábulos para entreter a sociedade com cânticos heroicos e discursos triunfalista que escamoteiam a verdade, um grupo de indivíduos se delicia da maçaroca, e o povo já cansado de dançar, se apercebe que não existe mais maçaroca para colheita.
Parte I
Dança ao Som do Batuque dos Vocábulos
1. Caríssimos, não há sombras de dúvidas de que o Presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi, inaugura uma nova fase da nossa história, caraterizada tanto por discursos, bem como por informes estruturalmente válidos, quanto retóricos e por que não demasiadamente didáticos e pedagógicos.
2. O discurso de Sua. Excia proferido aquando da sua tomada de posse em Janeiro de 2015 foi a demonstração clara da inauguração desta fase. Aliás, desde o beat da campanha “Eu Confio em ti, Nyusi” já se previa que entraríamos numa fase em que as nossas almas dançariam ao som do batuque dos vocábulos e de lindas letras.
3. O beat usado na campanha eleitoral no ano 2014 por parte do partido Frelimo, até aos dias de hoje habita sem ser corroído pelo esquecimento nas nossas mentes, tudo isso devido a linda letra que acompanha o mesmo. Um beat de que, sem discernir idades e gerações, todos nos maravilhávamos por ele. Ah, uma febre!
4. Caríssimos, até hoje, os moçambicanos se sentem maravilhados pelo belíssimo discurso de tomada de posse proferido pelo chefe de Estado. Não há canto em Moçambique, e quiçá no mundo, que não conhecem as célebres expressões "No meu coração cabe à todos moçambicanos", seguida por "O povo é o meu patrão" e finalmente "Boas ideias não têm cor partidária"!
5. Podem crer que, mesmo passados dois anos o povo ainda vive sob feitiço daquelas expressões. É extremamente difícil se esquecer delas, pois para além do feitiço por elas criado, o nosso nível de expectativas aumentou em relação ao Presidente da República e ao Governo por ele formado.
6. Enquanto ainda nos deliciávamos das lindas expressões do discurso de Sua. Excia (2015), já em 2016, o feitiço aumentava ainda mais, isso quando o informe Geral de Estado veio adicionar até mesmo no vocabulário dos aproximadamente 44% de moçambicanos analfabetos, a célebre expressão, "O Estado da Nação é Firme".
7. Não tardou para que este ano, ao som do Batuque de um novo vocabulário, dançássemos ao ritmo de um "Estado desafiante e encorajador". Caríssimos, se esse todo vocabulário enchesse a barriga, ou matasse a sede e aumentasse o nível de alfabetizados no país, não teriam dúvidas de que o nosso povo seria o melhor nutrido e alimentado pelo mundo.
Parte II
Mas a Maçaroca Não Deixam Comer!
1. Lembremos que, aquando da nossa independência, uma das grandes promessas feitas ao povo é que teríamos um Estado inclusivo e paternalista, onde as oportunidades seriam racionalmente partilhadas, isso para que a nossa independência não constituísse uma propriedade privada.
2. Acreditávamos que pudéssemos ser emancipados e glorificados pelo espírito de pertença e de patriotismo. Mas não! Fomos glorificados pela proliferação da fome, analfabetismo, desemprego, desnutrição e de mais desgraças.
3. Nesse texto tratamos a maçaroca como sendo os seis (6) itens abaixo descriminados;
* Qualidade no Ensino;
* Habitação;
* Emprego;
* Saúde;
* Acesso à Justiça;
* Paz.

4. Preferimos elencar estes seis (6) itens por considera-los como sendo as variáveis necessárias para analisarmos o último informe do Chefe do Estado sobre a Situação Geral da Nação.
5. Não sabemos como considerar encorajador um ano que herdou e, infelizmente, não conseguiu contornar uma taxa de 44% de analfabetismo pelo país. Aliás, na mesma senda, notamos que desde que fomos signatários dos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio em 2000, parece que a nossa preocupação foi de ter mais crianças no ensino formal, no lugar de proporcionar qualidade no próprio ensino.
6. Infelizmente, com essas taxas, alinhamos na lista dos países com a população mais analfabeta do mundo. Será isso encorajador Sua. Excia ao ponto de sermos resilientes? Talvez possa ser encorajador sim, mas para uma parte que vê ganhos com essa taxa, as usando como projecto político, sendo que, quanto maior for o número de analfabetos que o país tiver, mais serão as chances de sermos explorados e aldrabados e no fim acarinhados por expressões motivações.
7. Como é possível Sua. Excia, termos um país encorajador com o grosso da juventude sem casa própria? Por que o governo que Sua Excia. dirige não consegue prover políticas habitacionais, estas que possam ir de encontro ao rendimento que a juventude aufere? Será que ao relento seremos tão resilientes, ó Sua Excia?
8. Como será possível Sua. Excia., sermos resilientes num Estado onde as casas construídas pelo Fundo Público são para uma juventude que nem perfaz a taxa dos que realmente precisam das mesmas habitações e, acima de tudo, não pagam mensalidades para garantir o retorno do fundo como forma de gerar novos projetos?
9. Sua. Excia., sinceramente falando, não sabemos até que ponto, apenas o cidadão pacato deve ser resiliente face à um sistema de saúde precário, ao passo que os que colaboram para a elaboração dos seus discursos com um vocabulário triunfalista, recorrem à países vizinhos à busca dos melhores sistemas saúde.
10. Sua. Excia., a resiliência que tanto apela no seu lindo informe não pode ser seletiva: ou sejamos todos resilientes proibindo a emigração de doentes (falamos daqueles que fazem parte do governo e dos altos cargos do Estado), como mecanismo de incrementar, à nível nacional, o estabelecimento de um bom sistema de Saúde.
11. Sua. Excia., como pretende que sejamos resilientes face à um sistema Judiciário que age como serpente e que somente pica aos pés descalços? Um sistema Judiciário que não consegue punir o crime mais “hediondo” da nossa história como um Estado independente e soberano, um crime que colocou a economia do Estado numa situação catastrófica.
12. Sua.Excia., há 9 anos o nosso Produto Interno Bruno teve um crescimento histórico de 7 a 8%, algo que desde a nossa independência não havíamos experimentado, mas não demorou para que, motivados pela ganância e falta de patriotismo, limpassem tudo à favor da satisfação de apetites privados. Afinal, onde está a Justiça para fazer jus à essa questão?
13. Sua. Excia é quase que utópico ser resiliente num sistema judiciário que protege aos que deveriam ser responsabilizados por um saque que humilhou os quarenta e dois (42) anos da nossa independência nacional e da luta pela reconstrução económica do país.
14. Hoje não produzimos porque o dinheiro para a compra de matéria-prima, os indivíduos abecedário não sabem do seu paradeiro e muito negam que sejam os culpados, e sendo assim, deveria ser tarefa do judiciário investigar o paradeiro deste dinheiro, mas infelizmente o mesmo sistema também não é resiliente. Como seremos resilientes?
15. Sua.Excia, temos atenciosamente feito um acompanhamento das suas investidas na busca da propalada paz, mas, infelizmente, esses resultados não são satisfatórios, pois, os que ganham beliscando a paz não é o povo, mas sim o partido Renamo e algumas elites da Frelimo que muito se confundem com o Governo e Estado.
16. Desde a data do nosso nascimento em 1992 – nós, os articulistas deste texto – ano em que foi assinado o Acordo Geral de Paz nunca vimos o Partido Renamo pegar em armas e pressionar o Governo para construir estradas, escolas, hospitais, laboratórios de pesquisas, pontes, entre outras iniciativas para o bem social.
17. As armas, em muitos casos, só são pegas quando for para a revisão do pacote eleitoral. Será que os cerca de 26 milhões de moçambicanos fazem parte destes órgãos? Como ser resiliente dentro de um processo que é negociado para simplesmente beneficiar os interesses das partes? É deveras difícil ser resiliente num Estado quase que já privatizado.
In Moçambique, a terra do vocabulário e da maçaroca que não nos deixam morder!
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5 comentários
Comentários
Dércio Tsandzana Se dissesse o contrário estaria a ser contra-producente, este é um texto bem conseguido. Para mim, conforme deixei claro no dia do informe, é difícil fazer a análise de uma recitação lida na base de uma metodologia confusa. 

Aliás, sempre deixei claro que não se pode continuar com aquele tipo de informes, não se pode usar o Parlamento para "despejar" discursos e ir embora, ali é para se debater.
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Euclides Flavio Vocês falam muito pha. Kkkkkk "é dificil fazer uma a analise de uma recitação lida na base de uma metodologia confusa" 

Kkkkkkk
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Ivan Maússe De facto, caro Dércio Tsandzana, o Parlamento não pode servir de plateia para, impávida, receber o que o PR traz, senão este nem precisava de ir ao Parlamento.

Ou seja, da Presidência podia muito bem ler os seus informes, ou então, ir à TVM e outros canais de televisão e rádio, deixar o disco da gravação do informe e estes passariam para o povo na sua programação.
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Dércio Tsandzana Deixar o disco de gravação 🙂, xeque-mate.
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Ivan Maússe Ainda ontem, o meu Mestre Albano Macie, em comentário a um post meu e do Bitone, justificou que:

"A solenidade da cerimónia de apresentação do informe anual sobre o estado geral da nação deve-se, fundamentalmente, aos actos de indisciplina, falta de r...Ver mais
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Dércio Tsandzana Percebo, mas tenho uma outra visão. O Parlamento não é só lugar de consensos, o debate é também discórdia.
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Ivan Maússe Kkkkkkk Euclides Flavio! Falar muito e fazer pouco é o que fomos ensinados a fazer com excelência neste país. Aliás, tudo se evidencia ao mais alto nível.
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Ivan Maússe De facto, Dércio Tsandzana. Aliás, a própria CRM consagra como um dos objectivos do Estado moçambicano o respeito e promoção do pluralismo de expressão.

Portanto, nada mais justo do que começarmos dalí mesmo do Parlamento enquanto orgão de soberania fastor das leis, incluindo da própria CRM.

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