Estejamos claros numa coisa: ninguém, e é preciso sublinhar
isto, ninguém mesmo, em pleno gozo de uma saúde mental
clinicamente comprovada irá alguma vez se pronunciar
contra o difícil e reconhecido trabalho que a nossa polícia
tem realizado no combate ao crime violento que vezes amiúde tem tomado conta dos nossos principais centros urbanos, com particular incidência para os bairros periféricos das cidades de Maputo e Matola.
Estes bairros são os que acolhem a maioria dos que se consideram habitantes destas cidades, criando ainda uma intensa interacção entre os seus centros mais urbanos (o chamado cimento) e os meios rurais e semi-rurais que as circundam.
São estes bairros que fornecem a mão-de-obra que faz funcionar as duas cidades e oferece conforto às elites nelas residentes. Há quem trate toda esta massa de gente com o pior desprezo, mas basta fechar todas as entradas à cidade de Maputo ou da Matola por apenas um dia para tirar teimas.
Então, como que num sistema de vazos comunicantes, é importante que a segurança destas pessoas seja garantida, nem que seja pela necessidade de garantir que estas cidades continuem a funcionar com alguma regularidade. É por isso de todo condenáveis os actos de violência brutal que têm sido perpetrados contra cidadãos inocentes residentes nos bairros periféricos de Maputo e outras cidades do país. E é importante encorajar o trabalho da polícia nessa frente, assim
como lutar para que a corporação seja dotada dos meios necessários para que ela seja bem sucedida na sua missão de combate ao crime. Mas o combate ao crime, e a luta que aí se trava contra os criminosos deve obedecer a regras que fazem parte do manual de actuação da polícia. A existência de instituições de formação de polícias, incluindo ao nível superior, visa precisamente criar as condições necessárias
para que a polícia seja capaz de actuar dentro dos limites impostos pela Constituição e outras leis que compõem o nosso edifício democrático.
Qualquer actuação da polícia fora destes limites é matéria para pôr em perigo a nossa própria segurança colectiva. Suspender a Constituição e a lei para lidar com conjunturas momentâneas, fora dos procedimentos estatuídos na própria lei, cria o ambiente propício para o estabelecimento de um regime de anarquia, onde cada um resolve as suas disputas conforme as suas necessidades e conveniência. Ser polícia não significa apenas envergar uma farda, pegar numa
arma e pôr-se à rua. Infelizmente é esta a concepção que se tem da nossa polícia. Pior ainda, é assim que os seus dirigentes querem que ela continue a ser; um conjunto de guerreiros valentes que não levam prisioneiros para o quartel.
E foi assim que há cerca de duas semanas, sete indivíduos, supostos perigosos cadastrados em alegada confrontação com a polícia, foram abatidos em plena via pública. E toda a história ficou por aí. Não estando vivos para darem a sua versão dos acontecimentos, quem é que vai colocar a polícia na sua defesa?
Exasperados com a onda de crime que nos apoquenta, todos nós aplaudimos este tipo de acções porque acreditamos que justiça pelas sevícias de que somos alvos está a ser feita. Quando o crime violento nos bate à porta, é compreensível largar o benefício da dúvida a favor dos que têm a tarefa de combater os criminosos.
E mais, com uma polícia a reclamar a exiguidade dos meios que são colocados à sua disposição, a queixar-se de baixos salários em proporção com a sua missão tão perigosa, senão mesmo do perene conflito existente entre a polícia e os tribunais, estes que soltam criminosos sobre quem a polícia não tem reservas quanto às suas acções criminosas, não há como não nos solidarizarmos com esta classe de verdadeiros heróis. Também não podemos sugerir que ela fique a assistir ao espetáculo quando os atrevidos criminosos confrontam
os nossos agentes com armas de fogo. Eles têm todo o direito de se defender com a mesma (ou maior) poder de fogo.
O reverso da moeda, porém, é que hoje podemos celebrar quando a polícia massacra legiões de supostos gangsters na rua porque estamos exasperados com a alta onda de criminalidade. Mas devemos também estar preparados para amanhã termos que lidar com uma situação em que a polícia dirá que o deficiente funcionamento dos tribunais justifica que estes sejam substituídos pela lei do cano.
isto, ninguém mesmo, em pleno gozo de uma saúde mental
clinicamente comprovada irá alguma vez se pronunciar
contra o difícil e reconhecido trabalho que a nossa polícia
tem realizado no combate ao crime violento que vezes amiúde tem tomado conta dos nossos principais centros urbanos, com particular incidência para os bairros periféricos das cidades de Maputo e Matola.
Estes bairros são os que acolhem a maioria dos que se consideram habitantes destas cidades, criando ainda uma intensa interacção entre os seus centros mais urbanos (o chamado cimento) e os meios rurais e semi-rurais que as circundam.
São estes bairros que fornecem a mão-de-obra que faz funcionar as duas cidades e oferece conforto às elites nelas residentes. Há quem trate toda esta massa de gente com o pior desprezo, mas basta fechar todas as entradas à cidade de Maputo ou da Matola por apenas um dia para tirar teimas.
Então, como que num sistema de vazos comunicantes, é importante que a segurança destas pessoas seja garantida, nem que seja pela necessidade de garantir que estas cidades continuem a funcionar com alguma regularidade. É por isso de todo condenáveis os actos de violência brutal que têm sido perpetrados contra cidadãos inocentes residentes nos bairros periféricos de Maputo e outras cidades do país. E é importante encorajar o trabalho da polícia nessa frente, assim
como lutar para que a corporação seja dotada dos meios necessários para que ela seja bem sucedida na sua missão de combate ao crime. Mas o combate ao crime, e a luta que aí se trava contra os criminosos deve obedecer a regras que fazem parte do manual de actuação da polícia. A existência de instituições de formação de polícias, incluindo ao nível superior, visa precisamente criar as condições necessárias
para que a polícia seja capaz de actuar dentro dos limites impostos pela Constituição e outras leis que compõem o nosso edifício democrático.
Qualquer actuação da polícia fora destes limites é matéria para pôr em perigo a nossa própria segurança colectiva. Suspender a Constituição e a lei para lidar com conjunturas momentâneas, fora dos procedimentos estatuídos na própria lei, cria o ambiente propício para o estabelecimento de um regime de anarquia, onde cada um resolve as suas disputas conforme as suas necessidades e conveniência. Ser polícia não significa apenas envergar uma farda, pegar numa
arma e pôr-se à rua. Infelizmente é esta a concepção que se tem da nossa polícia. Pior ainda, é assim que os seus dirigentes querem que ela continue a ser; um conjunto de guerreiros valentes que não levam prisioneiros para o quartel.
E foi assim que há cerca de duas semanas, sete indivíduos, supostos perigosos cadastrados em alegada confrontação com a polícia, foram abatidos em plena via pública. E toda a história ficou por aí. Não estando vivos para darem a sua versão dos acontecimentos, quem é que vai colocar a polícia na sua defesa?
Exasperados com a onda de crime que nos apoquenta, todos nós aplaudimos este tipo de acções porque acreditamos que justiça pelas sevícias de que somos alvos está a ser feita. Quando o crime violento nos bate à porta, é compreensível largar o benefício da dúvida a favor dos que têm a tarefa de combater os criminosos.
E mais, com uma polícia a reclamar a exiguidade dos meios que são colocados à sua disposição, a queixar-se de baixos salários em proporção com a sua missão tão perigosa, senão mesmo do perene conflito existente entre a polícia e os tribunais, estes que soltam criminosos sobre quem a polícia não tem reservas quanto às suas acções criminosas, não há como não nos solidarizarmos com esta classe de verdadeiros heróis. Também não podemos sugerir que ela fique a assistir ao espetáculo quando os atrevidos criminosos confrontam
os nossos agentes com armas de fogo. Eles têm todo o direito de se defender com a mesma (ou maior) poder de fogo.
O reverso da moeda, porém, é que hoje podemos celebrar quando a polícia massacra legiões de supostos gangsters na rua porque estamos exasperados com a alta onda de criminalidade. Mas devemos também estar preparados para amanhã termos que lidar com uma situação em que a polícia dirá que o deficiente funcionamento dos tribunais justifica que estes sejam substituídos pela lei do cano.
Editorial, Savana 25-08-2017
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