Assinantes: Bitone Viage & Ivan Maússe
Há sensivelmente dez (10) meses, publicámos, através deste espaço, um artigo de opinião com o título «Stop aos terroristas da educação nas nossas universidades», no qual denunciávamos o comportamento de alguns docentes que arruínam o processo de ensino e aprendizagem ao nível das nossas universidades.
O mesmo artigo, muito por causa da sua intitulação, foi gerador de motins entre os assinantes e aqueles que participavam do debate através dos comentários. Visto que, por coincidência, certos comentadores eram docentes universitários, os mesmos sentiam-se importunados devido ao uso do termo «terroristas».
Na circunstância, explicámos que o uso da frase “terroristas da educação” justificava-se pelo facto de, no dia-a-dia das nossas universidades presenciarmos comportamentos anti-pedagógicos, protagonizados por docentes universitários em nome da sua autonomia, dos anos de trabalho e do nível académico que têm.
Assim, porque notamos que aqueles comportamentos continuam, e com os estudantes a se queixarem por todos os cantos, decidimos redigir o presente artigo de opinião para, mais uma vez, vilipendiar tais comportamentos e apontar a fragilidade dos Regulamentos Pedagógicos como um dos factores motrizes.
1. Das viciosas docências:
São viciosas, todas as docências que escapam dos carris dos objectivos, missão e visão das nossas universidades e institutos públicos e privados. Mormente, tal facto deve-se, dentre várias razões, a falta: (i) de vocação para a docência; (ii) de formação psicopedagógica e didáctica; (iii) de dinâmica de pesquisa.
Algumas das docências viciosas são daqueles candidatos que ingressam para a carreira docente em virtude de, enquanto estudantes, terem-se consagrado melhores estudantes em determinadas disciplinas ou, ainda, de todo curso de licenciatura, por um lado, e por outro, através de vias que sabem a nepotismo.
Pelo desconhecimento das técnicas didácticas, as docências viciosas mostram-se incapazes de elaborar um plano temático ou analítico, ou mesmo uma simples prova escrita para os seus estudantes. Formulam perguntas confusas e mal redistribuem a cotação pela prova: não observam para o grau de exigência das questões.
Durante o decurso do semestre lectivo, as docências viciosas chegam a não leccionar uma aula sequer. Atribuem trabalhos de grupo, e as aulas resumem-se em apresentações feitas pelos próprios estudantes e, no fim, chegam mesmo a não tecer quaisquer comentários em forma de síntese ao que foi apresentado.
Devido a sua fraqueza em termos epistemológicos, pedagógicos e didácticos, as docências viciosas camuflam a sua ignorância na arrogância e no autoritarismo, transformando a sala de aulas em um verdadeiro quartel. Implementam essa táctica para intimidar aos estudantes que queiram expor as suas dúvidas e ideias.
Por razões pouco claras, ou ainda ligadas à sua condição de “turbos”, as docências viciosas costumam levar muito tempo para a divulgação dos resultados dos testes e dos exames. Elas levam meses para publicarem uma pauta de um teste, e nalguns casos, outras publicam-na no próprio dia e hora do exame.
Para finalizar o tópico em análise, não podíamos descurar das viciosas docências que olham para as salas de aulas das nossas escolas como a extensão das agremiações políticas de que fazem parte. Estas realizam uma espécie de “patrulhamento ideológico” dando corpo a propagandas político-partidárias.
2. À fragilidade dos Regulamentos Pedagógicos:
As instituições, por uma questão de garantia do seu saudável funcionamento, criam leis, normas, regras que mormente devem vincular às pessoas e/ou órgãos que as integram ou de que fazem parte. E, no caso das nossas universidades temos, dentre vários dispositivos, o Regulamento Pedagógico respectivo.
Dos preâmbulos de três (3) Regulamentos Pedagógicos, nomeadamente, das Universidades Pedagógica (UP) e Eduardo Mondlane (UEM), bem como do Instituto Superior de Relações Internacionais (ISRI), constatamos que estes instrumentos vinculam, não só aos estudantes, como também aos docentes.
Percebe-se, desde logo, que quer os estudantes, quer os professores, nas suas actividades devem, ou pelo menos deviam guiar-se do preceituado no Regulamento Pedagógico. Na realidade, isso não acontece e, pior, nestes instrumentos as sanções pedagógicas são somente aplicáveis aos estudantes.
Os nossos Regulamentos Pedagógicos «apresentam um conjunto de direitos sem garantias aos nossos estudantes». Se, por um lado apontam os direitos reservados aos estudantes, por outro, não estabelecem as garantias que permitam a reclamação daqueles em casos de violação pelos seus docentes.
Os Regulamentos estabelecem sanções aplicáveis aos estudantes que não cumprem com as suas disposições, mas não apontam para as sanções aplicáveis aos docentes que não as cumprem, pelo que, constituem direitos sem garantia, donde decorre a sua vulnerabilidade em serem violados pelos últimos.
Os Regulamentos estabelecem critérios de avaliação, prazos de divulgação dos resultados, modalidades de ensino, e mais direitos e/ou vinculações para os professores em relação aos estudantes. Os docentes vivem violando esses preceitos e nada lhes acontece e, pior, nalgumas vezes, com a cumplicidade e encobrimento das chefias respectivas.
Muitas vezes, os estudantes submetem queixas junto dos Departamentos pedagógicos das faculdades respectivas, donde o processo leva tempo para ser resolvido e sob a probabilidade de serem indeferidas por falta de clareza ou, vício de forma. E, feitas as correcções, os mesmos departamentos podem acusar extemporaneidade do expediente.
3. Considerações finais:
Queremos construir universidades que sejam verdadeiras indústrias de produção do conhecimento digno de ser aplicado para o desenvolvimento do nosso país, o que jamais poderá acontecer se não “passarmos pente-fino” em algumas das docências viciosas que se pretendem cada vez mais oleosas e escorregadias.
Os nossos Regulamentos Pedagógicos devem ser cumpridos por todos aos quais vinculam. Estes não devem apenas estabelecer previsões e estatuições para os estudantes, mas também para os docentes. Dever do professor é direito para o estudante, e como tal, deve haver uma garantia para o gozo deste.
De forma recorrente, assistimos às docências que não cumprem com o preceituado no Regulamento, muito porque não há nenhuma sanção que lhes possa ser aplicada, senão a censura por parte da Direcção da universidade, que muitas vezes, os docentes chegam a não dar ouvidos e guiam-se ao seu bel-prazer.
Deve haver normas estabelecidas nos próprios Regulamentos capazes de sancionar os docentes que conduzem a nobre actividade à revelia do disposto nestes instrumentos. Desta forma, combatíamos as massivas perseguições que os viciosos fazem aos estudantes proactivos quando reclamam os seus direitos.
Bem-haja Moçambique, nossa pátria de heróis!
Maputo, 18 de Agosto de 2016.
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