domingo, 6 de março de 2016

“ 6. O Paradigmático Pós-Independência de Eduardo Mondlane “

Estudos
“ 6. O Paradigmático Pós-Independência de Eduardo Mondlane “
Nos julgamentos políticos de Nachingweya, uma das acusações feitas a Gwendjere e outros envolvidos nos acontecimentos do Instituto Moçambicano de Dar-Es-Salaam de 1968, era de que haviam fomentado uma conspiração de carácter racista e tribalista contra dirigentes da FRELIMO de raça branca, mulata e negros do sul de Moçambique que então formavam a ala que defendia a guerra de libertação prolongada.
Ora, factos documentais da época revelam que, em muitos aspectos, nomeadamente nos raciais e tribais, Eduardo Mondlane esteve tacitamente alinhado no diapasão estudantil que ecoava no Instituto Moçambicano de Dar-Es-Salaam e que, porventura, tirou mesmo partido deste acontecimento, tal como já fizera no casos precedentes de David Mabunda, Paulo Gumane e subsequentemente Leo Milas, para se livrar da chamada ala branca e mulata que pugnava pelo marxismo-leninismo puro e duro. Simplesmente, desta feita, Mondlane foi politicamente derrotado por Marcelino dos Santos e seus seguidores, que acabariam por impôr no pós-II Congresso, Samora Machel, como escolha ideologicamente mais estável para a materialização do processo marxista-leninista em Moçambique.
Numa entrevista em Inglês à revista cubana Bohemia, subsequentemente publicada em livro, Mondlane traça o cenário do pós-independência, defendendo um infame e reaccionário “affirmative-action” que Machel acataria parcialmente até a sua morte, como por exemplo:
Primo – Regionalismo e Tribalismo
“...Isto nunca foi um problema aquando da formação da FRELIMO, se bem que, o regionalismo estivesse bem vincado em cada um dos três movimentos que originaram a FRELIMO (...). Mas à medida que fomos consolidando a estrutura da FRELIMO, o inimigo reagiu e a questão tribal passou a ser relevante. Por isso, temos estado engajados no combate ao regionalismo e tribalismo desde então (...)”
Secundo – Integração dos nacionalistas brancos na FRELIMO
“(...) O problema em relação aos nacionalistas negros e mulatos está resolvido na FRELIMO (...). O desafio agora é a integração dos nacionalistas brancos (...) porque os colonos em Moçambique assemelham-se aos rodesianos. São racistas, obviamente, e têm sido privilegiados ao longo dos anos. Ainda que no seu seio hajam dois ou três jovens que estejam connosco, temos de ser cautelosos, porque é largamente sabido que todos os brancos em Moçambique estão contra a FRELIMO. (...) Pese embora, nós não pugnemos pela discriminação racial contra brancos. Nós aceitamos que eles se ocupem de trabalhos técnicos, mas jamais de índole política a nível do topo da organização. Eles podem ser membros da FRELIMO (...), mas não podem ser membros do Comité Central e assim por diante (...)”
Tertio – Relação com o Poder Tradicional em Moçambique
“(...) Somos essencialmente um povo camponês (...) e isto reflecte-se na composição do nosso Comité Central, começando por mim mesmo, que nasci no campo e até aos 15 anos de idade nunca fui à cidade (...). O camarada Simango, por exemplo, (cujo pai ainda se encontra na prisão) é um camponês, ainda que tenha passado uma boa parte da vida trabalhando na Beira e Lourenço Marques (...). Somos um povo cuja estrutura política original foi destruída pelos portugueses em 1898, com excepção de um sistema tradicional representativo dos interesses do colonizador. Este sistema de representação divina ou sobrenatural das nossas tradições sempre existiu, mas foi emasculado pela vontade dos portugueses em destruir a tradição e criar uma nova administração (...). Portanto, uma vez que a estrutura política tradicional foi extinta, a FRELIMO deve preencher o vácuo criado com novas políticas. (...) ”
Estas posições de Mondlane, sobretudo as de cunho racial, quanto ao caminho a seguir pela FRELIMO no pós-independência, estão na base de um violento artigo publicado pelo também periódico cubano “Juventud Rebelde”, país com mais de 70% de população branca e mulata, que o descreve como um perigoso impostor, atingindo o apogeu das más relações ideológicas que a FRELIMO manteve com Havana até à morte de Mondlane, nas quais se inclui uma referência ao famoso incidente diplomático com Che Guevara em Dar-Es-Salaam no ano de 1965, pouco antes deste partir para a Bolívia onde morreria em combate.
Quando hoje em dia, os académicos nacionais, sobretudo aqueles com aspirações políticas, recorrem displicentemente à figura de Eduardo Mondlane denominando-a de arquitecto da Unidade Nacional, certamente não estão a incluir a análise objectiva desta dialéctica contraditória que o finado alimentou até à sua morte em Fevereiro de 1969. Mas sobretudo, tenta-se preservar a tese peregrina de que Mondlane nunca alinharia ideologicamente com figuras como Gumane, Simango e Mabunda por estas serem contrárias ao envolvimento de sua mulher Janet Mondlane nos destinos da FRELIMO, simplesmente por ser branca e norte-americana, e que por isso, tiveram de arcar com as consequências da sua morte, como autores morais e materiais da mesma.
Leitura recomendada
1- http://www.iese.ac.mz/lib/saber/rec_4455.pdf
2- Portuguese Colonies: Victory or Death, pp. 219 - 253 (April 1971), “Urselia Diaz Baéz”, Instituto Cubano del Libro, La Habana, Cuba
3- Juventud Rebelde (21/05/1968)
Comments
Centro Mtelela Para melhor visualizacao do artigo em causa (parte 1):
Centro Mtelela e aqui (parte 2):
Emilio Piao Muito obrigado. Pela consideração no que diz respeito a partilha de pensar e informação.
Linette Olofsson Afinal? De arquitecto da unidade Nacional nada tem. Obrigada pelo testemunho exposto.
GostoResponder7 hEditado

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