08/08/2013
“Não percebo por que HCB não foi entregue antes”
José Sócrates foi uma peça decisiva na complexa reversão da HCB para Moçambique. Em Maputo, na semana passada, a convite do Chefe de Estado, o ex-primeiro-ministro de Portugal rebobinou ao “O País” por que decidiu fechar o negócio. Falou também da crise política e económica da Europa e do futuro da CPLP
Engenheiro José Sócrates, qual é a sua agenda em Moçambique? Tem algum interesse estratégico?
Não, pelo contrário, vai achar muito curioso… venho aqui para cumprir uma promessa que deixei para trás nestes últimos dois anos. Tinha prometido visitar o Presidente da República, quando saísse do cargo de primeiro-ministro. Uma visita de despedida que fui adiando mês após mês. Então, desta vez decidi não deixar passar mais tempo e vim só para o saudar, para mostrá-lo o quanto apreciei trabalhar com ele estes seis anos. A política deixa relações pessoais muito profundas. Às vezes, os políticos têm que enfrentar relações difíceis juntos e isso gera um companheirismo, ou seja, uma camaradagem. Lembro-me ainda bem da primeira vez que o Presidente Guebuza foi a Portugal e falámos. Por isso, vim para o cumprimentar e trocar opiniões sobre a vida além da política, sobre Moçambique e Portugal. É uma espécie de visita de saudade a um amigo querido que não tive a oportunidade de visitar nestes dois anos.
O presidente da República, Armando Guebuza, está prestes a terminar o seu segundo mandato e já disse que não se vai recandidatar. Como é que foi o seu reencontro com ele, olhando para o actual cenário político? O que é que abordaram como dois amigos?
O encontro foi pessoal. Quis dar uma palavra ao Presidente Guebuza, isto porque ele esteve do meu lado nos momentos marcantes da governação de seis anos que fiz em Portugal. Por outro lado, vim sinalizar que sempre considerei como grande prioridade a relação com Moçambique e, de certa forma, com os países de expressão portuguesa, mas em especial Moçambique. Eu talvez tenha tido pela primeira vez a intuição de ter percebido claramente, sem nunca ter tido uma relação especial com Moçambique, o valor simbólico que Cahora Bassa representa para Moçambique e para o Presidente Guebuza e percebi, como português e para servir os interesses do meu país, que o meu dever era rapidamenteresolver aquilo, que era uma pedra no sapato para Moçambique e que, de forma inacreditável e sem nenhuma razão, não tinha sido resolvido no passado.
Isso não era apenas um problema económico e financeiro, era um problema simbólico que eu hoje percebo muito bem. Como é que os moçambicanos poderiam aceitar aquela marca do colonialismo e, por isso, fizemos aquilo que é mais inteligente entre dois políticos. Dissemos, vamos lá resolver isto rapidamente e resolvemos. Aliás, a operação de venda foi até em benefício de Portugal, porque fomos pagos por aquilo que a avaliação ditava. E, a partir daí, criamos uma relação muito próxima e de muita confiança. Até que, na altura, vim a Moçambique só para estar na assinatura desse contrato e foi um momento muito importante para Moçambique. Mas, a partir daí, as portas estiveram abertas para a construção de um futuro comum, porque o que precisamos é construir e não passar a vida a lamentar. Estou sempre do lado dos políticos que explicam o que é que devemos fazer e não do lado daqueles que passam a vida a explicar o povo por que não fizeram. A acção política é sempre, como digo, construir alguma coisa. Quem é político candidata-se sempre a liderar os outros, a comandar o movimento comum para fazer um bocadinho de melhor do que já existe e não para nos resignarmos.
José Sócrates teve um papel decisivo na reversão da HCB de Portugal para Moçambique e desempenhou um papel importante no relançamento das relações entre os dois países. Qual foi a sua principal intervenção nesse dossier, tendo em conta que havia vários anos que Moçambique vinha negociando a transferência das participações mas sem sucesso?
Eu compreendi muito bem que se tratava de algo muito simbólico para Moçambique. Não compreendo por que antes de mim não se resolveu esse problema. Aquilo era uma marca de um colonialismo que não tinha razão de ser, que nós podíamos já ter resolvido, infelizmente, arrastou-se os pés durante muito tempo, talvez por culpas múltiplas, não interessa agora fazer esse juízo. A verdade é que o Presidente Guebuza revelou sempre uma grande abertura para pagar aquilo que se devia ao Estado português e, de imediato, eu disse-lhe que a minha vontade era resolver aquilo também, e talvez seja essa aproximação pragmática dos dois governantes que contribuiu para resolver o problema. Olhando para trás, percebo que a HCB devia ter sido revertida a favor dos moçambicanos há muito tempo.
Não havia razão para esperar tanto tempo, mas pronto, as vezes é preciso ter tempo para que os governantes tenham condições e também vontade de resolver as coisas rapidamente, e assim se fez, em benefício de ambos e cá estamos agora com Portugal com um novo clima nas relações com Moçambique de que hoje desfruta, em consequência também desses anos que passaram. Como resultado disso, desenvolvemos áreas de cooperação que não existiam antes como, por exemplo, nas energias renováveis, que era um dos faróis da minha governação em Portugal. Expandimos a nossa cooperação nas áreas de construção civil, infra-estruturas e compreendo que o grosso dessa cooperação se mantenha.
Portugal em África. A sua reversão para Moçambique, de certa forma, não foi consensual. Qual foi a reacção dos sectores da oposição quando abordou a reversão?
Não me recordo de ter tido oposição porque nós fizemos uma negociação. Nós tínhamos uma avaliação, apresentámos ao Presidente Guebuza, ele estudou a proposta e disse que pagava. Mas havia umas pessoas em Portugal com tiques que herdaram um certo preconceito de superioridade que vem um pouco da tradição cultural colonialista,mas são sectores minoritários em Portugal que não representam quase nada. Não tive oposição porque o Portugal moderno compreende bem que, realmente, Cahora Bassa para Moçambique é uma questão simbólica que tem que ver com a soberania nacional.
Portugal tinha um grande prejuízo com a posição que detinha na HCB, isto é, nas suas relações com Moçambique.
Quando visitou Moçambique em 2010, anunciou que Portugal iria comparticipar no financiamento da construção da ponte Maputo-KaTembe, a espinha dorsal e a construção da Central Norte da HCB, através da criação do Banco Nacional de Investimento (BNI). O que falhou?
Não domino agora esses dossiers com detalhe. Lembro-me muito bem que, primeiro, nós construímos um modelo de cooperação com Angola e Moçambique, que consistia na ideia de criação de um banco de Fomento nos dois países, porque isso era importante institucionalmente para nossa cooperação e para as empresas portuguesas que beneficiavam de todos esses projectos. E, nessa altura, em 2010, fiz todo o possível de garantir o financiamento para essas obras que eram problema de Moçambique, porque não tinha como financiá-los, porque esses projectos são, sem dúvida, de grandes retornos financeiros. Não sei o que aconteceu depois. Sabe que no meu país as coisas não andaram bem nestes últimos anos e, na Europa, estamos a viver uma crise sistémica, mas que está a atingir mais os países do Sul, nomeadamente, Portugal. É possível que tenha havido problemas de financiamento, não estou a par desses detalhes.
O PAÍS – 08.08.2013
Como é que a operação foi um exito para Portugal, quando o dinheiro usado logo na primeira tranche saiu diretamente dos cofres da HCB? FAZEM REALMENTE IDEIA EM PORTUGAL QUANTO CUSTOU FAZER E MANTER A HCB??? o que se pediu de dinheiro em troca é ofensivo para o valor dessa infraestrutura em termos económicos e vergonhoso em termos políticos.
"Até que, na altura, vim a Moçambique só para estar na assinatura desse contrato e foi um momento muito importante para Moçambique." Isto posso confirmar que é verdade, pois ao Songo não foi (ó cobarde), eu sei pois estava lá nesse dia. Pena que não tenha sido também um momento importante para Portugal, simbolo da uma reconciliação sem preconceitos entre dois povos. Por outro lado, e pincipalmente, foi uma pena o pseudo-Eng. Socrates não ter dito uma palavra sobre os portugueses que ao longo dos anos por lá passaram e a obra que deixaram, NOMEADAMENTE NO PROCESSO DE REABILITAÇÃO E MAIS EM CONCRETO NO PROJETO REABSUL, FIM DO QUAL PELA PRIMEIRA VEZ A BARRAGEM FICOU A TRABALHAR A 100% ... O MEU ABRAÇO AO ENG. ROCHA E SILVA, extensivo obviamente a toda a sua equipa de portugueses e moçambicanos. ABRAÇO AO ENG. HUMBERTO, ENG. MACHAVA, AO DR. SIMÃO BARBOSA, AO LESSA, AO IVO, AO NUNO, AO ABEL ... aos miudos do Songo que trabalharam comigo, ao segurança da Moseg que mataram por inveja, ao Carlitos esse monumento da simpata e do saber receber, e muitos outros ...
"Cahora Bassa para Moçambique é uma questão simbólica que tem que ver com a soberania nacional." ENTÃO E ISSO TEM PREÇO? PORQUE NÃO FOI ENTREGUE SIMPLESMENTE???? AFINAL FAZES PARTE DESSA MINORIA COM TIQUES COLONIALISTAS (no caso, abichanados).
Este gajo tira-me do sério ... desculpem lá o desabafo.