Um novo limiar
O governo e os seus sequazes, ficou ontem a saber-se, para quem ainda
tivesse dúvidas, perdeu toda a legitimidade que resulta daquele mínimo
de adesão e compromisso que a população confere ao poder depois de o ter
instituído democraticamente. Viu-se que essa confiante relação mínima
de espectativa está irremediavelmente destruída e que nada, agora poderá
remedia-la. As crises politicas internas e as inevitáveis dissensões
acabarão a curto prazo por o deitar por terra, por falta de força e de
consenso para levar por diante medidas duras e rigorosas que a sequência
lógica das suas escolhas cada vez o obrigará mais a implementar. Neste
contexto chegou a ser penoso assistir ás explicações de Paulo Portas,
quando metendo os pés pelas mãos procurou desvincular-se das
responsabilidades que lhe cabem por supostamente ser contra a TSU e
acabar por aceita-la, em nome da estabilidade da coligação. Ou seja
demonstrando por palavras canhestras que no governo não passa de um
apêndice do PSD e que nessa qualidade o Passos o trata por cima da burra
e o obriga, de facto, a subscrever tudo o que muito bem entenda.
Dentro destes condicionalismos muito embora politicamente desqualificado
e agónico é de recear que o governo se arraste ainda por um tempo
indesejável com o país mergulhado numa situação apodrecida. Isto porque o
líder do partido socialista se mostra notoriamente assustado com a
ideia de ser primeiro ministro, não revelando uma forte vontade de poder
nem um conjunto de soluções alternativas susceptiveis de galvanizar uma
opinião pública, hoje tão desencantada com os partidos da direita.
Ameaçar apenas com uma moção de censura no actual quadro parlamentar é
agitar um petardo sem pólvora. Ninguém o tomará a sério. Dizer que não
pretende eleições é um erro clamoroso ao arrepio das centenas de
milhares de pessoas que na rua pediram que o governo se fosse embora.
Mesmo que as eleições se lhe afigurassem embaraçosas não tinha o direito
de dizer que as rejeitava. Bastava-lhe afirmar que as não receava. Por
que o não fez?
Aquilino Ribeiro Machado