Sobre o comunicado da família Mondlane
Quando vi o comunicado fiquei chocado. Não vi a necessidade daquilo por várias razões. Mondlane tornou-se maior do que a família e, em condições ideais, devia transcender o partido Frelimo. Quanto mais gente se apropriar das suas ideias e dos seus ideais, melhor para todos nós, pois há muito que ainda não foi devidamente explorado. E não só. Num momento em que o partido que se quer guardião dessas ideias e desses ideais está à deriva, é importante recuperá-los.
Também achei, num primeiro momento, que em período eleitoral fosse incauto emitir um comunicado daquela natureza sabendo que se vai fazer passar a ideia de que o principal mote é o facto de haver um candidato independente portador do mesmo apelido e que aparentemente utiliza o que ele considera ser o legado de Mondlane. Num ambiente político polarizado, um comunicado desta natureza é um tiro que sai pela culatra para a família e para o partido com o qual ela está associada.
Em momentos assim, até aqueles que até há pouco punham em questão o legado de Mondlane ou destacavam mais os rumores segundo os quais ele teria encontrado a morte nos braços duma amante – o próprio candidato independente faz parte dos que destacavam este último aspecto segundo mostra um dos seus vídeos quando ainda andava na Renamo – podem redescobrir o Mondlane que representa os ideais mais nobres da república.
Muita gente que contestou Eduardo Mondlane nas últimas décadas, fê-lo por não estar de acordo com a historiografia da Frelimo. Parece-me um contra-senso de repente exaltar Mondlane sem nenhuma reflexão sobre essa contestação. É como alguém de repente achar que Chipande é patrimônio nacional depois de ter andado a duvidar do “primeiro tiro”... É que em momentos como os que vivemos, os méritos das questões contam menos do que a exaltação das preferências individuais. E isso é grave.
Portanto, o comunicado foi inoportuno. Contudo, concordo com a família. Vi um cartaz com o candidato independente e com uma foto do fundador da Frelimo com dizeres do tipo “tantos anos depois, mais um Mondlane para voltar a unir o povo”. Algo assim.
Há uma linha ténue entre aproveitamento eleitoralista do nome de Eduardo Mondlane e identificação com os ideais e com as ideias de Mondlane. Não conheço uma reflexão do candidato sobre o significado que Eduardo Mondlane tem para si como político e tanto quanto pude apurar da leitura do seu manifesto eleitoral, não há lá nada que evoque Eduardo Mondlane de forma directa e propositada.
Ainda se ele fosse dissidente da Frelimo que quisesse lutar pelos ideais de Mondlane “traídos” pela actual Frelimo, compreenderia. Mas não é. Parece usar – ele ou os que o apoiam – a coincidência do nome para ganhos políticos sem nenhuma necessidade. Ele conquistou um espaço político aproveitando as borradas da Nova Frelimo e as fragilidades da oposição. Tem uma mensagem que reflecte o seu perfil político e que mexe com certos sectores da população.
Faria bem em se concentrar nisso do que fazer algo que parece vender gato por lebre. O seu percurso político não foi marcado pela procura dos ideais de Eduardo Mondlane ainda que como qualquer outro político ele tenha o direito de dizer que se identifica com eles se ele e os seus apoiantes forem de opinião de que o Moçambique que querem é mesmo o Moçambique de Eduardo Mondlane.
Eduardo Mondlane é de todos, sim. Mas é tão grande que o recurso aos seus ideais precisa de ser honesto e de ter a profundidade que os problemas que o país enfrenta exigem. Por isso, concordo com a família Mondlane, ainda que continue a pensar que o comunicado foi desnecessário.
Ser - Huo
É este mais um convite seu para uma leitura desapaixonada do comunicado da Família Mondlane. Mas Professor, tenho cá uma limitação, talvez de natureza interpretativa do conteúdo do comunicado. Do melhor de meu entendimento, percebi que a família Mondlane, poderia ter feito melhor, e tornado o comunicado oportuno e necessário. Se a família tivesse aproveitado o que tenha servido como gatilho para o comunicado, para apelar ao BOM USO DO NOME DE EDUARDO MONDLANE, teria contribuído para a responsabilidade de se defender o LEGADO de Eduardo herói nacional. Uma responsabilidade que não recai a ela só como família de Eduardo, mas a toda sociedade moçambicana como um todo, incluindo os partidos, os políticos, e o próprio governo.
Entretanto, a família, no que me pareceu, nos meus exageros, ocupar mais de 90% do comunicado, estava mais preocupada em dizer que a familia é e apoia a FRELIMO e seu candidato. É aqui que a família comete o que acho erro capital. Eduardo Mondlane, o herói, NÃO representa mais a FRELIMO. Eduardo é a mocambicanidade, e não interessa se é RENAMO ou MAMOMO, ou FRELIMO.
A família Mondlane comete o erro de arremessar Mondlane a uma FRELIMO actual que parece não ter nada que se confunda com o legado de Mondlane. É aqui que mais uma vez acho que a família deveria ter aproveitado a razão do comunicado para apelar a todos, incluindo à própria FRELIMO que ela apoia, que respeitem o nome e legado do arquitecto da unidade nacional. É no comunicado que deveriam ter deixado isso sem reservas para ninguém. Isso não retiraria o explícito e natural apoio que a FAMÍLIA (não atrelada à Eduardo) faz ou tem com a FRELIMO.
Mas, o que a família fez com infelicidade, quanto a mim, é como se ela estivesse a dizer "VOCÊ VENÂNCIO NÃO NOS ARRANJE PROBLEMAS COM A FRELIMO". É um comunicado pintado à cor de medo (medo de quê, isso é outra coisa e eu nem sei, so acho).
Portanto, embora concorde que Eduardo seja este ser de todo moçambicano, a família deve sim fazer o seu possível para que o nome de Eduardo seja usado com a grandeza que se lhe reserva, mas a família não pode fazer aproveitamento indevido do uso do nome de Eduardo para fins e ganhos políticos.
Digo o mesmo dos que usam o nome de Samora, etc., e todos aqueles heróis quenja não vivos, não podem tomar partido, porque seu partido é Moçambique.
(Propositadamente não olhei para o mérito ou demérito do outro Mondlane estar a usar o nome, simplesmente porque aidna não tenho matéria sobre tal uso, e até que ponto fere a grandeza de Mondlane herói).
- Responder
- Editado
Luís José Loforte
Professor, não estará porventura a dar uma no cravo e outra na ferradura? É que me parece oscilar entre o choque e a brandura, sem propriamente se posicionar. É isso que eu retiro do que li. Admito estar errado. Pessoalmente, acho o comunicado da "família Mondlane" incoerente. Talvez o não fosse se nas muitas indignidades do partido de que E. Mondlane é patrono se posicionasse duramente em defesa do que muitos de nós lhe creditamos. Conclusão lógica: o comunicado é instrumento de defesa de interesses. Desculpa-me, Professor!
- Responder
Tomas Mario
Totalmente de acordo! Não faz qualquer sentido. Lembrou-me uma declaração feita aqui há uns 20 anos, por um porta-voz da FRELIMO, dizendo que o Museu da Revolução é propriedade do partido: mas então não é um local onde estão depositados objectos e artefatos que testemunham a luta do povo Moçambicano contra a ocupação colonial? Como pode, tal lugar, ser propriedade de uma entidade privada, como é um partido político? Enfim...incompreensiveis perplexidades da nossa sociedade política!
- Responder
Joaquim Huo
Eduardo Mondlane é herói? Eis o dilema:
Eduardo Mondlane entre ser herói do povo moçambicano e estar na jaula do partido-família Mondlane. O que escolher?
- Responder
Raul Junior
Não há mal, mas andar a fazer campanha dizendo que Chapo hi lweyi wa misisi ya hombe nos velhos é maldade. É desviar a atenção das pessoas
- Responder
Pedro Armando Sitole Paduana
Me intriga a necessidade de os familiares dos nossos Heróis, sempre que aparecer um candidato presidencial com seus apelidos, correrem para reafirmar a sua fidelidade ao Partido Frelimo. Os Macheles fizeram o mesmo. Porque será?
No comments:
Post a Comment