Decisão sensata no meio do caos
Editorial
13 de Agosto de 2018
Graça Campos
Gustavo Costa, correspondente, em Luanda, do semanário luso Expresso, revelou há uma semana que José Eduardo dos Santos não teria manifestado interesse num vasto programa de homenagem à sua figura que o MPLA pretende promover até Setembro.
No dia 12 de Agosto, o Secretariado do Bureau Político do MPLA apreciou o anteprojecto do programa de homenagem a José Eduardo dos Santos pelos seus feitos.
No comunicado emitido no final da reunião, assinala-se que a homenagem tem como propósito “enaltecer os feitos” de José Eduardo dos Santos enquanto “Arquitecto da Paz e da Unidade Nacional em Angola”.
No mesmo documento é referido que a homenagem visa, também, reconhecer a forma “abnegada e patriótica como dirigiu o país e o partido, destacando-se o facto de ter praticado, com dignidade e distinção, feitos humanitários, de solidariedade e concórdia memoráveis, na busca da paz definitiva, que culminou com a reconciliação entre os angolanos”.
As fontes do correspondente do Expresso garantiram-lhe que José Eduardo dos Santos, que nunca esbanjou qualquer oportunidade de ser adulado, desinteressou-se, agora, da iniciativa do MPLA. “Não há clima político e psicológico para tais honrarias”, teria dito um deputado do MPLA.
Se, na verdade, JES se demarcou de tal homenagem, dir-se-ia que estamos perante uma decisão muito sensata.
De facto, não faria qualquer sentido homenagear o ex-Chefe de Estado e próximo ex-presidente do MPLA no exacto momento em que estão a ser dramaticamente expostas as trafulhices e tropelias dos seus filhos. E, quer se queira, quer não, os factos que têm vindo a público mostram até à saciedade que os malfeitos de Isabel, Zenu e outros filhos tiveram sempre a assinatura e o carimbo do pai-presidente.
Sem o aval de JES, Isabel dos Santos não teria império algum. Nova Cimangola, Unitel, BFA, BIC, Luandina, Urbana 2000 e tantas outras empresas foram doações do pai. Tudo obtido à custa do erário. A bilionária em que se transformou resultou das mais generosas doações do pai-presidente. Por mais engenhosa que fosse, a simples venda de ovos não lhe proporcionaria mais do que alguns trocados para comprar sambapitos e pouco mais.
Aquela a quem alguns enfeitiçados consideram a maior empresária angolana é uma espécie de balão que se esvaziaria ao menor furo. Alguma vez ela teria arcaboiço para dirigir a Sonangol se não fosse filha de quem é?
Do mesmo modo, o Fundo Soberano de Angola não teria aterrado no colo de Zenu dos Santos e do seu mentor Jean Claude de Morais se José Eduardo dos Santos não tivesse sequestrado o Estado.
Outrossim, é de todo impensável que Zenu dos Santos ousasse congeminar e executar a golpada dos 500 milhões de dólares sem a assinatura e o olhar embevecido do pai-presidente.
Entendamo-nos de uma vez por todas: num momento em que vêm à luz do dia os crimes de lesa-pátria (sim, assim são mesmo) praticados por Isabel, Zenu e outros filhotes, seria de todo insensato homenagear o ex-presidente da República (a quem o MPLA se refere, invariavelmente, como “Arquitecto da Paz”, como se ela pudesse ser obra de apenas um indivíduo) e omitir o determinante papel desempenhado pelo pai-presidente, afinal, o autor moral de toda roubalheira.
Afinal de contas, desde que João Lourenço assumiu as rédeas do país têm-se sucedido revelações que atestam que enquanto fingia servir todos os angolanos indistintamente, José Eduardo dos Santos comandava um bando que saqueava com entusiasmo e abnegação o país.
Por ironia das coisas, a tal reunião do Secretariado do Bureau Político do MPLA que apreciou o programa de homenagem a José Eduardo dos Santos, no dia 12 de Agosto, foi presidida por João Lourenço, o mesmo que hoje lidera a cruzada que está a expor todos os desmandos praticados por Isabel, Zenu e outros com a anuência do pai.
Enfim, JES teria justificado todas as homenagens do mundo, sobretudo por causa da sua magnanimidade perante os perdedores da guerra – que os houve. Mas ao transformar o país num parque de diversão dos filhos, borrou a escrita toda.
Em 1977, Agostinho Neto disse que fundava o MPLA-Partido do Trabalho sob o olhar silencioso de Lénin.
Nos últimos anos, Isabel, Zenu, Jean Claude de Morais e outros saquearam o país sob o olhar conivente de José Eduardo dos Santos. |
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