Servir como deve ser
O Facebook pergunta-me o que estou a pensar hoje, agora.
Ora, estou a pensar no artigo que acabo de ler e que transcrevo a seguir, da autoria do Jaime Langa, Director Editorial do jornal "Notícias", o jornal diário de maior circulação em Moçambique, propriedade uma das publicações da Sociedade Notícias, S.A.; sociedade esta que é participada maioritariamente pelo Estado moçambicano—portanto, uma sociedade com capitais provenientes de fundos públicos—, tendo à cabeça o Banco de Moçambique.
Eis o artigo, transcrito fielmente.
--- INÍCIO DA TRANSCRIÇÃO ---
BLOGANALISE: Funcionários públicos que temos
Sexta, 11 Março 2016
Por Jaime Langa
HOJE estou muito aborrecido, por isso não esperem um texto simpático. Estou triste mais comigo mesmo do que com o que me aconteceu. Saí do meu gabinete e dirigi-me a uma instituição pública, por sinal uma das mais procuradas para tratar burocracias próprias inerentes a negócios com o Estado. A minha perspectiva, na qualidade de cidadão, era de ser "servido", ou melhor beneficiar de um serviço público com alguma dignidade. Esperava, por isso, encontrar um servidor público bem disposto. Puro engano! Saí frustrado e aborrecido.
Na língua chopi costuma dizer-se: - "Dhitina dhanthu i pondo, chibhongo i sumbulane" (não direi o nome de ninguém, pois para isso iria cobrar cem pelo nome e cinquenta pelo apelido).
Na realidade pouco importa indicar nomes aqui, pois o cenário que assisti provavelmente seja recorrente em muitas instituições públicas. Vale somente a referência do sucedido para uma reflexão conjunta sobre que administração pública temos e queremos.
Continuando, cheguei à prestigiada instituição e fiz uma consulta sobre os procedimentos a seguir para obter um determinado serviço. Enquanto explicava o que pretendia, a "perita" que me ouvia, sem me deixar concluir, julgou perceber o que eu queria e lançou-me uma colectânea de 8 páginas. Impaciente, de seguida, disse-me que tudo estava lá escrito, pelo que não havia nada por me explicar.
Perante a minha insistência em obter mais algum esclarecimento, a chefe do referido local saiu do seu gabinete e acusou-me de estar a perturbar o ambiente de trabalho, pelo que deveria abandonar o local imediatamente. Para agravar o cenário, ela afirmou que se eu pensava que alguém estaria ali disponível para me servir, tratava-se de puro engano meu!
Porque entendi colocar os visados em situação de anonimato, fica claro que só eu, a chefe, a secretária e a "perita" é que sabemos deste assunto, poiso objectivo deste texto é tão-somente lembrar aos funcionários públicos que o seu papel é de servidores dos cidadãos e não o de defender interesses próprios no local de trabalho.
Se eu tivesse me identificado como director do Jornal Notícias (o que não costumo fazer), provavelmente até café teria tomado e o expediente teria sido tratado com todo o zelo, mas como fui para lá como "povo" e não me conhecem, fui atendido como geralmente é o 'modus operandi' naquela instituição.
Infelizmente, com este tipo de gestores e funcionários públicos o país não vai a lado nenhum e ficaremos acusando uns aos outros sem sabermos identificar o culpado pela nossa pobreza. E quando é assim a culpa sempre será dos outros. É lamentável ver isso acontecer no meu país. Todavia, como não posso, por disciplina de metodologia, generalizar há funcionários públicos competentes neste país e que se preocupam em servir o público e ver o seu Moçambique crescer.
Enquanto rogava para a "perita" me esclarecer as minhas dúvidas, vi a secretária com a cara atónita escondida e quando a chefe irrompeu à recepção com arrogância fiquei diminuído. Razões não faltavam para tal, pois a "perita" sentiu que a sua acção foi legitimada e valorizada pela sua chefe que nem se quer procurou se inteirar do que estava a suceder. Depois de expulso, senti pena dos utentes que me seguiram.
Nada mais podia fazer se não sair lamentando o nível de ignorância que paira naquela instituição, e porque a minha luta não deve parar por aqui dou este contributo apelando ao funcionário público zelo e responsabilidade no exercício das suas funções.
Às visadas, podem ficar tranquilas, não irei meter queixa, embora devesse, pois até a secretária testemunhou os maus-tratos a que fui sujeito. A única coisa que um dia provavelmente farei é informar ao ministro de tutela pelo respeito e amizade que nutro por ele.
--- FIM DA TRANSCRIÇÃO ---
A minha opinião sobre este artigo é que, sendo o Jaime Langa o Director do "Notícias", ele TUDO DEVIA FAZER para que as funcionárias a que se refere neste seu artigo fossem conhecidas publicamente, pelos seus nomes, e também a instituição para a qual trabalham. Não me parece haver razão bastante para que assim não seja, tampouco para a preferência (do Jaime Langa) por abordar sigilosamente o Ministro que superintende essa instituição, sobre o mau serviço prestado ai prestado ao cidadão por certos funcionários. Aliás, esconder a identidade de funcionários que servem mal o povo é contribuir para a perpetuação do mau serviço prestado ao cidadão pelas instituições do Estado. Penso até que, na sua qualidade de Director de um órgão de informação com capitais publicos, o Jaime Langa está, também, a prestar mau serviço ao cidadão, quando esconde as identidades da instituição na qual foi mal atendido e das pessoas lhe atenderam mal. Não denunciar o mal indicia falta de senso de justiça e responsabilidade!
Vivido o episódio que Jaime Langa relata no seu artigo, uma atitude que acho que seria correcta—e bem alinhada com a profissão de jornalismo—que ele pode tomar, é, por exemplo, introduzir no "Notícias" uma rubrica informativa sobre a qualidade dos serviços públicos em Moçambique. Tal rubrica seria produzida por uma equipa de jornalistas destacados especialmente para medir o pulsar da administração pública moçambicana. O trabalho desses jornalistas consistiria em fazer jornalismo investigativo orientado para o combate contra o mau serviço prestado ao cidadão pelo Estado e pelos seus funcionários e agentes. Para a recolha de informação a publicar nessa rubrica, os jornalistas iriam se fazer passar (secretamente) por utentes de diferentes serviços públicos, para avaliar o atendimento e informar o público sobre as más (e, também sobre as boas) práticas, e os autores dessas práticas (funcionários e instituições). As más práticas assim reportadas deverão ser averiguadas e sancionadas (nos termos da lei) e, as boas, incentivadas (e.g. com premiações). Creio que desta forma podemos sonhar com um Moçambique onde o Estado se exime em servir cada vez melhor o cidadão.
Enfim, eu quero saber qual foi a instituição em que o Jaime Langa foi mal atendido e quem foi que lhe atendeu mal! E tu, meu amigo e compatriota (moçambicano)?
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