Quarta, 18 Março 2015
NO texto publicado quarta-feira passada, 10 de Março corrente, sob o título “Diabolização, G40 e os santos, afirmei no fim do segundo parágrafo que voltaria ao assunto “uma rádio em Ruanda”, que nos anos de 1990 promoveu o ódio étnico que resultou no massacre de milhares de cidadãos daquele país – hutus e tutsis. O motivo, para voltar ao tema, está relacionado com a evocação daquele tenebroso acontecimento, por Fernando Lima, durante os seus pronunciamentos feitos na sequência do assassinato do Professor Gilles Cistac.
É que, evocar um acontecimento tão trágico quanto aquele, pretendendo fazer uma analogia com a realidade moçambicana, para além de descabido, assume contornos perigosos, principalmente no momento em que o país precisa (qual pão para a boca), de discursos aglutinadores, discursos que convoquem a todos para o reforço da unidade nacional.
O nosso país está a viver uma fase particularmente preocupante. Pelo menos para todos aqueles que querem ver continuados e implementados os ideais pelo desenvolvimento económico, social e cultural para o bem de todos os moçambicanos. Sendo que para implementar esses ideais o país precisa de estabilidade. Para haver essa estabilidade requer-se que todos rememos para o mesmo lado.
Num momento como este, evocar a tragédia ruandesa – que certamente nem os próprios ruandeses querem recordar – é contraproducente a todos os títulos. Mas, mais grave ainda, porque há pessoas neste país predispostas à violência. Basta que se lhes dê uma pequena faúlha para acenderem um rastilho “desencadeador” de grandes escaramuças. Escaramuças que podem resultar em mortes de cidadãos inocentes. Escaramuças que podem resultar na destruição de propriedades, na destruição de todo um esforço de camponeses, de operários; escaramuças que podem deitar abaixo o sonho de milhões de moçambicanos; em fim, escaramuças que podem inviabilizar toda e qualquer iniciativa desenvolvimentista que tanto precisamos.
De figuras que “detêm” uma capacidade significativa de influenciar a opinião pública, sobretudo os que se consideram defensores da estabilidade e da democracia, esperam-se ideias que contribuam para a criação de um ambiente de serenidade, ideias que aglutinem as sensibilidades em prol de um mesmo objectivo: a estabilidade do país.
Preocupado com o rumo para o qual o país está sendo empurrado, preocupado com a machadada que vem sendo dada a uma das principais conquistas da independência nacional – “a unidade nacional” –, onde gentes do norte, do centro e do sul são um único povo preocupado, dizia, apelo não só aos ilustres de estirpe de Fernando Lima, como a todos quantos têm a possibilidade de influenciar a forma de pensar e de estar das pessoas no sentido de usar tal capacidade para elevar para o pedestal mais alto este importante valor social e cultural: “a unidade nacional”.
A diabolização – essa sim, é diabolização, de indivíduos que pensam diferente, agregando a essa diabolização e recordação das causas da tragédia mais hedionda que o mundo já viu, é ou pode ser uma semente cujos frutos não são aqueles que possam alimentar a “gula” dos amantes de guloseimas – entendendo-se de guloseimas, a paz, a estabilidade e a real democracia.
Uma considerável franja de opinadores, entre os quais detentores de cargos institucionais, tem vindo a defender e alimentar a tese que aponta já os culpados do assassinato do Professor Cistac. Admira-me muito esse posicionamento. Por várias razões, entre as quais a seguinte: as autoridades competentes – a Polícia ainda não apresentou uma informação, ainda que preliminar, indicando possíveis suspeitos. Então, como é que esses opinadores têm já a certeza quanto aos responsáveis pelo crime?
Deviam, na minha modesta opinião, perguntarem-se quem beneficia neste momento com a morte daquela figura? Estando, a Frelimo e seu Governo, a defenderem a ideia contrária à das “regiões autónomas” e tendo aparecido o Professor Cistac a defender o contrário, apoiando portanto a ideia da Renamo, é crível que essa Frelimo, para “ganhar” a causa, opte por silenciar aquela voz? Pensando e agindo desse modo, hipoteticamente, a Frelimo não estaria a dar o tiro no pé, na perna e, em última análise, em todo o corpo? Por que será que esses opinadores apressam-se a encontrar os culpados. Porquê essa pressa?
Marcelino Silva - marcelinosilva57@gmail.com
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