21/1/2013 11:21
Por Redação - de Brasília e São Paulo
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O quadro político nacional, antes um mar de almirante para a presidenta Dilma Rousseff, recebe as primeiras nuvens escuras para 2014, pintadas por analistas políticos mais conservadores. Na opinião do professor Renato Janine Ribeiro, da USP, tanto a presidente Dilma Rousseff quanto o senador mineiro Aécio Neves perdem espaço na corrida rumo a 2014. Expert nas ideias de Thomas Hobbes, segundo a qual os homens só podem viver em paz se concordarem em submeter-se a um poder absoluto e centralizado, Ribeiro prevê que aquela que parecia uma certa e tranquila reeleição da presidenta, com a candidatura do PSDB representada por um olímpico Aécio Neves, com desejo maior de concorrer do que de vencer nas urnas, tende a se transformar em uma batalha campal mais emocionante.
Segundo o professor, que estudou a fundo a obra Leviatã e, nela, as observações de Hobbes sobre a natureza humana e a necessidade de governos e sociedades, Dilma aparece agora mais fraca devido aos problemas no crescimento da economia, fator preponderante para o sucesso ou o fracasso dos governantes. Na obra do pensador inglês do século XVI, cada um de nós tem direito a tudo e, uma vez que todas as coisas são escassas, existe uma constante guerra de todos contra todos (Bellum omnia omnes), o que Ribeiro traduz na volatilidade do eleitorado que, hoje, embala sua confiança no governo Dilma em caixas de papelão, nas quais embrulham eletrodomésticos financiados a perder de vista.
Aécio, por sua vez, enfraqueceu-se diante da disposição radical do ora tucano José Serra de voltar à disputa, mais uma vez, das eleições presidenciais, ainda que para isso precise deixar o PSDB. A intenção de Serra não apenas divide a direita, mas leva Aécio a um desgaste dentro das próprias trincheiras.
Em artigo publicado na última edição do diário Valor Econômico, de propriedade cruzada entre os jornais conservadores paulista Folha de S. Paulo e carioca O Globo, Janine Ribeiro afirma que “Dilma estaria fraca, o que é muito curioso, não por seu desempenho na política, mas na economia. Ora, é sabido que ela gosta da economia; que prefere uma visão técnica, gerencial, das questões a uma visão política. Política aparece para Dilma em seu pior sentido: o do toma-lá-dá-cá, o da construção da governabilidade mediante concessões”.
“Aliás, é dessa mesma forma que a maior parte da população vê a política; talvez a popularidade presidencial se deva a essa coincidência do seu modo de ser com o da maioria do povo. Presidenta e povo convergem numa certa repulsa aos políticos. ‘Política’, aqui, é a submissão do melhor e mesmo do bom ao possível. Quem tem valores fortes geralmente sente repugnância por isso. Parece ser o caso dela. E, mesmo assim, neste momento Dilma está melhor no quadro político do que no econômico. Não tem um rival forte à sua direita, a oposição de esquerda é microscópica e a causa ecológica muito fraca, dois anos apenas depois da avalanche de votos em Marina Silva”, afirma o filósofo paulista.
Ainda segundo o professor-titular da cadeira de Ética e Filosofia Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), “economia é a praia de Dilma Rousseff”.
“A presidenta representa uma visão que, curiosamente, está perto do modo que, anos atrás, era a marca registrada de José Serra, na oposição interna ao governo FHC: o ideal de uma economia desenvolvimentista, pondo a regulação do Estado e o apetite dos atores privados a serviço de uma estratégia que aumente o crescimento e reduza a pobreza. (Não por acaso, jogo com o título do best-seller de 1975, que projetou o Cebrap de FHC e Serra, “São Paulo: crescimento e pobreza”). Não por acaso, me ocorreu escrever este artigo depois de ler uma entrevista do economista de esquerda Carlos Lessa, que foi professor de Dilma mas também padrinho de casamento de José Serra, e declara ter votado no candidato tucano”, afirma.
“Em suma, Dilma vê a economia não como fim em si, mas como o melhor instrumento técnico para fazer uma política que só é chamada de esquerdista porque, em nosso país, o mero propósito de construir uma nação de classe média soa radical – e talvez seja mesmo. Ora, é essa agenda que poderia ser comum ao maior número possível de pessoas, que poderia ser o ponto de encontro dos “homens de boa vontade”, superando as pautas político-partidárias de interesses mesquinhos – essa agenda das pessoas que “pensam no Brasil”, para usar uma expressão do então presidente Fernando Henrique Cardoso, numa crítica a uma sentença do Supremo Tribunal Federal – que está em risco. E está em risco porque a economia é uma caixa-preta”, pontua.
“Fala-se tanto em competência a respeito da economia mas, na verdade, ela é o movediço terreno da fortuna. Não se diz que os mercados ‘estão nervosos’? Nervosismo é o contrário da racionalidade. Daí que, apesar do cabedal de simpatia e da vantagem política em que está Dilma, com o PIB baixo as coisas se tenham tornado delicadas para ela. Não há melhor sinal disso do que a possível crise no abastecimento de energia. Esqueçam o sinônimo “luz” e pensem no sentido forte da palavra “energia”: é isso que pode nos faltar. Simbolismo forte, não é? E pode faltar caso faltem chuvas, que não dependem de nenhum político, mas da sorte. Se Dilma se enfraqueceu, foi devido a golpes da fortuna”, acrescenta.
No último parágrafo do texto, Janine Ribeiro questiona: “E Serra? Seu jogo é arriscado”.
“Fernando Henrique, que apoia Aécio, e Alckmin, que não apoia ninguém, parecem cansados de avalizar suas pretensões presidenciais. O pior para Serra será assumir o rótulo de ingrato, em relação aos correligionários, de desleal ao partido e de egoísta na aspiração ao Planalto. Com isso, ele pode tirar votos de Aécio, mas dificilmente conseguirá a candidatura tucana e, se a obtiver, sofrerá um intenso fogo amigo. Por hábil que seja Serra, que movimenta o xadrez político como poucos – dotado que é de muita “virtù” -, ele pode estar batendo no teto. Hoje, Dilma ainda vence Aécio, mas os dois enfraquecidos”, concluiu.
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