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- Publicado em quarta, 19 dezembro 2012
O respeitado Secretário-Geral da ONU que foi Kofi Annan, também foi o primeiro africano a assumir aquelas altas funções. Num relatório frequentemente lembrado, a propósito da multiplicação de conflitos militares no mundo então pobre, e geralmente conhecido por Terceiro Mundo, salientou que era urgente que adoptassem um critério de crescimento zero no que tocava aos orçamentos militares, e que se dedicassem à prática de boa administração.
O panorama não melhorou extraordinariamente até hoje, quando a fronteira da pobreza, com as sequelas do desemprego, da falta de esperança, do desespero, passou para o Norte do Mediterrâneo, enquanto anúncios desatendidos, já no fim do século passado, mostravam a falta de conteúdo das orgulhosas qualificações de sociedades consumistas, afluentes, ricas, segundo os sinais com que reputados financeiros e economistas animavam governantes confiantes, alguns demonstrando na adversidade do presente que não perderam a confiança na sabedoria anterior que conduziu ao desastre.
Nos EUA, sem perderem a convicção de serem a Nação indispensável, o fim do século encontrava a Câmara dos Representantes ocupada com as distracções juvenis do Presidente, enquanto na Argélia, no Burundi, na Serra Leoa, nos Balcãs o Kosovo reeditava o pior dos conflitos étnicos, a Rússia combatia os separatismos, e os Estados emergentes cresciam no sentido de aliarem o poder estratégico ao poder financeiro e económico.
Havia um plano de ordem mundial nos Tratados que fundaram a ONU e proclamaram os Direitos do Homem, mas a natureza das coisas fazia evoluir, com dinâmica própria, a geografia do poder e da política.
Que Churchill, sempre escutado, tenha dito que o século XX foi o “século do homem comum” porque foi quem mais sofreu, parecia ter esperança, não afectada, de que o novo século fosse de paz, e prosperidade, estado de espírito que a “cortina de ferro”, que viria a anunciar, não lhe deve ter consentido que se fortalecesse. Pelo contrário, nesse mesmo fim de século o Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados declarava-se responsável pela situação de 21 milhões de refugiados, e as migrações descontroladas de carentes que buscavam encontrar algum futuro na cidade planetária do Norte, apregoada rica, não pararam de espalhar por este suposto paraíso de recursos as situações que agravam a definição de crise ocidental. Particularmente da Europa, ela também agora afligida pela situação de pobreza de que subitamente foi informada pelos factos, e menos pelos governos, aprendendo duras penas que miséria humana também faz parte do globalismo, cujos factores vão sendo lentamente alinhados, mas longe ainda de consentir uma compreensão total, e de encontrar centros de poder confiáveis, e líderes inspirados, que tornem acreditável a convicção de que existe um futuro ao fundo do túnel.
Há sinais suficientemente elucidativos no sentido de que a já velha terminologia de Terceiro Mundo, entre o mundo ocidental e o sovietismo, de sociedades afluentes e sociedades pobres, de sociedades em liberdade e sociedades em submissão, tudo está a necessitar de ser substituído por novos conceitos tão globais como o globalismo que desafia a compreensão da nova realidade, e empurrem no sentido de considerar ultrapassadas as teimosas sabedorias que foram traçando o trajecto que levou até à situação presente.
Para sintetizar a ameaça que tal evolução representa em relação às estruturas, convicções, e práticas desse passado próximo, talvez seja suficiente lembrar que a fome não é um dever constitucional, e que peritos de humanidade, mal escutados por ideólogos do enriquecimento, repetidamente avisam que a pobreza é uma ameaça tão séria como as armas da destruição maciça.
Não há razões para apoiar a esperança apenas em estatísticas, nem em tradicionais interpretações de benevolência dos povos perante o sofrimento, sobretudo quando assumem a responsabilidade pela geração futura que chamam descendência. É seguramente tempo de juntar à definição do globalismo uma definição dos limites do sofrimento humano, que também caminha para global.
* Professor universitário português
O panorama não melhorou extraordinariamente até hoje, quando a fronteira da pobreza, com as sequelas do desemprego, da falta de esperança, do desespero, passou para o Norte do Mediterrâneo, enquanto anúncios desatendidos, já no fim do século passado, mostravam a falta de conteúdo das orgulhosas qualificações de sociedades consumistas, afluentes, ricas, segundo os sinais com que reputados financeiros e economistas animavam governantes confiantes, alguns demonstrando na adversidade do presente que não perderam a confiança na sabedoria anterior que conduziu ao desastre.
Nos EUA, sem perderem a convicção de serem a Nação indispensável, o fim do século encontrava a Câmara dos Representantes ocupada com as distracções juvenis do Presidente, enquanto na Argélia, no Burundi, na Serra Leoa, nos Balcãs o Kosovo reeditava o pior dos conflitos étnicos, a Rússia combatia os separatismos, e os Estados emergentes cresciam no sentido de aliarem o poder estratégico ao poder financeiro e económico.
Havia um plano de ordem mundial nos Tratados que fundaram a ONU e proclamaram os Direitos do Homem, mas a natureza das coisas fazia evoluir, com dinâmica própria, a geografia do poder e da política.
Que Churchill, sempre escutado, tenha dito que o século XX foi o “século do homem comum” porque foi quem mais sofreu, parecia ter esperança, não afectada, de que o novo século fosse de paz, e prosperidade, estado de espírito que a “cortina de ferro”, que viria a anunciar, não lhe deve ter consentido que se fortalecesse. Pelo contrário, nesse mesmo fim de século o Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados declarava-se responsável pela situação de 21 milhões de refugiados, e as migrações descontroladas de carentes que buscavam encontrar algum futuro na cidade planetária do Norte, apregoada rica, não pararam de espalhar por este suposto paraíso de recursos as situações que agravam a definição de crise ocidental. Particularmente da Europa, ela também agora afligida pela situação de pobreza de que subitamente foi informada pelos factos, e menos pelos governos, aprendendo duras penas que miséria humana também faz parte do globalismo, cujos factores vão sendo lentamente alinhados, mas longe ainda de consentir uma compreensão total, e de encontrar centros de poder confiáveis, e líderes inspirados, que tornem acreditável a convicção de que existe um futuro ao fundo do túnel.
Há sinais suficientemente elucidativos no sentido de que a já velha terminologia de Terceiro Mundo, entre o mundo ocidental e o sovietismo, de sociedades afluentes e sociedades pobres, de sociedades em liberdade e sociedades em submissão, tudo está a necessitar de ser substituído por novos conceitos tão globais como o globalismo que desafia a compreensão da nova realidade, e empurrem no sentido de considerar ultrapassadas as teimosas sabedorias que foram traçando o trajecto que levou até à situação presente.
Para sintetizar a ameaça que tal evolução representa em relação às estruturas, convicções, e práticas desse passado próximo, talvez seja suficiente lembrar que a fome não é um dever constitucional, e que peritos de humanidade, mal escutados por ideólogos do enriquecimento, repetidamente avisam que a pobreza é uma ameaça tão séria como as armas da destruição maciça.
Não há razões para apoiar a esperança apenas em estatísticas, nem em tradicionais interpretações de benevolência dos povos perante o sofrimento, sobretudo quando assumem a responsabilidade pela geração futura que chamam descendência. É seguramente tempo de juntar à definição do globalismo uma definição dos limites do sofrimento humano, que também caminha para global.
* Professor universitário português
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