quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Ditador democrático do Egipto? (conclusão)


Para Morsi, e os seus partidários, era imperativo neutralizar os juízes do Tribunal Constitucional, cujo poder dissolveu, no passado mês de Junho, a primeira Assembleia do Povo pós-revolução (a Câmara Baixa do Parlamento) eleita livremente. De acordo com o partido de Morsi, o Tribunal politizado planeava dissolver o Conselho Consultivo (Câmara Alta) e a Assembleia Constitucional, tal como alguns de seus juízes insinuaram publicamente. Da mesma forma, o procurador-geral que foi despedido não conseguiu apresentar nenhuma evidência sólida contra os chefes de segurança e os representantes de Mubarak que foram acusados de terem matado manifestantes, conduzindo à absolvição da maioria.
Sendo um Presidente eleito com uma maioria de 51,7 por cento, Morsi precisa de ser sensível às exigências dos seus apoiantes, principalmente dos islâmicos e dos revolucionários vítimas das forças de segurança. Mas, para muitos revolucionários, havia outras maneiras de despedir um procurador contaminado e purificar o poder judicial. Por exemplo, uma nova lei que regule o poder judicial tem sido uma exigência da revolução, desde que se iniciou.
Para Morsi, o dilema era que o Tribunal Constitucional pudesse derrubar a lei, fazendo com que o esforço ficasse sem sentido. Ele já recuou duas vezes: a primeira em Julho de 2012, quando abandonou os seus esforços, sob pressão do Conselho Supremo das Forças Armadas, para restabelecer o Parlamento eleito, e a segunda, quando tentou afastar o procurador-geral, tornando-o no embaixador do Egipto junto à Santa Sé.
A “Declaração Constitucional” de Morsi foi um passo decisivo – embora não democrático, polarizado e, portanto, politicamente dispendioso – para quebrar o impasse. E, embora tais decretos tenham conduzido a ditaduras, e não a democracias, noutros países em fase de transição política, nenhum deles tinha uma entidade politizada judicial que desempenhasse o papel de desmancha-prazeres no processo de democratização.
Na verdade, quase dois anos após o início da revolução, as forças de segurança do Egipto não foram reformadas de forma significativa. Agora, Morsi, com a sua tentativa para forçar a saída do procurador, terá de evitar a abertura de uma nova frente com os generais de segurança de Mubarak, de quem ele terá de proteger as instituições do Estado e manter um nível mínimo de segurança pública.
O sector de segurança pode, ao que parece, emergir desta crise como o único vencedor. Irá impor o Estado de direito, mas apenas por um preço. Esse preço será reflectido na Constituição, bem como nas regras por escrever da nova política do Egipto. Isto constitui uma ameaça muito mais séria e duradoura para a democratização do Egipto, do que os decretos temporários de Morsi.

* Cientista político e activista dos direitos humanos

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