Há unanimidade no seio do povo moçambicano informado de que o país está mal. Tanto a Frelimo bem como a Renamo e outros partidos, incluindo a sociedade civil, estão, raramente, de acordo em relação ao caos financeiro para o qual fomos atirados. Não é para menos!
As razões objectivas para sermos arrastados para esta situação ainda continuam no segredo. Ouve-se falar de que os dinheiros contratados foram usados para financiar a Proinducus, Ematum e, agora, a Base Logística de Pemba. Os montantes variam em função das fontes. Os critérios para contratação dessas dívidas assustam os mais e menos entendidos em matérias de finanças públicas.
E, para tornar a situação mais grave, somos brindados com a decisão do Executivo de que esta divida já não é das pessoas que a contraíram, mas sim já é de todos nós. Um punhado de pessoas cria empresa, contrai divida, não consegue pagar e depois repartem a divida por todos nós. Em todos estes processos o povo não foi consultado. Entretanto, há pessoas que acham isto normal. Pudera eu repartir a minha divida pelos meus vizinhos e amigos sem os consultar...
No final das contas, qual é o problema real? É porque não fomos consultados? O dinheiro deve ter sido desviado? Porque o dinheiro foi usado para compra de equipamento bélico? Porque os barcos da Ematum “pescam acostados no porto” e nunca se fazem ao mar? Porque o Parlamento não foi consultado? Qual é o problema real?
O problema real é que nos endividamos muito acima das nossas capacidades reais de repagar a divida dentro dos prazos acordados com os credores. Exemplificando, é como se alguém que aufere mensalmente 1000.00, 00 Mts fosse ao banco para contrair uma divida de 1.000.000,00 Mts para pagar em 5 anos. Esta é a situação actual.
Mas, como foi possível alguém no seu perfeito juízo tomar tal decisão? As respostas a esta pergunta são várias, mas a mais objectiva e desapaixonada é que alguém confiou que podia fazer omoletas com os ovos ainda dentro da galinha. Alguém tomou a decisão de se endividar junto ao banco contando pagar a divida com o dinheiro de um negócio que estava por fechar. Acontece que o negócio ainda não fechou mas o dono do dinheiro já o quer de volta. Ti ku kinze!
O que isto significa? Significa que temos de nos virar para pagar a divida. Temos de juntar todas as quinhentas que a nossa economia produz em divisas para pagar a divida. Tudo que for dólar que se encontra dentro do pais e fora, sob a alçada do banco central e do governo de Moçambique deve ser contabilizado para pagar as dividas. Acontece, porém, que os dólares que nós geramos neste momento não são suficientes para simultaneamente pagar a nossas dividas, importar comida, importar combustíveis, importar medicamentos, pagar as despesas dos cartões VISA feitas no estrangeiro em dólares quando viajamos, importar carros, pagar despesas de tratamentos médicos no estrangeiro, etc.
Consequências
Quais são os prováveis consequências desta situação para o povo? São vários e todos assustadores, nomeadamente:
a) Escassez de Divisas no Mercado
De onde vem os dólares para o nosso mercado domestico? Das receitas das exportações, das transferências dos moçambicanos no estrangeiro e das instituições diplomáticas e pagamentos empresas privadas e publicas para o mercado doméstico, dos investidores estrangeiros e das ajudas financeiras das instituições de Bretton Woods e de outros créditos externos.
Uma vez que todas estas fontes de receita de dólares americanos estão comprometidas, resulta que há cada vez menos dólares disponíveis no mercado para financiar/pagar as importações de bens e serviços necessários à economia. Isto faz com que não haja disponibilidade de divisas para realizar as importações e, as poucas divisas arrecadadas, são usadas para financiar actividades prioritárias tais como importação de medicamentos, comida, combustíveis, etc. Por quanto tempo? Ninguém sabe.
b) Depreciação do Metical: o aumento da procura do dólar americano pelo governo e pelos comerciantes, inflaciona o valor do dólar americano em relação ao metical, fazendo subir o custo de transacção do dólar no mercado financeiro. Isto é, as pessoas estão dispostas a pagar o que for necessário em meticais para ter os dólares necessários para financiar as suas actividades.
c) Subida de Preços: uma das consequências directas da escassez do dólar é a subida do preço de transacção da moeda, o que por sua vez provoca o aumento dos preços dos produtos no mercado doméstico. Ora, Moçambique quase importa tudo, com a excepção do ar livre que respiramos, da terra que pisamos e suas riquezas e da água dos rios, mares, lagos e oceanos. Tudo o resto é parcialmente ou totalmente importado. Para importar os bens e serviços precisamos de moeda forte (e.g dólar, euro, libra, rand, etc.). Estando o dólar a ser transaccionado em alta, resulta que todos os produtos importados com esta moeda estarão mais caros.
Impactos
Todos os produtos importados irão subir de preço, por via da carestia dos custos de transacção em moeda estrangeira. Mesmo os bens e serviços não importados serão afectados por via do aumento dos custos dos factores de produção i.e. energia, água, matérias primas, etc.
Esta subida de preços irá trazer sofrimento ao povo uma vez que com o mesmo salário auferido o povo comprará cada vez menos bens e serviços. O povo irá comprar cada vez menos pão, menos carne, menos manteiga, fará menos viagens, irá consumir menos medicamento, comprará menos roupa, ajudará cada vez menos as viúvas e órfãs, comprará menos energia, e a lista não termina.
Medidas de Prevenção
Aliado à seca que se faz sentir em algumas regiões do país, esta situação da carestia do custo de vida tem o potencial de despoletar reacções não desejáveis por parte do público. A nossa experiência colectiva das reacções por parte do público nos diz que o Governo precisa de tomar medidas pró activas para evitar tais reacções, nomeadamente:
• Maior abertura na prestação de informação educativa para o povo lidar melhor com a crise que se avizinha;
• Relaxar certas medidas fiscais que sufocam o povo;
• Reduzir a ostentação dos meios de vida, principalmente por parte de governantes e oficiais seniores do Governo;
• Reduzir e cortar gastos supérfluos com festas, festivais cerimónias oficiais de pouco valor e significado neste contexto de contenção;
• Evitar brutalizar o povo por parte das autoridades i.e. polícia municipal, polícia de protecção e de trânsito;
• Incrementar o diálogo político inter partidário e social para aumentar a coesão interna para melhor se lidar com a crise económica;
• Aumentar a eficácia do controlo interno no sentido de assegurar a eficiência dos custos e das despesas;
O nosso futuro é incerto, de tal modo que pensar nele seria um esforço em vão. O nosso esforço deve estar concentrado em sobreviver cada dia e isso deve ser feito num ambiente menos hostil e pacífico.
Todo o esforço colectivo, cada metical, cada homem, cada cabeça deve ser usado para assegurar que a gente atravessa esta crise como um país, um povo uno e em paz.
Sem comentários:
Enviar um comentário