Sunday, March 10, 2013

Guerra do ocidente contra a África (conclusão)

 

Com a NATO a trabalhar para fazer da Líbia um estado falhado, esse sistema local foi destroçado. As milícias salafistas não receberam só equipamento militar ultra moderno, cortesia da NATO; receberam também carta branca para saquear os arsenais do Governo líbio e um paraíso seguro a partir do qual organizaram ataques por toda a região.
Maputo, Sábado, 9 de Março de 2013:: Notícias
As fronteiras entraram em colapso, com a aparente conivência do novo Governo líbio e dos seus patrocinadores na NATO – como regista um trágico relatório da empresa de segurança global Jamestown Foundation.
Segundo esse relatório, “Al-Wigh era importante base estratégica do regime Khaddafi, localizada numa região próxima das fronteiras com Niger, Chade e Argélia. Depois da queda de Gaddafi, a base passou a ser controlada por combatentes da tribo Tubu, sob comando nominal do Exército Líbio, mas sob comando local de um comandante Tubu, Sharafeddine Barka Azaiy, que reclamou que "durante a revolução, controlar essa base era assunto de máxima importância estratégica. Conseguimos ocupar a base. Agora nos sentimos abandonados. Não temos equipamento suficiente, nem viaturas nem armas para proteger a fronteira. Embora sejamos parte do exército nacional, ninguém nos paga soldo.”
O relatório conclui que “o Conselho de Governo Nacional Líbio (GNL) e o que havia antes dele, Conselho Nacional de Transição (TNC), falharam na segurança de importantes instalações militares no sul e permitiram que a segurança de vastas porções de fronteira no sul fossem de facto 'privatizadas' nas mãos de grupos tribais, conhecidos há muito tempo pela prática, ali tradicional, de contrabando. Isso, por sua vez, põe em risco a segurança da infra-estrutura do petróleo líbio e a segurança das regiões vizinhas. Com a venda e o transporte de armas líbias já convertidos em mini-indústria na era pós-Gaddafi, as imensas quantidades de dinheiro com que conta a Al-Qaeda no Maghreb Islâmico conseguem abrir muitas portas, em região empobrecida e subdesenvolvida. Ainda que a invasão francesa no norte do Mali consiga desalojar os militantes islamistas, nem assim haverá o que impeça os mesmos grupos de estabelecer novas bases nas áreas mal controladas do deserto selvagem no sul da Líbia. Enquanto não houver estruturas de segurança controladas por autoridade central na Líbia, o interior desse país continuará a ser ameaça de segurança para todas as demais nações na região”.
A vítima mais óbvia dessa desestabilização foi o Mali. Não há analista sério que não saiba que a tomada do Mali pelos salafistas é consequência directa da acção da NATO na Líbia. Um dos resultados do avanço da desestabilização promovida pela NATO no Mali é que a Argélia – que perdeu 200 mil cidadãos numa guerra civil contra os islamistas nos anos 1990 – está hoje cercada por milícias salafistas pesadamente armadas em duas fronteiras: ao leste (fronteira com a Líbia) e ao sul (fronteira com o Mali). Depois da destruição da Líbia e do derrube de Hosni Mubarak no Egipto, a Argélia é hoje o único estado do norte da África ainda governado pelo partido anti-colonialista que conquistou a independência contra a tirania das forças coloniais europeias.
Essa postura de independência ainda está bem evidente na atitude da Argélia em relação à África e à Europa. No front africano, a Argélia é forte apoiante da União Africana, contribuindo com 15 porcento do orçamento da organização; e tem 16 bilhões de dólares empenhados na constituição do Fundo Monetário Africano, o que faz dela o maior contribuinte do FMA. E nas relações com a Europa, a Argélia tem-se recusado repetidamente a fazer o papel de nação subordinada que a Europa espera dela. Argélia e Síria foram os dois únicos países da Liga Árabe que votaram contra o bombardeamento da NATO contra a Líbia e a Síria. E, como se sabe, a Argélia deu abrigo a membros da família Gaddafi que fugiam de ser massacrados pela NATO.
Mas, do ponto de vista dos estrategistas europeus, muito mais preocupante que tudo isso é, provavelmente, que a Argélia – com o Irão e a Venezuela – constitui o que eles chamam de uma “(Organização dos Países Produtores de Petróleo) OPEP linha dura”, empenhados em vender caro o acesso aos seus recursos nacionais. Como se lia recentemente em furibundo artigo publicado no London Financial Times, “o nacionalismo dos recursos” impera. Resultado disso, “as Grandes do Petróleo padecem de muitas dificuldades na Argélia; as empresas reclamam da burocracia que as esmaga, dos controlos fiscais duríssimos e do comportamento abusivo da Sonatrach, a empresa estatal de energia, que participa em quase todos os contratos de petróleo e gás”. Na sequência, o artigo observa que a Argélia implementou “um controverso imposto monstro” em 2006, e cita um executivo de petroleira ocidental em Argel, que disse que “as empresas de petróleo estão fartas da Argélia”.
É instrutivo observar que o mesmo jornal também acusou a Líbia de “nacionalismo dos recursos” – ao que parece o crime mais hediondo, na avaliação daqueles leitores – apenas um ano antes da invasão da NATO.
Evidentemente, “nacionalismo dos recursos” significa precisamente que os recursos de uma nação sejam usados, em primeiro lugar, para promover o desenvolvimento em benefício da própria nação, não em benefício de empresas estrangeiras e, nesse sentido, a Argélia bem merece a “acusação”. A Argélia exporta mais de cerca de $70 biliões em petróleo por ano, e muito desse dinheiro tem sido usado em investimentos massivos em moradia e saúde pública, além de um financiamento recente de $23 biliões, num programa de estímulo para pequenos comerciantes. De facto, esses altos níveis de investimentos sociais são considerados por muitos como a principal razão pela qual não se viram levantamentos da “Primavera Árabe” na Argélia, em anos recentes.
A mesma tendência de “nacionalismo dos recursos” também aparece anotada em recente material distribuído por STRATFOR, empresa de inteligência global, que escreveu que “a participação estrangeira na Argélia sofreu, em larga medida, por causa das políticas proteccionistas aplicadas pelo governo militar fortemente nacionalista”. Seria evento particularmente preocupante, diz STRATFOR, no momento em que a Europa aproxima-se da situação em que se tornará muito mais dependente do gás argelino, com as reservas no Mar do Norte em processo de esgotamento. “Desenvolver a Argélia como grande exportador de gás natural é imperativo económico e estratégico para os países da União Europeia, no momento em que a produção da commodity entra em declínio terminal na próxima década. A Argélia já é importante fornecedor de energia para o continente, mas a Europa precisará de acesso expandido àquele gás natural, para suprir o declínio das suas reservas indígenas” – diz STRATFOR.

Os planos das Grandes do Petróleo para a África

Maputo, Sábado, 9 de Março de 2013:: Notícias
Prevê-se que as reservas britânicas e holandesas de gás no Mar do Norte estarão esgotadas no final desta década; e que as da Noruega entrarão em acentuado declínio a partir de 2015. Com a Europa temerosa de tornar-se superdependente do gás da Rússia e da Ásia, o relatório anota que a Argélia – com reservas de gás natural estimadas em 4,5 trilhões de metros cúbicos, e reservas de gás de xisto de 17 trilhões de metros cúbicos – tornar-se-á fornecedora essencial. Mas o maior obstáculo para que a Europa controle esses recursos ainda é o Governo da Argélia – com as suas “políticas proteccionistas” e o seu “nacionalismo dos recursos”.
Sem dizê-lo abertamente, o relatório conclui sugerindo que uma Argélia desestabilizada e convertida em “estado falido” seria sempre preferível a uma Argélia sob governo “proteccionista”. E sugere que “o envolvimento que se vê hoje das majors de energia da União Europeia em países de alto risco, como Nigéria, Líbia, Iêmen e Iraque, indica saudável tolerância à instabilidade e a problemas de segurança”.
Por outras palavras: em tempos de segurança privada, o Big Oil já não carece de estabilidade ou da protecção do estado para os seus investimentos. Zonas de desastre são toleráveis. Intoleráveis, só estados fortes e independentes.
Já aparece, portanto, no radar dos interesses estratégicos da segurança energética do ocidente, uma Argélia reduzida a estado falhado, exactamente como o Iraque, o Afeganistão e a Líbia um dia apareceram no mesmo radar.
Com isso em mente, é fácil ver como a política aparentemente contraditória de armar milícias salafistas num primeiro momento (na Líbia) e imediatamente depois passar a bombardeá-las (no Mali) faz, de facto, perfeito sentido. A missão francesa de bombardeamento visa, nas próprias palavras dos franceses, à “total reconquista” do Mali. Na prática, implica empurrar os rebeldes gradualmente para o norte do país. Quer dizer: directamente para a Argélia.
Vê-se afinal que a deliberada destruição do sistema de segurança que a Líbia coordenava em toda a região do Sahel-Sahara trouxe vastos benefícios para os que contam com que a África permaneça presa no papel de fornecedora subdesenvolvida de matéria prima barata. O processo já armou, treinou e assegurou território para milícias que, em seguida, serão usadas na destruição da Argélia – o único grande estado rico em recursos naturais do norte da África ainda empenhado numa genuína unidade africana, com independência. A operação também persuadiu alguns africanos de que – diferente da rejeição unânime contra o AFRICOM, há pouco tempo – eles realmente precisam, hoje, de que o ocidente os “proteja” daquelas milícias.
Como a clássica venda de protecção à moda das máfias, o ocidente cuida de tornar a sua protecção “necessária”: arma e atiça ele mesmo as forças contra as quais, adiante, as pessoas terão de ser protegidas.
Agora, a França está a ocupar o Mali; os EUA estão a montar uma nova base de drones no Níger; e o Primeiro-ministro britânico, David Cameron, fala do seu compromisso com uma nova “guerra ao terror” que se alastrou sobre seis países e durará décadas.
Mas nem tudo caminha bem, no front imperialista. Longe disso, porque o ocidente, sem dúvida alguma, contava com não ter de mobilizar os seus próprios soldados. O objectivo inicial era sugar a Argélia e colhê-la exactamente na mesma armadilha já usada com sucesso contra a União Soviética nos anos 1980 – exemplo anterior de Grã-Bretanha e EUA, patrocinando violenta insurgência sectária nas fronteiras do território inimigo, para atrair o inimigo-alvo para a guerra destrutiva de retaliação. A guerra da URSS no Afeganistão, no final, não apenas fracassou: ela também, no processo, destruiu a moral e a economia do país e foi factor-chave por trás da autodestruição do estado soviético em 1991.
Mas a armadilha para pegar a Argélia não funcionou. A jogada de Clinton e François Hollande, fazendo a cena do 'polícia bonzinho' e 'polícia durão' – uma “pressionando para a acção” em Argel, em outubro; e as ameaças dos franceses, dois meses depois – deu em nada.
Simultaneamente, em vez de se manterem fiéis ao roteiro, os imprevisíveis salafistas, na função de simulacros locais do ocidente, optaram por expandir a sua base no norte do Mali, não na direcção da Argélia, como previsto, mas para o sul, rumo a Bamako, ameaçando desestabilizar um regime aliado do ocidente, ali instalado, por golpe, menos de um ano antes. Os franceses foram obrigados a intervir, para mandar os salafistas de volta para o norte, de volta contra o estado que, desde o início, deveria ter sido o seu alvo real.
Até aqui, essa invasão parece contar com certo nível de apoio entre os africanos que temem os salafistas simulacros do Ocidente, ainda mais do que temem os próprios soldados ocidentais. Mas, à medida que a ocupação se aprofunde, desconstruindo a credibilidade dos salafistas e ultrapassando-os em número de soldados ocupantes, ao mesmo tempo em que se for conhecendo a brutalidade dos ocupantes e dos seus aliados... então, veremos. Veremos quanto tempo durará tudo isso.
  • Dan Glazebrook. “Al-Ahram Weekly”, Cairo

Comments

1
ZACARIA said in reply to Chacha...
Boa tarde .,
Comentar o quê Sr. Chacha ?? Coitados dos Líderes Africanos não têm culpa nenhuma ,a culpa é do Ocidente ...linda conclusão ,Saiba Sr. Chacha que do mesmo modo que há maus líderes Ocidentais também há maus líderes Africanos mas como estamos falando de líderes Africanos sempre lhe digo que o Sr.,sim o Sr.Chacha ,e os outros africanos como o sr. é que elegem os seus líderes por isso no final dos finalmente VOCÊS SÃO OS GRANDES RESPONSÁVEIS por "ESSES CRIMINOSOS " como o Sr. lhes chama Sr.Chacha .Pense bem no que acabei de lhe dizer e verá que estou certo .
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Muana Otomeia said in reply to Chacha...
SABE PORQUE MEU IRMAO?
ESTES LADORES DE LIDERES AFRICANOS ESTAO MAIS PREOCUPADOS EM ENCHER SEUS SACOS DE DINHEIRO E NAO NAS CAUSAS SOBERANAS DAS SUAS NACOES. RESULTADO:BASTA QUE LHES SEJA GARANTIDO OPODER E ALGUMAS CONDICOES, VENDEM A CAUSA NACIONAL SOB PRETESTO DE FINANCIAMENTOS A ECONOMIA, COMO SE A AFRICA NAO PODESSE DO ZERO REEGUER-SE SEM TAIS DOLARES E EUROS ENVENENADOS
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Chacha said...
QUE SE LEIA COM PROFUNDIDADE ESTE ARTIGO.
EXATAMENTE O QUE ESTAVAMOS A DISCUTIR NA SEMANA FINDA:
Eu dizia: "ESTES CRIMINOSOS SAO UMA CRIACAO DO OCIDENTE QUE OS CRIA PARA DESESTABILIZAR OS PAISES".
Algumas pessoas contaram muitas versoes suas.
Eu gostaria de ouvir comentarios, especialmente dos srs ZACARIA e MOISES.
NAO EH O OCIDENTE QUE CRIA CRIMINOSOS PARA A REALIZACAO DOS SEUS OBJETIVOS?
Segundo o artigo, a Argelia eh o foco maior neste caso, a desestabilizar. Tornar Argelia num estado falido. Que pena.
Segundo o artigo, se o Mal foi parar no MALI, porque Argelia conseguiu defender-se.
Entendem o jogo que est'a sendo jogado?
Isso deveia ser discutido e analisado muito profundamente pelos paises africanos. Eh grande pena que no meio desses africanos existem os que ja trairam a causa regional. Sera o problema da fraca capacidade de analise dos dirigentes africanos? Com tantas organizacoes regionais, o que realmente dificulta concertar as posicoes?
O que eu referi na semana passada, eh necessafrio congregar a intelectualidade africana para abordar estes problemas muito seriamente. Para chamar atencao aos palhacos dirigentes africanos o caminho tortuoso que estao a seguir, cegamente. Chamar a Franca para intervir antes que as possibilidades internas e regionais sejam esgotadas. O culambismo demais, alta traicao da causa regional.
Uma forma de participar nessas discussoes seria nos eventos em que eles se juntam. Devia haver espaco para que as pessoas que conhecem da materia exponham, chamando-lhes atencao.
Uma situacao delicada.

1 comment:

Anonymous said...

A tooth (plural teeth) is a cheap, calcified, whitish form start in the jaws (or mouths) of multitudinous vertebrates and used to defeat down food. Some animals, strikingly carnivores, also partake of teeth for hunting or instead of defensive purposes. The roots of teeth are covered by means of gums. Teeth are not made of bone, but rather of multiple tissues of varying density and hardness.

The general design of teeth is alike resemble across the vertebrates, although there is sizeable converting in their fabric and position. The teeth of mammals drink profound roots, and this design is also create in some fish, and in crocodilians. In most teleost fish, regardless how, the teeth are attached to the outer surface of the bone, while in lizards they are attached to the inner surface of the jaw by way of a man side. In cartilaginous fish, such as sharks, the teeth are joined by means of cold ligaments to the hoops of cartilage that construct the jaw.