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Josina Machel (1945-1971)
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Josina Muthemba Abiatar nasceu em 10 de Agosto de 1945 em Inhambane. Ela terminou a escola primária em 1956, e mais tarde entrou no instituto comercial em Lourenço Marques, onde se tornou politicamente activa em grupos estudantis clandestinos. Em Março de 1964 tentou, sem sucesso, chegar Tanganyika, mas foi presa pelos rodesianos, e entregue à PIDE. Na cadeia foi aliciada a receber bolsa de estudo em Portugal, tendo fingido aceitar ao que foi liberta mas, fugiu novamente, no início de 1965, desta vez viajando via Suazilândia, África do Sul e Bechuanaland (hoje Botswana) até Dar es Salaam. Após o treinamento, ela era activa na luta de libertação em Niassa e Cabo Delgado. Em Maio de 1969 casou-se com Samora Machel, então comandante militar da Frelimo. Morreu na madrugada de 7 de Abril de 1971, aos 25 anos. Na altura, estava empenhada na sensibilização das mulheres a entregarem os filhos ao cuidado da Frelimo, na Tanzania, onde receberiam todos os cuidados necessários. (Conferir o texto em baixo). O seu empenho a causa da mulher na luta continua a fazer dela um "símbolo da mulher moçambicana combatente".
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Intervenção da camarada Josina Machel, numa reunião realizada na Base Central do Niassa Oriental, em Janeiro de 1971, com o Departamento Feminino, em resposta a problemas vários apresentados pelo Departamento. Uma intervenção improvisada e gravada.
A FRELIMO somos nós mesmos; uma pessoa não pode currmprir uma tarefa devidamente sem compreender o seu valor. A FRELIMO tem um programa para cada criança que nós temos. Donde e de quem saiu a ideia ou plano de traçar esse programa? Saiu das ideias dos membros, dirigentes, nas suas discussões, exactamente o que as camaradas estão a fazer. É preciso saber que mesmo os dirigentes quando traçam um plano não pensam assim de qualquer maneira. Baseiam aquilo que eles pensam no povo. Eles têm opiniões e ideias dos camaradas e daí traçam um plano. Nós devemos realizar um trabalho a partir da realidade concreta em que nós vivemos. Sobre o plano das crianças, a camarada Dunia disse que não podia deixar a sua criança em Tunduru e continuar a trabalhar aqui. Ela disse isto deixando de dizer aquilo que pensa, e vai ao problema de Tunduru. O plano que está aqui é daqui e de Tunduru, é dela; portanto o que nós queremos é que ela diga das crianças que estão aqui e o que podemos fazer de maneira a permitir que as mães continuem a trabalhar. Nós temos muitos programas idênticos em cada Província, assim como no exterior. Temos o Centro de Preparação Político - Militar em Nachingwea, e em cada província também temos centros de preparação Político-militar. Vocês conhecem camaradas que receberam treinos aqui no interior e que combatem o inimigo sem nunca ir para o exterior porque não há necessidade, e assim eles continuam com o trabalho nas zonas onde foram afectados. Falando concretamente no plano das crianças, as camaradas sabem que não é só em Tunduru onde temos um programa de criar condições para o cuidado das crianças: nas províncias, dentro do nosso País, também temos este programa. Por exemplo, em Cabo Delgado e Niassa Ocidental estamos a organizar, e quanto aqui, devemos dizer que estamos a estudar como fazer e organizar o mesmo programa. Mas para organizarmos é preciso que haja uma ideia comum para que assim possa& permitir nascer um plano. Nós compreendemos muito bem as dificuldades que as camaradas têm na realização devida de certas actividades por causa das crianças. Nós também sabemos que as camaradas têm vontade de trabalhar, mas que não o podem fazer porque as circunstâncias em que se encontram às vezes não facilitam, e por nós estarmos a par disso, dirigimo-nos às camaradas para estudarmos em conjunto o plano, e daí começar o trabalho.
As Criança SERVIRÃO O PAÍS
As camaradas sabem que os objectivos da FRELIMO são em primeiro lugar pela libertação do nosso país, e durante este tempo de luta armada temos outros planos de acção, que ao fim e ao cabo têm os mesmos objectivos: Libertar o nosso país e a nós próprios do jugo colonial português. As camaradas falaram das dificuldades que as populações mostram em tratar os seus filhos para as escolas, porque não querem viver longe dos filhos, mas as camaradas sabem porque que é que a FRELIMO quer que estas crianças estudem, e como as camaradas compreendem não se cansam de explicar às populações a razão da FRELIMO querer levar as crianças para as escolas. As camaradas sabem que aquelas crianças depois de estudarem não servirão somente aos pais, mas também servirão para o desenvolvimento do nosso país depois da independência. Eu penso que quando as camaradas falam sabem o que estão a dizer e compreendem a linha que a FRELIMO traçou. As crianças que estão em Tunduru não estão perdidas, elas estão sob o controlo efectivo da FRELIMO, e a FRELIMO tem um programa traçado para elas. As camaradas sabem que em Tunduru há equipas de camaradas que estão ali especialmente para cuidarem das crianças, e tudo isto é feito porque nós sabemos Que são moçambicanos, e também sabemos que é ali onde está a nossa esperança. E das crianças que estão nas províncias sob o nosso controlo, os objectivos que a FRELIMO tem sobre elas são os mesmos. Portanto, o programa para as crianças não é só de Tunduru, mas sim de todas as frentes. A FRELIMO tenta o máximo em organizar. No lugar onde há organização tenta aperfeiçoar, e no lugar onde não há organiaação estuda os meios de organização.
PÔR A MILITÂNCIA ACIMA DO SENTIMENTO MATERNAL
Eu também tenho uma criança, ela é ainda pequenina, mas deixei-a não porque não queira ficar sempre junto dela, mas devido às circunstâncias de trabalho da Revolução que não permitem sempre estar com ela. O mesmo vai acontecer convosco e deste modo, se traçarmos um programa é preciso que as camaradas compreendam porque é que vai ser assim. É bom compreender que a FR'ELIMO ao traçar programas para vocês não é porque não queira que as camaradas vivam junto das vossas crianças - a FRELIMO sabe que as camaradas têm amor por elas, mas aqui o que é necessário é fazer um combate interno. Se as camaradas vêem que são militantes da FRELIMO e estão prontas para executar qualquer missão que a FRELIMO lhes confiar é porque sabem porque é que lutam. Há camaradas que dizem, e já disseram, que estavam prontas para executar qualquer trabalho indicado pela FRELIMO. Por outro lado, as camaradas vêem que nós, o órgão regional, assim como os dirigentes máximos da FRELIMIO têm muita preocupação quanto aos trabalhos do Destacamento Feminino. Para as camaradas aqui presentes que não têm filhos nós sabemos que elas continuarão a trabalhar devidamente sem problemas, mas o caso de vocês que têm filhos é já diferente. O programa da FRELIMO tem em relação aos filhos que tendes e os das outras camaradas nesta província e noutras é comum e o que nos falta é pôr em vigor. Agora, o problema reside em vocês. É preciso que compreendam porque é que vamos tirar as vossas crianças de vocês. Primeiro, saber como vão e como podem contribuir devidamente à Revolução; segundo, estar bem certas que as crianças serão cuidadas pela FRELIMO da mesma maneira como nós todos somos cuidados pela FRELIMO, e nós podemos dizer que esta é uma das razões que nos fez vir aqui estudarmos em conjunto. As camaradas com bebés ainda pertencem ao Destacamento Feminino, portanto, nunca pensar que já não pertencem pelo facto de possuírem crianças. Como disse no princípio, o problema está em vocês, porque se vocês mostrarem resistência ao programa que será traçado, então aí será difícil cumprirmos os programas segundo aquilo que nós pensamos. Quando as camaradas afirmam dizendo que estão dispostas a cumprir qualquer tarefa da FRELIMO isto indica que as camaradas compreendem, e deste modo elogio este espírito. Nós traçaremos um programa segundo o qual as camaradas não poderão estar junto das vossas crianças. Vocês podem realizar os trabalhos, e no momento em que necessitarem de ver as vossas crianças irão vê-las, mas essas crianças terão camaradas que se responsabilizarão por elas. As camaradas terão o cuidado da alimentação, roupa, higiene e tudo o que for necessário para a sua vida. Nós sabemos que as crianças são vossas mas também da FRELIMO. A FRELIMO tem uma grande preocupação sobre cada uma delas; a FRELIMO, tem uma grande responsabilidade de educar essas crianças, porque sabemos que delas sairão os continuadores da luta. A FRELIMO preocupa-se em, educar para que amanhã consigam continuar a contribuir melhor na luta em diferentes tarefas. No que se trata das crianças das populações o caso é diferente, e quanto a vocês o caso já é específico, porque vocês são militantes activas da FRELIMO, do Destacamento Feminino e nós precisamos de vocês nas fileiras. Nós devemos preocuparmos com as vossas crianças desde já enquanto estão convosco. Outro problema: as camaradas sabem que à medida que aparecem camaradas grávidas são logo afastadas do Destacamento Feminino para as populações ou para as branches até que dêem à luz, e durante esse tempo, do nosso lado, diminui-se o número de forças, porque o lugar que ocupavam essas forças está vazio. Se nós agimos duma forma a fazer com que vocês permaneçam ainda no Destacamento Feminino, esta é a razão fundamental. Estas são as nossas preocupações e elas são não só minhas, como responsável vossa, mas também são dos responsáveis da região e da direcção máxima da FRELIMO, portanto, estas preocupações são comuns.
O PROBLEMA DAS Populações
Por outro lado, queria elogiar os trabalhos que as camaradas têm vindo a realizar. O trabalho que as camaradas agora realizam no seio das populações é sério, especialmente aqui nesta região onde nós sabemos que as populações são poucas e devemos fazer os possíveis para as manter aqui no interior, visto que elas às vezes têm tentação de fugir para a Tanzânia. Quando lavamos as camaradas para as populações não pensem que é pelo facto de possuírem crianças, mas porque pensamos que ali é o melhor lugar para vocês poderem trabalhar enquanto cuidam das vossas crianças. Nós pensamos sempre em vocês e temos tido a preocupação de acompanhar a saúde das vossas crianças. Os problemas sobre as populações, que as camaradas acabaram de apresentar parecem brincadeiras, mas isso pode fazer com que elas recuem, portanto, é bom que as camaradas continuem com o trabalho de mobilização sem nunca se cansarem, e há-de chegar o momento em que elas vão compreender. É bom também explicar a situação da guerra noutras províncias, como Tete, Cabo Delgado e Niassa Ocidental, que também as populações vivem nas mesmas condições, uma vez que esta luta abrange todo o Moçambique e não só aqui no Oriente do Niassa. Devem também explicar que esse sofrimento não é porque os militantes começaram a luta contra os colonialistas portugueses. Os militantes compreenderam a necessidade de combater contra o inimigo para libertar a elas próprias -as populações. Nós sabemos que os países que estão independentes, mesmo em Tanzânia onde se querem refugiar, passaram por lutas para os tanzanianos se libertarem, portanto é nosso dever sacrificarmo-nos para amanhã nós também tornarmo-nos livres.
A PRODUÇÃO E A HIGIENE
Outro problema é o da produçáo: as camaradas devem continuar a desenvolver a produção. Se as populações consegl,rirem cultivar tantos campos quantos puderem ainda é melhor, porque o inimigo não vai conseguir estragar todas as machambas, porque se estragar uma teremos confiança noutra. É preciso explicar bem às populações a necessidade de produzir o suficiente porque a comida que vem do exterior não é suficiente para alimentar todos os camaradas, e ainda como vocês sabem outra parte da comida é consumida no caminho antes de chegar às bases. Estou muito satisfeita por ouvir aquilo que as camaradas disseram e isto tudo indica que vocês realmente realizam os nossos trabalhos devidamente. As camaradas também não se esqueçam de intensificar os trabalhos de higiene nas populações; vocês devem saber que o povo pode ser ensinado uma coisa hoje e amanhã não se lembrar dela; devem ter paciência em ensinar constantemente até chegar ao nível de compreensão. Às vezes pode-vos dirigir perguntas sem fundamento, mas tenham sempre a paciência de lhes explicar até que estejam completamente claros dos problemas. E no que respeita ao campo da higiene apelo-vos uma vez mais que façam sempre os possíveis em ensinar às massas até chegarem a compreender, mas também é preciso saber e compreender que a higiene deve começar por vocês mesmas. E agora falando mais uma vez do problema das crianças peço às camaradas que estudem profundamente, porque ele é sério. Nós temos um programa com estas crianças, portanto preparem-se moral e fisicamente para continuarem nas fileiras enquanto estão afastadas das vossas crianças. Nós não queremos ver o Destacamento Feminino apagado; e o programa de que vos falei não será posto em vigor hoje e nem amanhá, mas digo isso para as camaradas não lamentarem quando chegar o momento das crianças serem levadas para o lugar onde deverão ficar. Os responsáveis da região vão falar convosco e eles estudará o os meios de materializar o programa. A LUTA CONTINUA!
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