CRÓNICA exotérica - Por Yahia ben Yokhanon (alias João Craveirinha)
(Segundo texto apócrifo de Zoao Kraveirinya na era do Tsuname)
Nachingueia, Farm 17, sul de Tanzânia. Manhã de um dia diferente no mês de
Janeiro de 1975. Alguns Homens e mulheres abatidos estão perfilados perante
Samora Machel e o então 1º Ministro Joaquim Chissano, passando revista e
verificando até que ponto a “sessão” da noite anterior no mato (até ao
amanhecer), tinham causado danos físicos aos apresentados. O destino desses
homens e mulheres estão em jogo. Samora Machel dirige-se ao veterano nacionalista, Adelino Gwambe, com a
saudação: - “kundjane uá li kaya?” (Como estás patrício da terra?).
- Adelino Gwambe responde com altivez de mãos nos bolsos: …”chauane mufana uá mina”…(olá meu miúdo) …Valentim o Pide tetense, mestre da tortura, “reconvertido”, e os guardas de capacete de imediato tiram-lhe as mãos dos bolsos com rispidez. Mas Adelino uá kaGuambe, coloca-os de novo nos bolsos em desafio. E Samora sorri condescendente.
- Adelino Gwambe responde com altivez de mãos nos bolsos: …”chauane mufana uá mina”…(olá meu miúdo) …Valentim o Pide tetense, mestre da tortura, “reconvertido”, e os guardas de capacete de imediato tiram-lhe as mãos dos bolsos com rispidez. Mas Adelino uá kaGuambe, coloca-os de novo nos bolsos em desafio. E Samora sorri condescendente.
Adelino Gwambe (protegido de Kwame Nkrumah e de Mao – Tse - Tung). A. Gwambe, na década de 1950, sem dúvida o jovem moçambicano mais dinâmico no nacionalismo Africano clássico. E Marcelino dos Santos no exterior (na Europa e norte de África), outra “bandeira” do inconformismo nacionalista mais à esquerda. “Apadrinhado” pelo Rei Hassan de Marrocos, pelo francês George Marchais do Partido Comunista Francês e ainda por Mao - Tse -Tung líder da revolução chinesa. Conviveu com a resistência argelina de Ben Bela. Regressando a esse dia, algures do mês de Janeiro de 1975, em Nachingueia, estão também perfilados:
- Uria Simango ex –vice-presidente e sua esposa Celina Muchanga ex Presidente da LIFEMO; Paulo Gumane (co-fundador da FRELIMO e Presidente do COREMO baseado em Zâmbia); o ex-comandante da FRELIMO, Januário Napulula (rendeu-se aos portugueses em 1971); Joaquim Nhaunga (idem em Cabo Delgado); Pedro Simango ex – 1º comandante de mísseis portáteis terra – ar (entregou-se em Tete em 1972); Judas Honwana (ex - representante da FRELIMO no Cairo apoiou Uria Simango em finais de 1969 depois do Manifesto “ Gloomy Situation in FRELIMO”. apresentou-se voluntariamente à FRELIMO em 1974); Lázaro Kavandame; Kambeu; Veronika; Pascoal Almeida Nhampulo, ex comandante em Cabo Delgado muito corajoso (do tempo de Filipe Magaia). João Craveirinha do DIP, desiludido e “refugiado” em Nairobi (Quénia). “Empurrado” entrega-se em Lourenço Marques em Junho 1972. Após “conversações à distância” apresenta-se em Dar – es – Salaam em 1 de Agosto de 1974 onde é preso numa cave subterrânea alagada, no centro da cidade. Mais tarde (1975/1976) levado para Nachingueia e Niassa. Amnistiado em Abril de 1976 por Samora Machel em Maputo.
Outro dissidente, Lourenço Mutaca, separado de todos “passeia” em Janeiro 1975, num jeep russo com Samora Machel que lhe mostra o campo de Nachingueia. O regressado (dissidente muito activo), Lourenço Mutaca, “apadrinhado” pela Suécia é poupado. Reintegrado mais cedo no Moçambique Independente como quadro superior. Todavia, misteriosamente anos mais tarde é assassinado em Adis Abeba (Etiópia) para onde tinha sido destacado por uma Organização Internacional, autorizado pela Frelimo.
Dá enorme lista de dissidentes detidos constam ainda os nomes de Casal Ribeiro (um dos fundadores da FRELIMO pela Unamo de Tete) e refugiado desde finais de 1969 no norte de Tanzânia. Narciso iNbule um dos fundadores da Frelimo e oposicionista da 1ª hora ao movimento. Basílio Banda ex – estudante do Inst. Moç. Unhai (médico com consultório na Beira em 1974). Marqueza (engenheiro agrónomo) e Júlio Razão todos bolseiros da FRELIMO. Presente Joana Simeão vítima de cálculos políticos errados e manipulada pelo General Costa Gomes e antes por Jorge Jardim (ambos portugueses). De Blantyre (Malawi), Joana Simeão é induzida em erro por Kambeu (Direito Internacional), professor de Liceu na Beira. Kambeu ingenuamente acreditava num multipartidarismo em Moçambique. Joana Simeão regressa e é presa no aeroporto.
O deputado de Salazar, Marcos Assahel Mazula, é preso em Niassa em finais de 1974. Ia visitar os familiares. Vinha de Nampula onde residia, quando não estava em Lisboa. A ordem de prisão partira de Mário Sive na regência do governo em Vila Cabral (hoje Lichinga). …” Prendemos! Não matamos! Porque são inimigos políticos!”…Diria mais tarde, Samora Machel, em 12 de Maio de 1975 em Nachingueia num mega comício –, (centenas de recrutas e convidados), com a presença dos Presidentes da Zâmbia e Tanzânia, K. Kaunda, Samora M., J. Nyerere.
E numa entrevista concedida à RTP (Rádio Televisão Portuguesa), em 27 de Maio de 1975 (terça-feira), sobre a abolição das prisões e pena de morte depois da Independência, teria dito Samora Machel: …”Porque caso contrário teríamos permitido a criação de assassinos no nosso exército. Assassinos que não respeitam vidas humanas. Nós evitamos isso. Não queremos fuzilamentos.” (…)” Portanto, o trabalho político, o trabalho ideológico -, achamos que este é o instrumento fundamental para transformar o homem. Porque todo o homem se transforma não é preciso prisão (ou) paredes.
O que há é a reeducação do povo.” (fim de citação). No entanto ele mesmo, Samora Machel, seria ultrapassado pelo demasiado Poder em mãos alheias, daí talvez, sem a consulta prévia, tenham surgido ordens para matar e deixar em cinzas a maioria dos que ali condenados e humilhados lhes prometera um dia conceder amnistia geral depois de apresentados em mega comício no Estádio da Machava. No fundo, reconhecendo o direito (humano), a “serem libertados e contribuir” apesar de “terem traído a Luta pela Independência”. Esse era o espírito de Samora Moisés Machel, dentro do seu peculiar pragmatismo um tanto ao quanto “naïve ou ingénuo”.
E em 1975 indiferentes aos vários dramas e tragédias, o povo do Rovuma ao Maputo, continuava a entoar com fervor as canções militantes de Nachingueia (Nachingwea). “Tchengera, kapriconi ku Moçambique, lero. Tchengera, tiri, hokonguera, kumenha inkondo. Tchengera, ku Cabo (Delgado), ku lero, kuli ana uá Samora, tchengera. (tradução livre: atenção, hoje - agora, inimigos de Moçambique, atenção, com Samora estamos preparados para a luta, para a guerra, em Cabo Delgado, Niassa (etc)”.
João Craveirinha:
Jornal “O Autarca” da Beira de 11 de Maio de 2006
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