02.04.2016 às 18h08
O primeiro-ministro grego vai escrever à diretora do FMI pedindo esclarecimentos sobre uma alegada teleconferência entre altos quadros do Fundo a respeito da estratégia da organização de Washington para o exame em curso que foi divulgada este sábado pelo WikiLeaks
Ainda este fim de semana, o primeiro-ministro helénico Alexis Tsipras vai pedir esclarecimentos a Christine Lagarde, diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), a respeito de uma alegada teleconferência envolvendo altos responsáveis do Fundo onde se discute a estratégia face ao desenrolar do primeiro exame ao andamento do terceiro resgate à Grécia.
O alegado conteúdo da teleconferência de 19 de março entre Poul Thomsen, diretor do Departamento Europeu do FMI, Delia Velculescu, chefe da Missão do Fundo na Grécia na ocasião hospedada no Hotel Hilton em Atenas, e Iva Petrova, outro alto quadro do Fundo envolvido nas negociações do terceiro resgate no verão passado, foi divulgado este sábado por Julian Assange no portal do WikiLeaks.
Na teleconferência, os três altos responsáveis do FMI discutem detalhes da estratégia do FMI face ao governo grego e aos credores oficiais europeus e especulam nomeadamente sobre a forma e o momento de obrigarem o governo alemão a aceitar uma nova reestruturação da dívida grega e o governo de Atenas a fazer mais concessões em questões politicamente críticas.
Doutrina do "choque"
O risco que Thomsen e Velculescu alegam é o de uma coincidência entre o rebentar de uma nova crise grega (com a possibilidade no verão de um novo incumprimento em pagamentos ao FMI e ao Banco Central Europeu) e o processo de referendo britânico a 23 de junho.
Os dois altos responsáveis do FMI especulam sobre um “evento” que pudesse proporcionar a concretização dos objetivos do Fundo – obrigar Atenas a fazer concessões em pontos politicamente mais duros (que têm sido o cavalo de batalha de Thomsen e Velculescu) e levar a chanceler alemã Angela Merkel a dar luz verde ao alívio da dívida helénica (um outro ponto de honra da estratégia do FMI para se envolver no terceiro resgate com novo financiamento e manter a presença no acompanhamento técnico).
O tema do “evento” discutido na teleconferência é um ponto muito sensível e foi criticado já pelo governo grego. “Os governantes gregos interpretaram [aquela parte da conversa] como o encorajamento, por parte do FMI, de um ‘evento de crédito’ ou de uma bancarrota grega. A porta-voz do governo Olga Gerovasili comunicou que Tsipras exigirá a Lagarde uma explicação sobre se o teor da conversa representa a posição oficial do FMI”, refere o jornal helénico “Kathimerini” na sua edição online.
O jornalista inglês Paul Mason, autor do recente "Pós-Capitalismo - Um guia para o nosso futuro", designou esta estratégia do FMI como a "doutrina do choque".
Segundo aquele jornal grego, um porta-voz do FMI em Washington declinou confirmar ou negar a transcrição divulgada pelo WikiLeaks.
Alexis Tsipras contactou também o presidente grego Prokopis Pavlopoulos que reiterou ao primeiro-ministro que o “FMI não deverá participar mais no programa de resgate grego e que o Mecanismo Europeu de Estabilidade deve ocupar o lugar do Fundo”, refere ainda o jornal helénico.
O FMI tem acompanhado tecnicamente o desenrolar do terceiro resgate à Grécia, e nomeadamente as discussões no âmbito do primeiro "exame" que ainda não foi concluído, mas ainda não decidiu se participa com novo financiamento. Para esse envolvimento tem colocado condições tanto a Atenas como aos credores oficiais europeus.
O Tesouro grego tem de pagar mais de 4,4 mil milhões de euros em julho, o maior volume de encargos até final do ano, a detentores de dívida de curto prazo, ao Banco Central Europeu e ao FMI. Com o atraso da conclusão do primeiro "exame", Atenas não recebeu 4,9 mil milhões de euros no primeiro trimestre previstos no calendário indicativo do terceiro programa e tem mais 4,5 mil milhões que deveriam ser desembolsados pelos fundos europeus de resgate até final do primeiro semestre.
Entretanto gerou-se uma especulação sobre a fonte da “fuga” divulgada pelo VikiLeaks em virtude de, na transcrição, surgir o apelido de Delia Velculescu, que é romena, como “Velkouleskou” (helenizado), o que, segundo o repórter Marcus Walker, do “The Wall Street Journal”, sugeriria que a informação havia sido passada por algum serviço grego. O WikiLeaks desmentiu, de imediato, o tweet do repórter.
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