Primeiro-ministro britânico vendeu participação na Blairmore Investment Trust quatro meses antes de ser eleito, em 2010, obtendo um lucro de 19 mil libras.
O primeiro-ministro britânico admitiu ter detido uma participação no fundo de investimento offshore, por intermédio da sociedade de advogados Mossack Fonseca, no centro do escândalo do Panama Papers. David Cameron alienou essa participação por 30 mil libras (37 mil euros) quatro meses antes de ter sido eleito, em Maio de 2010.
A revelação, de consequências potencialmente explosivas para o líder conservador, surge cinco dias depois de o jornal Guardian, um dos parceiros do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, ter revelado queIan Cameron, um corrector da City de Londres já falecido, ter sido um dos clientes da firma panamiana, que o assessorou na criação da Blairmore Investment Trust, um activo sediado nas Bahamas e que, em trinta anos de actividade, nunca pagou um cêntimo de impostos no Reino Unido. Apesar disso, sublinha o jornal britânico, não há qualquer indício de que o esquema montado fosse ilegal.
A clarificação surge dois dias depois de o primeiro-ministro ter garantido que não possuía acções de empresas nem fundos sediados em paraísos fiscais. A afirmação não foi considerada suficiente pela imprensa e obrigou Downing Street a emitir três comunicados posteriores, afirmando primeiro que nem a mulher nem os filhos eram beneficiários de qualquer activo desse género e, um dia depois, que ninguém na família seria herdeiro de qualquer fundooffshore.
Mas a pressão sobre o líder conservador não diminui – nesta quinta-feira oGuardian fazia um retrato da origem da fortuna da família – e Cameron responde agora finalmente sobre a sua situação financeira passada. Numa entrevista à ITV, Cameron explicou que comprou cinco mil unidades de participação no fundo de investimento de que o pai era director em 1997 por cerca de 12.500 libras (15.400 euros), tendo alienado essa posição em Janeiro de 2010 por 31.500 libras (cerca de 38 mil euros) – o lucro obtido ficou ligeiramente abaixo da fasquia mínima para ser sujeito a imposto sobre mais-valias.
“Quero ser tão franco quanto possível sobre o meu passado, o meu presente e o meu futuro porque, honestamente, não tenho nada a esconder”, afirmou o líder conservador que, aproveitou a entrevista para sair em defesa do pai. “Tenho muito orgulho nele, naquilo que ele fez e no negócio que montou, bem como em tudo o resto”, disse, acrescentando “não suportar ver o nome dele arrastado pela lama”. “Eu escolhi um caminho diferente do meu pai, do meu avô, do meu bisavô, que foram todos correctores, e não tenho nada a esconder sobre as minhas contas. Terei todo o gosto em responder a perguntas sobre isso.”
O nome de Ian Cameron é várias vezes citados nos Panama Papers – 11,5 milhões de documentos da Mossack Fonseca obtidos pelo Consórcio – e neles fica claro que recorreu a vários estratagemas para garantir que o Blairmore não era visto pelas autoridades tributárias como estando sediado no Reino Unido, apesar de tanto a maioria dos seus investidores como quadros dirigentes serem britânicos. Para isso, de cada vez que a direcção do fundo tinha assuntos importantes a tratar Ian Cameron e outros directores reuniam-se no estrangeiro. O jornal Guardian adianta que o fundo contratou também vários cidadãos residentes nas Bahamas, cuja única tarefa seria assinar documentação.
David Cameron responde a estas alegações, negando que o fundo servisse para que os investidores “fugissem aos impostos”, mas como veículo para investimentos cambiais e participações em empresas.
Mesmo que legais, as práticas atribuídas ao pai, bem como o tempo que demorou a dar explicações sobre a sua situação financeira, são lesivas para o primeiro-ministro, que se tem apresentado como instigador de mudanças legais para combater a evasão fiscal e a falta de transparência dos paraísos fiscais. Já nesta quinta-feira, o Financial Times tinha revelado uma carta que Cameron escreveu em 2013 ao anterior presidente do Conselho Europeu defendendo que os fundos de investimento deveriam ser sujeitos a um controlo menos apertado do que as empresas.
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