A caminho dos 30 anos do Acordo de Paz (11)
- O “Congresso da Vitória” da Renamo e o fim das alas externas
No último texto destacamos o fim do isolamento internacional da Renamo, em finais de 1991. A marcar esse facto vai ser um inédito periplo de Afonso Dhlakama, por algumas capitais europeias, começando por Lisboa, no mês de Novembro desse ano.
Esta é uma fase de importantes mudanças estratégicas da Renamo, claramente preparando-se para ocupar o seu lugar em Moçambique pacificado e democrático. Assim é que, no seu regresso da Europa, Afonso Dhlakama vai convocar o II Congresso do movimento, que vai decorrer de 10 a 15 de Dezembro de 1991.
A reunião vai terminar com um largo reforço dos poderes de Afonso Dhlakama, que nos últimos períodos tinha-se livrado de “alas externas” encabecadas por representantes que pareciam agir por conta e risco próprios , como eram os casos de Janeiro da Fonseca, na Alemanha Federal, e Luís Serapião, nos Estados Unidos da América.
Por seu lado, há muito que a “ala” de Lisboa, com figuras como Paulo Oliveira e Jorge Correia, tinha sido desactivada.
Numa forte “remodelação” dos órgãos directivos do movimento, o Congresso vai eliminar praticamente todos os departamentos e exonerar os respectivos chefes.
As atribuições antes conferidas a tais órgãos ficam directamente supervisionadas pelo líder máximo, no quadro de um poderoso “Gabinete Presidencial”.
Vão sobreviver apenas três departamentos, a saber: Informação (Vicente Ululu), Relações Exteriores (transferidas de Raul Domingos para José de Castro) e Organização (Raul Domingos).
Domingos, que é igualmente reconduzido à chefia da delegação do movimento às negociações de Roma, fica assim com a incumbência de iniciar o longo processo da transformação do grupo guerrilheiro em partido político.
A Renamo dá, neste Congresso, sinais triunfalistas , ao baptizar a reunião como “Congresso da Vitória” .
Com os seus poderes assim reforçados e livre de influências de “alas externas”. Afonso Dhlakama procura agora reforçar a sua imagem na região da SADC – que lhe é genericamente hostil.
É assim que o ano de 1992 vai iniciar com uma noticia-supresa: tem lugar, no dia 10 de Janeiro, o primeiro encontro entre Afonso Dhlakama e o Presidente do Zimbabwe, Robert Mugabe, na capital malawiana, Blantyre!
O encontro é um acontecimento extraordinário, conhecidas que eram as velhas posições de pública hostilidade de Mugabe perante Dhlakama: as origens históricas da Renamo colocaram o grupo como uma força instrumentalizada pelo regime Rodesiano para bloquear as forças nacionalistas zimbabweanas na frontera com Moçambique.
O encontro tornou-se possível graças à mediação de uma figura com papéis muito peculiares, quer na guerra, quer na pacificação de Mocambique: Tiny Rowland, administrador da multinacional britânica, Lonhro – que vai estar muito activo até à data da assinatura do AGP!
Uma tentativa anterior do empresário britânico, de preparar um encontro entre Dhlakama e Chissano, tendo no meio o Presidente Zambiano Kenneth Kaunda, terminaria sem quaisquer resultados positivos, já que o estadista moçambicano condicionava evento a avanços significativos na mesa negocial, assegurando um acordo de cessar-fogo.
Pelo contrário, a Dhlakama tal encontro seria do maior interesse, visto que iria reforçar a sua imagem política antes que um acordo fosse alcançado.
Rowland, cuja multinacional foi a primeira a fazer investimentos de vulto em Moçambique em período de conflito, na área agrícola em Gaza, exploração de ouro em Manica, produção de algodão em Cabo Delgado e a gestão do Hotel Cardoso em Maputo, via o fim da guerra como oportunidade para uma maior rentabilização dos seus negócios.
“O meu encontro com Mugabe foi muito positivo. Assim que nos vimos, ele perguntou-me de onde eu era, em Moçambique. Eu respondi-lhe em Shona e ai começamos a conversar à vontade nas nossas línguas” , diria, mais tarde, AfonsoDhlakama.
Neste encontro, Mugabe terá assegurado a Dhlakama que o Zimbabwe iria respeitar qualquer acordo que fosse alcançado nas negociações de Roma e manter-se-ia neutro nas eleições gerais em Mocambique então previstas para o ano de 1993.
Contudo, o objectivo final de Tiny Rowland era claro: lograr um encontro “tetê-à-tête” , entre Afonso Dhlakama e Joaquim Chissano. Mas se por um lado, Maputo continuava a condicionar tal encontro a um compromisso de rápido acordo de cessar-fogo, já a Renamo insistia em dar primazia ao alcance de acordos e de garantias políticas.
Assim é que, contra todas as expectativas iniciais dos mediadores, apoiados por intensas diligencias político-diplomaticas da Europa e dos Estados Unidos, no início de mais uma ronda de conversações, aberta no dia 21 de Janeiro de 1992 a Renamo vai surgir sem a sua delegação militar – ao contrário da delegação do governo, à qual se havia juntado uma equipa militar liderada pelo General Todias Dai, então Comandante do Exercito.
Esta sessão ia assim limitar-se a iniciar a abordagem dos princípios do processo eleitoral, com a previsão de observação internacional – em que a Renamo vai acrescentar um ponto critico: “livre acesso aos meios de comunicação social durante a campanha eleitoral”.
Entretanto, um elemento novo vai ser introduzido nesta ronda: as delegações deixam a sede da Comunidade de Sant’ Egidio, passando a reunir em edifício oficial do Ministério dos Negocios Estrangeiros, a sumptuosa Villa Madama – local onde, dez meses mais tarde, Afonso Dhlakama e Joaquim Chissano iriam apertar as mãos, na assinatura do Acordo Geral de Paz.
Segundo alguns observadores, esta mudança de local das conversas não era casual: ante os contínuos impasses e a pressão de potencias estrangeiras, no sentido de participarem no processo, o Governo Italiano quis dar sinal forte do seu inteiro cometimento com o processo, ao mais mais alto nível.
Kuyengany Produções
Merci beaucoup tonton TVM
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Edmu Joao Panguene
Obrigado Tomás Viera Mário.
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