ESPOLIADOS DE
MOÇAMBIQUE
ARGUMENTOS PARA
CONTESTAR A PRESCRIÇÃO
Por Ângelo SoaresEm http://www.espoliadosultramar.com/imprensa1.html
1. Acordo de Lusaka assinado em
7/9/74: não contem uma única palavra a defender, após a independência, os bens
dos portugueses que viviam em Moçambique. A única referência a bens respeita ao
período do governo de transição. Acordo entre os representantes do Estado
Português e a FRELIMO partido político. Não consta que tenha, posteriormente,
sido ratificado pelo Governo legítimo de Moçambique.
Os 140 soldados portugueses
aprisionados pela FRELÍMO de forma traiçoeira, no dia 1/08/1974, na base Omar,
e levados para a Tanzânia, donde só foram libertados 12 dias depois de assinado
o Acordo de Lusaka terão servido, na opinião do alferes miliciano seu
comandante, como “moeda de troca” para
o referido Acordo: classificado por Spínola como “ uma das páginas mais vergonhosas da História do Exército Português,
uma arma decisiva na mesa das negociações”.
Em Agosto de 2005, Mariano
Matsinha, veterano da Frelimo que também esteve em Lusaka, declara ter sido assinado,
também e em simultâneo, um Acordo Militar, “documento
guardado a sete chaves pelo governo”, nunca divulgado a pedido dos
portugueses.
2. O Conselho de Ministros da
República Popular de Moçambique faz publicar o Decreto-Lei Nº 4/75, em 16 de
Agosto, que “encerra os escritórios de
advogados, por ter sido julgada incompatível a existência de advocacia privada
com uma justiça que se irá pôr ao serviço das largas massas do povo
moçambicano”.
Em consequência “deixou de ser permitido em Moçambique, a
título de profissão liberal, exercer advocacia ou funções de consulta jurídica,
solicitar judicialmente ou praticar procuradoria judicial ou extra judicial”,
tendo sido criado o Serviço Nacional de Consulta e Assistência Jurídica” na
dependência da Procuradoria-Geral da República.
3. Em Dezembro 1976 o Estado
Português mandou publicar em vários jornais um AVISO dirigido a todos os
interessados que tenham “deixado bens”
e “dinheiros” nos antigos territórios
portugueses que deverão enviar uma relação dos mesmos directamente ao Inst.
Coop. Económica, a qual “destina-se
apenas a obter uma tipificação e identificação de casos concretos a apresentar
em eventuais negociações”. Que nunca ocorreram e consta não terem sequer
sido tentadas.
4. Em resultado deste AVISO foram
registados no ICE/ICP largos milhares de processos, tendo 46.000 destes sido
processados por tabulação em computador (1976-1988) obedecendo a uma divisão
por 18 rubricas.
5. Da tabulação constam os valores,
tendo sido inúteis todas as insistentes diligências das Associações de
Espoliados para que fossem obtidos os totais por rubrica e o total geral.
Tal procedimento é considerado
boicote às reivindicações dos espoliados e confirma a incapacidade de ICE/ICP
dedicado à cooperação e do M.N.E em darem início, 33 anos decorridos, às
necessárias negociações com os PALOP’S.
6. O incrível e perverso Artº.
40º., da Lei Nº 80/77, de 26/10, pretende que os bens expropriados estão
sujeitos a regime de indemnização fixado segundo a Lei do estado da localização
dos bens.
A Assembleia da República não
teve em conta que o acordo de Lusaka não responsabiliza o Estado de Moçambique.
E, mesmo que o responsabilizasse, o Dec. Lei Nº 4/75, de 16 Agosto, impediria
qualquer acção.
Também a A.R. ignorou o exemplo
da França e Itália que na altura própria abriram negociações com os novos
países nascidos da descolonização e assumiram a responsabilidade pelas
indemnizações aos seus cidadãos espoliados. Na A.R. não houve consciência da
completa impossibilidade de tantos milhares de espoliados irem litigiar com os
novos países, abandonados por Portugal sem um mínimo de estruturas, a viverem
graves lutas internas e politicamente com tendências marxistas.
7. Com a data de 16 de Abril de
1992, o Conselho de Ministros
presidido pelo então Primeiro-Ministro,
Aníbal Cavaco Silva, publica a Resolução Nº 13/92, criando o G.A.E. Gabinete de
Apoio aos Espoliados, no âmbito do Ministério dos Negócios Estrangeiros e pelo
prazo de 5 anos.
Era competência do G.A.E. “a ponderação e defesa, junto dos governos e
autoridades dos países africanos de língua oficial portuguesa, dos interesses
dos portugueses cujos bens e direitos foram confiscados, nacionalizados,
ocupados ou intervencionados no decurso dos processos de descolonização”.
É evidente que desta forma o
Governo criou expectativas de uma solução para o problema das indemnizações e
durante os cinco anos em que o GAE existiu, os espoliados aguardaram com
esperança o resultado da sua actividade, pondo de parte qualquer intenção de
demanda judicial contra o Estado Português.
8.
Entretanto os espoliados iam tomando conhecimento desde
1988 (cf. Artº. 7º da Lei Nº
2/88, de 26/1) como também em
1992, 1993, 1994, 1995, 1996, 1997 e 1998 de que constava dos diversos
Orçamentos do Estado autorização concedida ao Governo para emitir empréstimos e
realizar outras operações de crédito para fazer face à “regularização de situações decorrentes das descolonização em 1975 e
anos subsequentes designadamente as que afectam o património de entidades do
sector público (alínea d) do artº 57º da Lei nº2/92, de 9/3”.
Até desta forma o Estado
português renunciou à prescrição porque terá reconhecido objectivamente o
direito à indemnização que cabe aos espoliados.
Acresce estarem em causa actos
internacionalmente ilícitos praticados pelo Estado português sendo a prescrição
um conceito quase estranho no Direito Internacional Público.
9.
O Decº nº 3/89, de 7 de Janeiro, aprovou o acordo entre a
República Portuguesa e a
República do Zaire relativo a indemnização dos bens zairinizados que pertenciam
a nacionais portugueses, assinado em Kinshasa, a 5 de Fevereiro 1988.
Fixa as modalidades de avaliação
do valor dos bens; critérios de avaliação; criação de uma comissão ad hoc e seu
regimento; forma de pagamento da indemnização que couber.
Tal foi feito, salienta-se, “ da mesma maneira como procederam
voluntariamente, em relação aos respectivos nacionais, todos os países europeus
com situações semelhantes”. Isto em 1989.
É evidente e inacreditável a
discriminação em relação aos espoliados do Ultramar.
10. O Despacho Nº 90/94-XII, do Ministro das
Finanças, constitui,
em termos gerais, inequívoca
renúncia à prescrição, porquanto: a)
autorizou a entrega do contravalor em escudos dos depósitos efectuados por
cidadãos portugueses nos Consulados Gerais de Portugal em Maputo e Beira até ao
montante de 1,4 milhões de contos.
Conforme informação da Direcção
Geral do Tesouro, em 30/11/99 haviam sido pagos Esc. 1.203.329.551$00.
Na realidade trata-se de bens
deixados em Moçambique.
11. O Projecto de
Lei Nº 442/VIII, Regularização das Situações Decorrentes do Processo de
Descolonização, apresentado à Assembleia da República em 24/04/01, e publicado
na II série-A, do D.R. 19/05/01, descreve as várias situações para as quais se
pretende a legislação necessária, tendo sido subscrito e apoiado pelo CDS/PP,
numa tentativa para que fosse feita justiça. Discussão em 26/10/01, na
Assembleia da República.
12. Parecer da
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, de
26/01/2000, aprovado por unanimidade, favorável à criação de estruturas para
estudo e proposta de soluções para o problema dos espoliados.
13. Despacho
conjunto nº 107/2005, de 4/1, assinado por Ministro das Finanças e da
Administração Pública, Ministro dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades
Portuguesas e Ministro da Segurança Social, da Família e da Criança, publicado
no D.R. II série nº 24, em 3/02/05, que cria “um grupo de trabalho com o objectivo de estudar e propor soluções para
as questões pendentes relativas aos cidadãos portugueses residentes nos antigos
territórios ultramarinos no período compreendido entre 25/04/74 e a data de
transferência de soberania para os novos Estados sucessores”.
14.
Por tudo o que
deixamos referido, tem sido o Estado português que tem vindo a sugerir – e
fê-lo repetidamente – que se mantém na disposição de indemnizar ou compensar as
pessoas que se viram privadas de bens sitos nas antigas Províncias Ultramarinas.
No
contexto do Código Civil, por «dolo do
obrigado» não pode deixar de se entender “qualquer sugestão ou artificio que alguém empregue com a intenção ou consciência
de introduzir ou manter em erro o autor da declaração”, conduzindo a
anulação da prescrição.
O ARTª 40º, da lei nº 80/77, como atrás foi
referido ate por ser inconstitucional, será mais uma causa para suspensão da
prescrição.
15. Para
finalizar este trabalho relembrem-se as claras vantagens que, para todos os
portugueses e portuguesas, advieram da descolonização, nomeadamente os
empréstimos do FMI e consequente estabilização financeira do País, e ainda o
estatuto preferencial na entrada para a Comunidade Económica Europeia,
objectivo já ambicionado durante o Estado Novo, mas de realização impossível
enquanto Portugal mantivesse as suas colónias, à revelia das resoluções da
Assembleia Geral das Nações Unidas, uma vez que a democraticidade é requisito a
adesão à Comunidade Europeia.
Os danos sofridos pelos portugueses
residentes no Ultramar foram especiais e anormais, pois não foram só avultados
e fizeram incidir o custo da descolonização apenas sobre os que lá construíram
a sua vida e o seu futuro e não sobre os portugueses na Metrópole e Ilhas
adjacentes.
Pretenderem os diferentes governos de
Portugal que sejam sacrificados (ainda mais) os espoliados do Ultramar às boas
relações com os PALOP’S, passa a classificar-se de uma injustiça desumana e
escandalosa imprópria de um País civilizado com séculos de uma valiosa
história.
Os bens deixados pelos
portugueses no Ultramar são um valioso Património Nacional que nenhum governo,
nos trinta e dois decorridos, teve a preocupação e capacidade de defender.
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