Carme Chacón.
Carme Chacón, ex-ministra de Zapatero, esteve com a irmã em Cádiz, passou quatro dias em Miami a defender a igualdade da mulher na política, voltou para o filho. Morreu na manhã seguinte, aos 46 anos.
“O Centro Cultural Espanhol apresenta a conferência: Mulheres e Política – O Desafio da Igualdade, com Carme Chacón, ex-ministra da Defesa de Espanha”. Na quinta-feira, a advogada marcou presença na Biscayne Boulevard, em Miami, para um colóquio com entrada livre que atraiu o interesse de muitas pessoas. Na véspera, tinha estado em direto no programa de Enrique Córdoba, para a Rádio Caracol 1260 AM, onde tocou um pouco na matéria, entre outros temas. Na palestra, refletiu sobre dois temas: os números da mulher na política e respetivas consequências para alcançar a igualdade de género e a posição da mulher na esfera pública e privada. No final, contou também a sua experiência de vida. Dois dias depois, voltou a Madrid. Foi a sua última viagem: acabaria por falecer no domingo de manhã. E ainda hoje, segunda-feira à noite, se chora a perda.
Carme Chacón sofria de uma rara anomalia no desenvolvimento do coração, conhecido como síndrome do “coração invertido”. Por causa disso, tinha 35 pulsações por minuto. E desde os dez anos, quando descobriu a doença, que encarava a vida como privilégio. “Tenho uma cardiopatia congénita e isso faz-me pensar que todos os dias são uma dádiva”, resumiu numa entrevista há um ano ao La Vanguardia. É assim que se podem também resumir os últimos dias de vida, como se percebe na reportagem do El Mundo.
Existiu um certo simbolismo por ter sido a última viagem que fez: foi no Miami Dade College, nos Estados Unidos, que deu aulas após abandonar a vida política espanhola, como especialista em Sistemas Políticos Comparados, Ciência Política e Administração Pública, sendo também assessora do Instituto de Ligação Cívica e Democracia. Em julho de 2014, passou a colaboradora da Fundação Ortega-Marañón, antes de integrar o Direito Público da prestigiada Ramón y Cajal Abogados.
Na passada terça-feira, quando chegou à Flórida, comentou também a política norte-americana no que concerne à igualdade entre sexos. “O governo de Donald Trump é um retrocesso em relação à política de género nos Estados Unidos”, disse. Aproveitou a estadia para rever amigos ao jantar e marcou presença na primeira edição do Congresso Iberoamericano de Comunicação Estratégica, onde privou com o assessor do presidente da Câmara de Miami, Julián Linares; com o diretor geral da Fundación La Caixa, Jaume Giró; ou Álvaro Cuadrado, vice da Federação Iberoamericana de Jovens Empresários que colocou na sua conta do Instagram uma imagem com a socialista.
Já Carme, que também sempre foi muito ativa nas redes sociais, ia colocando imagens no seu Instagram de Miami à chegada e à partida. Mas aquilo que lhe fazia mesmo falta era o filho, Miquel, de nove anos, fruto da relação com o jornalista e empresário Miguel Barroso, de quem se separou no ano passado. Dizia-se na altura que, amor à parte, havia até matéria-prima para conseguir construir a primeira mulher a liderar a Espanha. Nunca a socialista pensou nisso. E a separação foi de tal forma amigável que só foi necessária uma advogada para tratar dos papéis de ambos; Miquel estava à frente de tudo.
“Ganas de casa, ganas de mar. Y muuuuchas ganas de Miquelete”, escreveu no passado sábado, quando estava para regressar a Madrid. Como sublinha a revista Hola, a catalã descrevia-se nas redes sociais como “Mare feliç”. Mãe feliz. Todos os médicos torceram a ideia à maternidade quando ainda era ministra da Habitação, devido ao problema cardíaco. Carme não quis saber. E da mesma forma como se apresentava grávida, com o maior orgulho, em eventos no elenco de Zapatero, depois como ministra da Defesa, sendo exemplo paradigmático a visita às tropas no Afeganistão, fez sempre questão de partilhar com todos a ligação à maior conquista que teve na vida. No futebol (eram ambos adeptos do Barcelona, indo de quando em vez a Camp Nou), em aniversários, em festas como o Halloween, em refeições casuais de fim-de-semana.
Mal aterrou em Madrid, no sábado à noite, adiou um jantar com amigos para almoço no dia seguinte. Queria estar com o filho, que fará nove anos no próximo mês. Foi quando não apareceu no repasto nem atendeu as chamadas que a polícia foi chamada. Estava em casa, sem vida.
A última aparição pública, antes de um fim-de-semana em Cádiz com a irmã, cunhado e sobrinhos, tinha acontecido na candidatura de Susana Díaz a secretária-geral do PSOE, a 26 de março. Mas, como se percebe agora, Carme Chacón nunca conseguia estar parada. E aproveitou todos os dias como uma dádiva.