domingo, 1 de fevereiro de 2015

O talhante, o mordomo e o radical



02.02.2015
RAFAEL BARBOSA
Niko, 35 anos, talhante no mercado Varvakeios, não tem excessivas ilusões quanto ao futuro do seu país.
Queria uma mudança, "qualquer que ela fosse", e foi por isso que votou no Syriza. Cruzei--me com ele em Atenas e, apesar do pessimismo latente, fez questão de acrescentar uma porção de esperança. "Espero que os povos de Portugal, Espanha e até da Itália, que também estão a passar por grandes dificuldades, estejam solidários connosco e que, juntos, possamos mudar as coisas na Europa". A resposta que afoga esta expectativa de solidariedade mediterrânica entre povos sujeitos às bestialidades de uma política cega de austeridade, acabei por a receber uns dias depois, à chegada a Portugal, quando deparei na bizarra reação do nosso primeiro-ministro ao resultado eleitoral grego. Passos Coelho olha para a Grécia e só vislumbra um "conto de crianças". O mordomo de Angela Merkel não seria capaz de dizer melhor.
2 Se as opiniões sobre Alexis Tsipras fossem expressas através de um gráfico, formariam um "U". A extremidade do lado esquerdo corresponderia a junho de 2012, em que chegou a ser catalogado, pelos jornais alemães, como "o homem mais perigoso da Europa". O tempo passou, Tsipras foi dando umas entrevistas e escrevendo uns artigos de opinião, inclusive no "Finantial Times", e, nos tempos que precederam as eleições de 2015, atingiu-se a base do "U". O homem foi considerado, cá e lá fora, um político pragmático, quase um social-democrata de pleno direito. Acontece que Tsipras ganhou as eleições e, para surpresa pelos vistos geral, tratou de cumprir, logo no dia seguinte, o programa que lhe garantiu a eleição. Passámos para a extremidade do lado direito do "U". Está de regresso o radical que faz tábua rasa de compromissos assinados, enxota a troika de forma mal-educada e tem o desplante de pedir um perdão da dívida. Pelos vistos, não era disso que se estava à espera. É suposto prometer o impossível e, nos dias seguintes à vitória, voltar a colocar os pés no chão. Seguindo, aliás, o exemplo de outros grandes estadistas, como por exemplo Passos Coelho.
EDITOR-EXECUTIVO

Sem comentários: