quinta-feira, 27 de agosto de 2020
Liderança política
Elisio Macamo
1g ·
Vou terminar aqui as minhas reflexões sobre aspectos da nossa governação com divagações em torno da noção de liderança política, o nosso maior calcanhar de Aquiles. Aproveito, para o efeito, uma interessante carta escrita pelo Presidente do ANC dirigida aos membros do seu partido. Nessa carta, que circula pelos Whatsapp, o presidente sul africano lamenta a persistência da corrupção praticada pelos seus próprios membros, fala dos esforços que têm sido empreendidos para a combater e volta a lançar um apelo a todos, com novo conjunto de medidas, para que se preserve a boa imagem do partido.
Isto, para mim, é um exemplo de liderança política. A razão imediata por detrás da carta foram casos de desvios de fundos destinados ao combate à pandemia protagonizados por membros do partido aos mais variados níveis. Ramaphosa podia ter escolhido ignorar o assunto para não dar aos seus adversários o prazer de dizerem que ele próprio reconhece que o ANC é corrupto, ou dizer que é um problema de infiltrados que não representam o partido. Mas não fez nada disso. Ele dirigiu-se ao partido, disse sem rodeios que o partido tem um problema e que o partido precisa de resolver esse problema. Portanto, assumiu a sua responsabilidade de líder para dizer aos que ele lidera que há obstáculos na marcha que empreenderam e que precisam de ser removidos.
Essa é a função dum líder. Ele está atento aos problemas. Só que não são quaisquer problemas. Problemas, do ponto de vista da liderança, são as coisas que podem inviabilizar a realização de planos e projectos. Os problemas dum líder não são os problemas do povo, isto é a pobreza, falta de habitação, má qualidade da educação, etc. Problemas são sempre os meios. Várias vezes nessa carta Ramaphosa diz que a corrupção impede o ANC de fazer aquilo que precisa de fazer para o bem dos sul africanos. O tipo tem foco. É uma diferença abismal com os nossos líderes (todos eles desde que Moz existe) que são constantemente encorajados pelos seus assessores a definir a liderança com referência aos problemas do povo, não da máquina através da qual se pretende criar condições para que esses problemas do povo sejam resolvidos. Insisto: com este tipo de cultura de liderança vai ser muito difícil fazer melhor.
Agora, nem tudo é um mar de rosas na carta sul africana. Apesar duma excelente interpretação do papel de liderança, o Presidente do ANC revelou as mesmas fragilidades que muitos revelam quando o assunto é a corrupção. Ele confunde conceito com realidade. O termo “corrupção” é um excelente resumo de práticas e comportamentos sociais, políticos, económicos e culturais, mas ele não define nenhum fenómeno real. É vago e, no limite, moralismo barato. E isso nota-se logo nas medidas que ele anuncia – que apenas endurecem medidas anteriormente tomadas – sem nenhuma garantia de que tenham mais sucesso. A minha impressão até é que essas medidas só vão complicar as coisas ainda mais e, por essa via, criar mais oportunidades para que as práticas e comportamentos descritos pelo conceito se tornem ainda mais necessárias. São um convite à criatividade.
Qual é o problema? O problema é confundir o efeito com a causa. A corrupção é, na perspectiva da liderança política que tem objectivos a alcançar, de facto a causa da ausência de resultados. Mas do ponto de vista da abordagem do próprio problema da corrupção, ela é efeito. A causa é um conjunto de circunstâncias que a sua carta não descreve e, nisso, está em boa companhia, pois a “ciência” do desenvolvimento também não faz ideia. O meu palpite é que existe um particularismo moral próprio da história sul africana que “normaliza” certas práticas. Para ser mais directo: não é possível combater a corrupção na África do Sul sem primeiro redefinir a ideia de “empoderamento económico negro”. Ela não produz a corrupção, mas cria um quadro moral dentro do qual certas práticas ganham outro sentido. É a mesma coisa connosco. Enquanto predominar, na mente dos camaradas, a ideia de que só a Frelimo tem legitimidade para liderar o povo moçambicano, haverá muita coisa que vai sempre acontecer por conta disso e que nem a boa vontade do Presidente vai ser capaz de impedir. E a má notícia é que isso não vai desaparecer, por mais que todos tentem. As causas da corrupção morrem de morte natural, nunca de morte induzida.
Portanto, ao invés de perder tempo a exigir a declaração de bens ou a dotar os orgãos de justiça de mais meios, o que o Presidente sul africano devia fazer era procurar ver como “blindar” a sociedade contra os efeitos negativos dessas práticas. Um dos caminhos promissores para isso é o reforço da cidadania, isto é a criação de condições para que os cidadãos se protejam de más decisões políticas. É este o trabalho que se impõe também entre nós. Há certos comportamentos que você não vai mudar, por mais que tente. Mas você pode erguer barreiras de protecção contra eles. O curioso é que, a longo prazo, essas barreiras podem ajudar a diminuir os incentivos para a tal corrupção. Na verdade, é tudo simples se as pessoas se dessem ao trabalho de reflectir e não apenas moralizar.
Um exemplo particularmente interessante da fragilidade de liderança entre nós é o acordo que o governo assinou com a Total. Para além da curiosidade de o nosso governo ser pago por estrangeiros para garantir a protecção (não era esta uma das coisas que as “dívidas ocultas” queriam evitar?), o acordo revela o que não se aprendeu das dívidas. Os camaradas fartaram-se de insultar os “lesa-pátrias” num claro exercício cobarde de não quererem reconhecer problemas no seu próprio funcionamento. Na altura comentei que a Frelimo se furtava ao mais importante que era a reflexão sobre o que tinha falhado nos seus orgãos para que as dívidas tivessem acontecido da maneira como aconteceram. Uma dessas coisas foi a transparência que não só privou as pessoas envolvidas no negócio da opinião abalizada de outros (na sociedade) como também, por causa do secretismo (não importa se era necessário ou não), criou condições para o aproveitamento individual. Na verdade, muitos dos que se manifestaram contra o camarada Guebuza fizeram-no não porque fossem arautos da moralidade, mas porque não tinham feito parte do círculo fechado que fez o negócio. Se tivessem feito parte, aposto que muitos também teriam sucumbido às “oportunidades” que o negócio criou.
É assim, se a Frelimo tivesse aprendido das “dívidas ocultas” teria criado mecanismos para que contractos com multinacionais não fossem feitos à porta fechada. Isso não significa necessariamente mandar fazer um referendo, mas, por exemplo, criar condições para que os planos do governo sejam discutidos no parlamento. Para mim é inconcebível que negócios que têm a ver com recursos que são de todos nós sejam tratados de forma sigilosa pelo governo. O País tem tanta gente com conhecimento técnico que, de certeza, teria dado uma ou outra dica. Não nos esqueçamos que a Total comprou o projecto em segunda mão e o governo não viu nem uma quinhenta do valor exorbitante que ela pagou para isso, tudo isso por inépcia negocial e desconhecimento do direito internacional, aptidões que existem no País.
Quando se parte do princípio de que quem lidera tem de ser infalível e perfeito, o resultado é este. O maior investimento político que se vai fazer nessas circunstâncias não será na criação de condições para que as coisas andem. Será na protecção do próprio líder e na diabolização de quem ajuda criticando. A divisa já foi enunciada pelo ministro da agricultura: não se desenvolve o País com debates infindáveis. O curioso é que a principal característica dos países que hoje são desenvolvidos é essa mesmo: não páram de debater, se calhar porque têm consciência da falibilidade das pessoas que os governam.
29Ricardo Santos, Constantino Pedro Marrengula ve 27 diğer kişi
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Júlio Mutisse Julião Arnaldo publicou hoje no seu mural, o que ele chama de exemplo de transparência. Chamei lhe atenção a dimensão desse termo aplicado à política e a sazonalidade com que iniciativas que se querem de transparência surgem na nossa sociedade.
A propósito do silêncio, o PR ainda não se pronunciou, por exemplo, sobre a renda de 400 000 e sobre outros exemplos de despesismo. É como se não fosse nada...
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Elisio Macamo yanıtladı · 1 Yanıt
Delfim Jr de Deus Para matar o dragão é preciso antes acreditar que ele existe
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António Do Rosário Grispos O que o Ramaphosa fez, foi um mero exercício cosmético de liderança...começou bem, atacando o “verdadeiro” problema, ou pelo menos um dos maiores(a corrupção na máquina partidária), mas acaba mal, trazendo as mesmas soluções já ensaiadas(e falhadas), dando lhe uma nova roupagem.
Em suma: para a “mesma aspirina” para tratar todas as doenças. …Daha Fazlasını Gör
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Elisio Macamo yanıtladı · 1 Yanıt
Gervasioa Absolone Chambo Ya...
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MUNICÍPIO DE NAMPULA IMPLACÁVEL NO SAQUE DOS FUNDOS DO ERÁRIO PÚBLICO
QUANDO A VAHANLEZIÇÃO SE CONFUNDE COM FALTA DE NOÇÃO
Conselho Municipal de NampulaSayfayı Beğen
1g ·
MUNICÍPIO DE NAMPULA IMPLACÁVEL NO SAQUE DOS FUNDOS DO ERÁRIO PÚBLICO
O Conselho Municipal da Cidade de Nampula, tem vindo a ouvir e ver com preocupação a divulgação de notícias nos diferentes órgãos de comunicação social sedeados na cidade e Província de Nampula, dando conta a existência de desvio e má aplicação dos fundos do erário público.
As referidas informações apontam como alvo o pagamento de ajudas de custo a cidadãos que não trabalham na autarquia e reparação de viaturas de terceiros como o ponto principal de desvio de fundo no Município de Nampula.
Alias, é arrolada a cidadã Abiba Abá, como sendo a beneficiária dos fundos e da reparação da sua viatura com a chapa de matrícula número AHE 323 MC.
A verdade manda dizer que, a cidadã Abiba Abá, terá no dia 17 de Janeiro do ano de 2020, emitido uma carta a solicitar um apoio monetário avaliado em 40 mil meticais, cuja finalidade era levar uma das suas parentes a Província de Maputo com a finalidade de receber tratamentos médicos e que prometia fazer a devolução do mesmo no exercício económico de 2020, mas em duas prestações.
A referida carta, teria sido respondida de uma forma positiva tendo em conta a componente social que a instituição tem prestado aos munícipes que solicitam apoio sociais.
Após este pedido a edilidade teria emitido um cheque avaliado em 36 mil meticais em nome da cidadã Abiba Abá, e volvido sete meses a mesma teria emitido uma outra carta datada de 12 de Agosto de 2020, junto de um talão bancário, comprovando o pagamento da primeira prestação do valor acima referenciado avaliado em vinte mil meticais.
Com estas provas, queremos esclarecer aos nossos munícipes e o público em geral de que Abiba Abá para além de ser delegada do partido RENAMO que ela é, também é munícipe da cidade de Nampula, e goza dos direitos de qualquer munícipe desta cidade, para o efeito não poderia constituir algum alarme muito menos mau uso dos fundos do erário público.
A questão ligada a reparação da viatura com a chapa de matrícula AHE 323 MC, o Departamento dos transportes recebeu orientações do Presidente do Conselho Municipal da Cidade de Nampula, para a alocação de uma viatura condigna para servir do meio de transporte para uma comitiva proveniente de Lisboa em prol da criação de uma parceria nas áreas imobiliária e industrial.
E o Departamento dos transportes tendo visto que, a cidadã Abiba Abá, tinha uma viatura nos moldes acima referenciados, emitiu uma carta datada de 22 de Janeiro de 2020, a solicitar o empréstimo ou aluguer da mesma e que a proprietária da viatura teria respondido positivamente, mas que, colocou como condição a revisão da mesma.
E como resultado dessa parceria com os empresários Portugueses o Município de Nampula, beneficiou de duas ambulâncias oferecidos no âmbito daquela parceria, e que até então não chegaram a cidade de Nampula, devido a pandemia que assolou o Mundo.
Porque as regras jornalísticas obrigam o respeito de certas regras queremos aqui informar que a maioria dos órgãos que vincularam as informações não deram o Município o direito de resposta.
Apesar disso o município de Nampula, reiterar que continuaremos firmes a ser o parceiro número um da comunicação social, quer os que usam algumas informações para o aproveitamento político assim como mecanismo de formação, educação e comunicação com os cidadãos.
O executivo do Conselho Municipal continuará a trabalhar para prover condições de abastecimento de água, melhoramento das vias de acesso e mercados entre outras condições sociais. Aliás, o combate a corrupção é a chave desta governação e seremos implacáveis contra todos os actos que atendam o bom atendimento dos nossos munícipes e funcionamento desta instituição.s
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Antonio A. S. Kawaria Pelo que entendo, o Conselho Municipal não é um banco. Por outro lado, será mesmo que o Conselho Municipal dá crédito a todo o munícipe que socilitá-lo?
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Gamito Dos Santos Carlos Antonio A. S. Kawaria brincadeiras mais velho, eles pensam que estão lidar com meninos da crèche
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Helio Cristiano Celestino São macaquices. 😂🤣😂🤣
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Antonio A. S. Kawaria É muito triste ver gente a brincar com coisas sérias.
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Helio Cristiano Celestino Essas justificações meu Deus, quem trabalha lá no Município???? 🤔
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Alifo Júnior Ntheca Antonio A. S. Kawaria É triste isso
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Lucas Armando Chiambiro Consequências da má escolha dos dirigentes dá nisso. É só aguentar até 2023.
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Cipriano Mossuela Muchaia Cololo Porque nao lhes fumarem,foraaa todos ratos Fora,estao a sujar o Nome dos meus antepassatos,fora!
O desafio de Cabo Delgado
Elisio Macamo
14s ·
O desafio de Cabo Delgado
Tinha prometido que o texto de ontem seria o último a reflectir sobre a governação. Quebro a promessa por causa dum artigo assinado por Joseph Hanlon e Anastasya Eliseeva que levanta questões importantes de governação, mas também por causa da exortação feita por Guebuza na palestra de ontem sobre a importância do conhecimento baseado na pesquisa. Segundo os autores, a violência em Cabo Delgado não tem muito a ver com o Estado Islâmico. É uma guerra civil alimentada pela pobreza e desigualdade dentro dum contexto político em que as elites políticas nacionais estão apostadas em se apropriarem das riquezas nacionais para seu próprio benefício.
Acho a análise bastante pobre. Eu próprio já havia, há semanas, recorrido à ideia do Estado Islâmico como franquia para alertar para a necessidade de não se perder muito tempo e energia com estudos circulares sobre a pertinência da religião como variável que pudesse explicar a violência. Nisso, portanto, estamos de acordo. Já não concordo com os autores quando reduzem a violência totalmente à corrupção da elite política como se fosse possível estabelecer sem nenhuma dificuldade uma linha recta entre pobreza e desigualdade, dum lado, e violência. Este é um problema analítico que tem a sua origem em dois equívocos metodológicos.
O primeiro equívoco parece-me prática assente na análise social feita de forma artesanal. O pesquisador tira uma conclusão qualquer e depois junta informação que a confirma. O artigo em questão tem como base de argumentação escandalos financeiros conhecidos, suposições sobre a conduta das eleições, palpites sobre os níveis de descontentamento da população, casos coniserados semelhantes noutros países, etc. A colação desses casos todos torna plausível a conclusão tirada antes do estudo. Ao invés de usar a informação para pôr a conclusão à prova, o pesquisador usa os elementos dessa informação que podem ajudar a sustentar a sua conclusão. Chega a ser desonesto. O segundo equívoco, também recorrente na análise social artesanal, é a fraca sensibilidade para a relação que conceitos têm com a realidade. Conceitos são caixas negras. Eles encerram várias coisas dentro de si de tal modo que o recurso a um conceito para explicar seja o que for pode ser vago e não dizer absolutamente nada.
Por exemplo, quando alguém diz que a pobreza e a desigualdade alimentam a violência, ele propõe-nos três conceitos densos – pobreza, desigualdade e violência – que num primeiro momento escondem, mais do que revelam, informação. A pobreza é relativa, absoluta, situacional, geracional, rural, urbana, etc. Que tipo exacto de pobreza é responsável pela violência e como é que isso ocorre? Suponho que a relação entre pobreza e violência seja mediada pela radicalização de jovens. Ok, que tipo de jovens se radicalizam ao ponto de pegar em armas? Porque outros jovens igualmente pobres não se radicalizam, ou quando se radicalizam, não chegam ao ponto de pegar em armas? Ademais, qual é a relação exacta entre a pobreza, dum lado, e a corrupção das elites políticas? A teoria que enquadra esta análise tem que partir do princípio de que a pobreza gera violência. Porque é que, por enquanto, só há violência em Cabo Delgado? Acima de tudo, para que é necessária a corrupção das elites políticas para explicar a violência sabido que é que é possível ser pobre mesmo sem corrupção das elites políticas?
A relação que estabeleço entre governação e valorização do conhecimento baseado na pesquisa baseia-se nestas poucas perguntas que acabo de formular. Tenho acompanhado, atento, vários escritos, webinares e comentários sobre Cabo Delgado. Não sou especialista da área, nem do tema, mas aprendi metodologia e dou muito valor a ela. Há cada vez menos contribuições que me convencem. Cada especialista agarra-se à sua conclusão e junta dados para a proteger. Guebuza falava num outro contexto, mas tem razão. Temos que valorizar o conhecimento baseado na pesquisa. Isso significa que muitos têm de aprender a avaliar a produção científica para não ficarem reféns da análise social artesanal. Só num sentido metafórico é que podemos falar de “guerra civil” em Cabo Delgado. A violência que assola partes da província é sintomática duma constelação particular de factores sociais, culturais, económicos e políticos que têm como pano de fundo a fragilidade do processo de consolidação da autoridade estatal em países como os nossos. Análises 4X4 que simplificam as coisas com recurso à corrupção das elites políticas desviam a nossa atenção do essencial. Nada disto quer dizer que o aproveitamento individual que pessoas bem situadas no poder político fazem dos recursos não seja um problema. Nem que a pobreza ou desigualdade não sejam problemas. Tudo isso é problema, mas até a gente entender como se articulam para produzir o tipo de violência que produzem vai uma grande distância. Vai ser necessário trabalho científico mais sério do que tem havido.
Mas é por isto tudo que tenho criticado o governo, sobretudo a reluctância do Presidente em falar abertamente sobre Cabo Delgado. Essa reluctância faz parte dum quadro geral de inépcia política na abordagem dos desafios de governação. Enquanto os investigadores se perdem nas suas análises artesanais, o Presidente anda atrás de bodes expiatórios misturados com teorias de conspiração – “não nos querem ver a beneficiar dos nossos recursos” – que manifestam a sua falta de vontade – ou capacidade (?) – em abordar os desafios da governação de forma política. Cabo Delgado mostra as deficiências da nossa estrutura política. E isso vai desde a relação entre FDS e cidadão, passa pelos mecanismos locais de interpelação do poder, mas também de protecção e promoção da cidadania, até à relação entre poder central e poder local. Convocar gente abalizada para reflectir sobre isto e estimular debates na esfera pública sobre os desafios políticos que a província nos coloca é fundamental para a elaboração duma melhor abordagem. Não sei de nenhuma iniciativa do Conselho Nacional de Defesa e Segurança para reunir os vários especialistas que temos para ajudarem a reflectir sobre o assunto. Na Alemanha e na Suíça é assim que se fazem as coisas, mesmo sabendo que essas instituições dispõem elas próprias de gente abalizada.
Embora em minha opinião o governo nao seja directamente responsável pela violência lá em Cabo Delgado, a sua inépcia tem contribuído muito para a escalada. Dói dizer isto, mas tudo indica que o Presidente Nyusi vai legar nao só a violência de Cabo Delgado ao seu sucessor, como também o rastilho que ela representa para o resto do País. O acordo com a Total parece-me o pontapé de saída para a militarização irresponsável dum problema político. Preparemo-nos para o cenário igual ao norte do Mali.
42Alcídes André de Amaral, Constantino Pedro Marrengula ve 40 diğer kişi
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Reginaldo Mutemba Moz, acorde por favor!
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Paulo Guambe Desisti de ler o artigo do Halon por desconfiar que alguém estava a usar seu nome, pela fragilidade da argumentação que justifique a matriz da violência em Cabo Delgado.
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Paulo Guambe yanıtladı · 3 Yanıt 8s
Régis Rembeleki Nada a acrescentar. Varios cientistas sociais estão a rasgar os certificados.
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Régis Rembeleki yanıtladı · 2 Yanıt 7s
Ismail Mahomed Felismente o pais ja tem gente formada com descernimento, capacidade de analise e interpretacao dos factos, coisa que alguns analistas ainda nao perceberam que Moz de hoje ja nao e o mesmo de 1975, onde qialquer extrangeiro escrevia ou falava qualquer baboseira nos orgaos de comunicacao social e esta e esta logo se transformava em verdade absoluta. Esta gente esta a procura de formas de dar alguma hegiene na actuacao desses bandos, quer lhes prestar alguma acessoria de modo a nos passar uma mensagem de alguma causa justa por detras das atrocidades que estao sendo cometidas, foi assim no passado e parece que eatamos de volta ao mesmo cenario, ja dizia o presidente Chissano numa das suas varias entrevista que " ...A vida is uma espiral e agente volta sempre ao ponto de partida so que numa posicao mais acima..." nao me admira que daqui a mais alguns meses seremos brindados por uma conferencia de impensa com os lideres do grupo a declarar e apresentar os motivos da sua saga assassina que nao estara muito longe daquilo que esses analista de ocasiao apresentam, aguardemos...
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Elisio Macamo yanıtladı · 1 Yanıt 9s
Dinis Tivane Sou capaz de não estar a concordar com este post. Primeiro por trazer Guebuza, quando o próprio dono do post já diz que Guebuza, fez o pronunciamento que fez num outro contexto e não no desta análise metodológica que critica o texto desses dois autores e suas "(in)fundadas" conclusões.
Segundo porque acho que a sociologia não é a única ferramenta para explicar fenômenos político-sociais, económico-sociais e também culturo-siciais. Não vou me alargar a justificar isso, pois quero trazer alguns pontos que me fazem pensar que Joseph Halon não está tão longe daquilo que pode ser a "verdade":
1. Em Março deste ano, foi criada a ADIN - Agência de Desenvolvimento Integrado do Norte, com uma vocação muito concreta. Veja bem, está mencionado NORTE.
2. É no norte aonde estão os maiores contratos ou concessões ligados aos recursos minerais, gás e afins.
3. É no norte aonde há maior índice de pobreza. Pode ir, consultar a publicação POBREZA E BEM ESTAR EM MOÇAMBIQUE e comparar o preço por grama do arroz ou farinha e verá que no norte os preços são altíssimos.
4. É no norte aonde temos uma maior franja de população de religião islâmica.
5. Estrategicamente, é em Cabo Delgado aonde se pode começar uma guerra também, por factor localização (fronteira com Tanzânia que também tem uma grande população islâmica).
6. Moçambique está no top 10 dos países mais pobres do mundo segundo o Índice de Desenvolvimento Humano.
7. e 8. Nem preciso de destacar como estamos em termos de corrupção e justiça (que justifica ou faz compreender o índice de impunidade que graça o nosso País).
Como vê, não é muito difícil chegar às conclusões que eles chegaram. Prof. Macamo uma vez falou sobre a importância das EVIDÊNCIAS nas análises ou estudos e, sinceramente, não sei como estas evidências lhe escaparam.
Não estou a dizer que estejam absolutamente certos, porém não acredito que estejam longe da verdade.
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quarta-feira, 26 de agosto de 2020
Andar devagar
Andar devagar
Esta manhã tive uma reunião estimulante com colegas alemães a quem me juntei para elaborar um programa de pesquisa sobre alguns dos conceitos que fizeram o mundo. A minha contribuição vai ser um estudo sobre o conceito de desenvolvimento que antes se chamou progresso e antes disso civilização. Com a minha agregação em sociologia do desenvolvimento, tenho uma relação especial com esse conceito, sobre o qual tenho reflectido e trabalhado. Uma coisa que me incomoda na maneira como esse conceito é tratado na academia, mas também na prática, é a suposição segundo a qual ele descreveria um ponto de chegada inevitável sendo para isso necessário que se façam certas coisas tidas como infalíveis. Infelizmente, nem a história dos que hoje são desenvolvidos, muito menos a nossa confirmam esta suposição. Ninguém sabe dizer como se chega lá, por isso toda essa indústria intelectual e prática que anda por aí é coisa de impostores.
Há muito lugar-comum que passa por profundidade analítica na abordagem do assunto. (In)Felizmente, Moz dá-me uma excelente oportunidade de reflectir sobre o desafio que o desenvolvimento nos coloca com exemplos concretos. Seria fácil, por exemplo, olhar para Cabo Delgado, para as agressões a jornalistas, intelectuais e activistas como prova do tipo de atitude que não pode levar ao desenvolvimento. Isto é, a intolerância, a má governação e a falta de respeito pela liberdade de expressão e de imprensa podem ser usadas para “explicar” porque Moz estaria a regredir. Dito doutro modo, os nossos governantes não estariam a fazer o que é certo para desenvolverem o País. Não me parece ser o caso. Algumas pessoas que, hoje, condenam o vil ataque ao semanário Canal de Moçambique defendem, quando em civil, regimes como o do Ruanda, líderes como o ditador russo, Putin, sistemas políticos como o cubano, chinês, etc. por acharem que eles produzem resultados. O raciocínio é o seguinte: de que vale a liberdade de expressão sem comida, saúde e educação?
Essa é a lógica do desenvolvimento, mesmo quando os seus promotores defendem a democracia, direitos humanos e liberdades. Olham para isso de forma instrumental. Seja quem for que estiver por detrás dos males que cada vez mais nos assolam no País, essa pessoa pensa que está a trabalhar para o desenvolvimento de Moçambique. Pensa também que quem não vê, nem aprecia isso, é contra o desenvolvimento e, portanto, está contra o desenvolvimento e tem de estar também contra quem faz estas coisas. Entender o que se passa em Moçambique passa por, primeiro, entender a moral perversa da lógica do desenvolvimento e, segundo, resistir à tentação de reduzir as coisas às más intenções das pessoas. Nyusi não quer que Cabo Delgado, que o assassinato do Matavele, que o atentado contra o semanário, etc. aconteçam. Eu acredito que ele esteja contra e que se sinta mal quando isso acontece. O problema é a sua relação com quem faz isso por achar, por exemplo, que cada uma dessas acções sirva para levar adiante o projecto de desenvolver o País. Há muito tempo que venho dizendo isto, por exemplo, desde o conjunto de textos sobre “o poder da Frelimo”. Quando impera a lógica do desenvolvimento, mesmo o desvio de dinheiro público para fins individuais pode ser justificado pela necessidade de desenvolver o País fortalecendo o partido no governo (ou os seus membros) já que só eles é que sabem como levar o País até lá.
A concentração na famosa agenda do desenvolvimento (com discursos inúteis sobre a corrupção e boa governação – infelizmente macaqueados pelas OSC – luta contra a pobreza, etc.) é para mim o que explica as coisas más que acontecem. Impede o governo e a própria sociedade de prestarem mais atenção ao que realmente importa quando se constroi um País, nomeadamente a protecção da dignidade humana através da promoção da cidadania. A agenda do desenvolvimento obriga-nos a correr e nessa corrida a dignidade que é tão essencial à nossa vida passa a ser um mero “nice to have” (bom para ter, mas não absolutamente necessário) que pode ser sacrificada sempre que o interesse “maior” do desenvolvimento se impuser. Pouco importa se não há nenhuma garantia de que chegaremos lá. Nem pode haver, pois cada situação é fonte de várias outras situações de difícil previsão. É por isso que mais do que apostar numa ideia de desenvolvimento baseada na ilusão do controlo (ceteris paribus), a aposta em Moz devia ser na criação de condições para que possamos dar outro passo sabendo, naturalmente, que cada passo dado abre infinitas possibilidades. Estas condições não são materiais. São políticas e têm como alvo principal a protecção da dignidade de cada um de nós.
Ser Chefe de Estado em Moz é isto. Não é inaugurar hospitais, escolas, aterros sanitários, etc. Isso é “nice to have”. O essencial, o absolutamente necessário, é a criação de condições para que em tudo o que fazemos salvaguardemos a nossa dignidade através da promoção da cidadania. Na verdade, é aqui onde a gente vê a miséria da nossa cultura política. Todos querem resolver os problemas materiais do povo, mas dum modo geral olham para a dignidade e a cidadania como obstáculos. Podem não dizer isso, mas na prática é assim. Quem detém o poder hoje é o Presidente Nyusi e, por isso, podemos ver como ele está a claudicar. Só que ele claudica onde outros também claudicaram e iriam claudicar se tivessem a oportunidade. Desde o seu primeiro mandato que ele se tem furtado a esta agenda, mas tudo na melhor das intenções porque ele está preocupado com o desenvolvimento...
Quando assumiu o poder em 2015 definiu a paz como uma das suas prioridades e, para esse efeito, fez o que achou necessário, isto é negociar com a Renamo. Só que aquele conflito não se resumia a isso. Era um conflito cujo pano de fundo era o respeito pelas instituições, a inclusão política e a distribuição de oportunidades. Isso exigia a participação de todos e a protecção de qualquer solução que garantisse maior promoção da cidadania. O que ele fez? Colocou Secretários de Estado para contrariar a vontade do povo e hoje para além de gerir o problema que ainda não terminou tem que gerir o novo problema de SE e Governador. A polícia nacional, através dos seus agentes, envolveu-se em crimes hediondos. Nem uma palavra dele sobre isso, nem uma única iniciativa que revele preocupação com uma melhor polícia e necessidade de depuração de fileiras. De Cabo Delgado nem falo, com a agravante de que ultimamente, ao invés de focalizar as atenções no problema, procura por bodes expiatórios, tipo Bispo de Pemba ou aquela ideia fantástica de que são pessoas que querem explorar as nossas riquezas... Mais uma vez, a agenda do desenvolvimento pesa mais do que a agenda da promoção da cidadania.
Repito, não é por maldade ou intenção de “destruir” o País. Tudo isto acontece na melhor das intenções. A agenda do desenvolvimento cega. Os problemas que nascem do nosso esforço de desenvolver são simplesmente ignorados naquela de que, com o desenvolvimento, eles serão resolvidos. É um equívoco. Essa agenda obriga-nos a correr quando devíamos interiorizar a ideia de que devagar se vai longe. Apostamos na técnica e não na política porque queremos resultados (materiais) rápidos. Os seus companheiros partidários não o podem ajudar porque também estão reféns desta lógica do desenvolvimento. É aí onde se manifesta aquele medo de errar que descrevi há dias. O desenvolvimento requer um governo infalível. Um governo infalível, por definição, não erra. Se erra, não errou, os críticos é que não sabem bem ver ou estão contra. E, por isso, investe-se mais na procura de críticos e sua “neutralização”.
Nem tudo está perdido. Já três personalidades de peso se pronunciaram sobre isto: Oscar Monteiro, Rui Baltazar e, recentemente, Lourenço do Rosário. Não deviam fazer isto de forma isolada. Devia ser uma acção conjunta de resgate da Frelimo duma lógica de poder perniciosa. Pode parecer desonesto dizer isto, mas não é este o tipo de País que corresponde aos valores que motivam os membros e simpatizantes da Frelimo. Mas mesmo que o governo não tenha nada a ver com o atentado contra o semanário, ele acontece porque existe um ambiente político que protege os bandidos. O silêncio persistente do Presidente faz parte desse ambiente político. Mas, prontos, eu entendo. Ele está ocupado a desenvolver o País. Cabo Delgado que arda, jornais que desapareçam, activistas que sejam mortos por agentes policiais, enfim, os que sobrarem vão desfrutar o desenvolvimento...