Canal de Opinião por Adelino Timóteo
Na cultura moçambicana, no sentido mais amplo, o “ser negado” recebe a conotação de desqualificação. Não raramente, recebe o significado de estigmatizado, humilhado. Ouço comumente dizer-se “fulano foi negado”, “beltrana foi negada”, à frente já se sabe o que é. Todos se riem.
Todo aquele que é “negado” é alvo de chacota. Age como um búfalo ferido, porque o ser “negado” tem uma certa carga semântica no português corrente com o “inapto” ou o “ineficiente”. O “negado”, por causa da comiseração, sofre consequências sociais que o levam a agir fora do âmbito normal, acima do bem comum, acima do interesse social geral. É daí o motivo por que temos visto muito “negado (a)” queimar o carro, a roupa do consorte, numa atitude desesperada de reclamar para si a dignidade perdida. O bem mais precioso do ser humano.
Este intróito, ser “negado”, vem a propósito das motivações e razões de fundo que estão por detrás dos conflitos armados, digamos guerra, no meu país.
Vejamos: o nosso processo de paz é composto por uma “troika”.
Há os medicadores, os “negados” e os “negadores”. Os primeiros tentam dar aspirina para acalmar as partes. Temos dois promitentes interessados na cura, ou seja, um grupo de cidadãos, por ora “negados” e finalmente os “negadores”.
A missão dos “negados” é reclamar que estão sendo recusados.
A dos negadores é de se recusarem sempre, mesmo perante evidências verídicas e testemunhos.
A história é longa: os “negados” e “negadores” firmaram um acordo entre si. Foram a umas núpcias em Roma. Num dos hotéis tiveram lá as suas intimidades, diria, andaram aos beijinhos e passearam pelas ruas a sua classe de enamorados. Admiraram-se mutuamente pelos encantos.
O Padre da Capela Sistina benzeu-os e pariram um contrato chamado AGP. Quando regressaram ao país, para tomar o curso normal das suas vidas em comum, o “negadores” disseram que os tinham enganado no hotel, que o celebraram foi só para os aceitarem de tão sofridos que estavam pelo fogo ardente do namoro.
Fizeram-no para se desembaraçarem dos outros e assim “regressarmos de mãos dadas a casa”. Os “negados” sentiram-se atraiçoados na sua dignidade e reclamaram a reposição do que estava em falta. Mas em vão, pois a contraparte diz que já estava satisfeito com as núpcias e o casamento de papel assinado.
Os “negados” começaram a chorar pelos cantos, as pessoas a comentarem o óbvio: ele foram “negados”, deve ser chantagem, e estão com uma mão à frente e outra atrás.
O que passa no nosso meio é que nunca se dá ouvidos aos “negados”, particularmente quando a contraparte deste é abastada, que vai ventilando como gozou com o outro na noite de núpcias. Inventam-se conciliações e mediações de conflitos, e o “negado” acaba por ser sempre o “negado” e o “negador” aparece sempre em cima, gerando a dicotomia vilão e herói.
No que é comum, o “negado” sofrendo a perfídia e humilhações do “negador” acaba por adoptar acções defensivas e selvagens. Ele justifica-se que vai para aí três vezes que o “negador” o humilha. Ainda, o tentou matar por três vezes, por uma questão de afirmação absoluta da supremacia dos “negadores”, esses que ainda vão dizendo ao mundo que o “negado” sempre foi um promíscuo, e patati e patatá.
Todavia, o último acontecimento onde os “negadores” estiveram em alta deu-se há dias, quando eles voltaram a negar tudo, mesmo aquilo que assinaram preto no branco. Até deram uma conferência de imprensa para vincar a sua posição de negadores. Os “negados” já estão alerta: sabem que tudo o que se vier a assinar será posteriormente negado e rasgado pelos negadores, que se burlaram dos pacientes medicadores ao não assumirem o óbvio, na dita conferência de imprensa.
Ninguém está surpreendido pela conduta dos negadores, porque de outro jeito não teríamos negadores na cena teatral da política doméstica, onde, por certo, continuaremos a ouvir que aos “negados” é recusado todo e qualquer protagonismo pelos “negadores”.
Moral da estória: E ratatá ratatá, os “negados” parece que voltarão a se fazerem ouvir por estes meios, por aqueles que sempre continuarão a lhes negar a audição e as convenções que assinam de livre e espontânea vontade. (Adelino Timóteo)
CANALMOZ – 29.08.2016
Na cultura moçambicana, no sentido mais amplo, o “ser negado” recebe a conotação de desqualificação. Não raramente, recebe o significado de estigmatizado, humilhado. Ouço comumente dizer-se “fulano foi negado”, “beltrana foi negada”, à frente já se sabe o que é. Todos se riem.
Todo aquele que é “negado” é alvo de chacota. Age como um búfalo ferido, porque o ser “negado” tem uma certa carga semântica no português corrente com o “inapto” ou o “ineficiente”. O “negado”, por causa da comiseração, sofre consequências sociais que o levam a agir fora do âmbito normal, acima do bem comum, acima do interesse social geral. É daí o motivo por que temos visto muito “negado (a)” queimar o carro, a roupa do consorte, numa atitude desesperada de reclamar para si a dignidade perdida. O bem mais precioso do ser humano.
Este intróito, ser “negado”, vem a propósito das motivações e razões de fundo que estão por detrás dos conflitos armados, digamos guerra, no meu país.
Vejamos: o nosso processo de paz é composto por uma “troika”.
Há os medicadores, os “negados” e os “negadores”. Os primeiros tentam dar aspirina para acalmar as partes. Temos dois promitentes interessados na cura, ou seja, um grupo de cidadãos, por ora “negados” e finalmente os “negadores”.
A missão dos “negados” é reclamar que estão sendo recusados.
A dos negadores é de se recusarem sempre, mesmo perante evidências verídicas e testemunhos.
A história é longa: os “negados” e “negadores” firmaram um acordo entre si. Foram a umas núpcias em Roma. Num dos hotéis tiveram lá as suas intimidades, diria, andaram aos beijinhos e passearam pelas ruas a sua classe de enamorados. Admiraram-se mutuamente pelos encantos.
O Padre da Capela Sistina benzeu-os e pariram um contrato chamado AGP. Quando regressaram ao país, para tomar o curso normal das suas vidas em comum, o “negadores” disseram que os tinham enganado no hotel, que o celebraram foi só para os aceitarem de tão sofridos que estavam pelo fogo ardente do namoro.
Fizeram-no para se desembaraçarem dos outros e assim “regressarmos de mãos dadas a casa”. Os “negados” sentiram-se atraiçoados na sua dignidade e reclamaram a reposição do que estava em falta. Mas em vão, pois a contraparte diz que já estava satisfeito com as núpcias e o casamento de papel assinado.
Os “negados” começaram a chorar pelos cantos, as pessoas a comentarem o óbvio: ele foram “negados”, deve ser chantagem, e estão com uma mão à frente e outra atrás.
O que passa no nosso meio é que nunca se dá ouvidos aos “negados”, particularmente quando a contraparte deste é abastada, que vai ventilando como gozou com o outro na noite de núpcias. Inventam-se conciliações e mediações de conflitos, e o “negado” acaba por ser sempre o “negado” e o “negador” aparece sempre em cima, gerando a dicotomia vilão e herói.
No que é comum, o “negado” sofrendo a perfídia e humilhações do “negador” acaba por adoptar acções defensivas e selvagens. Ele justifica-se que vai para aí três vezes que o “negador” o humilha. Ainda, o tentou matar por três vezes, por uma questão de afirmação absoluta da supremacia dos “negadores”, esses que ainda vão dizendo ao mundo que o “negado” sempre foi um promíscuo, e patati e patatá.
Todavia, o último acontecimento onde os “negadores” estiveram em alta deu-se há dias, quando eles voltaram a negar tudo, mesmo aquilo que assinaram preto no branco. Até deram uma conferência de imprensa para vincar a sua posição de negadores. Os “negados” já estão alerta: sabem que tudo o que se vier a assinar será posteriormente negado e rasgado pelos negadores, que se burlaram dos pacientes medicadores ao não assumirem o óbvio, na dita conferência de imprensa.
Ninguém está surpreendido pela conduta dos negadores, porque de outro jeito não teríamos negadores na cena teatral da política doméstica, onde, por certo, continuaremos a ouvir que aos “negados” é recusado todo e qualquer protagonismo pelos “negadores”.
Moral da estória: E ratatá ratatá, os “negados” parece que voltarão a se fazerem ouvir por estes meios, por aqueles que sempre continuarão a lhes negar a audição e as convenções que assinam de livre e espontânea vontade. (Adelino Timóteo)
CANALMOZ – 29.08.2016
SOBRE A ACTUAÇÃO DA POLÍCIA DE TRÂNSITO EM MAPUTO
Centelha por Viriato Caetano Dias (viriatocaetanodias@gmail.com )
A regra de ouro de qualquer contrato social é a defesa dos mais desprotegidos. José Gomes Ferreira (1900-1985), escritor e poeta português.
Há mais de uma década que minha amiga Serawazimo (nome tradicional) não visitava a capital do país (Maputo). Depois de desembarcar no Aeroporto Internacional de Mavalane, ido das terras europeias, pediu-me que a levasse a passear pela cidade. O objectivo do passeio era fazer uma breve “autópsia” a cidade, para analisar a metamorfose do seu crescimento que ela tanto ouvira falar.
Um pedido desse, apesar de elevado custo do preço da gasolina, não deve ser recusado a uma investigadora que está em constante processo de indagação. Ainda mais, tratando-se de uma mulher de uma formosura fascinante, uma recusa seria uma ingratidão imperdoável e um acto susceptível de julgamento no tribunal da consciência. Durante o jantar (o prato do dia foi xicoa, xima e cicito ou sissito, como preferir, uma iguaria típica da minha terra - Tete), questionei a minha interlocutora sobre os resultados da autópsia que fizera a cidade.
Disse-me, mais ou menos, as seguintes palavras “Os assuntos sujos não admitem palavras limpas. As acácias morreram vítimas de urina humana. Maputo já não tem sanitários públicos. Os buracos cotejam-se as armadilhas usadas pelos massais para caçar animais selvagens de grande porte. As valas de drenagens servem de trincheiras para os empregados do crime. Os edifícios históricos estão em ruínas e servem de hotéis e laboratórios dos marginais. Os entulhos invadem passeios e estradas e denotam uma fraca urbanidade da urbe. As zonas verdes e de lazer foram transformadas em imponentes edifícios. Os semáforos servem de sacos de pancadas dos automobilistas alcoolizados. Uma avenida que se chama Marginal, e que, de facto, marginalizada pela polícia camarária (faz jus ao nome). Mas o que mais me entristeceu e entristece é o enxame de polícias de trânsito que pululam pela cidade, concentrados mormente em algumas avenidas de maior circulação de viaturas, em lugar de polícias de protecção, vulgo cinzentinhos.”
Num passado recente, aqui nesta gazeta do WF, escrevi uma crónica sobre a actuação da polícia de trânsito. Nessa altura, escondidos atrás de velhas árvores de acácias regadas de urina humana, andavam aos pares de três a seis polícias sem aprumo, sem brio e sem brilho.
De lá para cá quase nada mudou, excepto o número de bufos, pois andam agora aos pares de seis a doze polícias. Uma observação: se no passado os bufos eram transportados em viaturas e motorizadas policiais (que na sua maioria jazem nos parques da corporação), actualmente, salvo raras excepções, fazem-se transportar em viaturas próprias, uma nítida e provocante demonstração de musculatura financeira.
Escolhem a dedo uma determinada rua ou avenida onde, por razões circunstanciais, há maior circulação de viaturas e montam armadilhas para a materialização da prevaricação. As avenidas como Joaquim Chissano, Acordos de Lusaka, Guerra Popular, Kenneth Kaunda, 25 de Setembro, 24 de Julho, etc., são transformadas em zonas tampões, com várias cancelas policial, onde cada grupo de bufos demarca o seu espaço e reivindica a cobrança de “impostos” as suas vítimas. Com radares apoiados em tripés improvisados, como se fossem técnicos de laboratórios em descobertas de microrganismos, afinam as vistas simulando estarem a tirar velocidades das viaturas, quando, na verdade, “caçam” gorjetas.
Coitado dos automobilistas: aquele que não “molhar as mãos ou dar refrescos” arrisca-se a recebe uma pesada multa. Esfaimados que andam (talvez por causa desta maldita crise), não lhes interessam o valor, o que conta é cheiro do metical. A missão da polícia de trânsito é o respeito pela legalidade, garantindo a ordem, tranquilidade e segurança públicas dos cidadãos.
O que tenho assistido é precisamente o contrário. Os automobilistas têm receio de circular à vontade, sobretudo nas “horas de ponta” nos finais de semana. Primeiro, enfrentam os congestionamentos de viaturas, visto que os semáforos andam desorientados e as estradas são porosas a acidentes; segundo, é a própria polícia de trânsito que, ao interceptar um automobilista, faz uma ladainha de pedidos (carta de condução, livrete, ficha de inspecção, etc., etc., etc.), facto que acaba por obstruir a normal circulação de viaturas nas horas de ponta.
A carta de condução, o livrete, a ficha de inspecção e o seguro da viatura só são devolvidos pelos agentes depois de “muito namoro” e alguma cedência por parte do automobilista. Torna-se difícil denunciá-los porque não colocam nem apresentam dis-tintivo policial. A esse propósito, um amigo meu ficou sem a carta de condução. No acto da apreensão, questionou ao polícia o nome, a esquadra e para onde levaria a sua carta. A única resposta que teve do bufo foi esta: “procure-me no comando.” Que comando, senhor agente? Quantos polícias de trânsito trabalham num comando? 100, 500, 1000, 5000, quantos? Até hoje, volvidos três meses, o meu amigo vai todos os dias aos comandos da PRM à procura do tal agente.
Está privado de conduzir porque um polícia, com sinais de embriagues, decidiu tirar-lhe a carta de condução. Neste caso, não é só o automobilista que fica prejudicado, também os seus alunos de Changalene e Marracuene, pois nem sempre podem ter aulas sem atrasos. Andar de chapa nem sempre ajuda para quem trabalha com horário. Conheço alguns automobilistas que, por causa das sucessivas extorsões dos polícias, penduram no interior das viaturas crachás e outros documentos de serviços, incluindo bonés ou fardamentos dos seus ofícios, para se livrarem das intentonas dos agentes prevaricadores.
Se a concentração dos polícias de trânsito fosse por motivos didácticos, Maputo seria hoje uma cidade sem acidentes. Ao invés de concentrarem-se numa única avenida 100 polícias de trânsitos, a desconcentração traria uma mais-valia para os automobilistas que enfrentam diariamente um congestionamentos de 10 a 20 kms. É incrível que esses polícias nunca estão na estrada quando os automobilistas são roubados viaturas, quando há assaltos a mão armada, quando chove ou quando faz muito frio.
A polícia de trânsito é necessária, sim, mas não para criar desordem e extorquir dinheiro aos cidadãos. Ao terminar, permita-me uma ressalva: o título está no plural, mas nem todos os polícias de trânsitos são corruptos. Conheço tantos, na sua maioria, que dedicam a vida ao serviço da Pátria Amada e da corporação, em particular. Reconheço, nesses polícias, o grande heroísmo e espírito patriótico.
Para esses polícias, valentes moçambicanos, vai a palavra de apreço e admiração. Acredito que o novo Comandante-geral da PRM, General Júlio dos Santos Jane, aliado aos esforços dos polícias honestos e profissionais, saberá separar o tripo do joio e tornar a nossa capital mais segura.
Zicomo e um abraço nhúngue ao Custódio Duma, pela simplicidade.
WAMPHULA FAX – 29.08.2016
Sem comentários:
Enviar um comentário
MTQ