domingo, 1 de novembro de 2015

Despartidarizar o estado


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Sim, despartidarizar o Estado. Mas o que isso significa, que passos dar para não se correr sem chegar a lugar algum, que dimensões assumem a opção? De onde se veio e para onde caminhar?
Entendo como muitos que o Estado não pode estar prisioneiro de partidos, nem estar alheio a eles.
Nenhum Estado democrático pode existir sem que haja um espaço largo para os partidos políticos se pronunciarem sobre os destinos e os programas de governação do país, sem que sindicatos e outras organizações sociais estejam em condições de contribuir para as opções e acções desse Estado. Na intervenção dos partidos, através dos processos eleitorais resultantes determinam-se quem exerce as funções de Chefe do Estado, Chefe do Governo, a composição do Governo, a configuração das Assembleias.
Em 1975 fora da FRELIMO e do remanescente do Estado colonial pouco ou nada existia.
A meia centena de partidos ou ditos partidos que se formaram após o 25 de Abril em Portugal, quase todos haviam-se esvaído e os dois ou três últimos desapareceram após o fracasso da intentona dos ultras do colonialismo a 7 de Setembro de 1974.
Simango e o seu grupelho, como Joana Simeão haviam-se juntado à conjura, esperando que Spínola cumprisse a promessa de apoiar o golpe. Nkavandame recusou aderir.
O MFA em Portugal distanciara-se das ideias e planos do soberbo Marechal.
Em Moçambique o povo saiu para a rua e as forças armadas portuguesas apoiaram a aplicação do assinado em Lusaca.
A Rodésia quando consultada por Simango condicionara o apoio à posição de Pretória e o apartheid recusou pois que desejava abrir-se à África para sobreviver.
Havia pois um grande vazio que só se podia preencher com os militantes da FRELIMO vindos da luta armada de libertação e da clandestinidade. Natural que Estado e FRELIMO se confundissem, tanto mais que a postura de partido único primava em todo o continente.
Quarenta anos depois há que rever.
Na diplomacia e nas forças da ordem e segurança já se havia despartidarizado, mais ou menos.Mais ou menos porque por força do acordado em Roma a RENAMO pode designar quadros seus tanto para as chefias como para os efectivos das forças armadas, frequentemente sem qualquer qualificação para o desempenho da tarefa.
Gentes que nada sabiam de aviação, marinha, blindados, técnicas de navegação e de motores por força do acordado viram-se nomeados para cargos que exigiam esses conhecimentos científico técnicos e experiência. Pela paz e reconciliação fez-se o sacrifício. Porém há que dizer, a RENAMO não integrou a totalidade dos seus homens, não se desarmou como se comprometera. Gentes que não honram a palavra nem a assinatura.
Desde 1994 que regularmente a RENAMO ameaça o país e sociedade de recomeçar os tiros. Não interessam as razões, fá-lo. Como disco rachado invoca a fraude, ora e pelo menos em 1994 nunca apresentou ao Tribunal Eleitoral Internacional qualquer alegação. Este tribunal fora criado pelas Nações Unidas, não dependia minimamente do governo moçambicano, não integrava qualquer magistrado moçambicano ou designado por Moçambique. Nada podia afectar a sua credibilidade a sua total isenção. O boçalismo não se interessa pela razão, mas e apenas pelo capricho e desejos do seu mandante.
Como fazer a leitura da despartidarização do Estado?
A formação dos governos nos países democráticos resulta da correlação de forças em cada eleição.
Nos países democráticos compete ao partido vencedor, ou à aliança de partidos com a maioria parlamentar, formar livremente o Governo. Em boa lógica compete à maioria parlamentar aprovar o Programa do Governo, o Orçamento Geral do Estado, e demais legislação, sem o que nenhum governo pode levar a cabo a política para a qual o país o elegeu.
A admissão, as funções, as promoções e sanções dos funcionários não podem estar ligadas à filiação em qualquer partido.
As funções dos funcionários do Estado não se podem acumular com funções partidárias. Um administrador de distrito, por exemplo, não pode exercer funções de 1.º Secretário distrital dum Partido, ou de adjunto, tanto mais que por força dos estatutos, neste caso vertente da FRELIMO, as funções partidárias resultam de eleições internas e nunca por inerência. Até o Presidente da República, que é Chefe do Governo, para se tornar Presidente da FRELIMO deve ser eleito para isso.
Um Director Provincial ou distrital ou nacional, um funcionário não podem ser eleitos membros de um órgão partidário, deve haver incompatibilidade.
Em nenhum momento, todavia, se pode questionar o direito de um funcionário, um diplomata, um militar, um polícia aderirem a uma formação política. Isto faz parte dos seus direitos constitucionais, enquanto cidadão.
Um governador provincial não faz parte dos funcionários do Estado. O Chefe do Estado nomeia ou põe termo ao mandato do Governador. Ele representa e age em nome do Governo do país no escalão provincial.
Estas questões elementares fazem parte do B, A, BÁ da democracia. Não haveria necessidade de as debater tratando-se de factos óbvios e adquiridos. Apenas a ignorância mais boçal e violenta pode pretender o contrário.
A tese das províncias autónomas põe em causa a própria democracia. Nunca um só partido ganhou em todos os distritos e localidades de uma província. Como justificar então que ele governe uma província em nome da autonomia, pisando os resultados eleitorais que ocorreram? Governa a província o Governo do país, democraticamente eleito pelos cidadãos, independentemente dos resultados neste ou naquele local.
Ao mesmo tempo que um partido se ufana de haver atacado as forças armadas, declara que cria uma Comissão para a Paz. Há que dizer que nenhum ataque se fez contra forças operacionais mas sim contra uma coluna de abastecimento em alimentação a postos fronteiriços. Nunca houve dezenas de mortos, a província não dispões de tantos lugares na morgue e nunca se deixariam os corpos a apodrecer. Essa mortandade toda a gente a veria. Mentira pura, pois.
Estamos habituados a este tipo de patacoadas, mas elas não ajudam a um clima de distensão, não encorajam o investimento nacional e estrangeiro tão necessários para o desenvolvimento e luta contra a pobreza. Juízo por favor, patriotismo por favor. 
P.S. Quarenta anos representam meia vida de uma pessoa, mas um país ainda se inicia no gatinhar. Algo nós fizemos em tempos bem perturbados, sujeitos às sucessivas agressões dos sistemas racistas que ajudamos a derrubar, e às birras do boçal por eles criado. Paciência. Apesar de tudo come-se, veste-se e calça-se na povoação, emerge uma camada média, a energia e o celular vão chegando às zonas rurais, com a bicicleta e a TV. Parabéns Moçambique, parabéns e um abraço compatriotas.

SV

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