terça-feira, 10 de março de 2020

A Guiné-Bissau fica em África

A Guiné-Bissau fica em África
Escrevi uma postagem a dizer que Moz, Guiné-Bissau e Ruanda eram estados em construção. Algumas pessoas reagiram incrédulas como se eu tivesse cometido um sacrilégio por colocar a Guiné-Bissau no mesmo patamar que o Ruanda. Não me enganei. A sociologia não funciona como a ciência popular que envereda pelo lado menos doloroso e prefere dar destaque às aparências e ao trivial. É verdade que a Guiné-Bissau há vários anos que atravessa momentos políticos difíceis. As elites políticas assim como todos os guineenses são responsáveis por isso, mas nada do que lá acontece está fora do que é de esperar dum País africano.
A questão não é cultural. É profundamente estrutural. A Guiné-Bissau, por enquanto, constitui um exemplo extremo de tudo quanto pode correr mal no processo de construção dum Estado. Os países que não passam pelo que a Guiné-Bissau vive hoje são apenas sortudos, a engrenagem estrutural que determina o que acontece quando num determinado momento se falha o passo (no caso da Guiné-Bissau o golpe de Nino Vieira foi esse momento - e por razões totalmente compreensíveis, ainda que problemáticas) poupou aos outros países o tipo de dissabores que a Guiné-Bissau vive e que se agudizam em razão da sua estrutura social específica. A Guiné-Bissau é a África quando as coisas não vão bem assim como a África é o mundo quando as coisas não vão bem. O problema da Guiné, e de África, é que o que não vai bem tem uma história bem específica.
Nāo existe um horizonte temporal para que o sofrimento acabe. Pode ser que a Guiné nunca mais acerte o passo. O mundo não é justo no sentido de que ele não recompensa quem faz bem as coisas. Muita coisa é simplesmente aleatória que a gente, por preguiça de pensar, atribui à visão, clarividência, boa governação, etc. de políticos. Não estou a desfiar um argumento fatalista porque acredito que essas coisas são importantes, ainda que não dê os seus efeitos positivos por adquirido. Num outro momento histórico Kagame podia fazer as mesmas coisas que faz agora e dar berro. O Ruanda é pequeno demais para ser mais forte que as circunstâncias. A gente exagera os méritos de Kagame. A Costa do Marfim de Boigny nunca teria levado ninguém a imaginar as guerras civis que destruíram tudo o que o velhote tinha construído. E a verdade é que essas guerras civis foram resultado do que ele fez, também. De igual modo, ninguém teria apostado um tostão sequer no Gana até ao primeiro mandato democrático de Rawlings, mas hoje o Gana é talvez a melhor história de sucesso em África. O Botswana que até há pouco fazia lágrimas jorrarem dos olhos da indústria do desenvolvimento pelo exemplo de “boa governação” parece ter iniciado um processo de declínio que ainda vai dar que falar.
Eu estou aberto à possibilidade de a Guiné-Bissau nos surpreender um dia destes. De resto, a história mostra que momentos de cataclismo tornam países robustos. Se calhar o Ruanda está a colher dessa árvore...
É o que digo: a sociologia pode não servir para muita coisa, mas ela é duma paciência que constitui bom antídoto contra conclusões apressadas e contra a resistência que sempre manifestamos contra a necessidade de realmente pensarmos os nossos países e não sermos apenas caixas de ressonância.
A Guiné-Bissau fica em África. Em cada um dos nossos países há uma Guiné à espera de acontecer. Andamos apenas com mais sorte do que os nossos irmãos.
Yorumlar
  • David Banze Bravo Professor.
    Uma boa aula de sampiência.👏👏👏
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  • Patricia Godinho Gomes Caro Elisio penso que a Guiné Bissau há de surpreender. Como bem dizes, são momentos de cataclismo que acredito tornarão o país bem mais forte. A sua história nos ensina sobre isso. Abraço
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  • Rui Costa 55 Paises em Africa e só um ( Gana) destaca-se na opiniao do Dr.Macamo. Curioso fazer dos estrondosos falhanços com 50 anos, de varios Paises ,possiveis tranpolins para o " sucesso " Surpreende-me essa Paciência da Sociologia e a análise constante no que se passou sem se demorar em porquês,
    Não há nenhum capitulo da Ciencia das grandes análises , cheias de angulos pertinentes e "sintaxe bordada", que nao perspective o futuro????.
    Continuo a lê-lo muito atento porque o acho cheio de coragem, no amor que tem pelo que faz.
    Obrigado e
    Cumprimentos
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  • Fodé Abulai Mané Caro Professor, também subescrevvo integralmente a sua análise, porque para uma reflexão honesta sobre a actual situação da Guiné-Bissau é necessário levar em conta vários factores, que partem desde a forma como acedeu a independência, o processo de construção de Estado, passando pelas suas caracteristicas culturais, não apenas estruturais, muito visível nas ultimas eleições, onde foram repescadas algumas identidantes para criar ódios ao adversário e captar simpatias, os interesses geo-estrat-egicos dos vizinhos e ainda o pior e que ancorou nas forças armadas e para-militares, a rede de tráfico de drogas. Portanto as crises são ambientes favoráveis aos negócios ilicitos e elas em sí, são negócios.Assim, é muito imprevisivel o fim de uma situação desta, até que apareça um "milagre", em que vai aparecer quem irá vestir um "colete de força" a bater a mão na mesa e dizer BASTA
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  • Pedro Pereira Leite Vale também a pena equacionar a responsabilidadr da comunidade internacional. Esta à dez anos no país e o mandado qie deveria ter acabadoem 2019 foi prolongado mais um ano por razoes, algumas evidentes (derivadas da situação eleitoral) outras menos visiveis. Entre estas últimas a incapacidade de se criam instituições crediveis. A Guiné Bissau é hoje uma realidade dual. Com.um povo a fazer a sua vida, de forma informal, e im conjunto de dependentes da ajuda internacional. Basta olhar para o sistema educativo para entender a dimensão so problema.
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    • Elisio Macamo sem dúvidas. mas a gente gosta de ver estas coisas sempre de forma isolada.
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  • Pedro Tiago Acrescentaria a este leque outros dois países, por motivos distintos mas abordados no texto. A Somália, que er a um Estado próspero e agora é uma ruina, bem como a Etiópia, que esteve a beira do falhanço e que agora já é um bom exemplo.
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    • Elisio Macamo pois. há tantos outros exemplos positivos e negativos. o zimbabwe, burquina faso, etc.
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  • Antonio Gundana Jr. Eis a labuta: pensar os nossos países para se "esquivar" das caixas de ressonância!
  • David Boio Caro, Professor, desculpe colocar-lhe uma questão “básica”. Que entendimento atribui a variável “estrutura” no texto? A ver se consigo perceber sem equívoco o alcance da sua reflexão que muito aprecio
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    • Elisio Macamo David Boio, estrutural é tudo que não depende do voluntarismo para constrager as opções. não é só querer desenvolver-se que se vai desenvolver. igualmente, cada uma das coisas que a gente faz limita opções e lança-nos numa espiral que independe da vontade individual.
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  • Lyndo A. Mondlane Sao muitos factores
    Mas gestao danosa dos dirigentes no ajuda
    Desviar 22% do PIB de um pais ja de por si pobre e pretender q esse saia d miseria nao è realista


    Nos como cidadaos temos tambem culpa d situaçao dos nossos paises

3 comentários:

  1. As reported by Stanford Medical, It's in fact the one and ONLY reason this country's women live 10 years longer and weigh on average 19 KG less than we do.

    (And by the way, it has totally NOTHING to do with genetics or some secret-exercise and really, EVERYTHING about "HOW" they are eating.)

    P.S, I said "HOW", and not "what"...

    TAP on this link to uncover if this quick quiz can help you discover your true weight loss possibility

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  2. As stated by Stanford Medical, It's in fact the one and ONLY reason women in this country get to live 10 years more and weigh 42 lbs less than we do.

    (And really, it has NOTHING to do with genetics or some secret-exercise and really, EVERYTHING around "HOW" they eat.)

    BTW, What I said is "HOW", not "WHAT"...

    Tap this link to reveal if this short questionnaire can help you decipher your true weight loss possibilities

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  3. «momentos de cataclismo tornam países robustos»-Sim, ou não.
    Analisado há muito por historiador emérito, Arnold Toynbee, que em vez de ler a História em dois períodos, antes de Cristo (aC) e depois (dC), considera aG e dG (Gama, Vasco da Gama).
    Sobre a caminhada das sociedades, a tese do problema, 'desafio' ou catástrofe, como mecanismo de superação (continuidade) ou não superação (morte).
    O 'desafio' suficientemente robusto ao qual fazem frente e os torna mais fortes, são capazes,
    o desfio demasiado forte, perante o qual não são capazes de reacção, acabando por ficar para trás e desaparecer.

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