segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Porque Fecharam as Empresas Moçambicanas? - Viajar Sentado no Mesmo Lugar (1)

Por julgar actuais, decidi republicar uma série de textos que escrevi há uns 15 anos. Os textos foram, na altura, publicados no Jornal "Meia Lua", que já não existe. Hoje partilho o primeiro dessa série:
Porque Fecharam as Empresas Moçambicanas? - Viajar Sentado no Mesmo Lugar (1)
Moçambique está a caminhar a passos largos para uma União Aduaneira no âmbito da SADC. Este desenvolvimento pode vir a constituir-se num importante desafio para os nossos empresários. Será que estamos preparados? Qual tem sido a nossa experiência, como país, em termos de gestão empresarial? As falências e encerramentos de empresas que ocorreram no final da década de 1980s poderão ser explicados apenas com base na eventual falta de honestidade dos gestores? Foi apenas um problema de falta de capacidade de gestão? Não será importante examinar o contexto internacional em que essas falências ocorreram? Como é que o ambiente institucional interno pode ter influenciado o mau desempenho empresarial?
Os artigos que se seguem destinam-se a problematizar a percepção que prevalece no país em torno dos encerramentos de empresas que ocorreram na década de 80. Estes fenómenos têm sido analisados apenas na base do exame do perfil dos gestores da época, os quais, muitas das vezes, são rotulados de incompetentes e desonestos. Os artigos pretendem assim trazer à colação outros factores que poderão estar na origem dum fenómeno arrasador que lançou para o desemprego e para a pobreza milhares de moçambicanos. Talvez assim nos preparemos melhor para os desafios que a União Aduaneira representa. Nada melhor do que começar por citar um curioso dito shangana: “u ta yendza na wu yo tshama” que, numa tradução não literal para o português significaria “viajarás sem te ausentares”. Esta expressão pretende ser uma admoestação contra atitudes levianas de pessoas e comunidades e é um chamado no sentido de um comportamento responsável. Funciona como um aviso de que todas as coisas erradas que fizermos serão levadas pelo vento para locais que nem sonhamos visitar. Ou seja, as pessoas parecem preferir veicular as coisas erradas em relação às boas acções. E a maneira como os outros nos encaram será construída a partir de factos pouco dignificantes
Esta questão da dignidade parece assumir nas pessoas uma dimensão transcendental, daí que elas dediquem uma atenção particular não só aos factos mas também às percepções que giram em torno desses factos da vida. Ninguém no seu perfeito juízo gosta de vender o seu lado mais defeituoso. Seria um caso raro e um doloroso exemplo de rebaixamento e de aviltamento próprio que alguém se comprazesse nos seus defeitos, que solenemente se adiantasse, cercado dos seus amigos, e exclamasse para o público, com a fronte alçada: - “fala-se aí de um tipo que é um medíocre, um indivíduo que habitualmente foge do banho como o diabo da cruz, um fanfarrão e um ébrio. Ora, com tão minguadas qualidades só eu existo por aqui. Esse indivíduo, portanto, sou eu!”
Ter uma boa imagem pública parece estar na origem do curioso dito shangana, que intima as pessoas, comunidades e países a cultivarem e a preservarem o que de melhor há neles. E, desse modo, a evitar associar-se a factos e percepções negados pela sociedade.
Moçambique, como país, não deve querer viajar sem se ausentar. Daí toda a sua indignação a actos associados, por exemplo, com corrupção. Com os roubos. Com encerramentos de empresas devido a roubos ou gestão incompetente. E, no nosso país, há várias pessoas que têm estado a viajar sentadas no mesmo lugar, acusadas precisamente deste último aspecto. Que o diga o Dr. Hermenegildo Gamito. Sempre que os seus adversários políticos lhe queiram desmoralizar, principalmente no Parlamento, é só falar da Mabor, do BPD, da MAQUINAG e por aí fora.
Evidentemente que, sobre tema tão vasto, muitas explicações podem ser avançadas, dependendo dos campos de especialização das pessoas. Mesmos entre os economistas as abordagens podem ser diferentes e os leitores poderão ser tentados a perguntar: em quem acreditar? Naturalmente que é em mim que os leitores deverão acreditar… No que se refere às diferentes abordagens, as suas causas podem ser as mais diversas. A começar pelo facto de alguns comentadores serem mais inteligentes que outros. A opção política dos intervenientes no debate pode ser outra causa das diferenças. E devo confessar que isto tem sido verdade no meu caso; ao longo dos anos, principalmente em períodos eleitorais, tenho encontrado muita sagacidade em opiniões económicas de correligionários do Partido de minha escolha, cujo analfabetismo é no mínimo proverbial, economicamente falando.
Falando mais seriamente, talvez fosse de referir que o objecto de estudo da ciência económica, diferentemente das ciências naturais, está num processo de constantes mudanças. As instituições, as empresas, o comportamento dos consumidores, a função do governo, a força de trabalho, não são fenómenos estáticos. Isto significa que a ciência económica, para não ficar fossilizada, deve se adaptar de dois modos. Ela deve mudar à medida que novas informações são obtidas ou a nossa capacidade de os apreender e interpretar melhora. E, em segundo lugar, ela deve mudar à medida que as instituições sofrem alterações. As diferenças aparecem então porque diferentes economistas têm diferentes atitudes perante as mudanças. Muitos tendem a acreditar que o objecto de estudo da ciência económica, semelhantemente ao que ocorre com as ciências naturais, é estático.
Para a tentativa de explicação que tento sugerir nos textos que se seguem, e mesmo para outras tentativas com que os amigos leitores se toparão no futuro, tenho um conselho simples. Testem as explicações na base da seguinte pergunta: a explicação procura apreender a complexidade de factores susceptíveis de explicar o fenómeno em análise? Subsequentemente, os leitores deverão se perguntar a si próprios se a explicação é verdadeiramente completa, em termos de considerar a multiplicidade de factores que influenciam um fenómeno e se essa explicação “faz sentido”, em termos mesmo de senso comum.
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