domingo, 1 de setembro de 2019

Um mandato sem planos

Um mandato sem planos
Quando Simango foi eleito, com o suporte dum documento onde dizia conhecer o futebol moçambicano, apresentou uma série de dados. No quadro 3.1 do documento que aborda clubes que movimentam o futebol de 11, Simango apresentou um total de 205 clubes. Quando faltam menos de 30 dias para terminar o seu mandato o número de clubes reduziu significativamente. Por exemplo, Maputo contava com 45 clubes legalmente constituídos e agora apresenta apenas 35. Se a redução não é necessariamente um atestado de incapacidade a repetição deste padrão em todo território nacional significa algo: ou Simango estimou mal, o que lhe deixa numa posição desconfortável ou, ainda, não conhece o futebol moçambicano, o que é tremendamente péssimo. Portanto, não se trata de pegar nos Mambas ou numa simples qualificação fruto do acaso para estimar o mérito ou demérito.
O que Simango prometeu, no que diz respeito a massificação do futebol federado não aconteceu. Os números mostram isso de forma cristalina. A situação, em alguns lugares, permanece exactamente a mesma ou simplesmente regrediu. Não é, como se pretende deixar transparecer, um problema de Abel Xavier ou dos Mambas, mas da base de recrutamento que Simango foi incapaz de exponenciar como prometido em dois documentos. Quando Simango entrou 32% dos distritos movimentavam futebol 11, mas agora essa percentagem desceu para 29%. Naquilo que Simango deve ser avaliado ele falhou completamente. Mesmo em relação ao números de provas, que Simango queria aumentar, nada aconteceu. O grande problema da discussão sectária deste país, no que tange ao desporto, é o seu desamor pela verdade, é o amiguismo e aquele discursinho de meia-tigela que pinta tudo em preto ou branco, o famoso nós e os outros que Ikonoklasta afirmou numa das suas músicas como nocivo ao progresso.
Nesta sociedade em que fazemos tudo partindo do tecto uma simples classificação ou uma vitória anestesiante distanciam-nos dos factos e daquilo que, enquanto jornalistas, devemos perseguir. Em suma: Simango é mais um homem que comanda os destinos da FMF sem saber o que fazer, agarrado aos resultados quando sequer escolhe os jogadores. É o que acontece quando um gestor não faz o que se comprometeu a fazer ou nem sabe como fazer. Quem lhe assessora não lhe indica as linhas do manifesto exactamente pela natureza dum país onde julgamos pelo mais visível. O futebol nacional é uma espécie de titanic que embateu com um iceberg de realidade na Guiné e nos delírios subsequentes dentro das quatro linhas. O que seria bom para reflectirmos no caminho que se deve trilhar. A FMF lembra-me Pablo Escobar quando ganhava corridas de carro a custo de colocar pregos no trilho dos adversários. É uma estratégia benéfica até bateres de frente com uma DEA com os ilhéus cá ao lado.
O que me irrita nos presidentes da FMF é que odeiam a frustração de consolidar os processos durante um longo período e dão de quatro ao prazer dos corta-matos.
Voltando ao Simango importa destacar os 10 compromissos por ele definidos:
1. Agir em defesa da verdade desportiva
2. Criar mecanismos para melhorar a saúde financeira dos clubes
3. Melhorar o alcance
4. Atrair o apoio dos megaprojectos para o desenvolvimento das associações provinciais
5. Criar em todo país competições para massificar o futebol escolar (parceria FMF e MINED)
6. Valorizar a experiência das antigas glórias
7. Parcerias internacionais para fortalecer a componente de gestão na FMF
8. Formações contínuas de atletas e gestores.
9. Atrair conhecimento científico oriundo das instituições de ensino superior em Moçambique.
10. Fortalecer o relacionamento com o Governo.
No que diz respeito às prioridades, Simango definiu as seguintes vertentes: verdade desportiva, formação, infra-estruturas, cooperação internacional, futebol feminino, futebol de praia, futsal, selecções nacionais, selecção A e escalões de formação. Essa coisa de consolidar a verdade desportiva é das mais absurdos que se alardeiam cá no burgo.
Agora que o mandato termina um jornalista inteligente deveria perguntar ao elenco do homem que foi apadrinhado como o mais profundo conhecedor do futebol o que foi feito para propiciar a emergência dos escalões de formação nos clubes? Onde estão as tais competições provinciais? De que forma elas se desenrolam? O que foi feito ao nível de infraestruturas? Qual é o estágio do futsal em cada província? O que se faz em relação ao futebol feminino? Quantos clubes existem com futebol federado feminino? Quantos atletas temos no futsal?
Bem, a vitrine das vitórias morais dos Mambas devem ser as mais nutridas do mundo e não só pelas suas pequenas qualificações ao CAN, também pelos seus expressivos fracassos. Alberto Simango Júnior não passará a história dos Mambas pelo primeiro aspecto, mas já figura com os seus antecessores no quadro de honra das etapas absurdas (todas). Hoje sabemos do desastre total em que consistiu o já quase felizmente extinto simanguismo, desde que chegou à FMF como homem do futebol até ao seu dramático empenho em piorar os números de Faizal Sidat. Simango obrigou-nos a desenterrar dados que já não se registavam no futebol moçambicano desde que nos chamamos Mambas. Mas o mais absurdo dos momentos simanguianos não foi a eliminação aos pés dos poderosos ilhéus, o mobiliário novo para uma recém-inaugurada sede da FMF, mas sim a estagnação em relação à sua promessa de levar o futebol aos distritos, de aumentar o número de praticantes e de criar uma estrutura para projectar o futebol a todos níveis. Vencemos duas vezes a Zâmbia. Nunca antes tínhamos visto uma equipa tão enferma a praticar um futebol tão maravilhoso. Aquilo, víamos, não tinha sentido, como não teria a alegria numa cidade bombardeada. Que Simango deve largar a FMF já se sabia a meio percurso do seu mandato. E não porque os Mambas perderam uma ou duas partidas; sim porque não aprendeu de cada derrota e se o fez nunca se visualizou fora do campo onde devia implantar as estruturas para ganharmos um dia. É certo que ensaiou discursos desesperados - todos menos levar o futebol aos distritos -, intensificados por ideias que não concretizavam uma ordem racional, nem fomentavam um caos produtivo.
Simango chegou com uma ideia, implementou outra coisa e não foi questionado com o mesmo vigor que o seu antecessor. Faizal já submeteu a sua candidatura, mas tal como Simango não implantou nada que pudesse ser usado como base para definir etapas de progressão. Esse é o grande problema do nosso desporto. As cadeiras trocam-se, os rostos sucedem-se e um plano continua a ser tão raro como uma mulher com roupas até ao joelho na rua dos prazeres.
PS: O tempo de Faizal Sidat já passou. Não queremos um nome, mas sim um plano.
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