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A Aula Pública de Sociologia (A.P.S) é uma iniciativa da direcção máxima da Associação
Moçambicana de Sociologia (A.M.S) que procura reconhecer e distinguir publicamente
individualidades e/ou entidades nacionais e/ou estrangeiras que se tenham destacado ao
contribuir para o desenvolvimento da sociologia. A ideia principal consiste em convidar um
académico de reconhecido mérito na sociologia ou áreas afins à partilhar a sua formulação
sociológica de um problema específico da disciplina ou identificado em torno de um tema. A
APS, portanto, é um evento público onde o orador convidado aborda os aspectos centrais da
sua investigação sobre determinado assunto. Por norma, é dada preferência à sociólogos
moçambicanos como forma de divulgar sua pesquisa e ideias à um público mais alargado.
Este ano a A.P.S da A.M.S vai na sua segunda edição. O conteúdo da A.P.S é da inteira
responsabilidade do orador que profere a aula.
Maputo, 03 Outubro 2012
O Presidente da A.M.S.
Prof. Doutor Patrício Vitorino Langa
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Breve nota biográfica
Elísio Salvado Macamo é Professor Catedrático de Estudos Africanos na Universidade de
Basileia, Suiça desde 2009. Antes, ensinou sociologia do desenvolvimento na Universidade
de Bayreuth, onde foi um dos fundadores da Escola Internacional de Pós-Graduação de
Estudos Africanos da Universidade de Bayreuth, Alemanhã. Macamo possui um mestrado em
Tradução e Interpretação pela Universidade de Salford, na Inglaterra. Obteve um segundo
mestrado em Sociologia e Política Social pela Universidade de North London, também na
Inglaterra. Doutorou-se em Sociologia Geral pela Universidade de Bayreuth e fez o pósdoutorado
também na Universidade de Bayreuth. Foi pesquisador do Centro de Estudos
Africanos de Lisboa (Portugal), pesquisador associado do Instituto de Estudos Avançados de
Berlim. Regularmente oferece oficinas metodológicas para estudantes de doutorado em
colaboração com o CODESRIA (Conselho para o Desenvolvimento da Pesquisa em Ciências
Sociais em África). Foi professor visitante na Universidade Eduardo Mondlane. Nasceu e
cresceu em Moçambique, mas concretamente em Xai-Xai, provincia de Gaza. Ele estudou em
Maputo (Moçambique), Salford e Londres (Inglaterra) e Bayreuth (Alemanha).
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Por uma sociologia objectiva
E. Macamo
Não quero ser mórbido, o dia de hoje não se presta ao humor negro. Mas enquanto ouvia os
depoimentos aqui feitos não consegui reprimir o desejo de que o ambiente seja assim mesmo
no dia do meu funeral! Boas acções, como as que aqui foram enumeradas, garantem a muita
gente a imortalidade. Como todo o machanganga que se preza, uma pessoa, portanto, que não
foi abençoada com a virtude da modéstia, também gostaria de alcançar a imortalidade. Ao
contrário de muitos, porém, e possivelmente contra todas as leis da natureza, gostaria de
alcançar essa imortalidade por uma via menos complicada do que a via das boas acções,
bondade e genorosidade. Como dizia Woody Allen, quero ser imortal simplesmente não
morrendo. No dia do meu velório quero ouvir, ao invés de discursos e depoimentos em meu
abono – que até vou precisar como carta de recomendação para apresentar ao São Pedro –
quero ouvir, dizia eu, alguém a interromper um desses depoimentos com a seguinte frase
simples e singela: olha, ele está a mexer-se!
Para entrar directamente no tema da minha palestra hoje insisto, porém, que essa exclamação
“olha, ele está a mexer-se” corresponda à verdade. Ou melhor, sejam honestos para convosco
próprios no sentido de dizerem em voz alta aquilo que os vossos sentidos vos comunicam
como sendo a manifestação factual da verdade. Não digam isso para me agradar, nem, o que
para mim é mais importante ainda, deixem de dizer isso só porque acham que não mereço,
que o mundo fica melhor com menos um “sociólogo de carteira”, que não faz pesquisa, é
lambe-botas, bajulador ou apóstolo da desgraça. Sejam, numa única palavra, objectivos!
Caro Patrício, Presidente da AMS,
Caro Nataniel, Director da ECA,
Caros colegas, amigos, estudantes e demais,
Sinto um enorme rigozijo pela honra que me deram de fazer a palestra pública de sociologia
deste ano. Não vou fingir modéstia manifestando o desejo de que o convite viesse muito mais
tarde, pelo menos longe da primeira para que sejam primeiro distinguidos aqueles que como
Luís de Brito, o primeiro orador no ano passado, tanto deram para o desenvolvimento das
ciências sociais. Não vou dizer os nomes para não arriscar olvidar um e outro, mas o colega
Carlos Serra do CEA, as colegas Teresa Cruz e Silva, Isabel Casimiro, Ana Loforte bem
como todos aqueles que como José Castiano, João Colaço, Adriano Maurício, José Castiano,
Manuel Macie, Obede Baloi, Filimone Meigos entre vários outros – e aqui nem menciono a
nova geração: Baltazar Muianga, Rehana Capurchande, Neto Siqueira, Hélder Jauana, Carlos
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Bavo, Orlando Nipassa, etc. asseguraram durante vários anos a formação em sociologia no
nosso país, são nomes incontornáveis e merecem, muito mais do que eu, a honra de se
dirigirem a uma plateia como esta e dissertar sobre o passado, presente e futuro da sociologia.
Eu quero aproveitar esta ocasião para render homenagem a alguns colegas que foram
responsáveis pelo meu regresso ao país para dar aulas na UFICS. A principal pessoa foi o meu
caro amigo e pessoa cuja inteligência e obra admiro bastante, Severino Ngoenha, que no
longíquo ano de 2000 me sugeriu a ideia de trabalhar como professor visitante de sociologia
na UFICS. Não foi difícil convencer-me, pois em 1998 já tinha ganho gosto pelo contacto
académico com o país através dum convite que Carlos Serra, para mim o decano da sociologia
moçambicana, me havia feito para proferir uma palestra numa aula aberta por ele organizada.
Esse foi o meu primeiro contacto com a academia moçambicana depois de quase 10 anos sem
pôr os pés no país. A seguir à sugestão de Severino Ngoenha veio o interesse manifestado
pelo então Reitor, Brazão Mazula, a quem fui apresentado por Carlos Serra, bem como o
interesse imediato manifestado pelo então Director da UFICS, Obede Baloi, em me acolher.
Na altura a UFICS estava em crise e eu sabia que estava a ser convidado como uma espécie
de bombeiro, pois a greve dos professores fundadores da UFICS estava a comprometer a
abertura da licenciatura em sociologia. Esse contexto de crise criou-me muitas dificuldades de
ordem moral, pois embora não conhecesse os detalhes do conflito que opunha os adversários,
não me agradava a ideia de tomar partido tácito por uma das partes. Tomei a minha decisão
definitiva a favor da cooperação com a UFICS após uma conversa, em Amsterdão, com Luís
de Brito – espero que ele ainda se lembre dessa conversa – a quem pedi opinião uma vez que
ele estava directamente envolvido no conflito pela outra parte. Luís de Brito disse-me que não
via nenhum problema tanto mais que tudo que fosse a favor dos estudantes precisava de ser
acarinhado. Confesso que não sei o que teria feito se Luís de Brito me tivesse aconselhado
contra a cooperação. Ainda bem que não o fez, pois o dia de hoje não teria de certeza
acontecido!
Ao longo dos poucos anos que essa cooperação directa com a UFICS durou travei
conhecimento com pessoas excepcionais, quer do lado do corpo docente e dos funcionários da
UFICS, quer do lado dos estudantes. Tenho muitas saudades do Sr. Mahumane e do Sr.
Tovela; guardo com muito carinho a amizade e apoio que Manuel Macie, Francisco da
Conceição bem como os colegas Samuel Quive me deram enquanto essa cooperação durou.
Rigozijo-me muito pelo facto de os meus estudantes, que tão bem me acolheram – o medo de
que eles fossem hostis levou-me a uma tentativa de corrupção que consistiu em lhes oferecer
chocolate com a desculpa de que na aula anterior teriam feito cara de fome; aproveito desde já
confessar que foi a partir desse dia que me comprometi publicamente a nunca mais criticar a
corrupção para não parecer incoerente aos olhos dos meus estudantes... – mas dizia eu que me
rigozijo bastante pelo facto de que muitos, senão todos os meus estudantes, terem ficado meus
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amigos, alguns, naturalmente, mais dos que outros por se terem tornado companheiros da má
vida, e mau comportamento, de Maputo. Não vou dizer, é claro, os seus nomes. Muitos já se
casaram, têm família, e eu quero que as suas mulheres e maridos continuem a pensar que
quando saiem comigo é para irmos falar de Max Weber e Emile Durkheim ou falar mal de
sociólogos de carteira...
Gostaria, contudo, de destacar duas pessoas e peço imensas desculpas aos muitos outros por
quem nutro muito afecto por não os incluir nesta lista curta. Todos eles sabem quanto eles
significam para mim, por isso sei que me vão desculpar. Quero destacar o nome do Patrício
Langa, Presidente da Associação Moçambicana de Sociologia pelo enorme investimento
físico, intelectual e mesmo político que ele tem feito para que a sociologia tenha visibilidade e
se constitua como uma comunidade com igual direito de existência na grande família
académica do nosso país. É claro que sem o empenho de muitas outras pessoas, entre aqueles
que foram seus colegas de carteira na UFICS e os que hoje se iniciam na sociologia, ele não
teria feito, talvez, metade do que foi possível fazer pela sociologia. Sinto orgulho por ter sido
seu docente e sinto-me honrado por constar da sua lista de amigos. Se tivesse tempo ia ao seu
perfil de Facebook e clicava “I like, I like, I like” até o teclado encravar.
A outra pessoa que gostaria de destacar é o Rogério Sitoi. Dou graças à difícil relação que ele
tinha com vírgulas nos seus trabalhos académicos pela facilidade com que ultrapassei os
medos de ter na minha sala de aulas o director dum jornal tão importante como o jornal
Notícias e, rapidamente, estabelecer uma relação de amizade que o inclui, assim como ao
Patrício Langa, na lista das pessoas cujos nomes não vou mencionar para não lhes criar
problemas com as esposas. Destaco Rogério Sitoi por ter aberto as páginas do seu jornal aos
meus textos. Não me refiro aqui ao facto de com isso o meu nome ter ficado mais conhecido
na esfera pública. Saliento mais o facto de a publicação dos meus textos no jornal Notícias ter
ajudado a conferir mais respeito ainda ao pensamento sociológico. Tenho recebido muitas
mensagens de jovens que se iniciam na sociologia e que me dizem terem sido estimulados
pelo pensamento sociológico tal e qual eles o viram esplanado nos meus textos. Rigozijo-me
por isso, mas mais do que isso, agradeço ao Rogério Sitoi por ter contribuido, dessa forma,
para um maior protagonismo da nossa disciplina na esfera pública.
Não quero transformar toda a minha palestra num elogio aos amigos e colegas. Prometi, e foi
anunciado que eu iria falar da necessidade duma sociologia objectiva. Se comecei por
destacar o lado talvez lúdico das coisas foi também porque queria começar por transmitir um
princípio que me é muito caro. Na brincadeira como no trabalho tento, dentro das minhas
possibilidades, fazer as coisas seriamente. Brinco seriamente. E trabalho seriamente.
Trabalhar seriamente, e trabalho para mim é essencialmente sociologia, significa renovar
permanentemente o meu compromisso com uma sociologia objectiva.
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Sobre a minha relação com a sociologia escrevi, quando fechei o meu blogue “Ideias Críticas”
há três anos, o seguinte: “Penso que apesar disto tudo o blogue cumpriu com o seu objectivo
principal de estimular reflexões sobre o país baseadas na distância crítica. Alguns debates
foram bem quentes e tenho, inclusivamente, a sensação de que a minha insistência numa
atitude crítica de princípio na abordagem de seja qual for o tema levou algumas pessoas ao
desespero ou mesmo à dúvida sobre se com o tipo de sociologia que privilegio se pode
construir qualquer país que seja. Não tenho respostas para muitas perguntas, mas para essa
sobre a utilidade dessa sociologia tenho: de facto, quem esperar por ela para construir um
país vai esperar, esperar e... esperar. A sociologia não produz o tipo de conhecimento
susceptível de construir um país nos moldes imaginados por aqueles que acham que o útil é
só aquilo que constrói (visivelmente). A sociologia, na realidade, não serve para muita coisa.
É uma maneira de estar no mundo. É um ponto de vista que se desdobra em vários, curioso,
de olhos abertos, sempre à procura de novas maneiras de apreender o mundo. É uma
maneira de estar no mundo que nos devolve à infância dando-nos os olhos das crianças para
redescobrirmos as coisas, mas também equipando-nos com alguns instrumentos que nos
permitem interrogar o nosso próprio olhar. A sociologia é uma ciência narcisa: está muito
ocupada consigo própria para se meter com as coisas da vida. É um acto de introspecção
sobre as razões que temos para descrevermos o mundo da forma como o descrevemos. E a
pergunta é sempre de saber não só se o mundo que descrevemos corresponde ao que vemos,
mas também como vemos, de onde vem a certeza que temos de que vemos e de que o mundo
que descrevemos realmente existe. Portanto, a sociologia é teoria de conhecimento, mas
também metodologia.
A sociologia é a aventura do conhecimento. Ela permite-nos não só apreendermos o mundo,
mas também saber como o apreendemos e, através de interpelações críticas feitas pelos
outros, revermos a nossa maneira de apreender, aperfeiçoar posturas, posições, perspectivas
e ângulos. A sociologia é uma longa conversa que só tem início, mas não tem fim. Um
assunto conduz a outro. Cada interpelação, cada opinião, cada ponto de vista representam
atalhos irresistíveis pelos quais descemos, e caminhamos, sem a certeza de um dia voltarmos
à estrada principal. Por vezes levam-nos a outras estradas principais. A sociologia é um
labirinto cheio de musas a assobiarem. Ela é a perdição.”
Na verdade, o que quero partilhar convosco hoje nesta aula pública é algo que vai parecer até
contraditório. Vou defender a tese segundo a qual a ideia duma sociologia objectiva seria
redundante. A sociologia ou é objectiva, ou não é sociologia. Sei que com esta afirmação
entro imediatamente num campo bastante lamacento, sobretudo se tivermos em conta a
história intelectual do nosso país profundamente marcada pela visão marxista do período
imediatamente a seguir à independência. Mas é esta a ideia que vou defender. Para mim o
contrário de objectivo não é “subjectivo” porque isso poderia sugerir a ideia de que o que é
subjectivo não tem valor científico. O enorme desenvolvimento das abordagens qualitativas
na metodologia tem vindo a provar que é possível ser subjectivo sem necessariamente ser
contra a ciência, isto é contra formas de pensar acessíveis a todo o indivíduo racional. O
contrário de “objectivo” para mim é irracional, pois aqueles que têm o hábito de colocar
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pontos de interrogação à volta dessa noção fazem-no muitas vezes no intuito de sugerir que a
conversa racional não é possível senão entre pessoas que partilham os meus interesses.
Lamento bastante que a ideia de “objectividade” em alguns cantos da nossa academia
continue a ser vista com desconfiança e é contra essa ideia que faço a minha reflexão hoje.
Vou, então, dissertar sobre a sociologia e tentar erigir algumas barreiras que a possam
proteger da irracionalidade e garantir, por essa via, a sua relevância no nosso país. Para esse
efeito, vou começar por discutir os pressupostos que tornam atraiente a desconfiança que
alguns de nós têm mostrado à noção de objectividade. Em seguida, e com base em alguns
exemplos concretos, vou mostrar porque uma sociologia que não se reconcilia com a noção da
“objectividade” é não só problemática como também pouco merecedora desse rótulo e vou
concluir com algumas ideias sobre a relevância da sociologia no nossos país.
Alguns esclarecimentos podem ser úteis para o público menos especializado. A objectividade
consiste na ideia de que factos estão acima de qualquer consideração subjectiva. Esta
definição é muito mais complexa do que parece. Por exemplo, se chove e eu vejo que chove,
o meu dever como observador é reportar fielmente esse facto. Está a chover. Onde está a
dificuldade? A dificuldade está no facto de que quando observo alguma coisa estou ao mesmo
tempo a proceder a uma operação de tradução. Isto é, tenho à minha disposição certos
critérios científicos (definições de quando um determinado comportamento da natureza deve
ser classificado como chuva) que devo traduzir (ou interpretar) de modo a resultarem nessa
constatação de que está a chover. Esse processo de tradução, todavia, está sujeito a uma série
de constrangimentos, um dos quais é o facto de um observador (vamos lá, ligado à associação
de agricultores que está a pedir subsídios para aliviar as consequências da seca) não estar
interessado em constatar a presença da chuva.
O problema no nosso país, na prática das ciências sociais como no debate público, é que se
parte da ideia segundo a qual a objectividade não existiria. Se alguém diz, por exemplo, que
fez um estudo em que constatou altos níveis de corrupção no aparelho do Estado desconfia-se
logo que esse relatório não reporta a realidade factual, mas sim manifesta o interesse
particular dessa pessoa em pintar o país dessa maneira; o contrário também é válido. Se
alguém critica um estudo que diz que há muita corrupção, diz-se que essa pessoa o faz para
defender o governo e garantir ou proteger certos privilégios que espera desse governo. O que
me vai ocupar hoje é uma elaboração desta discussão que chega ao ponto de dizer que uma
vez que a produção do conhecimento está sujeita a este tipo de constrangimentos a ideia de
objectividade deve pura e simplesmente ser abandonada. É claro que eu não concordo com
esta ideia. Na minha discussão vou fazer uma distinção entre objectividade – deixar falar os
factos – e neutralidade axiológica, isto é a prática de suspender os nossos valores na pesquisa
para dizer que embora a objectividade seja difícil de alcançar ela é importante como
orientação normativa da pesquisa.
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Da desconfiança
A questão na base de toda a discussão sobre a objectividade na ciência é simples: é possível
procurar por respostas para problemas da nossa vida que não se fundem nos nossos valores e
interesses? Colocada desta maneira a questão não pode ter outra resposta senão a negativa.
Anterior a essa questão é uma outra, nomeadamente a questão do estatuto das ciências sociais
no concerto da produção de conhecimento. Ela levantou-se no longíquo século XIX quando
pensadores como Wilhelm Dilthey – de quem sou colega póstumo na Universidade de
Basileia – defenderam a ideia de que as ciências sociais – que ele apelidou, apoiando-se numa
ideia bastante asquerosa de Hegel, de ciências espirituais – são diferentes das ciências naturais
e que, por isso, precisam dum fundamento metodológico diferente. A empatia, compreensão e
interpretação constituiriam esse fundamento na opinião de Dilthey, mas também de Max
Scheler e, acima de tudo, de Max Weber – com quem partilho a honra de ter publicado duas
obras na mesma editora – um dos principais fundadores da sociologia. Embora o argumento
que eles produziram fosse, em minha opinião, perfeitamente coerente, ele criou mais
problemas do que resolveu. Ao destacar a história como o contexto de validação do
conhecimento – no fundo era nisso que assentava a ideia de Dilthey, daí que tenha sido
também chamada de historicista – abriu-se de certa maneira espaço para a ideia de que
valores, e logo interesses, pesariam mais na validação do conhecimento do que os próprios
factos. Ou por outra, o verdadeiro significado dos factos não podia residir nas suas qualidades
essenciais, mas na perspectiva que o cientista social consigo levava para abordar os
fenómenos.
Na verdade, esta maneira de ver as coisas ganhou mais força ainda com o chamado debate do
positivismo que sacudiu a academia alemã nos anos 60 e que contou com intervenções de
nomes sonantes como Jürgen Habermas e Theodor Adorno. Foi Habermas, por exemplo,
ainda fortemente influenciado pela escola marxista de Frankfurt, que disse, sem pestenajar,
suponho, que o conhecimento sociológico estava necessariamente ligado aos interesses sociais
dos pesquisadores. Penso que a sua obra mais recente, sobretudo a teoria da razão
comunicativa, mas acima de tudo a sua defesa da modernidade contra as investidas do
pensamento pós-moderno, revela um abandono desta posição, mesmo que ele não o diga
abertamente. E ele só faz bem em abandonar essa posição.
Na verdade, a ideia de que interesses sociais estejam na base da produção intelectual não
precisa necessariamente de desembocar na conclusão segundo a qual em razão desse facto o
conhecimento não seria objectivo. Esse é um problema essencialmente lógico que tem as suas
raízes na filosofia sobre a qual a rejeição da objectividade assenta. Neste caso, como no caso
de Moçambique em geral, trata-se da filosofia marxista que associa a percepção do mundo aos
interesses de classe. É lógico, portanto, que a origem da vontade do conhecimento se articule
com a posição social. O problema, contudo, é que a mesma filosofia reclama ter descoberto
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leis universais que dão razão ao conhecimento produzido dentro do seu contexto. Assim, o
conhecimento que nós produzimos e tem como objectivo libertar os injustiçados para que
estes assumam o seu lugar na História e a conduzam até ao seu desfecho lógico é
conhecimento legítimo e verídico, na acepção marxista, porque ele tem como base uma lei
universal, o materialismo histórico, que é verdadeira por definição. O problema lógico que
isto acarreta é fácil de ver: que critérios temos nós para julgar a veracidade destas leis?
Mas antes de apreciarmos devidamente esse problema lógico vamos reflectir brevemente
sobre o que isto significa no debate público moçambicano. A posição é defendida por aqueles
que entendem a sociologia como crítica social. E crítica social no nosso contexto é dizer mal
das coisas, de preferência das coisas que são feitas (ou omitidas) pelo governo. Considero este
exercício não só supérfluo como também profundamente contraproducente. Supérfluo porque
se embriaga no estupaficiente das suas próprias certezas com aquele potencial incrível de
auto-confirmação que o senso-comum detém. Que existe pobreza no meio de riqueza no país,
isso já sabemos; que o nosso sistema sofre muito do facto de ser dominado por um único
partido, também já sabemos; que estamos mal, mas mal mesmo, também sabemos. A simples
repetição destas coisas e, acima de tudo, a constatação de mais uma instância empírica que
confirma o que sabemos não aumenta o nosso conhecimento sobre o nosso país de nenhuma
maneira significativa. Estamos aqui perante aquela dificuldade típica da filosofia da ciência
que consiste no problema da saturação empírica que não prova nada como bem teria dito Karl
Popper com recurso à noção de falsificação. Mais importante do que andar atrás de mais um
exemplo da podridão seria procurar dar conta do papel de cada um de nós na produção do tipo
de sociedade em que vivemos. As lamentações encaixam perfeitamente na lógica dominante
de reprodução da nossa sociedade, pois elas contribuem para reforçar a ideia de que vivemos
numa sociedade dominada por certas pessoas com intenções obscuras e vis. Não vemos que
essas pessoas a quem nós atribuímos tanta manobra – para usar terminologia do antigamente –
são um produto dos nossos receios e de formas muito problemáticas de pensar. Já reflecti em
tempos sobre o que chamei de “poder da Frelimo”. Acho que algumas coisas que disse nessa
reflexão continuam válidas, ainda que precisem de trabalho empírico para melhor
fundamentação. Nessa reflexão, efectivamente, sugeri que o tão propalado “poder da Frelimo”
não existiria a não ser como artimanha que usamos, uns com mais sucesso do que outros, para
assegurar os nossos lugares na sociedade. Volvidos anos após essa reflexão estou mais
convencido ainda da plausibilidade dessa ideia. Estamos perante a força duma ilusão que faz
do nosso país uma das construções simbólicas mais fascinantes que já passaram pela face da
terra. É incrível observar como todo um país, toda uma sociedade podem estar presos a uma
ilusão e, para confirmar o que o casal Thomas (I.G. e Dorothy) disse no longínquo ano de
1928, produzir a realidade do país a partir da crença que se torna realidade pela força da
convicção: “Quando os homens definem uma situação como sendo real, ela é real nas suas
consequências”. A análise dessa ilusão só é possível para quem resiste à tentação de reduzir a
sociologia (e as ciências sociais) à ideologia e chamar isso de crítica social.
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Então, eu volto à pergunta que colocava mais acima: que critérios temos nós para avaliar a
veracidade das leis enunciadas pelos que consideram ter um acesso privilegiado ao
funcionamento da natureza? É óbvio que esses critérios não podem estar enterrados nos
nossos interesses, pois os nossos interesses são diversos. A não ser que alguém diga que só
um conjunto de interesses é legítimo e que outros não são. Por acaso isto é o que se fez no
nosso país. Falava-se de falsa consciência justamente para deligitimar interesses que não
estivessem em sintonia de onda com a opinião dominante que, para parafrasear Marx, é
sempre a opinião dos que dominam. Para apreciarmos a veracidade das leis universais
proclamadas pelo Marxismo – e, por extensão, por todo aquele que acha que o seu quadro
ético confere legitimidade ao que diz em público – precisamos dum espaço de discussão que
esteja acima – ou debaixo de – todos quadros éticos que entram na discussão. Precisamos de
critérios de avaliação da plausibilidade dum argumento que não estejam dependentes de
quadros éticos particulares. Precisamos, enfim, da ideia de objectividade, isto é dum
conhecimento que se produz a partir de interesses particulares, mas valida-se por intermédio
de critérios que todo o indivíduo racional pode aceitar, independemente do seu quadro de
valores.
É isto que levou Max Weber a dedicar muita atenção à questão. Poucos sabem, mas Max
Weber sempre usou a palavra “objectividade” entre aspas. Ao fazer isso ele queria destacar a
dificuldade básica de cancelar os nossos valores na apreciação da plausibilidade dos nossos
argumentos. Ele reconhecia que a prática da sociologia dependia muito de valores. O meu
interesse por questões de pobreza, HIV, corrupção ou moda tem a sua origem na minha
biografia, nos meios sociais em que cresci, na ideia que tenho do que é a boa vida e do que é
uma sociedade justa. Weber insistia, contudo, na ideia de que a origem social do meu
interesse não podia conferir, por si só, veracidade às conclusões a que eu chegava. Weber
insistiu, por exemplo num texto de 1904, que existe na prática da sociologia – e da história –
uma tensão fundamental entre conhecimento e julgamento. Produzimos conhecimento quando
aceitamos a nossa responsibilidade de descortinar a realidade factual. Tecemos juízos de
valor, isto é julgamos, quando aceitamos apenas a nossa responsabilidade de defender os
nossos ideais. No primeiro caso emulamos o princípio sagrado da neutralidade axiológica; no
segundo caso fazemos política. E eu digo mais: má política e prestação de mau serviço aos
nossos próprios ideiais.
Quando o contrário de objectividade é a “irracionalidade”
Eu sou pela defesa da neutralidade axiológica que Max Weber faz e isso não só porque foi na
Alemanha onde aprendi sociologia. Sou pela neutralidade axiológica porque só ela é que torna
possível alcançar com a actividade sociológica aquilo que o conhecimento científico de mais
valioso nos proporciona: a atitude crítica. E a atitude crítica, não preciso de enfatizar isto, é
fundamental para a produção dum mundo melhor. É, incidentalmente, por esta razão que não
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me farto de citar e recomendar a leitura do “Decálogo do sociólogo” da autoria do nosso
colega Carlos Serra. Nesse decálogo destaca-se acima de tudo a atitude crítica como
fundamento duma cidadania plena. A sociologia, no final de todas as contas – incluindo
gorjetas e tudo – não é mais, nem menos do que a prática duma cidadania plena, portanto da
condução duma vida responsável.
O nosso país atravessa um momento particularmente delicado e marcado por fortes tensões
resultantes de diferenças de interesses. Embora essas diferenças não sejam assumidas
abertamente, elas existem e não se fartam de erguer a sua cabeça – muitas vezes feia – na
esfera pública onde, apoiando-se em quadros éticos mal formulados, envenenam o ambiente
de discussão e recuperação racional da nossa sociedade. Na nossa esfera pública o que confere
validade a um pronunciamento é menos a sua validade racional e mais o que o aproxima
duma maneira emocional de ver o país. Este quadro negativo é reforçado pela influência
negativa desempenhada pela dependência do nosso país do auxílio ao desenvolvimento que
impõe a ideia da necessidade do desenvolvimento – mas um desenvolvimento definido por
outros segundo uma leitura teleológica da História ao jeito do que nos levou à beira do
pricipício depois da conquista da independência – como principal árbitro da validade do
conhecimento. Essa dependência do auxílio externo traz consigo uma narrativa
essencialmente normativa sobre a nossa sociedade – que até perde a sua individualidade no
jargão desse discurso – que nos devolve o país pela via de conceitos de natureza discursiva
que se fazem passar por conceitos analíticos. Usamos, sem nenhum problema, conceitos como
pobreza, corrupção, democracia, justiça, direitos humanos, população, comunidade, etc. e não
questionamos a sua profundidade analítica, isto é – e numa perspectiva da teoria da descrição
– não procuramos saber se os critérios sobre os quais eles assentam para descrever a nossa
sociedade conforme os seus promotores gostariam que nós os recuperássimos fazem sentido.
Não fazemos isso porque esses conceitos sugerem o tipo de mundos que alguns de nós julgam
ser o tipo de mundos que o conhecimento sociológico deve contribuir para produzir.
Não foi por acaso que as minhas primeiras duas intervenções públicas como sociólogo no
jornal Notícias tenham consistido num ataque a dois conceitos que ocupam um lugar
privilegiado nesse discurso: pobreza e corrupção. Nesses ataques procurei chamar a atenção
dos leitores, sobretudo dos leitores que se interessam por uma abordagem mais analítica, e
logo crítica, do nosso país, à necessidade de discutir o problema da pobreza e da corrupção no
nosso país com base na interpelação dos critérios sobre os quais assenta a ideia de que esses
fenómenos constituem problema que precisa de solução. Com isso estava a dar substância a
um credo pessoal que aprendi da leitura de Hans-Georg Gadamer, o filósofo fenomenológico
alemão, e que consiste na ideia de que o mundo está cheio de respostas e soluções pelo que a
filosofia, no meu caso a sociologia, tem que definir a sua tarefa como sendo a de procurar
pelos problemas e perguntas para os quais já temos soluções e respostas. Foi por isso que o
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livro que reuniu estes textos todos e foi publicado pela editora Meianoite ficou com o título
“Um país cheio de soluções”.
Foi também no quadro destas preocupações que me pronunciei criticamente em relação à
influência nociva das consultorias e cheguei a dizer, numa palestra organizada pelo meu
amigo musculoso Hélder Jauana com a anuência condescendente do também amigo Filimone
Meigos no ISCTEM, que elas, portanto as consultorias, constituiam a morte anunciada das
ciências sociais. Ao dizer isso queria, ainda, destacar esta questão da objectividade. Com
efeito, a prática da consultoria, sobretudo o tipo de consultoria que é feita no país onde se
exigem “soluções” para problemas práticos padece dos mesmos males de que padece a ideia
de que o conhecimento científico não é objectivo. O problema aqui, tal como na crítica à
objectividade, consiste na ideia de que razões nobres podem ocupar o lugar da validade
metodológica na avaliação da veracidade do conhecimento. É por isso, por exemplo, que
quase toda a consultoria parte do pressuposto segundo o qual o problema para o qual o
consultor é chamado a encontrar uma solução – que ele empacota em “recomendações” – já
está claro e não carece mais de compreensão. Temos aqui, mais uma vez, aquela distinção que
Max Weber fazia entre conhecimento científico e juízo de valor. Para o juízo de valor todo o
problema está claro, desde o momento que ele reflicta a nossa visão do mundo; para o
conhecimento científico, porém, a abordagem do problema começa necessariamente da
questão que assenta naquilo que não sabemos e precisamos de saber para podermos entender
um fenómeno.
Dou-vos dois exemplos, ainda que algo distantes das consultorias, mas que espelham as
minhas inquietações. O primeiro é o dos desmaios que aconteceram na escola Quisse Mavota;
o segundo é o dos sequestros que assolaram Maputo nos últimos meses. Em ambos os casos o
principal interesse que investimos consistiu em articular as notícias que íamos recebendo
sobre um e outro fenómeno com a ideia que temos de como o mundo devia ser. Assim, no
caso de Quisse Mavota partimos da ideia fantástica segundo a qual a sociedade moçambicana
assentaria numa cultura tradicional essencial e perene e em cujos elementos devíamos
procurar a inteligibilidade do fenómeno dos desmaios. Não questionamos a própria ideia de
“desmaio”, nem nos preocupamos em articulá-la com o compromisso que firmamos com uma
visão científica do mundo, compromisso esse feito de forma tácita quando aceitamos o
diploma de conclusão dos nossos estudos. Ou por outra, preferimos a superstição à abordagem
crítica do país sob o efeito nefasto da crença na ideia de que o que satisfaz o ideal de
sociedade que temos em mente é suficiente como critério de validação do conhecimento.
Agora, uns fizeram isto porque não queriam ferir nenhumas susceptibilidades – ninguém quer
ser acusado de não estimar a cultura tradicional – enquanto que outros simplesmente
pensaram que a nossa sociedade é assim mesmo. Em ambos os casos falhamos o teste da
objectividade e prestamos mau serviço à sociedade, serviço que uma psicóloga veio a prestar
ao chamar a nossa atenção para o facto de que os tão propalados “desmaios” não estavam a
Av. Pedro Langa, Alto Maé, 1088 R/c, Maputo
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acontecer. Nisso ela apoiou-se no seu compromisso com a visão científica do mundo e definiu
desmaio como perda de consciência. Ao constatar que nenhuma das adolescentes que
“desmaiavam” perdia a consciência, desconfiou.
No outro caso, o caso dos sequestros, voltamos a confundir as coisas ao dar prioridade, na
discussão pública, aos nossos sentimentos em relação ao governo e à comunidade afectada
pelo problema. Nisso perdemos a oportunidade de colocarmos perguntas pertinentes que até
poderiam ter ajudado a polícia a mais cedo chegar à questão central. Logo no início ficou
evidente que havia necessidade de colocarmos fortes interrogações em torno da noção de
“sequestros” uma vez que a informação de que dispúnhamos não era suficiente para
associarmos o conteúdo das notícias a esse termo. Com a honrosa excepção do Comandante
da Polícia que especulou bem alto que se tratava de tudo menos de sequestros – e foi,
naturalmente, vaiado – os restantes comentadores preferiram desfiar todo o tipo de teorias
sobre a ineficiência da nossa polícia e sobre as ligações perigosas do governo.
Conclusão
Creio que já falei muito. Creio também que já transmiti o essencial do que queria partilhar
convosco. Achei oportuno aproveitar este momento solene de celebração da sociologia em
Moçambique para insistir no tipo de postura que nos vai ajudar a assegurar o lugar da nossa
disciplina no firmamento académico moçambicano. Lembro-me tão bem do meu primeiro dia
de aulas no curso de sociologia do anfiteatro da UFICS. Lembro-me da amável apresentação
que o Francisco da Conceição fez e do olhar desconfiado dos presentes, muito possivelmente
por causa da sacola colorida bem ao estilo africano que trazia comigo. Lembro-me de ter dito
para os meus botões, “meu Deus, todo este pessoal sentado em carteira só pode virar
sociólogo de... já sabem! - os futuros sociólogos de Moçambique” e ter suspirado com
desespero a tentar perceber onde me tinha metido. Lembro-me do decurso da aula, de como
falamos da feiticeira na escola Josina Machel e vi nos olhos de cada um dos presentes uma
luzinha a brilhar à medida que as perguntas que eu ia colocando convocavam os estudantes a
encontrar na interrogação o momento mais alto da prática da sociologia. Foi esse brilho nos
olhos que me levou a decidir espontaneamente que na aula seguinte cada um deles teria
direito a um chocolate, mas também dissipou todas as minhas dúvidas em relação ao futuro da
sociologia. A realização da segunda aula pública de sociologia é, para mim, a consagração do
que tem sido feito. É o acender do tipo de luzes que o nosso país precisa não para se
desenvolver – como é hábito dizer – mas sim para continuar a atrair a atenção daqueles que se
maravilham com o milagre da sociedade, com esse engenho sem rosto, nem corpo que é capaz
de produzir com tanta espontaneadade uma coisa tão complexa, mas ao mesmo tempo
simples, como é a nossa sociedade. Uma sociedade construída sobre os alicerces ténues da
ilusão duma força invisível, mas ilusão feita de teias sólidas que conferem realidade ao que
são os nossos receios, angústias e temores.
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Não quero imaginar o que vai ser do país quando um dia despertarmos dessa ilusão. Espero,
contudo, que antes do despertar colectivo esteja um de vocês, os sociólogos entre nós, para
fazer o relatório do evento, colocar no Facebook para todos nós irmos lá clicar: I like. Muito
obrigado por me terem escutado com tanta paciência! Muito obrigado pela honra que me
conferiram de proferir esta aula pública! A sociologia somos nós.
Obrigado!
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