quarta-feira, 3 de maio de 2017

TOMÁS VIERA MÁRIO: UM SANTO HOMEM METIDO EM SARÍLHOS

Armando Nenane
8 min · Tomás Viera Mário, pessoa por quem tenho a minha mais elevada estima e consideração, homem que admiro pela sua integridade moral, bom nome, honra e reputação quase que inabaláveis: oh, quanta santidade abunda num homem só: jornalista, jurista e activista dos direitos humanos e cidadania, especializado em matérias de direito à informação, designado presidente do Conselho Superior da Comunicação Social, tem com a Procuradoria-Geral da República, contas por ajustar. Não é comigo que o Tomás tem contas por ajustar, mas sim com a procuradoria, entidade competente que o confiou enquanto instituição responsável por zelar pela independência dos órgãos públicos de comunicação social. Não fui eu que confiei no Conselho Superior da Comunicação Social para tramitar tal expediente, que exige essencialmente o esclarecimento do caso G 40. Foi a procuradoria. A mim coube-me o exercício de exigir esclarecimentos a procuradoria, quem, por sua vez, tomando a peito as minhas dores, achou por bem encaminhar o expediente ao Tomás, quem deverá, junto com a sua cúpula, discutir as questões que ali são colocadas e deliberar sobre as mesmas. Pessoalmente, admira-me muito a paciência da procuradoria face à demora do conselho superior em responder ao expediente, já lá vão cerca de dois anos e meio. Não sendo eu tão paciente quanto os senhores magistrados do Ministério Público, acabo mesmo por me ver na condição daquele pacato camponês analfabeto, que não sendo estudado em matérias de direito, em presença de um tribunal que não julga o seu caso, acaba por achar que a justiça não existe para ele e assim decide começar a insultar e a mandar manguitos que nem aquele maluco dos semáforos que passa a vida a mandar manguitos para os automobilistas. Talvez seja o caso de eu, enquanto autor da queixa contra o G 40, poder ter enlouquecido, mas como não fui eu que encaminhei o expediente para o conselho superior da comunicação social não deverá ser para mim passada a certidão de insanidade mental, mas sim a procuradoria, que mandou o expediente para lá, em jeito de remissão. Enquanto durar o silêncio do Tomás e seu elenco sobre este expediente da procuradoria, nós os outros, que somos aqui achados loucos por termos o atrevimento de questionar o inquestionável, cabe-nos remetermo-nos ao bom uso da imaginação, a fim de imaginarmos que o ilustre Tomás não responde ao nosso questionamento – via procuradoria – porque recebeu “orientações superiores” para não o fazer. Orientações superiores essas que só podem vir da pessoa que lhe confiou a cadeira de presidente do Conselho Superior da Comunicação Social, nomeadamente o próprio Presidente da República, Filipe Nyusi. Em tempos tão difíceis quanto os que hoje vivemos, tempos estes de grandes incertezas, um posicionamento de Tomás Viera Mário e seu elenco sobre o caso G 40, tanto absolvendo quanto condenando o “fenómeno G 40”, pode ser a chave da porta que nos dará acesso ao esclarecimento de como os moçambicanos sofreram um golpe de Estado através das rádios e das televisões públicas, onde se estabeleceram as 40 vozes que acabaram por aniquilar os princípios mais nobres que regulam a comunicação social, incluindo o contraditório e a independência editorial, o que culminou com a violação da Lei de Imprensa, da Constituição da República e do Estado de Direito e Democrático. Foi para legitimar actos decorrentes da má governação nos últimos 15 anos, caracterizados pela cultura do roubo, da gatunagem e do gangsterismo, que se instituiu o infame G 40 nas nossas rádios e televisões públicas. Não nos admira que o mesmo partido Frelimo, que criou o G 40, tenha tido a proeza de legalizar as dívidas contraídas secretamente e ilegalmente em 2012 e 2013 atafulhando-as na Conta Geral do Estado de 2015, aprovando, com a sua maioria esmagadoramente fascista, um documento que nos mostra esse desprezo total pelo povo, numa autêntica violação grosseira da Constituição da República e do Estado de Direito e Democrático. Enquanto o G 40 ia se atarefando com a defesa de uma governação fascista nas nossas rádios e televisões públicas, naqueles seus coitos combinados a que atribuíam o nome de debates, promovendo a perseguição de inimigos jurados do poder político a que eles mesmos chamavam de “apóstolos da desgraça”, “espíritos agitadores”, “críticos de Maputo”, “agentes da mão-externa”, “vândalos”, como forma de os colocar de fora do debate das ideias, nas artérias de Maputo e arredores íamos ouvindo tiros que ceifavam a vida de intelectuais e outros académicos que primavam pelo pensamento livre e descomprometido, incluindo Gilles Cistac, Paulo Machava, Jeremias Pondeca, assim como outros como Jaime Macuane e Carlos Jeque, aos quais apenas foram dados tiros com o intuito de lhes pôr coxos. Na sequência do assassinato de Gilles Cistac, que até tinha uma queixa recente contra elementos do G 40 que lhe chamaram de “ingrato” e “mal-agradecido” no lugar de debaterem as suas ideias, ouvimos o professor Lourenço do Rosário dizer que estava na hora do dono dos cachorros recolher os seus cachorros porque estavam a atacar as pessoas injustamente nas nossas rádios e televisões públicas que vivem dos nossos impostos. Estou convicto de que os tais cachorros são o G 40, cabendo agora ao Conselho Superior da Comunicação Social o dever de os recolher definitivamente, o que passa, pura e simplesmente, por, fazendo uso da consciência, da Lei de Imprensa, da Constituição da República e dos princípios que enformam o Estado de Direito e Democrático, responder a procuradoria. Raciocinando em sede dos mecanismos de protecção das vítimas, testemunhas e denunciantes, deverá aqui imaginar o Tomás que, enquanto não responde ao expediente da procuradoria, tem nas suas mãos a vida de quem exerceu em sede própria o dever de denunciar em tempo útil os que através das nossas rádios e televisões públicas violaram a nossa dignidade colectiva. Se de repente o pobre Nenane aparecer morto por ai, não custará ao povo culpar o mano Tomás, quem anda a dormir por cima do processo. Já o líder espiritual do G 40, Gustavo Mavie, tratou de preparar-me a cama, ao me qualificar de “líder da quinta coluna”, sendo a tal “quinta coluna”, segundo ele, um grupo de espiões que trabalham para derrubar o regime do dia. Depois de nos qualificarem com nomes feios, para a materialização do aniquilamento final basta um simples piscar de olhos. Há quem considere os esquadrões da morte uma espécie de prolongamento do G 40, afinal de contas um jornal da praça escrevia na sua manchete que “braço armado do G 40 mata Cistac”. As investigações da PGR sobre as dívidas contraídas secretamente e ilegalmente levaram a quebra do sigilo bancário de Armando Emílio Guebuza e de 19 individualidades a ele ligadas, incluindo ilustres elementos do G 40, em cujas contas se pretenderá saber quanto dinheiro existe, qual a proveniência e a que se destina. Não é de se estranhar que os “advogados” que acompanham as incursões de Guebuza hoje, incluindo aquando da sua ida a Comissão Parlamentar de Inquérito instituída para averiguar as dívidas sejam alguns ilustres membros do G 40, incluindo os juristas Isálcio Mahanjane, que chegou a ser designado director de informação da Miramar, Alexandre Chivale, a quem foi atribuído o prémio de membro do Conselho Superior da Magistratura Judicial, assim como Armindo Chavana, então responsável pela comunicação pública do ex-Chefe do Estado. Não é de estranhar que muitos dos operativos do G 40, que se fizeram passar por analistas e comentadores políticos nas nossas rádios e televisões públicas quando na verdade não passavam de pobres propagandistas que operacionalizavam um plano maquiavélico de roubar o povo moçambicano, tenham sido posteriormente agraciados como titulares de altos órgãos do Estado, incluindo um tal Patrício José que se tornou vice-ministro da defesa, um tal Filimão Suazi que se tornou membro do Conselho Superior da Magistratura do Tribunal Administrativo, uma Emília Moiane, então chefe da redacção da televisão pública, que virou directora do Gabinete de Informação, resultado de uma enorme urdidura. Não é de estranhar que jornalistas como Rogério Sitói, então director do jornal Notícias, tenham passado pela humilhação de se verem exonerados e posteriormente substituídos das suas funções por G 40s como malta Jaime Langa, que sendo meu amigo de verdade não o vejo nem perdido nem achado em matérias de jornalismo, mas como alguém capaz de se fazer passar por aquilo que não é para atingir objectivos decididamente inconfessáveis. De resto, a maioria dos indivíduos que de repente, assim do nada, transformaram-se em grandes estrelas da nossa televisão pública, dos telejornais e dos programas de comentário e análise política, eram indivíduos de cuja proveniência e progressão na carreira malta nós desconhecíamos. De certeza que só podiam ser traficantes, aqueles cuja palavra estaria ao serviço de alguém muito poderoso, mas num golpe extremamente baixo e que revela muita falta de cultura. Quando ouvi dizer que Castel-Branco e Fernando Mbanze responderiam em tribunal por haverem tido o atrevimento de publicar um certo escrito crítico a governação, logo conclui que só podia haver nisso a mão do G 40, até porque a procuradora Sheila Matavele, que deduziu a acusação, falando de crimes contra a segurança do Estado, tem fortes ligações com a elite política no poder, muito por conta do seu casamento com o meu amigo Arsénio Henriques, antes jornalista e depois nada mais nada menos que assessor de imprensa do presidente Filipe Jacinto Nyusi. Na altura da contracção das dívidas ilegais, que empurraram o país para a bancarrota, Filipe Jacinto Nyusi vinha exercendo as funções de Ministro da Defesa Nacional, tendo sido responsável pela assinatura do expediente que viria a autorizar o então Ministro das Finanças, Manuel Chang, a avançar com o processo que culminaria com a criação da ProIndicos, afinal a verdadeira mãe da Ematum e da MAM, o que pode significar que as investigações decorrem sobre um ambiente em que tudo se vai fazendo nos bastidores para colocar incólume o nome do Chefe do Estado, por sinal metido até ao pescoço. Na expectativa de que não tenha recebido “orientações superiores” da parte de quem lhe nomeou para a cadeira de presidência do nosso órgão de disciplina da comunicação social, espero do Tomás e seu elenco algum respeito e consideração, a fim de que o vosso silêncio não acabe por equivaler a passagem de um certificado de insanidade mental para todo o povo moçambicano que viu ao longo dos últimos 15 anos as suas rádios e televisões públicas serem tomadas por gangsteres que praticam o teatro e o coito combinado em defesa do rei no lugar de promoverem o debate aberto e inclusivo de ideias construtivas. Há dias vi e ouvi o Tomás a dizer que os juízes do Tribunal Supremo deviam ser expulsos por terem ali processos há mais de vinte anos. Considerando que o nome do Tomás consta na lista do G 40, tornada pública pelo SAVANA de 23 de Julho de 2011, pelo respeito que tenho por V.Excia, pelo seu bom nome, pela sua honra, reputação e integridade moral, pelo alto sentido de Estado e de missão com que nos tem conduzido nesta nossa luta pela liberdade de imprensa e de expressão, pelo direito do povo à informação, nada mais me resta senão vê-lo como um santo homem metido em sarilhos, mas também me reservo ao direito de achar que neste jogo o ilustre aparece como um jogador que joga com o apito na boca ou como um juiz em causa própria, ao que nos resta ainda esperar encontrar o bom senso junto dos seus pares que fazem do conselho um órgão colegial. Pelo que vos peço que respondam a procuradoria, a fim de que a procuradoria possa por seu turno dizer-me alguma coisa ex-oficio para que eu também possa no final poder dizer alguma coisa aos demais cidadãos que me acompanham nesta nossa caminhada, que já vai longa. Pela Liberdade de Imprensa e de Expressão, a Luta Continua!
PS: Pelas celebrações do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, que hoje se assinala, a todos os jornalistas e cidadãos sérios deste país e do mundo em geral as minhas mais cordiais saudações…

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