Pensando nas ruínas em que vivemos
CARTA A MUITOS AMIGOS
É bem penoso para todos pensar no seu quotidiano e sobretudo sobre o dia de amanhã.
Circulando alguém pelas ruas da capital, nos transportes públicos, nos cafés, nos restaurantes, na família, com amigos, em qualquer vila ou cidade do país, o mesmo panorama: despedimentos, empreendimentos a fechar, imóveis vazios e cada dia tornando irrisórios os preços de venda ou aluguer, toda a gente queixando-se da tremenda desvalorização do seu poder de compra, em mais de 50% nos últimos dois anos.
Obviamente que vários factores negativos determinam o desespero em que vivemos, alguns internos e outros que vêm de fora.
Claro que Moçambique não possui capacidade para determinar os preços mundiais do petróleo, do gás, do carvão, das diversas matérias-primas desde os recursos minerais aos produtos da agricultura, das florestas, do mar.
Em consequência disto e baixando os preços do carvão fecham minas em Tete, Zambézia, Nampula. Segue-se o desemprego.
O exportarem-se matérias-primas em vez de produtos acabados custa autênticas fortunas ao país, compramos de fora tecidos e roupa, porém vendemos algodão.
Vendemos madeiras, compramos de fora as portas, caixilhos, mobílias, armários.
O absurdo vai ao ponto de na África do Sul se refinar o nosso gás e lá vamos buscar o mesmo gás processado, vai a energia de Cahora-Bassa para a África do Sul e Maputo compra na sequência essa mesma energia. Quem ganha? Quem perde?
De onde provém o peixe, a carne, os vegetais que consumimos? Vende a Angónia ou Tsangano o seu milho e trigo, o Chokwé o tomate? Como sobreviver e criar emprego deste modo?
Graças ao terrorismo não circulam os camiões e viaturas senão em colunas escoltadas, bem lentas e muitas vezes atacadas. Os comboios que deveriam evacuar o carvão pararam, minas fecharam porque as empresas não podem vender o seu produto.
Faz dias visitei Manica. Encontrei o mesmo cenário, fecham lojas e fábricas, fecham minas excepto as clandestinas que mineram o ouro.
Em 1962 o investigador francês René Dumont grande conhecedor do continente publicou um livro com o título L’Afrique Noire est mal partie. A África Negra começa mal. Houve muitas críticas acerbas, mas e bem infelizmente para todos nós os factos tendem a provar que ele tinha razão.
Olhemos o que acontece na África Subsariana:
· Países que estão de tal modo dilacerados que o estado não funciona, os casos mais evidentes a Somália e a Guiné-Bissau. As populações buscam refúgio e o seu ganha-pão nos estados vizinhos. A Moçambique chegam muitos somalianos, alguns ficam nos campos de refugiados, outros criam uns pequenos negócios mais ou menos clandestinos, uma boa parte busca passar para a África do Sul.
· A Somália faz parte dos alvos do terrorismo. Mas o terrorismo assola muitos outros Estados, a Nigéria, o Mali, a República Centro Africana, etc.
· Organizações terroristas da Somália agora apoiam em armas e munições e treino o nosso terrorista local.
· Reina no continente a vontade de nunca o Presidente querer deixar o poder:
o Terminou o Congresso do MPLA. O Presidente angolano foi reeleito, está a dirigir o Estado desde 1979. Ainda não mostrou vontade real de cessar as funções. Dois dos seus filhos entraram no CC do Partido. Uma das suas filhas é considerada a mulher mais rica do continente.
o Na Guiné Equatorial o Chefe do Estado Theodore Obiang que depôs e mandou executar o seu tio então Presidente, está no poder desde Agosto de 1979. É considerado um dos homens mais ricos do mundo, já colocou o seu filho também milionário como Vice-Presidente.
o A Procuradoria francesa deseja investigar este filho uma vez que possui muitos imóveis e bens em França e ignora-se a legitimidade da origem dos fundos. A violência contra qualquer dissidente já fez objecto de vários relatórios das Nações Unidas.
o No Congo (B) o presidente depois do assassinato de Marian Ngouabi em 1977 reina o Presidente Sessou Neguessou, cuja fortuna pessoal não se pode desprezar. Também não há indícios da vontade de sair do poder. Há uma grande repressão no país. Raras as semanas sem prisões, mortes e feridos, disparos contra manifestantes e o pior que se pode imaginar.
o No Congo (K) vizinho, o Presidente Kabila que sucedeu ao seu pai no falecimento deste, também não indicia a vontade de sair do poder. Repressões, mortandades sucedem-se. De verdade não há grande progresso desde a deposição do ditador sangrento Mobuto.
o O que vemos no vizinho Malawi além dos apetites do controlo do Lago e a vontade louca de navegar o Chire e o Zambeze? Miséria, perseguições contra adversários políticos e predecessores.
o Ao nosso lado um reino, a Suazilândia, com um monarca que anualmente aumenta o número de esposas, todos se deleitando no luxo e o povo sofrendo.
o Na África do Sul o ANC perdeu a capital do país, a capital económica, Mandela Bay e Cape Town a favor da chamada Aliança Democrática, herdeira dos sectores menos ferozes e mais esclarecidos do antigo apartheid. Perdeu devido aos escândalos financeiros do Presidente e ao falhanço total da política de Mbeki de empoderamento negro que criou meia dúzia de bilionários negros e a grande maioria das pessoas continuam na miséria.
Na nossa terra também o poder também nas últimas décadas serviu a ganância e o ego de alguns, pilhou-se o Estado, perseguiu-se gente capaz e honrada. Situação triste.
Certa comunicação social e também as ditas redes sociais tentam denegrir o Presidente, o seu Governo e até mesmo incriminam os filhos. Triste, muito triste este comportamento. Há que nos interrogarmos de onde vem esta campanha, quem a financia.
Mas importa repetir a Luta Continua! Um abraço.
P.S. Um abalo sísmico de grande magnitude destruiu uma cidade histórica italiana. Solidarizemo-nos com as famílias das vítimas e aqueles que tudo ou quase perderam.
Os nossos amigos portugueses vêm-se assolados por sucessivos incêndios, da Madeira ao continente. Há mortos e destruições para as vítimas o nosso carinho. Parece que uns loucos pirómanos provocam os desastres.
Aqui não há pirómanos na destruição das florestas, até em reservas. A ganância, o desleixo das autoridades locais estatais ou tradicionais, para além dos comboios e camiões que transportam o carvão vegetal. Em todos os vizinhos proíbe-se a produção do carvão vegetal a partir das florestas.
SV
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